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1 Beatriz Machado de Almeida Emergências cirúrgicas – Aula 8 ROTEIRO • Apresentação clínica. • Estratificação de risco. • Estabilização. • Localizar o sítio e terapêutica do sangramento. INTRODUÇÃO • Sangramento ao longo do trato gastrointestinal. ❖ Hemorragia digestiva alta: quando o sangramento ocorre no TGI acima do ângulo de Treiz. Esôfago, estômago, duodeno. ❖ Hemorragia digestiva baixa: quando o sangramento ocorre abaixo do ângulo de Treitz. Jejuno e íleo, cólon, reto e ânus. • Relação com o ligamento de Treitz: marco anatômico durante cirurgias abdominais (onde passa a artéria e a veia mesentérica inferior). O intestino delgado fica solto no intestino, sendo possível percorrer os seus 3 metros. Quando vai na válvula ileocecal (porção final do íleo) e percorre para o começo, encontra uma alça fixa pelo ligamento de Treiz (porção final do duodeno). Para especialistas tem a denominação de hemorragia digestiva média, que é hemorragia do intestino delgado. CLASSIFICAÇÃO QUANTO A APRESENTAÇÃO Importante – Cai em prova. • Enterorragia: evacuação volumosa de sangue vermelho rutilante. O paciente evacua vermelho vivo. • Hematoquezia: evacuação de sangue, reconhecido como tal nas fezes. O paciente refere rajas de sangue misturada com as fezes. Considerado um sangramento de pequena monta, normalmente relacionado a alguma coisa na porção final do trato digestivo (ex. hemorroida). • Melena: evacuações enegrecidas, de consistência líquida e fétida. É sangue digerido pelo TGI. Tipo borra de café. Normalmente, tem que dar tempo de passar ao longo de um trajeto, sendo associada ao TGI alto. *As características da evacuação são consequência do volume, da velocidade, da localização do sangramento e velocidade do trânsito intestinal. Ex: Se for um sangramento mais baixo, não dá tempo de digerir, e o sangue é um pouco mais vermelho vivo. HEMORRAGIA DIGESTIVA ALTA Sangramento oriundo do trato gastrointestinal (esôfago, estômago ou intestino delgado proximal - antes do ângulo de Treitz). APRESENTAÇÃO CLÍNICA • Hematêmese (vômito com sangue): Normalmente está associado a varizes esofágicas, neoplasia do esôfago ou estômago, síndrome de Mallory-weiss - laceração esofágica após esforços pra vomitar. • Melena (sangue digerido): • Hematoquezia (mais rara); • Sangramento oculto: exemplo: tumor de estômago em fase inicial. O paciente geralmente tem uma manifestação clínica só com desconforto, anemia, mas nada gritante. Outros sintomas que podem vir associados a depender da etiologia: ❖ Doença ulcerosa péptica: epigastralgia, dispepsia; ❖ Laceração esofágica: odinofagia/disfagia, vômitos; ❖ Tumor: anemia; A depender do grau da hemorragia, o paciente pode vir a apresentar alterações hemodinâmicas, desenvolver choque hemorrágico e até ir a óbito, caso o suporte oferecido não seja adequado. Hemorragia Digestiva 2 Beatriz Machado de Almeida Emergências cirúrgicas – Aula 8 ETIOLOGIA Segundo a professora, isso não será cobrado especificamente na prova. Entretanto, faz parte da história clínica do paciente. + COMUNS • Doença ulcerosa gastroduodenal: normalmente, é a causa mais comum de hemorragia digestiva. • Gastrite/duodenite erosiva ou severa; • Esofagite erosiva ou severa; • Varizes esofágicas: pacientes portadores de cirrose, hipertensão portal. • Angiodisplasia; • Mallory-weiss: laceração esofágica após estímulos excessivos pra vômitos. • Lesões tumorais (pólipos/câncer); • Desconhecida (10-15%). - COMUNS • Lesão de Deulafoy. • Gave. • Hemobilia. • Hemossucus pancreaticus. • Fístula aortoentérica. • Úlceras de Cameron. • Varizes ectópicas. • Iatrogenia (após procedimentos endoscópicos). ÚLCERA GÁSTRICA E/OU DUODENAL (20-25%) Na maioria das vezes, a hemorragia digestiva alta está associada a úlcera gástrica ou duodenal. Isso quando é um paciente que não tem hipertensão portal. CLASSIFICAÇÃO DE FORREST É uma classificação vista constantemente em laudos de endoscopia. Usada para descrever qual é o status daquela úlcera encontrada ou no estômago ou no duodeno. Serve também para avaliar risco de resangramento. • Sangramento ativo: ❖ IA → quando passa o endoscópio e visualiza um vaso jorrando sangue. ❖ IB → não é um vaso em jato, mas a mucosa sangra como se tivesse babando sangue. • Sangramento recente: sabe que sangrou, mas não está sangrando no momento. É uma úlcera que tem estigmas-sinais de sangramento. ❖ II A → vaso viável. ❖ II B → coágulo aderido. ❖ II C → mancha de hematina plana. • Sem sinais de sangramento: ❖ III → úlcera em fase de cicatrização com fundo limpo. HDA POR ÚLCERA PÉPTICA: Porém ... Na maioria dos casos, não será possível definir a causa do sangramento apenas com fundamentos clínicos! A ENDOSCOPIA É SOBERANA! A única coisa que vem antes da endoscopia é a estabilização clínica do paciente. No final das contas, todo paciente com hemorragia digestiva alta vai precisar de uma endoscopia. ABORDAGEM DO PACIENTE • Avaliar quadro clínico na chegada: tentar colher o máximo de informações possíveis. Tempo e quantidade de sangramento, coloração, odor, doenças de base, cirurgia recente, 3 Beatriz Machado de Almeida Emergências cirúrgicas – Aula 8 internamento prolongado (lesão de mucosa gástrica), cirurgia ortopédica (necessidade de AINE por mais de 5 dias). DETALHAR! • Estratificar o risco: a partir do exame físico do paciente. ABCDE. Paciente de alto risco é aquele que sangrou muito, tem sinais de choque hemorrágico. • Tratamento ambulatorial ou hospitalar. PASSO 1: ESTRATIFICAÇÃO DE RISCO Rockall score, AIMS 65, Glasgow-Blatchford (EGB) Tabela: Escore de Glasgow Blatchford: usado na emergência para avaliar a gravidade do paciente e definir a necessidade de internamento ou atendimento ambulatorial. • EGB >= 1: casos de alto risco de intervenção ou morte, com sensibilidade >99%. • Se EGB = 0: casos de baixo risco e podem receber alta precoce, com realização da EDA ambulatorialmente no dia seguinte. PASSO 2: ESTABILIZAÇÃO • Paciente estável? normotenso, normocárdico, eupneico. ❖ Sim: Buscar pelo sítio de sangramento. História clínica + exame físico + solicitação de EDA. ❖ Não: 1 – estabilizar o paciente – MOV (monitor, oxigênio – cateter nasal de O2, veia – acesso calibroso, hidratação) + ABCDE; 2 – buscar pelo sítio de sangramento. PASSO 3: LOCALIZAR O SÍTIO E TRATAR Se o paciente tiver qualquer sinal de instabilidade clínica, a primeira coisa a ser feita é estabilizar. A endoscopia deve ser feita o mais breve possível, mas só pode ser feita quando o paciente apresentar estabilidade hemodinâmica. ESTABILIDADE HEMODINÂMICA • EDA em até 24 horas; • Exame negativo (endoscopia – ausência de sangramento em todo o trojeto avaliado – esôfago, estômago e porção inicial do duodeno) → colonoscopia (melena) / enteroscopia (hematêmese). • Colonoscopia negativa → 1 - avaliar intestino delgado. 2 – angiografia/enteroscopia. Para os especialistas, a hemorragia digestiva é dividida em alta (esôfago, estômago e duodeno), 4 Beatriz Machado de Almeida Emergências cirúrgicas – Aula 8 média (jejuno e íleo) e baixa (cólon, reto e ânus). Tanto a endoscopia digestiva alta (só vai até a porção inicial do duodeno) quanto a colonoscopia (só vai até o íleo) não conseguem visualizar a hemorragia digestiva média, que é a área que fica sem avaliação. Então, ao fazer a endoscopia e a colono e ainda assim não souber de onde sangrou, tem que prosseguir a investigação avaliando o intestino delgado: enteroscopia (como se fosse a endoscopia; aparelho muito maior que passa por todas as porções do duodeno, atravessa o ângulo de Treitz e consegue percorrer todo o delgado; não está sendo feita na Bahia).Nestes casos, pode-se solicitar a cintilografia para tentar determinar o sítio do sangramento. INSTABILIDADE HEMODINÂMICA/SANGRAMENTO SEVERO • EDA o mais breve possível (estabilidade hemodinâmica). • Contactar equipe cirúrgica/radiologia intervencionista. • Exame negativo → colonoscopia. O tratamento é não medicamentoso e medicamentoso. Todo paciente que chega na unidade de emergência com hemorragia digestiva tem que usar IBP (omeprazol venoso, por exemplo). Até que se prove o contrário, a principal causa é doença ulcerosa péptica, e por isso, é necessário que seja iniciado o tratamento. É feito o IBP com uma dose de ataque de 80 mg em bolus e depois a manutenção é feita com 8 mg/h em BIC ou 8/8 - 12/12horas. As demais drogas são utilizadas de acordo com a causa. Terlepressina é um análogo da epinefrina que é utilizado nas varizes esofágicas, hipertensão portal pra promover vasoconstrição e assim diminuir o sangramento. Se for um paciente que tem fibrilação atrial, faz uso de anticoagulante (clexane, marevan, xarelto), tá sangrando de alguma angiectasia intestinal por conta da fragilidade vascular, tem que reverter a anticoagulação, suspendendo-o. Nos pacientes cirróticos pode colocar antibiótico, assim como somatostatina e octeotride. OUTROS RECURSOS • Arteriografia/cintilografia: indicados normalmente pelo especialista (gastro). • Balão de Sengstaken Blakemore: tem que saber indicar na unidade de emergência. É um balão pra um paciente que está com hemorragia digestiva alta maciça, com história de varizes esofágicas ou de fundo gástrico. Tem 3 guias e 2 balões (um fica dentro do estômago e o outro no esôfago – principal sítio de localização das varizes). Ao fazer a compressão mecânica do esôfago e do fundo gástrico, há uma interrupção do sangramento. A desvantagem é que ele não é um tratamento definitivo, tendo tempo determinado. O balão não pode ficar muito tempo insuflado, pois pode promover isquemia da parede. É basicamente parar tirar o paciente da urgência, estabilizar, fazer hemotransfusão, intubar, iniciar droga, fazer o que for preciso pra melhorar a performance clínica do paciente e fazer com que ele possa realizar a EDA e receber o tratamento de acordo com a causa. 5 Beatriz Machado de Almeida Emergências cirúrgicas – Aula 8 HEMORRAGIA DIGESTIVA BAIXA CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO TEMPO • HDB aguda: início recente (<3 dias) → Instabilidade hemodinâmica, anemia, necessidade de hemotransfusão. • HDB crônica: duração prolongada → lenta, intermitente. Normalmente está associada a angiodisplasia ou a tumor. CLASSIFICAÇÃO QUANTO AO VOLUME Esse parâmetro só pode ser dado depois da avaliação (frequência cardíaca, pressão arterial sistólica) e realização de exames laboratoriais (hemoglobina e eritrócitos) do paciente. CAUSAS Normalmente está associada a doença diverticular, mas quando se trata de pacientes idosos, a principal causa de hemorragia digestiva é a angiodisplasia /ectasia vascular. Outras causas: neoplasia, colite isquêmica, pós polipectomia, doenças orificiais (hemorroidas, fissuras), DII e colite actínica (homem – associada a radioterapia por neoplasia de próstata; mulher – normalmente associada a radioterapia por neoplasia de colo de útero). CONDUTA Suporte hemodinâmico → história clínica + exame físico (toque retal). Na emergência, todo paciente com história de sangramento pelo reto (HDB) é obrigatório a realização do toque retal. • EDA → afastar HDA que simule HDB (15%). É sempre a primeira conduta mandatória, ainda que o sangramento seja de reto. A endoscopia digestiva alta é de fácil realização, não precisa de preparo intestinal, apenas de jejum. Às vezes existem hemorragias digestivas altas tão volumosas que não dá tempo de digerir, transformar em melena, e o paciente expele sangue vivo pelo ânus. • Cintilografia. • Arteriografia. • Colonoscopia: feita quando a endoscopia não identifica o sítio de sangramento. É necessário preparo intestinal, uso de manitol. CINTILOGRAFIA: É feito para identificar sangramentos do trato gastrointestinal que não foram determinados através da endoscopia ou da colonoscopia. • Sangramentos ativos (vigência do sangramento) de 0,1 a 0,5 ml/min. Mesmo os microvasos (angioectasias diminutas) podem ser detectados. • Pouco invasivo. • Sensibilidade = 91 a 97% / Especificidade = 76 a 95%. • Desvantagens: localização imprecisa, não permite terapêutica. • Identificar pacientes que se beneficiariam da arteriografia. ARTERIOGRAFIA • Sangramentos ativos >1 ml. • Sensibilidade/especificidade: 47 a 100%. • Exame invasivo. • Vantagens: localização precisa (localização exata do 6 Beatriz Machado de Almeida Emergências cirúrgicas – Aula 8 extravasamento de contraste), permite terapêutica. ❖ Infusão de vasopressina. ❖ Embolização transarterial: êmbolos que vão obstruir os vasos sangrantes. Se o paciente chegou com hemorragia digestiva baixa é preciso avaliar se ele está estável ou não. O paciente tem que ter estabilidade hemodinâmica! Colher história, fazer exame físico e toque retal. Se o paciente tem uma causa proctológica evidente e está estável, ele deve procurar um especialista. O paciente com HDB vai para EDA ... caso seja conclusiva (exemplo: úlcera) é necessário realizar o tratamento específico daquele sangramento. Se for inconclusiva, é preciso partir para colonoscopia ou retossigmoidoscopia. Se a colonoscopia for conclusiva, já pode iniciar o tratamento. Se inconclusiva, existem algumas opções. Caso a suspeita seja de sangramento de intestino delgado, pode-se fazer enteroscopia (se disponível) ou partir para exames de imagem (cintilografia – útil se o paciente estiver sangrando naquele momento OU arteriografia). RESUMO Estratificar o risco (saber se o paciente está estável ou instável). Se estiver estável, tem que fazer endoscopia, independente se foi alta ou baixa. Depois disso, segue a investigação. Se estiver instável, é preciso fazer o MOV (monitorização, oxigênio e veia) e tratar e gravidade (Glasgow <= 8, risco de broncoaspiração por hematêmese → IOT; acesso venoso calibroso - reposição volêmica – hidratar; hemoderivados; coleta de exames; solicitar tipagem sanguínea para hemotransfusão). Após a estabilização clínica do paciente, inicia-se as medicações necessárias a depender da causa e depois fazer a EDA. O primeiro exame é sempre a endoscopia! *Quando o paciente tem DRGE, existe alguma incompetência do esfíncter esofagiano inferior, fazendo com que o conteúdo ácido do estômago retorne para o esôfago. O PH do estômago é extremamente ácido e agressivo para determinadas mucosas que não estão adaptadas. No caso do esôfago, ele fica recendo resquícios daquela secreção ácida e a sua mucosa na porção final vai sofrendo metaplasia esofágica (transformação de um tecido mais frágil em um tecido mais resistente). Ao longo dessas mitoses, alguns pacientes podem desenvolver esôfago de Barret (lesão pré-maligna do carcinoma escamoso do esôfago).
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