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MEDICINA UNIVERSIDADE NOVE DE JULHO @jujnamed Clínica médica Infecção pelo HIV Conceitos - Virion/virião = forma infecciosa do vírus (brota da superfície da célula infectada e incorpora várias proteínas do hospedeiro na sua bicamada lipídica) Virologia HIV - O vírus da imunodeficiência humana pertence á família Retroviridae e á subfamília dos lentivírus - O HIV pode ser de 2 tipos biológicos: HIV-1 ou HIV-2 * O quadro clínico da AIDS causada pelo HIV-2 tem curso mais benigno, causando menor imunodeficiência que o HIV-1 (porém ambos replicam nos linfócitos TCD4) Características estruturais Material genético - O HIV é composto por 2 cópias de RNA cercado por 3 enzimas e um capsídeo (constituído pela proteína p24) Enzimas virais - As 3 enzimas que se encontram na partícula do HIV e são necessárias para a replicação intracelular do vírus são: . Protease . Transcriptase reversa (responsável pela transcrição do RNA genômico viral em uma fita dupla de DNA cuja função é criar uma cópia de DNA fita dupla e degradar a fita-molde de RNA viral) . Integrase (responsável pela integração da cópia de DNA fita dupla no genoma da célula hospedeira) Membrana lipídica - O HIV é envolvido por um envelope (bicamada lipídica originária da membrana celular da célula hospedeira) que é composto por 2 glicoproteínas que tem como principal função mediar a entrada do HIV na célula hospedeira: . GP120 = é uma glicoproteína de superfície, tem um papel chave na entrada do HIV na célula TCD4+ facilitando a fusão das membranas do vírus e da célula . GP41 = é uma glicoproteína transmembrana, se liga à molécula CD4+ da célula T auxiliar durante a infecção Ciclo infecioso do HIV Transmissão viral 0- A transmissão do HIV se faz através da relação sexual (heterossexual ou homossexual), pelo sangue, pelo aleitamento materno e pela transmissão vertical (passagem do vírus da MEDICINA UNIVERSIDADE NOVE DE JULHO @jujnamed mãe para o feto através do contato com fluidos contaminados durante o parto ou na gestação) Fase precoce 1- O HIV entra na célula hospedeira através da GP120, a qual se liga nos receptores CD4 (glicoproteína que pode ser detectada na superfície de cerca de 60% dos linfócitos T) 2- A ligação GP120 + CD4 permite que a GP120 se ligue a correceptores (CCR5 ou/e CXCR4) presentes sobre a superfície da célula hospedeira infectando-a 3- Após a ligação da GP120 + correceptores, a GP41 é incorporada na membrana celular, permitindo que o núcleo viral penetre no citoplasma da célula alvo (células TCD4) * A ligação da GP-120 ao CD4 é crucial para a entrada do vírus na célula, mas também interfere com as vias dos sinais de transdução intracelular e promove apoptose nas células CD4. Desse modo, a molécula CD4 é um receptor primário e necessário para o HIV Replicação viral 4- No citoplasma a enzima transcriptase reversa realiza a conversão do RNA viral em DNA viral através da transcrição reversa do RNA genômico em cDNA (cópia de DNA fita dupla) 5- Através da enzima integrase o cDNA é transportado para dentro do núcleo e nele ocorre a transcrição dos genes do HIV para o genoma do hospedeiro (o cDNA é incorporado no genoma da célula hospedeira, resultando no DNA proviral) 6- Ocorre a ativação da replicação viral e síntese de proteínas para geração de novas partículas virais Fase aguda 1 (replicação viral + síndrome aguda da soroconversão) 7- Um novo virion/virião é formado e liberado através da membrana da célula hospedeira por brotamento infectando outras células que se fundem com linfócitos TCD4 e disseminam o vírus pelo organismo 8- A resposta imunológica inata que se estabelece no foco da infecção atrai uma quantidade adicional de células T, o que aumenta a replicação viral 9- A partir disso o vírus é disseminado inicialmente para os linfonodos locais e depois sistemicamente, estabelecendo um reservatório viral latente (o vírus é detectado nos linfonodos regionais dentro de 2 dias da exposição -> depois de mais de 3 dias pode ser detectado no plasma -> depois segue infetando outros órgãos como o cérebro, baço e demais linfonodos) * Nessa fase, o organismo ainda não desenvolveu qualquer resposta imune, e a carga viral (medida quantitativa do RNA viral circulante) revela níveis significativamente elevados * É nessa fase que podem ocorrer manifestações clínicas de uma infecção aguda viral, muitas vezes semelhantes às da MEDICINA UNIVERSIDADE NOVE DE JULHO @jujnamed mononucleose infecciosa (síndrome da infecção aguda pelo HIV) Fase aguda 2 (ativação da resposta imune humoral + soroconversão) 10- A replicação viral e a livre circulação do vírus na corrente sanguínea causam um pico de viremia por volta de 21-28 dias após a exposição ao HIV, sendo associada a um declínio acentuado no número de linfócitos TCD4+ 11- Em resposta a essa invasão, linfócitos TCD8 específicos contra o vírus (anticorpos anti-HIV) são ativados e controlam parcialmente a infecção, porém isso não é suficiente para impedir a lenta e progressiva depleção de linfócitos TCD4 e a eventual progressão para a AIDS (essa ativação de linfócitos TCD8 específicos contra o HIV ocorre antes da soroconversão, porém na ausência da terapia isso acaba sendo ineficiente e eventualmente o paciente progride para a síndrome da imunodeficiência adquirida) * O diagnóstico da fase aguda é feito exatamente pela soroconversão que é identificada por dois exames colhidos no início dos sintomas da doença aguda entre 30-60 dias após a infecção (entretanto a soroconversão é descrita em até 6 meses após o contato infeccioso) * 50%-90% dos pacientes com infecção primária pelo HIV apresentam sintomas inespecíficos entre 2-4 semanas após ocorrer a transmissão do vírus Fase de latência 12- Nessa fase, o vírus se multiplica principalmente nos centros germinativos dos linfonodos e o portador de HIV entra em estado de latência clínica, podendo permanecer assintomático por muitos anos (em média esse período dura de 5 a 10 anos, quando então o indivíduo começa a apresentar sinais clínicos de AIDS) * O desenvolvimento da AIDS depende do nível da carga viral e do estado imunitário do portador de HIV, o qual pode ser mensurado através da contagem dos linfócitos TCD4 MEDICINA UNIVERSIDADE NOVE DE JULHO @jujnamed Formas clínicas evolutivas da infecção pelo HIV 1. Infecção aguda (síndrome retroviral aguda) - Após a infecção viral, depois de 2 dias o vírus migra para os linfonodos regionais alterando sua arquitetura, destruindo os centros germinativos e diminuindo a função imunológica do indivíduo contaminado - Em até 5 dias inicia-se a viremia, marcada pela intensa migração do vírus para o sistema nervoso central - Dependendo do volume da infecção, do subtipo do vírus (HIV-1 ou HIV-2) e da competência imunológica do hospedeiro, o paciente poderá ou não apresentar manifestações clínicas nesse estágio - Cerca de 40% dos pacientes são assintomáticos, os outros 60% apresentam sintomas de síndrome febril inespecífica entre 1-4 semanas após a infecção (dentre os sintomas estão: febre elevada ou moderada, acompanhada de cefaleia, dor retro-orbitária, sudorese noturna, mialgia, artralgia, odinofagia e adenomegalias) 2. Infecção crônica assintomática e linfadenopatia generaliza persistente - Após a fase aguda o paciente entra na fase crônica assintomática da infecção pelo HIV - Essa fase é caracterizada pela latência clínica, mas não virológica - É um período biologicamente ativo, com replicação viral, no qual o paciente transmite o vírus por sangue, esperma e secreções genitais - Ocorre replicação viral lenta e persistente, que vai eliminando as células TCD4+ por citotoxicidade direta ou apoptose por via indireta (essa replicação ocorre nos tecidos linfáticosque passam a ser o maior reservatório do HIV) - Nesse estágio, alguns pacientes podem apresentar longos períodos de febre (entre 38˚C-39˚C) intermitente ou contínua, emagrecimento, fadiga, sudorese noturna e diarreia * A partir daqui a evolução da síndrome depende da resposta imunológica do paciente 3. Síndrome pré-AIDS - Essa fase é marcada por: . Sinais de baixa imunidade (ex: candidíase oral de repetição, leucoplasia pilosa, herpes zoster em pacientes com menos de 60 anos, queilite angular, gengivite, úlceras recorrentes na boca, tonsilite e sinusite de repetição, candidíase vulvovaginal persistente ou resistente, angiomatose bacilar) . Alterações cutâneas (ex: pele com turgor e elasticidade diminuídos em todas as idades, exacerbação de lesões prévias, como psoríase e dermatite seborreica, alterações da pigmentação causando hiper ou hipocromias, furunculoses de repetição e outras infecções por bactérias, fungos e ácaros) . Febre sem foco definido . Emagrecimento 4. Síndrome da imunodeficiência adquirida - O diagnóstico de AIDS é feito quando: . O paciente apresenta 2 testes de triagem para detecção de anticorpos anti-HIV MEDICINA UNIVERSIDADE NOVE DE JULHO @jujnamed reagentes e 1 teste confirmatório que tenham uma contagem de LTCD4 no sangue abaixo de 350/mm3 (independentemente de outras causas de imunodeficiência) OU . O paciente apresenta uma doença definidora de AIDS com qualquer nível de LTCD4 * De acordo com os critérios do CDC, AIDS é definida pela contagem de linfócitos abaixo de 200 células/mm3 * Atualmente no Brasil são considerados para efeito de notificação os pacientes sintomáticos ou os assintomáticos com menos de 350 células TCD4 * Os casos com menos de 50 células TCD4 constituem infecção avançada do HIV *RESUMINDO* • A infecção do HIV pode ser dividida nos seguintes estágios: 1. Transmissão viral 2. Infecção primária (AIDS aguda ou síndrome aguda da soroconversão) 3. Soroconversão 4. Período de latência clínica (com ou sem linfadenopatia persistente generalizada) 5. Infecção sintomática inicial pelo HIV (complexo relacionado à AIDS) 6. AIDS propriamente dita Diagnóstico - É baseado na detecção de anticorpos contra o HIV ou na detecção de antígenos do HIV - Pode ser feito através dos seguintes testes: A) ELISA . É um teste de triagem . Possui sensibilidade e especificidade superior a 98% . O resultado por ser não reativo (quando não houver infecção pelo HIV), reativo (quando o indivíduo por portador do vírus) ou indeterminado (quando em gestantes, portadores de doenças autoimunes e reumatológicas, neoplasias e infecções) . Um resultado falso-reativo pode ocorrer em casos de LES B) Western Blot . É um teste confirmatório . Detecta a presença de anticorpos contra diferentes proteínas (antígenos) do HIV . Os antígenos detectados podem ser da porção central do vírus (p17, p24, p55), da polimerase (p31, p51, p66) ou do envelope (gp41, gp120, gp160) . O resultado pode ser negativo (quando houver ausência de bandas), positivo (quando houver presença de ao menos 2 das 3 principais bandas) ou indeterminado (quando houver presença de qualquer padrão de bandas que não corresponda aos critérios para a positividade) MEDICINA UNIVERSIDADE NOVE DE JULHO @jujnamed C) Testes diagnósticos . Funcionam como uma técnica de ELISA simplificada na qual o soro do paciente é adicionado a uma mistura de látex coberta com antígenos do HIV . Possuem sensibilidade e especificidade acima de 99% Tipos de teste diagnóstico 1- Teste rápido . Não deve ser utilizado como rotina de diagnóstico . Está indicado nas seguintes situações: determinar o estado sorológico da fonte de exposição nos casos de acidentes com material biológico, gestantes que não tenham sido testadas durante o pré-natal ou cuja idade gestacional não assegure o recebimento do resultado do teste antes do parto, parturientes e puérperas que não tenham sido testadas no pré-natal ou quando não se conhece o resultado do teste no momento do parto 2- Teste da saliva . Consiste em coletar saliva e concentrar imunoglobulina IgG para a realização de teste EIA . Quando o paciente é portador do vírus HIV a quantidade de IgG obtida da saliva é bem maior que a do plasma e está acima do nível necessário para a detecção dos anticorpos anti-HIV * A detecção de anticorpos anti-HIV em crianças com menos de 18 meses de idade não caracteriza infecção, podendo ser atribuída à transferência de anticorpos maternos pela placenta (nessas crianças é necessária a realização de outros testes para o diagnóstico da infecção pelo HIV) Tratamento - A terapia antirretroviral (TARV) combinada é a base do tratamento dos pacientes infectados pelo HIV - Atualmente os fármacos disponíveis para a terapia antirretroviral combinada são classificados nos seguintes grupos: A) Inibidores da neurominidase viral . Oseltamivir e zanamivir B) Inibidores da DNA polimerase viral . Aciclovir, valaciclovir, famciclovir, ganciclovir, valganciclovir, foscarnet C) Inibidores da transcriptase reversa . Inibidores da transcriptase reversa análogo de nucleosídeo (ITRN) = lamivudina, tenofovir, abacavir, zidovudina, entecavir . Inibidores da transcriptase reversa não análago de nucleosídeo (ITRNN) = efavirenz, nevirapina, etravirina D) Inibidores de integrase (INI) . Dolutegravir e raltegravir E) Inibidores de protease (IP) . Atazanavir, darunavir, ritonavir e lopinavir MEDICINA UNIVERSIDADE NOVE DE JULHO @jujnamed F) Inibidores da fusão (antagonistas do CCR5) . Enfuvirtida * A terapia inicial deve ser a associação de 2 ITRN/ITRNt (lamivudina e tenofovir) + 1 inibidor de integrase (dolutegravir) * A exceção ao esquema citado acima deve ser observada para os casos de coinfecção tuberculose HIV, mulheres vivendo com HIV em possibilidade de engravidar e gestantes Exames para avaliação e acompanhamento A) Testes qualitativos - São testes de biologia molecular que avaliam a concentração do HIV no plasma - Servem para detectar o DNA pró-viral e quantificar o RNA viral plasmático (carga viral) - Contribuem para o esclarecimento do diagnóstico, especialmente durante a gestação - Podem ser feitos através de diferentes técnicas: reação em cadeia da polimerase (PCR) do RNAHIV (Amplicor HVI-1), branched chain DNA (bDNA) ou amplificação baseada em sequência de ácidos nucleicos (nucleic acid sequence bases amplification ou NASBA), PCR em tempo real (RT-PCR Abbott) Indicações 1- Avaliar o prognóstico da infecção . Durante a infecção aguda há uma intensa multiplicação viral, traduzida por valores muito elevados da carga viral, geralmente superiores a 500.000 cópias/mL . O paciente com carga viral de 500 cópias/mL e sem TARV tem uma sobrevida de mais de 10 anos, enquanto nas mesmas condições o paciente com carga viral acima de 30.000 cópias tem a sua sobrevida reduzida para cerca de 4 anos 2- Monitorar a resposta ao tratamento . Sabe-se que o uso de TARV cursa com queda significativa da carga viral . O efeito antiviral máximo é atingido após 4 a 6 meses de tratamento e objetivo do tratamento é atingir carga viral indetectável 3- Avaliar o risco de transmissão vertical e definir o tipo de parto . Há uma forte correlação entre o nível de carga viral da gestante e o risco de transmissão do HIV para o bebê . Portanto, esse exame deve ser realizado na primeira avaliação da gestante 4- Diagnóstico de infecção aguda pelo HIV . Como nessa fase os níveis de carga viral são extremamente elevados, esse exame pode ser utilizado no período que antecede a MEDICINA UNIVERSIDADE NOVE DE JULHO @jujnamed soroconversão (ou seja, enquanto a sorologia ainda está negativa ou inconclusiva) . O exame deve ser realizado fora da vigência de infecções B) Contagem de LTCD4+ - A frequência com queesse exame deve ser realizado depende da condição do paciente (os pacientes que não estão em uso de TARV podem fazer o exame a cada 3-6 meses e os que usam TARV geralmente realizam o exame a cada 4 meses) - Quando feito junto ao teste quantitativo da carga viral é um bom indicador de prognóstico Indicações . Definir o estadiamento da doença . Tomar decisões quanto ao início do tratamento antirretroviral (TARV) . Monitoração do tratamento . Definir instituição ou suspensão de profilaxias para infecções oportunistas Interpretação dos resultados . Percentual de CD4+ inferior a 14% = contagem de LTCD4+ inferior a 200 células/ mm3 . Percentuais de CD4+ acima de 29% = contagem de CD4+ superior a 500 células/ mm3 * Os valores normais são de 800 a 1.000 células/mm3 * Uma contagem de linfócitos CD4+ inferior a 200 células/mm3 é diagnóstico de AIDS, mesmo em pacientes assintomáticos C) Análise genotípica e fenotípica do vírus - São testes moleculares que identificam determinadas cepas de vírus que pode ser resistentes a alguns antirretrovirais - Devem ser realizados quando há falha terapêutica D) Hemograma - É útil quando não se dispõe da contagem de linfócitos CD4+, uma vez que valores abaixo de 1.000 linfócitos/mm3 estão relacionados com contagem de CD4+ inferior a 200 células/mm3 - Também é útil para monitorar a ocorrência de efeitos colaterais de várias medicações que o paciente infectado pelo HIV utiliza ao longo do tempo (ex: anemia, macrocitose, leucopenia, plaquetopenia) E) Outros - Bioquímica do sangue (TGO, fosfatase alcalina, gama-GT, bilirrubina, ureia, creatinina, glicemia, triglicerídeos, colesterol total e frações, desidrogenase lática) - Sorologias para sífilis (VDRL), toxoplasmose e hepatites virais - Radiografia de tórax - PPD - Papanicolau - Exame urina 1 - Parasitológico de fezes MEDICINA UNIVERSIDADE NOVE DE JULHO @jujnamed Diagnósticos diferenciais - Além da AIDS, outras patologias também podem ser causas de contagem de LTCD4+ baixa - Dentre os diagnósticos diferenciais de LTCD4+ inferior a 800 células/mm3 estão: . Síndrome de DiGeorge (aplasia tímica) . Agamablobulinemia . Síndrome de Sjögren . Sarcoidose . Radiação . Linfoma . Uso de corticosteroide . Linfocitopenia de CD4+ idiopática . Pneumonia por Pneumoocystis (PPC) . Sarcoma de Kaposi
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