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Entrevista Clínica na Psicologia

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I
A entrevista clínica
Marcelo Tavares
 entrevista c l ín ica não é uma técnica úni-
l { .u. Existem vár ias Íormas de abordá- la,
:onforme o objet ivo específ ico da entrevista e
= orientação do entrevistador. Os objetivos de
:ada t ipo de entrevista determinam suas es-
: .ategias, seus alcances e seus l imi tes. Neste
: :pí tu lo, vamos def in i r a entrevista c l ín ica, exa-
r inar seus elementos e di ferenciar os t ipos em
:;e podem ser c lassi f icadas. Em seguida, dis-
: . l i i remos alguns aspectos das competências
=ssenciais do entrevistador para a condução
r: uma entrevista c l ín ica. Concluímos com
,-ra ref lexão sobre a ét ica dos temas discu-
:305.
DEFININDO A ENTREVISTA CLíNICA
-r 
psicologia, a entrevista c l ín ica é um con-
.,.to de técnicas de investigação, de tempo
:=,'imitado, dirigido por um entrevistador trei-
-:do, que utiliza conhecimentos psicológicos,
:"ì uma relação profissional, com o objetivo
:e descrever e avaliar aspectos pessoais, rela-
: onais ou sistêmicos ( indivíduo, casal , famíl ia,
':de social), em um processo que visa a Íazer
'ecomendações, encaminhamentos ou propor
:lgum tipo de intervenção em benefício das
Dessoas entrevistadas. Convém agora exami-
-ar os elementos dessa def in icão.
Por técnica entendemos uma série de pro-
cedimentos que possibi l i tam invest igar os te-
mas em questão. Ainvest igaçáo possibi l i ta al-
cançar os objet ivos pr imordiais da entrevista,
que são descrever e avaliar, o que pressupoe o
levantamento de informações, a part i r das
quais se torna possível re lacionar eventos e
experiências, fazer inferências, estabelecer con-
clusões e tomar decisoes. Essa invest igação se
dá dentro de domínios específ icos da psicolo-
gia c l ín ica e leva em consideração concei tos e
conhecimentos amplos e profundos nessas
áreas. Esses domínios incluem, por exemplo, a
psicologia do desenvolv imento, a psicopatolo-
gia, a psicodinâmica, as teor ias s istêmicas. As-
pectos específicos em cada uma dessas áreas
podem ser pr ior izados como, por exemplo, o
desenvolv imento pr icossexual , s inais e s into-
mas psicopatológicos, conf l i tos de ident idade,
relação conjugal , etc.
Af i rmamos ainda que a entrevista é parte
de um processo. Este deve ser concebido, ba-
sicamente, como um processo de aval iação,
que pode ocorrer em apenas uma sessão e ser
dir ig ido a Íazer um encaminhamento, ou a
definir os objetivos de um processo psicotera-
pêut ico. Muitas vezes, o aspecto aval iat ivo de
uma entrevista in ic ia l confunde-se com a osi-
coterapia que se in ic ia, devido ao aspecto te-
rapêut ico intr ínseco a um processo de aval ia-
ção e ao aspecto avaliativo intrínseco à psico- emergência de novos conteúdos na mente do
terapia. Outras vezes, o processo de avaliação sujeito. O entrevistador deve estar atento aos
é complexo e exige um conjunto diferenciado processos no outro, e a sua intervenção deve
de técnicas de entrevistas e de instrumentos e orientar o sujeito a aprofundar o contato com
procedimentos de avaliação, como, por exem- sua própria experiência. Em síntese, concluí-
plo, além da entrevista, os instrumentos pro- mos que to_dos os tipos de entrevista tÇm al-
jetivos ou cognitivos, as técnicas de observa- guma forma de estruturação na medlde,qryì que
ção, etc. A importância de enfatizar a entrevis- à atiüdade do entrevistador direciona a entre-
ta como parte de um processo é de poder vis- " vista no sentido de alcançar t"rr obiúuot.
lumbrar o seu papel e o seu contexto ao lado . . Entrevistadoreentrevistadotêm, nessepro-
de uma grande quant idade possível de proce- ' ' cesso, atr ibuiçoes di ferenciadas de papéis. A
dimentos em psicologia. A entrevista cl ínica é função específ ica do entrevistador coloca a
um procedimento poderoso e, pelas suas ca- ' entrevista clínica no domínio de uma relaçáo
racterísticas, é o único capaz de adaptar-se à . profissional. É dele a responsabilidade pela
diversidade de situações clínicas relevantes e \ condução do processo e pela aplicação de co-
de fazer expl ic i tar part icular idades que esca- nhecimentos psicológicos em benefício das
pam a outros procedimentos, pr incipalmente pessoas envolvidas. É responsabi l idade dele
aos padronizados. A entrevista é a única técni- dominar as especificidades da técnica e a com-
ca capaz de testar os limites de aparentes con- plexidade do conhecimento utilizado. Essa res-
tradiçoes e de tornar explíc i tas característ ica5 '" ponsabi l idade del imita (estrutura) o processo
indicadas pelos instrumentos padronizados, em seus aspectos cl ínicos. Assumir essas res-
dando a eles validade clínica (Tavares, 1998), por 
. 
ponsabilidades profissionais pelo outro tem
isso, a necessidade de dar destaque à entrevista aspectos éticos fundamentais; signifi-ca reco-
clínica no âmbito da avaliação psicológica. , nhecer a desigualdade intrínseca na relação,
Definimos ainda a entrevista cl ínica como ' :que dá uma posição pr iv i legiada ao entrevis-
tendo a característica de ser dirigida. Afirmar tador. Essa posição lhe confere poder e, por-
que a entrevista é um procedimento dir igido tanto, a responsabi l idade de zelar pelo intd-
pode susci tar alguns quest ionamentos. Mes- resse e bem-estar do outro. Também é do en-
mo nas chamadas entrevistas "livres", É,!q._"1.- trevistador a responsabilidade de reconhecer
sárlo o reconhecimento, pelo entrevistadoç de a necessidade de treinamento especializado e
seus objetivos. Como afirmamos antes, os ob- atualizaçóes constantes ou periódicas.
jetivos de cada tipo de entrevista definem as O papel principal da pessoa entrevistada é
estratégias utilizadas e seus limites. É no intui- o de prestar informações. A entrevista pressu-
to de alcançar os objetivos da entrevista que o póe pelo menos uma pessoa que esteja em
entrevistador estrutura sua intervençáo. lsso condições de ser um participante colaborati-
nos parece verdadeiro, inclusive para os psicó- vo, e o sucesso da entrevista depende do seu
logos que consideram que é o sujeito entrevis- modo de participação. Essa dependência tor-
tado quem conduz o processo.. O en!-q_qy!!a- na-se mais evidente nos casos de participantes
dor precisa estar preparado para lidar com o resistentes ou não voluntários. O entrevistador
direcionamentoqueosujei topareceQuéré/ i lar tem a necessidade de conhecer e compreen-
à entrevista, de forma a otimizar o encontro der algo de natureza psicológica, para poder
entre a demanda do sujeito e os objetivo,s da fazer alguma recomendação, encaminhamen-
tarefa. Assim, quando o entrevistadorconfron- to ou sugerir algum t ipo de atenção ou trata-
ta uma defesa, empaticamente reconhece um mento (intervenção). Nos casos em que pare-
afeto ou pede um esclarecimento, ele está cer- ce haver dificuldades de levantar a informação,
tamente definindo direçoes. Até mesmo a ati- é bem provável que o entrevistador tenha de
vidade interpretativa na associação livre ou a centrar sua atenção na relação com a pessoa
rçsposta centrada no cliente do psicólogo dá entrevistada, para compreender os motivos de
uma direção, faci l i tando ou di f icul tando a sua at i tude. Geralmente, essas di f iculdades
estão associadas a distorções relacionadas a
cessoas ou instituições interessadas na avalia-
cão, a idéias preconcebidas em relação à psi-
cologia ou à saúde mental e a fantasias incons-
. entes v inculadas a ansiedades pessoais acer-
:a do processo. Tudo isso gera questões trans-
'erenciais importantes, que devem ser esclare-
: idas adequadamente. Essas formas de resis-
: :ncia podem atrapalhar, mas, quando escla-
-ecidas. se t ransformam em uma das mais im-
:ortantes fontes de compreensão da dinâmi-
: : do sujei to.
A complexidade dos procedimentos espe-
: ' rcos de cada t ipo de entrevista c l ín ica, dos
::nhecimentos psicológicos envolv idos e dos
:rcectos relativos à competência do entrevis-
:"dor, necessár ios para sustentar uma relação
-:erpessoal de invest igação cl ín ica, requerem
:'?tnamento especializado. O resultadode uma
:- : revista depende largamente da exper iência
: :a habi l idade do entrevistadoç além do do-
* nio da técnica. Alguns temas abordados na
:- : revista c l ín ica são, pela sua própr ia nature-
-r difíceis ou representam tabus culturais. Criar
-- 
c l ima que faci l i te a interação nesse contex-
:: : a abertura para o exame de questóes ínti-
- :s e pessoais ta lvez seja o desaf io maior da
=-: 'evista c l ín ica. Essa dependência da expe-
-ê^cia aproxima a condução de entrevistas da
:- : r - embora ela seja corretamente def in ida
: : . ro técnica. A necessidade de ensinar a rea-
: : r uma entrevista c l ín ica coloca, portanto,
: :saf ios para quem deseja t ransmit i r esses co-
--ecimentos e habi l idades. Pequenos detalhes,
:-=ndo desconsiderados, levam a conseqüên-
-,=s não desejadas. Muitas vezes, o profissio-
-,: só se dá conta da importância desses deta-
--r quando algum problema está conf igura-
: : O treinamento tem o intui to de antecipar
: e.itar essas situações e procura apresentar e
: scut i r vár ios aspectos prát icos dos procedi-
* .ntos. Embora muitas "dicas" possam ser
: i :Cas, em úl t ima instância, é a qual idade da
ì:"rnação cl ín ica e a sensibi l idade do aval iador
: ,e 'a os aspectos relacionais - por exemplo, a
:=cacidade de trabalho na contratransferên-
r â - oue o assist i rão nos momentos mais di f í -
: : s e inesoerados. Além do treinamento for-
-31 nos cursos de graduação e especial ização,
a prática supervisionada é reconhecida como
melhor estratégia para a consolidação dessa
aprendizagem.
Supõe-se que a entrevista clínica deve ter
como benefrciado direto as pessoas entrevis-
tadas. Por outro lado, isso nem sempre é c laro
nos dias de hoje, quando os psicólogos têm
que se haver, cada vez mais, com terceiros en-
volv idos, como juízes, empregadores, empre-
sas de seguros, etc. Quando uma entrevista
cl ín ica ocorre em uma empresa. por exemplo,
o entrevistador deve estar ciente dos conflitos
de interesse e das questóes éticas envolvidas,
mesmo quando a entrevista tem apenas a f i -
nal idade de encaminhamento. Quando a en-
trevista envolve interesses múltiplos, a defini-
ção de quem são os seus cl ientes, a c lareza de
suas demandas e a expl ic i tação dos conf l i tos
poderão ajudar o prof issional a estabelecer a
sua conduta relat iva a cada um deles. Nesse
exemplo, parece necessário definir em que sen-
t ido a empresa é c l iente, e que demandas são
apropr iadas ou não.
A necessidad e de delimitação temporal pa-
rece-nos óbvia, visto que não faz sentido uma
aval iaçáo se dela não resul ta alguma recomen-
dação. Essa delimitação não requer, necessa-
r iamente, um único encontro. Mesmo quando
o processo requer encontros em mais de uma
ocasião, no processo de entrevista, l3-9 hq um
contrato de cont inuidade como em um pro-
cesso terapêutico, embora, freqüentemente, a
entrevista clínica resulte em um contrato tera-
pêut ico. A del imitação temporal entre a entre-
vista inicial e o processo terapêutico tem a fun-
ção de explicitar as diferenças de objetivos dos
dois procedimentos e dos papéis diferenciados
do prof issional nas duas si tuaçóes. Essa del i -
mitação define osetting e fortalece o contrato
terapêut ico, que pode ser consol idado como
conclusão da(s) entrevista(s) in ic ia1( is) . Essas
recomendações, o encaminhamento ou a def i -
n ição de um setf ing e contrato terapêut ico
podem ocorrer integrados como parte de uma
única sessão de entrevista ou podem ser reser-
vados para uma entrevista designada exclusi-
vamente para este fim (entrevista de devolu-
ção), demarcando, de maneira mais precisa, .o
término do processo de aval iação.
TIPOS E OBJETIVOS DA ENTREVISTA CLINICA
Classi f icar os t ipos de entrevista não é uma
tarefa fácil, pois exige a consideração de eixos
classificatórios e o exame sistemático dos ti-
pos pr incipais de técnicas de entrevistas. Essa
tarefa se estende além dos objetivos deste ca-
pí tu lo, mas indicaremos aqui a lgumas direçóes.
Vamos levar em consideração dois eixos: se-
gundo a forma (estrutura) e segundo o obje-
t ivo.
CLASSTFTCAçÁO QUerurO AO ASPECTO
FORMAL
Quanto ao aspecto formal. as entrevistas po-
dem ser divididas em estruturadãs, semi-éstru-
tïradas e de l ivre estruturação. As entrevistas-
estruturadas são de pouca ut i l idade cl ín ica. A
Jpiièãção desse tipo de entrevista é mais fre-
qüente em pesquisas, pr incipalmente nas si-
tuações em que a habi l idade cl ín ica não é ne-
cessár ia ou possível . Sua ut i l ização raramente
considera as necessidades ou deúandai do
sujei to aval iado - usualmente, e la se dest ina
ao levantamento de informaçÕes def in idas
pelas necessidades de um projeto. Um exem-
Blo t íp ico é a entrevista epidemiológica, que,
como um censo, requer que o entrevistador
cubra um grande número de questões em pou-
co tempo. Nela, não se pode exigir do entre-
vistador exper iência ou conhecimento c l ín ico,
pelos altos custos envolvidos no processo. Este
é o caso daDiagnostic lnterview Schedule (DlS);
(Robins, Helzer. Croughan et a l i i , 1981). As en-
trevistas estruturadas privilegiam a objetivida-
de - as perguntas são quase sempre fechadas
ou delimitadas por opções pÍèviamente deter-
minadas e buscam respostas específicas a ques-
tões específicas. Quando respostas abertas são
possíveis, geralmente são associadas a esque-
mas classi f icatór ios operacional izados, que fa-
ci l i tam a tradução da informação em catego-
r ias do t ipo objet ivo.
Nas entrevistas c l ín icas, desejamos conhe-
cer o sujei to em profundidade, v isando a com-
preender a situação que o levou à entrevista.
Nesse caso, o entrevistado é porta-voz de uma
demanda e espera um retorno que o auxi l ie. A
uti l idade das entrevistas clínicas depende, por-
tanto, do espaço que o procedimento deixa
para as manifestaçóes indiv iduais e requer ha-
bil idades e conhecimentos específicos que per-
mitam ao entrevistador conduzir adequada-
mente o processo. Essa especificidade clínica
favorece os procedimentos semi-estruturad.òs
e de l ivre estruturação
É tradição se referir à entrevista de l ivre es-
truturação como entrevista l ivre ou não-estru-
turada. Temos argumentado que toda entre-
vista supóe, na verdade exige, alguma forma
de estruturação. É necessár io que se conheçam
suas metas, o papel de quem a conduz e os
procedimentos pelos quais é possível at ingir
seus objetivos. Estes e outros elementos pró-
prios das entrevistas lhes conferem uma estru-
tura, mesmo que o entrevistador não a reco-
nheça explicitamente. Por esse motivo, referi-
mo-nos a esse tipo de entrevista como entre-
vista de livre estruturação. A grande maioria
das técnicas de entrevista divulgadas em psi-
cologia c l ín ica. desde seus pr imórdios, enqua-
dra-se nesse tipo de entrevista. As técnicas de
entrevista vêm sendo gradat ivamente especi-
f icadas. de modo que sua estrutura pode ser
mais c laramente deÍ in ida, a part i r do desen-
volvimento das técnicas de avaliação e trata-
mento, part icularmente com o surgimento de
manuais psicoterapêut icos (Luborsky, 1 984,
1993; Si fneos, 1993), manuais diagnóst icos
(APA, 1995; Spi tzer, Gibbon, Skodol et a l i i ,
1994) e cr i tér ios de seleção de pacientes (Da-
vanloo, 1980; Malan, 1980; Marmor, 1980; Si-
fneos, 1980, 1993). Tomando-se os objet ivos
de uma téc,rrica de l ivre estruturação, é possí-
vel desenvolver alguma forma semi-estrutura-
da de se obter o mesmo t ipo de informação.
Histor icamente, é assim que têm surgido as en-
trevistas semi-estruturadas, como é o caso
da Entrevista Cl ín ica Estruturada para o DSM-
lV (SClD) (Spitzer, Will iams, Gibbonef a/rï,1992;
Tavares, 1997,2OOOb). Esta avalia um conjun-
to de 44 psicopatologias mais comuns, faci l i -
tando o diagnóst ico di ferencial nos casos mais
di f íceis. Um exemplo mais específ ico é a Posi t i -
ve and Negative Symptoms for Schizophrenia
(PANSS) (Kay, Fiszbein & Opler, 1987), uma téc-
nica de aval iação semi-estruturada que permr-te discr iminar graus de gravidade e compro-
met imentos na esquizofrenia. Outro exemplo
interessante de semi-estruturação é a Entrevista
Diagnóst ica Adaptat iva Operacional izada
TEDAO), de Ryad Simon (1989, 1993), uma en-
trevista de aval iação de fundamentação psico-
dinâmica.
As entrevistas se_mi-estruturadas são assìm
denominadas porque o entrevistador tem cla-
reza de seus objet ivos, de que t ipo de infor-
mação é necessár ia para at ingi- los, de como
essa inforúação deve ser obt ida (perguntas
suger idas ou padronizadas), quando ou em que
seqüência, em que condições deve ser invest i -
gada (relevância) e como deve ser considerada
,uÌ f iza(ão de cr i tér ios de aval iação). Além de
estabelecer um procedimento que garante a
obtenção da informação necessár ia de modo
padronizado, ela aumenta a conf iabi l idade ou
frdedignidade da informação obt ida e permite
a cr iação de um registro permanente e de um
oanco de dados úteis à pesquisa, ao estabele-
cimento da ef icácia terapêut ica e ao planeja-
nìento de açóes de saúde. Por esses motivos,
as entrevistas semi-estruturadas são de gran-
de ut i l idade em settrngs onde é necessár ia ou
Cesejável a padronização de procedimentos e
registro de dados, como nas cl ín icas sociais,
na saúde públ ica, na psicologia hospi ta lar , etc.
Recentemente, desenvolvemos uma entrevista
cl ín ica semi-estruturada para a aval iação da his-
iór ia e do r isco de tentat iva de suicídio, tendo
em vista estudar esse fenômeno, com ênfase
nos aspectos mórbidos e psicodinâmicos asso-
ciados (Tavares. 1 999).
CLASSTFTCAçÃO QUANTO AOS OBJETTVOS
Um esforço em classi f icar as entrevistas quan-
to aos seus objetivos seria uma tarefa bem mais
complexa. Essa complexidade decorre da inter-
dependência entre abordagem e objet ivos. A
t í tu lo de exemplo, vamos imaginar dois entre-
vistadores hipotét icos, um de abordagem psi-
codinâmica e outro, comportamental . Ao en-
trevistar um sujei to para def in i r uma estraté-
gia de intervenção 
. terapêut ica, emÈóìa' te-
nham, aparentemente, o mesmo objet ivo, e les
atuar iam de maneiras completamente di feren-
tes. O primeiro exploraria o desenvolvimento
precoce e os processos inconscientes, defesas
e conf l i tos predominantes, enquanto o segun-
do procurài ia determinar as s i tuaçoes-proble-
ma eêxaminar os antecedentes que mantêm o
comportamento na atual idade. Cada um def i -
Ãiiíâ ob;ètivos eipecíficos para os seus proce-
dimentos.
Para abordar essa questão, é necessár io dis-
t inguir dois níveis de objet ivo. A f inal idade
maior de uma entrevista é sempre a de descre-
ver e aval iar para oferecer alguma forma de
retorno. Este objet ivo úl t imo é comum a todas
as formas de entrevista c l ín ica. conforme nos-
sa def in ição. Todas elas requerem uma etapa
de apresentação da demanda, de reconheci-
mento da natureza do problema e da formula-
ção de al ternat ivas de solução e de encami-
nhamento. Além desses objetivos-fins, existem
objet ivos instrumentais, que são def in idos por
todo t ipo de entrevista c l ín ica. Em nosso exem-
plo hipotét ico supra, as di ferenças podem ser
consideradas instrumentais. São muitos e va-
r iados os exemplos de objet ivos instrumentais.
Quando se pretende aval iar um quadro psico-
patológico, torna-se necessário um exame de-
talhado dos sintomas apresentados. Na entre-
vista psicodinâmica, é importante a invest iga-
ção do desenvolv imento psicossexual . Cada
modal idade de entrevista def ine seus objet i -
vos instrumentais, e estes del imitam o alcance
e as l imi taçoes da técnica. Por isso, estratégias
di ferentes de aval iação podem ser ut i l izadas
para at ingir os objet ivos de cada si tuação, ou
combinadas para atingir objetivos diversos. lsso
nos parece adequado, considerando os vár ios
contextos em que a entrevista c l ín ica é ut i l iza-
da, no consul tór io, na saúde públ ica, na psico-
logia hospi ta lar , etc.
Dada a enorme var iedade de objet ivos ins-
trumentais, conforme variaçóes de abordagem,
de problemas apresentados e de cl ientelas
atendidas, não temos a intenção de tentar c las-
sif icar as entrevistas neste nível. Por outro lado,
alguns tipos de entrevista devem ser mencio-
nãdôs quanto à sua f inal idade: de tr iagem, de
anamnese, diagnóst icas (que podem ser s in-
drômicas ou dinâmicas), s istêmicas e de devo- aspectos importantes do desenvolv imento,
lução, Uma entrevista para a avaliação na clí- embora de maneira náo tão extensiva como
nica psicológica pode ter por f inal idade carac- faz a entrevista de anamnese.
terísticas vinculadas a um desses tipos, ou pode De um certo modo, toda entrevista clínica
ter por objetivo uma combinação de aspectos comporta elem91los diagnósticos. Neísa pers-
relacionados a mais de um desses t ipos de en- pect iva, empregamos o termo de maneira bem
trevistas. Prof issionais de todas as abordagens ampla. Em outro sent ido, empregamos o ter-
podem realizar entrevistas clínicas com esses mo diagnóstrco de modo mais específìco, defi-
objetivos. Examinaremos cada um desses tipos nindo-o como o exame e a análise expllc,i lg-5
de entrevista. ou cuidadosos de uma condição na tentat iva
A entrevista de triagem tem por objetivo de compreendê-la, explicá-la e possivelmen_tê
pr incipal aval iar a demanda do sujei to e fazer modif icá- la. lmpl ica descrever, aval iar , re lacio-
um encaminhamento. Geralmente, é ut i l izada nar e infer i r , tendo em vista a modif icação âa-
em serviços de saúde públ ica ou em cl ín icas quela condição. A entrevista diagnóst ica pode
sociais, onde existe a procura contínua por uma pr ior izar aspectos s indrômicos ou psicodinâ-
diversidade de serviços psicológicos, e torna- micos. O pr imeiro v isa à descr ição de sinais
se necessár io aval iar a adequação da deman- (baixa auto-est ima, sent imentos de culpa) e
da em relaçáo ao encaminhamento pretendi- s intomas (humor depr imido, ideação suic ida)
do. Um dos equívocos mais comuns é o de r para a c lassi f icação de um quadro ou síndro-
pessoas que procuram ajuda indiv idual para " me (Transtorno Depressivo Maior) . O diagnós-
problemas relacionais. Outra s i tuação impor- Ì ; t ico psicodinâmico visa à descr ição e à com-
tãnte ocorre quando existe a opção de terapia jJpreenseo da exper iência ou do modo part icu-
indiv idual e grupal , tornando-se necessár io ' l ! lar de funcionamento do sujei to, tendo em vista
aval iar a adequação dos membros conforme a ' I uma abordagem teór ica. Tanto o diagnóst ico
composição e os objet ivos dos grupos terapêu- J s indrômico quanto o psicodinâmico visam à
t icos. A t r iagem é também fundamental para 
- 
modif icação de um quadro apresentado em
aval iar a gravidade da cr ise, pois, nesses casos. benefíc io do sujei to. r '
torna-se necessário ou imprescindível o enca-. Algumas vezes, a característica classificató-
minhamento para um apoio medicamentoso.- r ia do diagnost ico s indrômico parece se con-
Embora não pareça tão óbvio, o c l ín ico que trapor a uma compreensão dinâmica do mes-
trabalha sozinho também terá que triar seus mo; contudo, estas duas pers,peç,1tva.s devem
cl ientes e encaminhar aqueles que não ju lgar ser v istas como complementares, operando
adequado atender, conforme sua especial ida- dentro de uma mesma estratégia de entrevis-
de e competência. ta. Tradic ionalmente, os textos tendiam a en-
A entrevista em que é feita a-an_amngs-e (vide f alizar uma ou outra abordagem. Hoje em dia,
A história do examínando, nesta obra) tem por entretanto, vemos cada vez mais um esforço
objet ivo pr imordial o levantamento detalhado de integração dessas duas abordagens (Jacob-
da históría de desenvolvimento da pessoá, [_rin- son & Coop er, 1993: McWill iams, 1994; Oth-
cipalmente na infância. A anamnese é uma téc- mer & Othmer, 1994). Por e-Igmplo, sabemos
nica de entrevista qúe pode ser faci lmente es- que pessoas depr imidas (um sintoma o1r sín-
lruturada cronologicamente. Embora a uti lìff i : drome)frequenieménteàirijêm ruu 
"grãiiíui-de da anamnese seja mais c laramente v is lum- dade contra s i mesmas (üm aspecto dinâmi-
brada na terapia infanti l, muitas abordagens c_o), e que isso pQde-resui!q1-Çm comp-ort.iìen-
que integram ou valorizam o desenvolvimento tos autodestrutivos (sinãis) or, nò èxtìemõ, ãm-
precoce podem se beneficiar deste tipo de en- ide;çáó iuii iOà (um iintômì). Quando e*Ëlern
trevista. Certamente, aprender a fazer uma sintomas cl ín icos c laros, o diagnóst ico s indrô-
entrevista de anamnese i rá faci l i tar a aprecia- mico torna-se necessár io por mot ivos que nos
ção de questões desenvolv imentais por parte parecem óbvios. Contudo, não se podem igno-
do cl ín ico, pois muitas abordagens invest igam rar os aspectos dinâmicos nesses casos. É cp-
f
mum a existência de sinais e s intomas isolados
ou subcl ín icos, que não são suf ic ientes pará
dar conf iquracão a uma síndrome, mas que são
___- _*. : . ._ì-- . -
impõi{ántes por suger i r uma dinâmica e indi-
car um modo part icular de adoecer. O reco-
nhecimento precoce dessas condiçóes tem um
papel preponderante na prevenção de cr ises
ou no desenvolv imento de um quadro c l ín ico
estabelecido.
Reconheiõendo esta interação entre sinais,
s intomas e síndromes com os aspectos dinâ-
micos (modos de funcionamento), o entrevis-
tador ampl ia seu domínio sobre a s i tuação.
torna-se mais capaz de compreender o sujei to
e sua condição e mais capaz de ajudá- lo de
maneira eficaz. Voltemos ao exemplo da pes-
soa que se apresenta depr imida. Em um pr i -
meiro momento, o clínico pode estar interes-
sado na sever idade do quadro e buscar def in i r
quais s intomas estão presentes e em que in-
tensidade. Contudo, em seguida, pode ju lgar
rmportante invest igar em mais detalhes os sen-
t imentos de culpa, inut i l idade e menos val ia
que a pessoa exper imenta subjet ivamente e
relacioná-los tanto aos sintomas quanto às fan-
tasias inconscientes e aos eventos importan-
tes no desenvolv imento e na histór ia fami l iar
(relações objetais). Tal estratégia integra uma
abordagem fenomenológica do quadro s in-
tomático com a compreensão psicodinâmica do
seu desenvolvimento - ela busca descrever e com-
preender o fenômeno em sua complexidade para
sugerir modos de intervenção terapêutica.
As entrevistas sistêmicas para avaliar casais
e famíl ias estão se tornando cada vez mais
importantes em psicologia, pr incipalrr Íente,
*quando há a demanda de atenção psicológica
para crianças e adolescentes (Féres-Carneiro,
1996). Elas podem focal izar a aval iação da es-
trutura ou da histór ia relacional ou fami l iar .
Podem também avaliar aspectos importantes
da rede social de pessoas e famílias. Essas téc-
nicas são muito var iadas e for temente inf luen-
ciadas pela orientação teórica do entrevista-
dor. Como exigir iam um capítulo à parte, f ica
aqui apenas o registro de sua existência e
importância.
A entrevista de devolução tem por finalida-
de comunicar ao sujei to o resul tado da aval ia-
ção. Em muitos casos, essa atividade é inte-
grada em uma mesma sessão, ao f inal da en-
trevista. Em outras situaçóes, principalmente
quando as atividades de avaliação se estendem
por mais de uma sessão, é út i l destacar a en-
trevista de devoluçáo do restante do processo.
Outro objet ivo importante da entrevista de
devolução é permitir ao sujeito expressar seus
pensamentos e sentimentos em relação às con-
clusões e recomendações do avaliador. Ainda,
permite aval iar a reação do sujei to a elas. Ou
seja, mesmo na fase devolutiva, a entrevista
mantém seu aspecto aval iat ivo, e tem-se a
oportunidade de ver i f icar a at i tude do sujei to
em relação à avaliação e às recomendaçóes,
ao seu desejo de segui-las ou de recusá-las. Fi-
nalmente, como objetivo da entrevista de de-
volução, destaca-se a importância de ajudar o
sujeito a compreender as conclusóes e reco-
mendações e a removey distorçóes ou fanta-
sias contraproducentes em relação a suas ne-
cessidades. A devolução pode ser s imples,
como, por exemplo, de que o motivo que o
levou a procurar ajuda pode ser atendido em
um processo terapêutico ou complexo, a pon-
to de requerer mais de uma sessão.
O processo de avaliação psicológica pode
envolver tÍifeiêÌïtê3 procedimentos, incluindo
vários tipos de entrevista. Por exemplo, na ava-
l iação de um jovem adolescente que apresen-
tava comportamentos estranhos e incompre-
ensíveis para família, o processo iniciou-se com
uma entrevista de famíl ia, seguida de uma en-
trevista com o jovem para avaliação do qua-
dro sintomático e seus aspectos psicodinâmi-
cos. Depois da apl icação de instrumentos de
aval iação psicológica e sua anál ise, houve uma
entrevista de devolução com o jovem, seguida
de outra com ele e seus pais. Essas entrevistas
tiveram o objetivo específico de ajudar o jo-
vem e seus pais a compreenderem a situaçáo
(que envolvia um quadro psicót ico), a explorar
a sua repercussão no plano afetivo e relacional
e a tomar decisões específicas quanto aos es-
tudos e a outros elementos estressores na vida
do jovem e da família. Hourne mais uma entre-
vista com os três, a f im de consol idar o enca-
minhamento para uma aval iação psiquiátr ica
(para fazer um acompanhamento medicamen-
toso) e de determinar uma estratégia psicote-
rapêut ica (para o apoio na cr ise).
COMPETÊNCIAS DO AVALIADOR E A
QUALIDADE DA RELAçÃO
As diversas técnicas de entrevista têm em co-
mum o objet ivo de aval iar para fazer algum
tipo de recomendação, seja diagnóst ica ou te-
rapêut ica. A entrevista, como ponto de conta-
to in ic ia l , é crucial para o desenvolv imento de
uma relação de ajuda. A acei tação das reco-
mendações ou a permanência no tratamento
dependem de algumas característ icas impor-
tantes desse pr imeiro contato, que são inf lu-
enciadas por um conjunto de competências do
entrevistador. A di f iculdade de acei tação das
recomendaçÕes ou a desistência de in ic iar um
processo terapêutico, quando ocorÍe, se dá nos
pr imeiros contatos. Comentaremos aqui a l -
gumas competências pessoais essenciais para
a condução de uma entrevista, independen-
tes da or ientação teór ica do entrevistador ou
dos objet ivos específ icos da entrevista. A
atenção a esses aspectos e o desenvolv imen-
to dessas competências são elementos fun-
damentais para o êxi to na condução de en-
trevistas.
Uma entrevista, na prát ica, antes de poder
ser considerada uma técnica, deve ser,y ista
como um contato social entre duas ou mais
pessoas. O sucesso da entrevista dependera,
portanto, de qual idades gerais de um bom
contato social , sobre o qual se apóiam as tec-
nicas c l ín icas específ icas. Desse modo, a exe-
cução da técnica é inf luenciada pelas habi l ida=
des interpessoais do entrevistador. Essa inter-
dependência entre habi l idades interpessoais e
o uso da técnica é tão grande que, muitas ve-
zes. é impossível separá-las. O bom uso da tec-
nica deve ampl iar o alcance das habi l idades
interpessoais do entrevistado e vice-versa. Para
levar uma entrevista a termo de modo adequa-
do, o entrevistador deve ser capaz de:
1 ) estar presente, no sentido de estar intei-
ramente disponível para o outro naquele mo-
mento, e poder ouvi- lo sem a interferência de
questões pessoais;
2) ajudar o paciente a se sent i r à vontade e
a desenvolver uma al iança de trabalho;
3) faci l i tar a expressão dos mot ivos que le-
varam a pessoa a ser encaminhada ou a bus-
car ajuda;
4) buscar esclarecimentos para coloçaçQes
vagas ou incompletas;
5) gent i lmente, confrontar esquivas e con-
tradições;
6) to lerar a ansiedade relacionada aos te-
mas evocados na entrevista;
7) reconhecer defesas e modos de estr-utu_--
ração do paciente, especialmente quando elas
atuam diretamente na relação com o entrevis-
tador ( t ra nsferência);
8) compreender seus processos contratr-ans-
ferenciais; !
9) assumir a in ic iat iva em momentos de
impasse;
10) dominar as técnicas que ut i l iza.
Examinaremos, a seguir , cada uma dessas
capacidades.
Para estar presentee poder ouvir o pacien-
te, o entrevistador deve ser capaz de isolar
outras preocupações e, momentaneamente,
focal izar sua atenção no paciente. Para fazer
isso, é preciso que suas necessidades pessoais
estejam sendo suf ic ientemente atendidas, e
que ele possa reconhecer os momentos em que
isso parece não estar ocorrendo. lsso impl ica
que as ansiedades presentes não sejam tão
fortes a ponto de interferir no processo. As
ansiedades inconscientes do entrevistador le-
vam à resistência e di f icul tam a escuta, pr inc ' r=
palmente de material latente na fala do entre-
vistado. Cuidando de suas necessidades pes-
soais, 'o entrevistador poderá ouvir o outro de
um modo di ferenciado. Essa escuta di ferencia-
da, por s i só, é considerada um dos elementos
terapêut icos (Cordiol i , 1 993).
Por estar atento ao paciente, o entrevistâ-
dor estará mais apto a ajudá-lo a sentir-se à
vontade e a desenvolver uma al iança de traba-
lho. A al iança para o t rabalho. que mais tarde
se desenvolverá em uma al iança terapêut ica, é
composta de dois fatores: a percepção de es-
tar recebendo apoio e o sent imento de esta-
rem trabalhando juntos (Horvath, Gaston &
Luborsky, 1993; Luborsky, 1976). Desenvolver
* - ì atrnosfera de colaboração é essencial para
: : , .€sso de uma aval iação. Para isso, é im-
:r : ' : - . ie que o paciente perceba que o entre-
, ' ' : : jor está reëeptìvo a suas di f iculdades e a
:e-s oojet ivos, que ele demonstra entendê- lo
: =: : :a- lo, que ele reconhece suas capacida-
: ,És : seu potencial , e que ele o ajuda a mobi l i -
- : '5-a capacidade de auto-ajuda. Essa percep-
=: :cdalece a relação e favorece uma atitude
::, es'3rativa e participativa por parte do sujeito.
=:c i l i tar a expressão dos mot ivos que levam
il :Ës50a a buscar ajuda é o coração da entre-
, , : -= Contudo, nem sempre é fáci l . Freqüente-
n"-h.- :e, os mot ivos reais não são conhecidos,
: ' - : : apresentam de maneira latente. Muitas
rc,- :s estão associados a afetos ou idéias di f í -
::-. i€ serem aceitos ou expressos. Outras ve-
: ' : : =xistem resistências importantes que di Í i -
: - : : " Ì1 o processo. O paciente deverá se sent i r
: '31 
-'o o suficiente para poder arriscar-se. O
*!" : r E s igni f icat ivo, pois a entrevista tem o
;r : : :^cìal de modif icar a maneira como ele se
r€r:Êoe (auto-estima), percebe seu futuro pes-
i:È clanos, desejos, esperanças) e percebe
:,i-:- r 'elaçoes significativas. Portanto, sp há es-
:r- i .Çâ de que a entrevista venha a lhe t razer
l ; , ì - -os, há também o receio de que possa con-
r* : ' a perdas signi f icat ivas. Abandonar idéias
,-*-e-, . ,a lor izadas ou auto- imagem distorcida
:í:,:Ê ser concretamente experienciado como
;,:.:: real. Abrir mão de um desejo pode levar
; =.cer iência de luto, como, por exemplo, a
ì r ,= que inconscientemente acredi tava que, se
'tr: ' ::,: "suficientemente" boa, ela conseguiria
:?:-cerar o pai alcoólatra. Todo o seu esforço
sr: :rì ' ì vão. Para desistir desse pai e poder in-
n€s: ' na própria vida, ela teve que viver o luto
,ru: perda do pai que desejava ter e abando-
-e ' : fantasia de obter do pai real o apoio que
"e :sliorçava para dar-lhe, sem resultado. Em-
: ' : - : seu comportamento fosse conf igurado
r;r um conf l i to na fantasia*, a v ivência da per-
' l:rpreendemos Íantasia não em oposição à realidade,
rÌãs como realidade interna, subjetiva, com vínculos em
rea::es objetais e afetos associados, que podem ter um
rcã:'io na experiência do sujeito tão ou mais forte que a
r** :ade externa, e que podem, conseqüentemente, in-
{ue-: ar o comoortamento de maneira decisiva.
da era real . A segurança para enfrentar essas
situações vem em parte do tipo de escuta e
atenção que percebe estar recebendo, como
também da capacidade do entrevistador de
facil i tar a expressão de experiências, sentimen-
tos e pensamentos relevantes.
Em muitos momentos, o entrevistador de-
verá buscar esclarecimentos para colocações
vagas ou incompletas e, gent i lmente, confron-
tar esquivas e contradiçóes. Ut i l izamos o ter-
mo confrontar no sentido de "colocar-se dian-
te de.. . " . Opoe-se a evi tar , esquivar-se ou de-
fender-se, e mobi l iza a capacidade de enfren-
tamento do sujei to, no nível adequado à sua
capacidade e estrutura egóica. Por isso, a con-
frontação é uma técnica dirigida ao insfiât õ
iéquèr certa capacidade de tolerar a ansieda-
de. O cl ín ico exper iente saberá cr iar um con-
texto suf ic iente de apoio para que o sujei to se
sinta em condições de enfrentar esses momen-
tos. Alguns entrevistadores recuam, em mo-
- 
mentos cruciais, mais f reqüentemente do que
gostaríamos de admit i r . Respostas pouco ela.
boradas, colocaçóes vagas ou omissões atuam
.como defesas que obscurecem o assunto em
questão. Quando o entrevistador deixa passar
esses momentos, perde uma oportunidade de
desenvolver uma idéia mais c lara sobre o as-
sunto, a lém de não ajudar o paciente a am-
pl iar sua percepção da questão. Contrar iamen-
te à noção di fundida, o que não foi d i to antes
freqüentemente permanece sem ser abordado
mais tarde.
Assuntos importantes, afetivamente carre-
gados e associados a exper iências dolorosas,
muitas vezes aparecem nas entrevistas c l ín icas.
Para sustentar esses momentos, o entrevista-
dor deverá desenvolver a capacidade de tole-
rar a ansiedade e de falar abertamente sobre
temas di f íceis, que têm o potencial de evocar
emoçóes intensas. O entrevistador deverá de-
senvolver conf iança em sua própr ia capacida-
de de suportar ta is momentos com natural ida-
de e de poder dar apoio ao outro q.ue passa
pela exper iência, sem ser internamente prgs,
s ionado a evi tá- la. Caso contrár io, e le pode
comunicar imperíc ia ou di f iculdades pessoais
relacionadas ao tema em questão, o que cr ia
um cl ima carregado de mat izes inconscientes,
difíceis de serem resolvidos na relação. Tais te-
mas podem vir a ser configurados como tabus
na relação e podem não ser abordados ade-
quadamente. Por exemplo, uma senhora sol-
teiralapresentou-se para terapia com uma his-
tória de depressões recorrentes. Ficou claro que
tais episódios começaram após um envolvimen-
to amoroso com um padre e a decisão unilate-
ral dele de abandonar o relacionamento. A
perspectiva de falar de experiências sexuais,
neste contexto, com alguém da idade da mãe
do terapeuta trouxe para ele dificuldades que
levaram a um impasse sério na entrevista ini-
c ia l .
A capacidade de reconhecer as defesas e o
modo particular de estruturação do paciente é
de especial interesse. Uma pessoa que adota
um est i lo r ígido de personal idade (p.ex., colo-
ca-se de uma maneira predominantemente
dependente em suas relações) ou persistente-
mente projeta (p.ex.. culpa os pais por suas
dificuldades), revela aspectos significativos de
seu modo de ser (estrutura) e funcionar (dinâ-
mica). Reconhecendo esses aspectos, o entre-
vistador poderá antecipar essas situaçóes de
transferência e evitar respostas contratransfe-
renciais inadequadas. Ao reconhecer as dinâ-
micas e modos de interagir do sujeito, pode-
mos dirigir nosso modo de proceder de ma-
neira mais ef ic iente. O aval iador pode anteci-
par as ansiedades da pessoa'e adaptar-se de
modo correspondente. Se a pessoa apresenta
uma postura dependente, obsessiva, auto-en-
grandecedora ou colaboradora, a observação
desta atitude ou comportamento já é informa-
ção diagnóstica a ser integrada na interpreta-
ção. A observação do comportamento, da co-
municação não-verbal e do mater ial latente
contr ibui de maneira especial . Restr ingir o
âmbito do interpretável somente ao conteúdo
explícito da comunicação pode acarretar per-
da de informação cl ínica signi f icat iva.
Ser capaz de compreender seus processos
contratransferenciais é, possivelmente. um dos
recursos mais importantes do clínico. Rg_coq|e-
cer como os processos mentais e afetivos sáó, 
.
mobilizados em si mesmo e ser capaiïe reia--
cionar esse processo ao que se passa narelã-
ção imediata com o sujeito fornece ao entre-
vistador uma via inigualável de compreensão
Oà èiperiência do oüiro. A contràfránsfeiêh-
cia foi inicialmente conceituada, como proces-
so patológico residual do terapeuta, como "os
próprios complexos e resistências internas"'"
(Freud, 1910, p.130). Com o tempo e o desen-
volvimento do conceito de identificação proje-
tiva, percebeu-se a característica universal do
processo contratransferencial e sua importân-
cia na compreensão piofunda da comunicação
paciente-terapeuta. Os trabalhos clássicos de
Heimann (1950), Racker (1981) e Pick (1985),
bem como a revisão detalhada de Hinshelwood
(1991), descrevem e i lustram esses processos.
Existem momentos em que a entrevista pas-
sa por situaçóes d-e impasse importantes. Por
exemplo, uma pessoa pode, a determinada al-
tura, dizer: "Náo sei se realmente deveria estar
falando isso. Não sei se realmente quero fazer
isso". Ou, mais decididamente: "Essa é a ter-
ceira vez que procuro ajuda. e não adiantou
nada". Assumir a inic iat iva em momentos de
impasse significa poder mobilizar recursos pes-
soais diante de si tuações di f íceis e inespera-
das. Signif ica poder usar a cr iat iv idade para dar
uma resposta eÍicaz no momento. Por exem-
plo, pode ser crucial ajudar a explorar alterna-
tivas e buscar uma perspectiva em momentos
de desesperança. Eis algunlexemplos de- situ-a-
qóes críticas que requerem do eltreyis!-ador
capacidade de agir : r isco de vida ( ideação sui-
cida), s intomas'psicót icos, v iolência, impulsi-
vidade, ou outras situações que podem levar a
um desfecho prejudícíal para as pessoas e4-
ygryjdas Uma paciente disse. dez minutos an-
tes do Íinal da primeira entrevista: "Não sei se
estarei aqui na semana que vem". A partir da
exploração cuidadosa dessa fala, tornou-se cla-
ro que ela estava considerando o suicídio. A
terapeuta precisou lidar com isso de forma di-
reta e decisiva, de modo a evitar um desfecho
autodestrutivo. Desenvolver recursos pessoais
para l idar com tais si tuaçóes é fundamental
para que o entrevistador possa trabalhar com
seguranç4.
Finalmente, espera-se que o entrevistador
tenha domínio das técnicas que ut i l iza. É pelo
domínio da técnica que o entrevistador pode
deixar de se preocupar com a sua execução e
se concentrar no paciente, no que ele apresen-
ta e na sua relação com ele. { competência
tecnica dá e comunica segurança ao l iberar o
entrevistador para dir ig i i sua atenção aos as-
pectos mais importantes da relação. A fal ta
desse domínio pode resul tar em uma apl ica-
cão mecânica e desconexa das diretr izes da
tecnica. Com a prát ica e a exper iência, os as-
oectos mecânicos da técnica tornam-se secun-
dár ios, eo sujei to e a relação passam a sedes-
:acar. Torna-se evidente uma integração natu-
'a l dos aspectos técnicos e a valor ização da
'elação com o sujei to. Assim, a entrevista f lu i ,
e a atuação refinada do profissional transfor-
nra a técnica em arte.
coNcLUsÃo
:ste capítulo apresentou e discut iu uma def i -
' icão de entrevista c l ín ica e seus t ipos. Abor-
Jamos as competências pessoais do aval iador
€ 
a sua responsabi l idade prof issional no pro-
:esso de entrevista. Mencionamos a s i tuação
:r- iv i legiada e o poder que tem o entrevista-
Jor, diante do entrevistado. A entrevista confi-
gura-se como um poderoso meio de inf luen-
ciar o outro, pr incipalmente considerando que
3s pessoas freqüentemente buscam ajuda ou
são aval iadas em momentos de fragi l idade.
isse aspecto, a l iado aos já discut idos neste ca-
ci tu lo, nos leva a ref let i r sobre algumas ques-
:Ões éticas acerca da nossa intervenção. Segun-
o um di to popular, "nada mais prát ico do que
.rnna boa teor ia". Gostaríamos de poder dizer
nada mais ét ico do que um bom treinamen-
:o" (teórico e técnico). Infelizmente, isso não é
si:f iciente. Uma prática ética depende desre
:neinamento, mas também dos vàlóres e da
Íormação pessoal do profissionà1, que desen-
.olvem nele o respei to e a consideração pelo
outro, e que o colocam em condiçóes de ante.-
c ipar como as conseqüências de seu compor-
tamento e de suas omissões poder iam afetar o
outro, adversamente. Desejamos enfatizar este
ponto.
As questóes éticas colocam-se em evidên-
cia em si tuações de conf l i to. Pr imeiro, o inte-
resse (consciente ou inconsciente) do prof is-
sional pode contrariar o interesse do sujeito
avaliado (por exemplo, o profissional recebe-
ria menos pelo seu serviço se informasse ao
paciente que atende por um convênio do qual
ele e benef ic iár io) . Segundo, mesmo quando o
interesse de ambos parece ser o mesmo, este
pode ter conseqüências que colocam em r isco
o bem-estar do outro (por exemplo, manter
relaçóes não-profissionais com o sujeito). Ter-
ceiro, o prof is i ional pode ser chamado a aten-
der interesses conflitantes (por exemplo, em-
presâ-empregados, casais em processo de me-
diação, relação pais-adolescentes, etc.).
Vendo a ética na perspectiva do conflito,
destacamos duas maneiras como o proÍ issio-
nal pode manter o compromisso ét ico em suas
at iv idades. Pr imeiro, cabe a ele antecipar os
conflitos inerentes a essas atividades. Na ava-
l iação psicológica, encontramos muitos desses
casos. Um exemplo são as s i tuações em que
existe a necessidade de def in i r quem são os
cl ientes e como responder adequadamente às
demandas de cada um deles. A aval iação pode
envolver, a lém do sujei to, fami l iares, outros
profissionais, instituições, etc. Nesses casos,
falamos dos conf l i tos gerados pela at iv idade
e, portanto, colocados externamente aos pro-
f issionais. A estratégia mais s imples que temos
utif izado nesses casos é a de socializar a dúvi-
da. Trata-se de colocar a questão a colegas e
procurar ver i f icar como eles têm l idado com
di lemas simi lares, em busca de alguma or ien-
tação normat iva. As comissões de ét icq dos
diversos conselhos têm oferecido orientação
em muitos casos, e os profissionais devem lem-
brar deste recurso quando se virem nessas si-
tuaçÕes.
O segundo t ipo de conf l i to ét ico importan-
te diz respeito à própria relação com o sujeito.
ldealmente, esses conflitos deveriam ocorrer na
esfera consciente, e o profissional deveria pro-
curar resolver seus interesses sem envolver o
paciente. Nossa experiência em supervisão, no
entanto, mostra que existem situações, não
raras, em que o conf l i to não é diretamente
percebido pelo aval iador. Um exemplo comum
é o paciente di f íc i l ou inconveniente, que pode
ser negl igenciado ou até mesmo abandonado
pelo prof issional que, inconscientemente, de-
seja evitá-lo. O melhor contexto para desen-
volver habilidades internas para lidar com es-
sas si tuaçóes é na supervisão cl ínica. Ela nos
permite enxergar com os olhos do outro. A
sup,ervisão é uma atividade que oferece meiof
fundamentais para o prof issional entrar em'
contato com entraves pessoais no trabalho clí-
n iço, Q qvgn do se r uti I iza d q le 0 ìp !.e- gtrg, R-Orii:
Y9lr-lrinçipalmente no início de car.teira.. Mes-
mo pessoas experientes buscam colegas para
darem opinióes em si tuaçÕes di f íceis. Um olhar
diferente tem sempre o potencial de favorecer
nossa compreensão sobre um caso. Em ambas
as situações descritas - de conflitos impostos
pela natureza da tarefa, ou pela experiência do
profissional na relação -, o antídoto é não se
isolar, buscar apoio em prof issionais e colegas
de confiança e desenvolver a capacidade pes-
soal de l idar com a complexidade dessas si tua-
ções.

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