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Monografia João Rafael

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UNIVERSIDADE DO SUL DE SANTA CATARINA 
JOÃO RAFAEL DE FAVERI LEACINA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A (IM)POSSIBILIDADE DA USUCAPIÃO LAJEÁRIA DE BENS PÚBLICOS 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Içara 
2019 
 
 
JOÃO RAFAEL DE FAVERI LEACINA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A (IM)POSSIBILIDADE DA USUCAPIÃO LAJEÁRIA DE BENS PÚBLICOS 
 
 
 
 
 
Trabalho de Conclusão de Curso 
apresentado ao Curso de Direito da 
Universidade do Sul de Santa Catarina 
como requisito parcial à obtenção do título 
de Bacharel. 
 
 
 
Orientador: Prof. Claudia Helena Coradi, Esp. 
 
 
 
 
 
Içara 
2019 
 
 
JOÃO RAFAEL DE FAVERI LEACINA 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
A (IM)POSSIBILIDADE DA USUCAPIÃO LAJEÁRIA DE BENS PÚBLICOS 
 
 
 
 
Este Trabalho de Conclusão de Curso foi 
julgado adequado à obtenção do título de 
Bacharel e aprovado em sua forma final 
pelo Curso de Direito da Universidade do 
Sul de Santa Catarina. 
 
 
 
 
Içara, 2 de dezembro de 2019. 
 
 
 
______________________________________________________ 
Professora e orientadora Claudia Helena Coradi Esp. 
Universidade do Sul de Santa Catarina 
 
______________________________________________________ 
Prof.ª. Ana Carla Ferreira Marques, Esp. 
Universidade do Sul de Santa Catarina 
 
______________________________________________________ 
Prof.ª. Vanessa de Assis Martins, Ms. 
Universidade do Sul de Santa Catarina 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Dedico este trabalho à minha Família, que 
foi o meu porto seguro durante toda a 
jornada acadêmica. 
E também à memória dos meus avós e 
amigo que deixaram imensa saudade. 
 
 
AGRADECIMENTOS 
 
Primeiramente gostaria de agradecer a Deus. 
A todos os meus professores do curso de Direito da Universidade do Sul 
de Santa Catarina, em especial à minha orientadora Claudia Helena Coradi, que com 
sua dedicação e docência me fez amar a matéria de “Direito de Propriedade”, 
agradeço imensamente por aceitar conduzir o meu trabalho. 
À minha família, Daniel Leacina, Marli de Faveri e Luiza de Faveri Leacina, 
que sempre estiveram ao meu lado me apoiando ao longo de toda a minha trajetória. 
A todos os meus amigos do curso de graduação, em especial os do grupo, 
que compartilharam dos inúmeros desafios que enfrentamos, sempre com o espírito 
colaborativo. 
Ao professor, Júlio Cesar da Rosa, pela indicação de bibliográfica, que 
ajudou muito na pesquisa do contexto histórico. 
Também quero agradecer à Universidade do Sul de Santa Catarina que, 
como Universidade Comunitária, demonstrou estar comprometida com a qualidade e 
excelência do ensino. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
“Esse é o grande mistério das cidades: elas crescem e se modificam, 
guardando porém sua alma profunda apesar das transformações do seu conteúdo 
demográfico, econômico e da diversificação de suas pedras.” (Milton Santos, 1999). 
 
 
RESUMO 
 
Como uma legislação inovadora, a Lei 13.465/2017 trouxe ao ordenamento jurídico 
nacional um novo direito real, o chamado direito real de laje; contudo, muito se discute 
sobre a aplicação de institutos comuns do Direito das Coisas ao direito de laje, sendo 
o objeto do trabalho a aplicação do instituto da usucapião, com enfoque na 
possibilidade de usucapir lajes de imóveis públicos. A doutrina ainda não tem 
posicionamento consolidado sobre o tema, com argumentações prós e contras, 
enquanto que a jurisprudência ainda é tímida ao tema do direito de laje. 
 
Palavras-chave: Direito Real de Laje. Usucapião. Bens Públicos. 
 
 
ABSTRACT 
 
As an innovative legislation, Law 13.465/2017 brought to the national legal system a 
new real right, the so-called real right of slab; However, much is discussed about the 
application of common institutes of the Law of Things to the slab law, and the object of 
the work is the application of the usucapion institute, focusing on the possibility of 
usucapirating slabs of public real estate. The doctrine has not yet consolidated position 
on the subject, with pros and cons arguments, while jurisprudence is still timid to the 
theme of slab law. 
 
Keywords: Real Slab Law. Adverse possession. Public goods. 
 
 
LISTA DE ILUSTRAÇÕES 
 
Figura 1 - Oswaldo Cruz 'limpando' o morro da favela .............................................. 22 
Figura 2 - Morro da Favela ........................................................................................ 24 
Figura 3 - Classificação das Lajes ............................................................................. 42 
Figura 4 - Formas de aquisição da laje ..................................................................... 45 
 
 
 LISTA DE SIGLAS 
 
ART – Anotação de Responsabilidade Técnica 
BNH – Banco Nacional da Habitação 
CGJ/SP – Corregedoria Geral de Justiça do Estado de São Paulo 
CEF – Caixa Econômica Federal 
CSN – Companhia Siderúrgica Nacional 
COHAB – Companhia de Habitação 
FAR – Fundo de Arrendamento Residencial 
FCP – Fundação da Casa Popular 
FGTS – Fundo de Garantia do Tempo de Serviço 
FHC – Fernando Henrique Cardoso 
IBGE – Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística 
IPMF – Imposto Provisório sobre Movimentações Financeiras 
MCMV – Programa Minha Casa Minha Vida 
MP – Medida Provisória 
PAR – Programa de Arrendamento Residencial 
PAIH – Plano de Ação Imediata para Habitação 
REURB – Regularização Fundiária Urbana 
REURB-E – Regularização Fundiária Urbana de Finalidade Específica 
REURB-S – Regularização Fundiária Urbana de Finalidade Social 
RRT – Registro de Responsabilidade Técnica 
SBPE – Sistema Brasileiro de Poupança e Empréstimo 
SERFHA – Serviço Especial de Recuperação das Favelas e Habitações Anti-
higiênicas 
SFH – Sistema Financeiro Habitacional 
SNH – Sistema Nacional de Habitação 
STJ – Superior Tribunal de Justiça 
STF – Supremo Tribunal Federal 
 
 
SUMÁRIO 
 
1 INTRODUÇÃO ..................................................................................................... 12 
1.1 DELIMITAÇÃO DO TEMA ................................................................................. 13 
1.2 JUSTIFICATIVA................................................................................................. 14 
1.3 OBJETIVOS ...................................................................................................... 16 
1.3.1 Objetivo Geral ................................................................................................ 16 
1.3.2 Objetivo Específico ....................................................................................... 16 
1.4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS .......................................................... 16 
1.5 ESTRUTURAÇÃO DOS CAPÍTULOS ............................................................... 17 
2 CONTEXTO HISTÓRICO .................................................................................... 19 
2.1 EXPLOSÃO DEMOGRÁFICA ........................................................................... 20 
2.1.1 Sobre a Lei Áurea e a expulsão dos pobres para os morros .................... 20 
2.1.2 O êxodo rural brasileiro ................................................................................ 22 
2.2 SOBRE A FALTA DE ESPAÇO FÍSICO ............................................................ 23 
2.3 POLÍTICAS PÚBLICAS HABITACIONAIS ......................................................... 24 
2.3.1 Governos Populistas .................................................................................... 26 
2.3.2 Ditadura Militar .............................................................................................. 27 
2.3.3 República Nova ............................................................................................. 28 
3 A LAJE NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO ...................................32 
3.1 DOS DIREITOS REAIS ..................................................................................... 32 
3.1.1 Conceito ......................................................................................................... 32 
3.1.2 Características .............................................................................................. 33 
3.1.3 Classificação dos direitos reais ................................................................... 34 
3.2 DO DIREITO REAL DE LAJE ............................................................................ 35 
3.2.1 Conceito e natureza jurídica ........................................................................ 35 
3.2.2 Distinção entre direito real de laje, direito de superfície e condomínio ... 39 
3.2.3 Classificação ................................................................................................. 41 
3.2.4 Laje e normas urbanísticas .......................................................................... 43 
3.2.5 Aquisição e instituição da laje ..................................................................... 44 
3.2.6 Da alienação da laje ...................................................................................... 48 
3.2.7 Da extinção da laje ........................................................................................ 49 
4 USUCAPIÃO LAJEÁRIA ..................................................................................... 51 
4.1 DA USUCAPIÃO................................................................................................ 51 
 
 
4.1.1 Conceito ......................................................................................................... 51 
4.1.2 Requisitos comuns para todas as modalidades de usucapião ................ 52 
4.1.3 Modalidades de usucapião de bens imóveis .............................................. 53 
4.1.3.1 Usucapião ordinária ...................................................................................... 54 
4.1.3.2 Usucapião extraordinária .............................................................................. 54 
4.1.3.3 Usucapião especial urbana ........................................................................... 55 
4.1.3.4 Usucapião especial rural............................................................................... 55 
4.1.3.5 Usucapião urbana por abandono do lar ........................................................ 55 
4.1.3.6 Usucapião especial urbana coletiva ............................................................. 56 
4.1.3.7 Usucapião especial indígena ........................................................................ 56 
4.2 DA USUCAPIÃO DE LAJES .............................................................................. 56 
4.3 DA USUCAPIÃO LAJEÁRIA DE BENS PÚBLICOS .......................................... 59 
4.3.1 Breve considerações sobre bens públicos ................................................ 59 
4.3.2 Da usucapião de bens públicos e da (im)possibilidade de usucapião 
lajeária de bens públicos ........................................................................................ 60 
5 CONCLUSÃO ...................................................................................................... 64 
REFERÊNCIAS ......................................................................................................... 68 
 
12 
 
1 INTRODUÇÃO 
 
A questão relativa à moradia sempre esteve no centro do debate sobre 
políticas públicas no Estado brasileiro; o “ter onde morar” afeta não apenas a questão 
habitacional, pois irradia também sobre a qualidade de vida geral da população. 
Como resultado da notória falta de planejamento urbano e de políticas 
públicas habitacionais efetivas em nosso país, nasceram as chamadas favelas, 
formas de periferia exclusivas do Brasil, criadas por trabalhadores pobres e carentes 
de presença do Estado, como explicitado na música “No Brooklin”, do álbum o “Rap é 
Compromisso” do rapper Sabotage: 
 
Lá no bairro do Brooklin, reparei que, na periferia, a maioria dos moradores é 
gente pobre, carente de cultura própria. O terceiro mundo tem sido cruel. Eu 
vejo a marca do sofrimentos no rosto dos brasileiros. É, Sabotage, cada 
pessoa tem a sua história, e o respeito é tu que faz prevalecer. Vai na fé negô! 
(SABOTAGE, 2000). 
 
Nas favelas, lares passaram a se amontoar sobre lares em espaços físicos 
reduzidos e irregulares, sendo que nesses ambientes inóspitos surgiu a laje brasileira, 
de nome popular e de características parecidas com os direitos de sobrelevação 
regulamentados ao redor do mundo. 
Diante da realidade fática cada vez mais consolida, o legislador brasileiro 
decidiu regulamentar as moradias lajeadas, como forma de garantir segurança jurídica 
àqueles que encontraram na laje uma forma de moradia alternativa às convencionais. 
Assim, por meio da Lei n. 13.465, de 11 de julho de 2017 (que trata, dentre 
outros temas, da regularização fundiária urbana – a chamada Reurb), foi incluído no 
Código Civil de 2002, no rol de direitos reais do art. 1.225, o direito real de laje, como 
um mecanismo voltado à concretização da regularização fundiária com enfoque 
principalmente nas favelas, como disposto na justificativa para a promulgação da 
Medida Provisória n. 759/16, embrião legislativo da Lei n. 13.465/17: 
 
113. VI – SOBRE O DIREITO REAL DE LAJE. Em reforço ao propósito de 
adequação do Direito à realidade brasileira, marcada pela profusão de 
edificações sobrepostas, o texto prevê a criação do direito real de laje. [...] 
115. O direito de laje não enseja a criação de co-domínio sobre o solo ou 
sobre as edificações já existentes. Trata-se de mecanismo eficiente para a 
regularização fundiária de favelas. (BRASIL, 2016). 
 
13 
 
Apesar de não ser uma figura exclusiva das favelas, foi pensando nelas 
que o direito real de laje foi regulamentado, para, em conjunto com os demais 
mecanismos previstos na Lei n. 13.465/17 (Reurb), regularizar as moradias de 
inúmeras famílias. 
Com a criação do direito real de laje surgem dúvidas por parte da doutrina 
e da jurisprudência com relação à sua aplicação em consonância com os demais 
institutos já consolidados no ordenamento jurídico brasileiro, e nesta conjuntura 
questiona-se sobre a aplicação do instituto da usucapião em lajes, aprofundando-se 
o tema acerca da sua utilização para aquisição de lajes em prédios públicos. 
Essa questão tem a sua importância, pois sendo possível a utilização de 
usucapião lajeária para aquisição de bens públicos, poder-se-ia então regularizar 
inúmeras moradias em prédios ocupados, caso que ocorre com frequência nos 
grandes centros urbanos brasileiros. 
 
1.1 DELIMITAÇÃO DO TEMA 
 
O Direito é, entre as ciências humanas, aquela que tem a maior capacidade 
de transformação da realidade social; no entanto, por vezes ocorre que a sociedade 
passa por mudanças e alguns mecanismos da ciência jurídica acabam por se tornar 
obsoletos. 
Isso ocorreu com o Direito Civil, no que cabe aos direitos reais. As famílias 
que constituíram suas moradias sobre ou sob uma outra construção se encontravam 
em um limbo jurídico, tendo alguns de seus direitos ceifados por conta de uma 
omissão dos legisladores brasileiros. Com essa perspectiva criou-se um novo direito 
real, denominado de direito real de laje. 
Apesar do avanço da legislação brasileira, tal inovação por si só não foi 
suficiente para a regularização das inúmeras lajes ao redor do país, em decorrência 
de muitas das ocupações irregulares ocorrerem, por exemplo, em prédios públicos. 
Ora, sabe-se que a aquisição de bens públicos é vedada pela Constituição 
Federal que dispõe que “os imóveis públicos não serão adquiridos por usucapião.” 
(BRASIL, 1988) – tal vedação, no entanto, estende-se ao direito real de laje? Assim, 
com base no exposto, apresenta-se a seguinte delimitação temáticade pesquisa: A 
(im)possibilidade da usucapião lajeária de bens públicos. 
14 
 
E para corroborar com a natureza do tema proposto e motivar a 
investigação lançam-se primeiramente algumas indagações, como: O que é o direito 
real de laje? Quais as suas principais características? Quais as formas de constituição 
do direito real de laje? Em qual contexto surgiu a necessidade regularização dessa 
situação habitacional? São aplicáveis todas as modalidades de usucapião ao instituto 
do direito de laje? É defeso a aquisição de todos os direitos reais constituídos em bens 
públicos mediante usucapião? Destacadas as indagações e com o fim de tornar 
preciso o problema da pesquisa, estabelece-se como pergunta central: Há 
possibilidade de usucapir a laje de um prédio público? 
 
1.2 JUSTIFICATIVA 
 
O grande período de êxodo rural iniciado no Brasil durante a Era Vargas 
(período compreendido entre 1930 e 1945), somado à marginalização dos negros 
libertos no século XIX, originaram graves problemas durante o processo de 
urbanização no Brasil. 
Conforme leciona Rodrigues (1994, p. 40), nesse cenário de desordem no 
desenvolvimento dos centros urbanos é que surge a favela, nascida da necessidade 
do onde e como morar; a favela, para muitos, mostrava-se (e ainda se mostra) como 
a única alternativa de moradia. 
 
Um dos problemas mais graves das cidades atuais é a falta de moradia, que 
faz com que milhares de pessoas não tenham outra alternativa a não ser viver 
em precárias condições de vida, quase sempre em áreas de risco. As favelas, 
cortiços e loteamentos clandestinos são exemplos clássicos deste tipo de 
situação. (BRAICK; MOTA, 2010, p. 253). 
 
O Estado, na sua busca de reordenar o manto urbano e garantir o direito 
constitucional à moradia, passou a criar leis e projetos públicos com esse objetivo, a 
exemplo de programas como Habitar-Brasil e Morar-Município no Governo de Itamar 
Franco, da Lei nº 10.188/01 (que institui o Programa de Arrendamento Residencial - 
PAR), durante o a gestão de Fernando Henrique Cardoso, e os programas Minha 
Casa Minha Vida (MCMV), positivados pelas leis 11.578/07, 11.977/09, 12.424/11 e 
13.173/15, dos governos Lula e Dilma. 
No entanto, por seguir uma lógica de mercado, a maioria desses programas 
habitacionais focavam na construção de grandes condomínios por empreiteiras, que 
15 
 
por sua vez optavam por construí-los em áreas afastadas, quando não em áreas 
rurais, por conta do baixo valor do terreno. O resultado era que esses condomínios 
habitacionais para famílias de baixa renda acabavam sendo construídos em áreas 
isoladas, longe dos centros comerciais e dos parques industriais, o que no fim 
dificultava a vida dos novos moradores. 
 
Em muitos casos, os moradores de favelas e cortiços localizadas em áreas 
centrais recusam-se a aceitar os programas governamentais de habitação, 
que tentam resolver essa situação construindo conjuntos habitacionais nas 
periferias. As pessoas não aceitam mudar-se porque essas moradias – 
construídas com baixo custo e vendidas para serem quitadas em prazos 
longos e a juros baixos – estão longe dos locais de trabalho, fato que gera 
maiores despesas com transporte, que tem grande peso no orçamento 
familiar. (MENDES; TAMDJIAN, 2005, p. 153). 
 
De outro turno, as favelas continuavam a se expandir, e sua expansão é 
marcada pelo crescimento vertical dos imóveis, resultado do pouco espaço geográfico 
e do crescimento populacional. Esse processo resultou no surgimento da figura da 
laje, que se configura pela cessão da parte superior do imóvel para que terceiro 
edifique sobre, de acordo com Feitosa (2017, p. 16). 
Essas construções se popularizaram nas comunidades periféricas, 
ocorrendo da seguinte maneira: o dono de uma construção aliena, de forma onerosa 
ou gratuita, a sua laje superior ou inferior para a construção de uma residência - em 
tese, é nisso que se baseia o direito real de laje. 
O tema se justifica pela importância que representa ao campo jurídico, 
principalmente no que se refere ao direito que todos têm garantido (ou deveriam) na 
Constituição Federal brasileira que é o direito à moradia, que deve ser digna, segura 
e regular. 
Outro motivo de ordem jurídica relaciona-se ao fato do direito de laje ser 
recente no sistema jurídico brasileiro; inicialmente, teve sua regulamentação 
normativa por meio da Medida Provisória nº 759, de 22 de dezembro de 2016, que 
serviu de embrião para a Lei 13.465, que teve sua promulgação na data de 06 de 
setembro de 2017, pelo então Presidente da República Michel Temer. Por isso, as 
implicações jurídicas e sociais foram pouco estudadas pelos juristas e doutrinadores 
em geral. 
 
16 
 
1.3 OBJETIVOS 
 
Objetivo trata-se daquilo que se alcançar, são propósitos a serem 
observados na condução de uma produção cientifica, segundo o dicionário Houaiss 
(2011, p. 673), a palavra objetivo tem o significado de “o que quer se alcançar”. 
 
1.3.1 Objetivo Geral 
 
Analisar as consequências no âmbito do direito, da justiça e da sociedade 
em geral, da promulgação da Lei nº 13.465/17, que dentre outras providências, 
acrescentou o direito de laje no rol dos direitos reais previstos no art. 1.225 do Código 
Civil Brasileiro de 2002. 
 
1.3.2 Objetivos Específicos 
 
Os objetivos específicos são pontos importantes a serem desvendados 
para elaboração do presente trabalho, sendo eles: 
a) Discorrer sobre o contexto histórico e cultural acerca da criação do 
sistema de lajes; 
b) Discorrer sobre os conceitos doutrinários e legais pertinentes ao tema 
em estudo; 
c) Discutir acerca dos encadeamentos resultantes da criação deste novo 
direito real; 
d) Relacionar a importância da regulamentação do direito de laje para a 
regularização das inúmeras situações fáticas consolidas; e 
e) Discorrer sobre a possiblidade de usucapir a laje, em especial as 
constituídas sobre/sob de bens públicos. 
 
1.4 PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS 
 
Os procedimentos metodológicos que serão utilizados na pesquisa 
consistem no monográfico e no comparativo. O primeiro é referente à uma 
preocupação com o aprofundamento do tema em estudo e o segundo, a necessidade 
de comparações entre leis, normas e doutrinas. 
17 
 
Método é o meio pelo qual o pesquisador se utiliza para buscar respostas 
e obter resultados confiáveis. “O método é um recurso que requer detalhamento de 
cada técnica aplicada na pesquisa. É o caminho sistematizado, formado por etapas, 
que o pesquisador percorre para chegar à solução.” (MOTTA, 2012, p. 83). 
O método de abordagem que se aplicará na pesquisa é o do tipo dedutivo, 
uma vez que se analisarão documentos, inerentes às normas e leis, e doutrinas 
vinculadas ao tema proposto no projeto e a pesquisa proposta para o trabalho 
monográfico, quanto ao seu objetivo, será a do tipo exploratória, envolvendo 
levantamento bibliográfico. 
Quanto aos procedimentos na coleta de dados, serão aplicadas as 
pesquisas dos tipos bibliográfica e documental, a primeira decorre da necessidade de 
se fazer leituras, análises e interpretações de fontes secundárias (livros, revistas, 
jornais, monografias, teses, dissertações, relatórios de pesquisa, doutrinas, etc.). A 
finalidade desta consiste em colocar o pesquisador em contato direto com tudo o que 
já foi escrito ou dito sobre o tema em estudo. (MOTTA, 2012). É uma pesquisa que 
explica o tema em questão à luz dos modelos teóricos pertinentes, em relação à 
segunda, pesquisa documental baseia-se em fontes primárias ou documentais, uma 
vez que serve de base material ao entendimento da tese em questão. Pertence ao 
campo da hermenêutica, pois o documento deve ser analisado como se apresenta, e 
não como quer que se apresente. (MOTTA, 2012). 
Por sua vez, com base no objeto de estudo, a pesquisa será a do tipo 
instrumental, pois diz respeito à preocupação prática, que busca “[...] trazer uma 
contribuição teórica à resoluçãode problemas técnicos (transformando o saber em 
saber-fazer).” (SILVA, 2004 apud MOTTA, 2012, p. 48). As pesquisas bibliográfica e 
documental definem-se como instrumentais, podendo ser divididas em doutrinárias, 
legal ou jurisprudencial. 
 
1.5 ESTRUTURAÇÃO DOS CAPÍTULOS 
 
O presente trabalho está organizado de modo que após o capítulo 
introdutório será abordado, no segundo capítulo, em continuidade o contexto histórico 
que levou o legislador a criar o direito real de laje. O terceiro capítulo abordará a laje 
no ordenamento jurídico brasileiro, discorrendo brevemente sobre os direitos reais e, 
na sequência, sobre o direito real de laje propriamente dito (conceito, natureza 
18 
 
jurídica, distinção de outros institutos com os quais guarda semelhança, classificação, 
normas urbanísticas aplicáveis à laje, aquisição e instituição, alienação e extinção). 
No último capítulo, será discutida a possibilidade ou não de usucapião de lajes de 
bens públicos, razão pela qual serão feitas considerações necessárias quanto ao 
instituto da usucapião e acerca do conceito de bens públicos. 
19 
 
2 CONTEXTO HISTÓRICO 
 
O direito real de laje é um instituto jurídico que visa concretizar os direitos 
constitucionais à propriedade e à moradia; de outro ângulo, também visa integrar os 
moradores das periferias brasileiras às cidades, garantindo o acesso dessas pessoas 
às políticas públicas habitacionais. 
O enorme salto populacional ocorrido no país no Século XX e da falta de 
espaço físico-territorial obrigaram a população de baixa renda a buscar moradia em 
ambientes inóspitos, denominados de favelas. 
 
O termo favela, de acordo com o mesmo IBGE, diz respeito a um aglomerado 
de pelo menos cinqüenta domicílios – na sua maioria carentes de infra-
estrutura – e localizados em terrenos não pertencentes aos moradores. O que 
distingue a favela de outros locais de moradia, também sem infra-estrutura é 
a natureza da ocupação das terras. Os mais variados termos são utilizados: 
invasão de terras alheias, apropriação indevida de vazios urbanos, câncer 
urbano. (RODRIGUES, 1994, p. 36). 
 
Conforme explica Rodrigues (1994, p. 35), as causas de existência das 
favelas e de seu crescimento estão relacionadas à expulsão dos trabalhadores rurais 
dos campos, eufemisticamente chamada pela sociedade de ‘atração da cidade’, e aos 
baixos salários aos quais são submetidos parte dos trabalhadores urbanos, o que os 
impede de pagarem aluguel. 
Segundo Bezerra (2018, p. 130): 
 
nas unidades habitacionais irregulares, a comunidade cria regras de 
convivência, sendo tais regras erigidas espontaneamente, resultado das 
necessidades das pessoas que nela convivem. Assim surgiu o direito de laje, 
principalmente nas favelas. 
 
Na realidade brasileira, a laje foi gestada nesse ambiente de desordem 
urbana – ou seja, da favela surge a laje. Tanto que, no Brasil, a laje, como estrutura 
física ainda está ligada, no imaginário do senso comum, às favelas. Este tipo de 
pensamento, atrasado (e talvez até um pouco preconceituoso) decorre da origem da 
laje no cenário urbano nacional, qual seja, mediante construções de unidades 
autônomas sobrepostas em favelas, como alternativa à falta de espaço físico-territorial 
e ao alto custo na aquisição de imóveis próprios, seguros e regulares. 
A falta de políticas públicas também foi importante para o crescimento 
desordenado das cidades, que resultou na necessidade de criação das lajes. De 
20 
 
acordo com Rodrigues (1994, p. 35), o Estado não se importava com as verdadeiras 
necessidades dos favelados, mas sempre um interesse particular ou eleitoral, e 
quando aparecia de fato uma organização com um interesse coletivo efetivo esta era 
sempre perseguida pelas organizações estatais. 
No debate sobre prédios periféricos é importante destacar também a 
existência dos cortiços que, conforme Rodrigues (1994, p. 46), são habitações 
coletivas, em imóveis com pouca ou nenhuma conservação, que se proliferam nas 
áreas decadentes dos centros urbanos, onde há uma coabitação forçada, onde tudo 
o que é disponível nos cortiços é coletivo e deve ser usado por mais de uma família. 
A problemática repete-se nas inúmeras cidades brasileiras, ressalvadas as 
diferenças relacionadas ao tamanho, tipo de atividade e região ao qual o município se 
integra. De acordo com Santos (1993, p. 95-97), as organizações internas das cidades 
revelam-se um problema estrutural, cuja análise sistêmica permite verificar como 
todos os fatores mutuamente se causam e se perpetuam. 
 
2.1 EXPLOSÃO DEMOGRÁFICA 
 
Cabe discorrer inicialmente sobre o modo como ocorreu o salto 
populacional nas periferias brasileiras. Como forma de dinamizar a exploração do 
conhecimento, este tópico será dividido em duas partes, abordando inicialmente a 
segregação dos negros libertos para os morros, seguido pelo êxodo rural brasileiro. 
 
2.1.1 Sobre a Lei Áurea e a expulsão dos pobres para os morros 
 
Em 13 de maio de 1.888, era assinado pela Princesa Isabel, Regente do 
Império do Brasil, a Lei Imperial de n. 3.353/88, que declarava a extinção da 
escravidão no Império do Brasil. Tal medida veio para consolidar situação que já 
ocorria de fato pelas províncias, e surgia em decorrência de uma mobilização de 
intelectuais e da demanda de impérios estrangeiros que consideravam a mão de obra 
assalariada menos custosa do que a mão de obra escrava. (MARINGONI, 2011). 
Apesar de abolida a escravidão, não houve por parte do Estado Brasileiro 
nenhuma medida reparatória ou compensatória para com aqueles que foram escravos 
e agora eram libertos; não houve qualquer tomada de medida por parte do Império do 
Brasil, tampouco pelo regime republicano que se seguiu após o fim da monarquia, 
21 
 
alguma política que integrasse o negro liberto na sociedade. Sobre o assunto ensina 
Fernandes (2008, p. 29) que: 
 
a desagregação do regime escravocrata e senhorial se operou, no Brasil, sem 
que se cercasse a destituição dos antigos agentes de trabalho escravo de 
assistência e garantias que os protegessem na transição para o sistema de 
trabalho livre. Os senhores foram eximidos da responsabilidade pela 
manutenção e segurança dos libertos, sem que o Estado, a Igreja ou qualquer 
outra instituição assumisse encargos especiais, que tivessem por objeto 
prepará-los para o novo regime de organização da vida e do trabalho. 
 
O liberto se viu como senhor de si mesmo, sendo obrigado a custear a o 
seu próprio sustento, o que inclui alimentação, saúde e moradia para si e para os seus 
dependentes, e apesar de tamanha responsabilidade, este não dispunha de meios 
materiais e morais para que atravessasse esse período de transição de um regime 
para outro. (FERNANDES, 2008, p. 29). 
Portanto, após o fim da escravidão, os negros libertos não tiveram outra 
escolha a não ser buscarem moradias em regiões precárias e afastadas dos bairros 
centrais das cidades. Tal fato só piorou a situação, por exemplo, na cidade do Rio de 
Janeiro, onde houve uma reforma urbana que expulsou as populações pobres para 
os morros. (MARINGONI, 2011). 
A reforma urbana ocorrida no Rio de Janeiro no início do Século XX teve 
origem em uma política pública que tinha como objetivo modernizar a capital nacional 
(na época) aos moldes das cidades europeias, e deu-se com um caráter higienista, 
tanto no caráter medicinal quanto no caráter doutrinário. (CHALHOUB, 1996). 
Os intelectuais da medicina, liderados durante a reforma urbana pelo 
prestigiado sanitarista Oswaldo Cruz, começaram a ver as classes mais pobres como 
perigosas, não apenas no sentido de organização do trabalho e da manutenção da 
ordem pública, mas agora pelo perigo de contágio de doenças por conta de seus 
hábitos nocivos à ‘sociedade’, e suas habitações coletivas, na época denominadas de 
cortiços, seriam focos de irradiação de epidemias e vícios. (CHALHOUB, 1996, p. 29). 
De forma didática, Zaluar e Alvito(1999, p. 12) discorrem sobre o 
pensamento de parte dos intelectuais cariocas, e todos são categóricos ao afirmar que 
existia uma intenção em dividir a cidade do Rio de Janeiro em duas, uma sendo 
europeia e a outra indígena. 
O discurso higienista agradava boa parte do Capital local e nacional, pois, 
com a derrubada dos cortiços e habitações coletivas semelhantes abria-se espaço 
22 
 
para construção de novos empreendimentos imobiliários, tal aliança foi de grande 
valia para execução da reforma urbana. (CHALHOUB, 1996, p. 52). 
 
 Figura 1 - Oswaldo Cruz 'limpando' o morro da favela 
 
Fonte: Revista “O Malho” de n. 247 (1907) 
 
A limpeza social efetuada durante esse episódio fez com que inúmeros 
moradores de habitações coletivas e cortiços se refugiassem nas favelas, e fez com 
que o estigma dos moradores das comunidades periféricas e favelizadas aumentasse, 
não sendo realizadas, à época, políticas públicas que possibilizassem condições de 
higiene e de moradia ideais para a dignificação daquelas pessoas. 
Segundo Valladares (2000), importante destacar também a contribuição 
para a formação das favelas dos antigos soldados que batalharam na Guerra de 
Canudos, e que após a dispensa do exército foram se abrigar também nos morros. 
 
2.1.2 O êxodo rural brasileiro 
 
Por muito tempo a economia brasileira girou em torno da produção e 
exportação do café; as fazendas cafeeiras eram tão importantes para economia 
nacional que, por um período da história (denominado pelo historiadores como 
República Velha), as elites fazendárias do café dominavam a política nacional, a ponto 
23 
 
de conseguirem eleger diversos presidentes em alternância com a oligarquia leiteira. 
(MAIA; SARAIVA, 2012). 
Após a quebra da bolsa de valores de Nova Iorque em 1929, a indústria 
cafeeira entra em colapso, sendo necessária a criação de políticas 
desenvolvimentistas com o objetivo de nutrir os novos anseios das elites nacionais, o 
que acabou com culminar na criação e expansão de políticas de incentivo à indústria 
nos centros urbanos. 
 
Em função da transição da economia de base agro-exportadora para uma 
economia urbano-industrial, a partir da crise do café em 1929 o Estado 
passou a exercer forte presença no desenvolvimento econômico, por meio de 
políticas macroeconômicas e desenvolvimentistas que atendiam aos 
interesses da oligarquia cafeeira. O interesse pela industrialização e o anseio 
em aumentar a produção nacional resultaram no processo de modernização 
da agricultura brasileira nos anos de 1960, culminando na manutenção dos 
problemas no campo e a existência de conflitos localizados pela posse da 
terra. (PRIORI; POMARI; AMÂNCIO; IPÓLITO, 2012). 
 
Como alerta Ribeiro (1995, p. 198), apesar de a industrialização e a 
urbanização serem processos que complementam um ao outro, ao modo em que com 
a industrialização são gerados empregos em áreas urbanas, o que eventualmente 
potencializa o êxodo rural, deve-se considerar os demais fatores que afetam os dois 
processos, entre eles o monopólio da terra e a monocultura que promovem a expulsão 
do trabalhador rural. 
Embora haja variações regionais, o fenômeno ocorreu por todo o país 
(RIBEIRO, 1995, p. 198), sendo, em geral, efeito do desenvolvimento da indústria 
nacional, dos conflitos pela posse da terra e do desemprego desencadeado pelo 
declínio das fazendas monoculturais, o que iniciou o processo de migração humana 
do campo para os centros urbanos. E como resultado prático, em decorrência da falta 
de condições financeiras que assegurasse uma moradia digna, muitos trabalhadores 
viram nos morros uma opção para construírem suas casas. 
 
2.2 SOBRE A FALTA DE ESPAÇO FÍSICO 
 
Após a chegada de inúmeros migrantes, trabalhadores rurais e nordestinos, 
a favela passou a ser vista como ambiente retrógrado de migrantes mal adaptados 
aos desafios da vida urbana, ignorando os problemas resultados do convívio forçado 
em um espaço pequeno. (ZALUAR; ALVITO, 1999, p. 15). 
24 
 
Portanto, da explosão populacional derivou outro grave problema nas 
periferias e favelas dos grandes centros urbanos, que é a falta de espaço físico, que 
gerou a necessidade de adaptação das populações faveladas, que foram obrigadas a 
buscar meios alternativos de constituição de moradia. 
 
 Figura 2 - Morro da Favela 
 
Fonte: Tarsila do Amaral (1924) 
 
Deste problema surgiram duas soluções: a primeira era construir um 
segundo imóvel no mesmo terreno; no entanto, como podemos perceber na obra 
“Morro da Favela”, da pintora modernista Tarsila do Amaral, essa solução não era das 
mais viáveis nas favelas, por conta da utilização da maior parte do terreno e da 
aproximação entre os prédios, que por vezes eram literalmente ‘grudados’ à 
construção confrontante. 
Portanto, a única saída era construir para cima; assim, da falta de espaço 
físico originou-se a necessidade de construção de moradias na direção vertical 
(CÔRREA, 2008), sendo uma forma inclusive de manter famílias próximas, com pais 
cedendo suas lajes para seus filhos constituírem novas famílias. 
 
2.3 POLÍTICAS PÚBLICAS HABITACIONAIS 
 
25 
 
O Estado brasileiro tem uma vasta gama de precedentes em políticas 
públicas habitacionais, algumas com o objetivo de diminuir o déficit habitacional por 
meio de construção de casas populares ou por meio de alugueis pagos ou subsidiados 
pelos entes públicos, outras com o foco na regularização fundiária. Também existiram 
políticas de construção de moradias por meio de associações comunitárias e por meio 
de financiamentos bancários subsidiados pelo governo. 
Quanto às favelas, Rodrigues (1994, p. 41) salienta que durante muito 
tempo a preocupação do Estado tem sido na sua erradicação, por meio da remoção 
dos moradores e a liberação da área antes ocupadas para outros usos. 
Durante um longo período o governo brasileiro não se interessou por este 
tipo de política pública, em razão da maior parte da população viver em zonas rurais 
e por conta do vasto território. Bezerra (2018, p. 121) explica que: 
 
a ausência de políticas públicas urbanas gerou direito informal a várias 
comunidades que ocuparam o espaço urbano sem nenhum 
planejamento/investimento governamental, nascendo nessas comunidades 
um conjunto de regras de convivência/necessidade para o convívio social. 
 
Conforme leciona Rodrigues (1994, p. 55), apesar de não haver políticas 
públicas habitacionais por parte do Estado Brasileiro, o setor industrial, ainda 
embrionário no país, atraía mão de obra por meio de oferecimento de empregos com 
moradia garantida, dando origem às vilas operárias, que contavam com incentivos 
estatais com a exoneração de impostos e facilidades da compra da terra pela indústria. 
Exemplo de tal prática ocorreu na região sul de Santa Catarina, onde 
grandes empresas, como Companhia Siderúrgica Nacional-CSN, criaram vilas 
operárias com residências confortáveis como forma de incentivo aos seus 
trabalhadores. 
 
Devido ao incentivo do governo federal à indústria nacional e consequente 
instalação da Companhia Siderúrgica Nacional-CSN. Empresa que assumiu 
a maioria das ações da Carbonífera Próspera em 1952. A intervenção estatal 
resultou em uma série de “benefícios”. As casas operárias construídas pela 
CSN possuíam um maior conforto com o número maior de cômodos sendo 
que alguns eram feitas em alvenaria. (COSTA, 2004). 
 
Tal situação perdurou por muitas décadas; contudo, as vilas operárias eram 
prejudiciais aos trabalhadores, pois obrigava-os a continuarem no emprego 
independente das condições, sendo que, no momento em que eram demitidos, 
também ficavam sem moradia. 
26 
 
A partir da Crise de 29 e do Golpe de 30, o Brasil inicia um período de 
desenvolvimento industrial que leva a muitos nacionais a migrarem para os centros 
urbanos, sendo todo esse contexto exposto anteriormente. Deste quadro, surge por 
necessidade, a iniciativa dos gestores públicosem lidar com esse novo desafio. 
Burgos (1999, p. 27) explicam que em razão da impossibilidade dos 
analfabetos votarem, e após o início da Era Vargas, confere-se maior participação 
política para os trabalhadores formais; contudo, as favelas não foram alvos iniciais das 
políticas habitacionais. 
 
2.3.1 Governos Populistas 
 
Na Década de 40, após o fim da Era Vargas e com o início dos Governos 
Populistas, Dutra, o primeiro presidente pós-varguismo que governou o Brasil de 1945 
a 1950, criou a Fundação da Casa Popular (FCP) pelo Decreto-lei de n. 9.218/46, 
sendo este o primeiro órgão público com o objetivo de promover políticas públicas 
habitacionais. 
Segundo Almeida (2010, p. 28-29), “a atuação da FCP evidencia a baixa 
prioridade que os governos da época concederam ao problema da carência 
habitacional do país”, pois mesmo em conjunto com a atuação dos institutos e das 
caixas de aposentadorias e pensões dos governos dos demais entes federativos, o 
problema do déficit habitacional não chegou perto de ser resolvido, sendo construído 
no período cerca de duzentas mil moradias. 
Nos anos 50, por receio da instrumentalização dos morros pelos 
comunistas, a Arquidiocese do Rio de Janeiro e a Prefeitura Municipal do Rio de 
Janeiro organizaram uma instituição dedicada a assistência material e moral dos 
habitantes das favelas do Rio, que promovia políticas assistencialistas e iniciava uma 
cooptação dos movimentos sociais locais em prol da Igreja e do Estado que perduraria 
por muitos anos. (BURGOS, 1999, p. 29). 
Após o avanço dos programas assistenciais, as favelas passam a gozar de 
certa identidade positiva, o que levou a Igreja e a Prefeitura a aprofundarem o trabalho 
que estava sendo realizado, sendo criado pela Igreja Católica em 1955 a Cruzada de 
São Sebastião, e pelo Governo Municipal é criado em 1956 o Serviço Especial de 
Recuperação das Favelas e Habitações Anti-higiênicas (SERFHA), que avançaram 
muito bem em projetos de urbanização das favelas cariocas. (BURGOS, 1999, p. 30). 
27 
 
Por conta de divergências políticas, a SERFHA sofre um esvaziamento que 
resulta em sua extinção após um ano e meio de existência; para sua substituição é 
criada a Companhia de Habitação Popular (COHAB) que teria como foco a construção 
de casas populares de baixa renda (BURGOS, 1999, p. 33), sendo que tal programa 
foi replicado por diversos Munícipios e Estados até o início do Século XXI. 
 
2.3.2 Ditadura Militar 
 
Durante a Ditadura Militar, que tem início de 1964, são promulgados pelo 
governo os Decretos de n. 870 e 3.330, que colocavam as organizações de moradores 
sob controle da Secretaria de Serviços Sociais, passando a permitir a existência de 
uma única organização por comunidade, sendo que esta deveria cumprir uma séria 
de requisitos para que pudesse funcionar de forma legal, de acordo com Burgos (1999, 
p. 35): 
 
ao fixar a competência da associações, esse novo decreto completa a obra 
iniciada em 1961 pelo Serfha, subvertendo o papel das associações, que de 
representante dos moradores passam a fazer as vezes do poder público na 
favela, cabendo-lhes, entre outras atribuições, controlar, autorizando-as ou 
não (“consultados os órgãos do Estado”), as reformas e concertos nas 
habitações, bem como reprimir novas construções. 
 
Além do controle das organizações sociais, a plataforma da nova política 
habitacional seria marcada por projetos de remoção das populações faveladas para 
novos residenciais de casas populares, porém, tais operações removeram menos de 
1% (um por cento) das populações das favelas cariocas. Ademais, o resultado 
insignificante todo o procedimento foi muito traumático para as populações periféricas, 
sendo difícil computar a extensão do dano causado por esse modelo de política 
habitacional. (BURGOS, 1999, p. 35-39). 
Também é criado durante este período o Banco Nacional de Habitação 
(BNH) pela Lei n. 4.380/64, sendo definida a sua finalidade pelo art. 17 desta lei: 
 
Art. 17. O Banco Nacional da Habitação terá por finalidade: 
I - orientar, disciplinar e controlar o sistema financeiro da habitação; 
II - incentivar a formação de poupanças e sua canalização para o sistema 
financeiro da habitação; 
III - disciplinar o acesso das sociedades de crédito imobiliário ao mercado 
nacional de capitais; 
IV - manter serviços de redesconto e de seguro para garantia das aplicações 
do sistema financeiro da habitação e dos recursos a êle entregues; 
28 
 
V - manter serviços de seguro de vida de renda temporária para os 
compradores de imóveis objeto de aplicações do sistema; 
VI - financiar ou refinanciar a elaboração e execução de projetos promovidos 
por [...] conjuntos habitacionais, obras e serviços correlatos; 
VII - refinanciar as operações das sociedades de crédito imobiliário; 
VIII - financiar ou refinanciar projetos relativos a [...] de materiais de 
construção e pesquisas tecnológicas, necessárias à melhoria das condições 
habitacionais do país [...] 
Parágrafo único. O Banco Nacional da Habitação operará exclusivamente 
como órgão orientador, disciplinador e de assistência financeira, sendo-lhe 
vedado operar diretamente em financiamento, compra e venda ou construção 
de habitações, salvo para a venda dos terrenos referidos no artigo 26 ou para 
realização de bens recebidos em liquidação de garantias. (BRASIL, 1964). 
 
Na mesma lei de fundação do BNH é criado o Sistema Financeiro da 
Habitação (SFH). Segundo Almeida (2010, p. 30) “a criação do SFH se deu num 
momento de intensa crise do setor de habitação no Brasil” e o processo de 
urbanização do país aumentou a demanda por moradia, o que acabou gerando um 
grande déficit habitacional. 
O SFH tinha como fontes de seus recursos o Sistema Brasileiro de 
Poupança e Empréstimo (SBPE) e o Fundo de Garantia por Tempo de Serviço (FGTS) 
e era gerido pelo BNH. 
 
A política habitacional assume um modelo empresarial, num momento em 
que é crucial para o novo regime dar provas de que é capaz de atacar os 
problemas sociais, resolvendo a questão da moradia. É preciso ocupar os 
vazios deixados com o fechamento político. “As massas estão órfãs”, diz 
Sandra Cavalcanti na exposição de motivos de criação do BNH. 
(RODRIGUES, 1994). 
 
Durante muitos anos o BNH foi o grande protagonista das políticas públicas 
habitacionais, porém após o agravamento da crise que se iniciou no fim da Ditadura 
Militar Brasileira o banco foi incorporado à Caixa Econômica Federal (CEF), que 
passou a lidar com os problemas habitacionais como um setor dentro da autarquia, 
sendo diferente do BNH que tinha a habitação como sua atividade fim. 
 
2.3.3 República Nova 
 
Após a redemocratização, o setor habitacional apresentava um baixo 
rendimento social e econômico para o país, e por conta da grave crise financeira que 
o Brasil atravessava, o executivo nacional iniciou programas alternativos ao Sistema 
Financeiro Nacional, destacando-se entre eles o Programa Nacional de Mutirões 
Comunitários que alcançou a construção de apenas dois terços das moradias 
29 
 
populares previstas, muito por conta da corrupção e do clientelismo que marcava o 
programa. (ALMEIDA, 2010, p. 39). 
Durante o Governo Collor, que durou de 1990 a 1992, com a continuidade 
da grave crise no sistema de habitação, foi necessária a criação de uma nova política 
habitacional conhecido como Plano de Ação Imediata para Habitação (PAIH), que 
fracassou pelos motivos expostos por Almeida (2010, p. 40): 
 
interessante ressaltar que não se cumpriu o prazo inicialmente previsto e 
tampouco se atingiu o número de unidades a serem construídas. O tempo 
previsto foi dilatado por mais de dezoito meses, o custo unitário médio 
extrapolou o previsto, resultando na diminuição da meta inicial para 210 mil 
unidades e, por fim, o clientelismo impediu a alocação de recursos definidos 
pelo conselho curador do FGTS para os diversos estados da Federação. 
 
Com o impeachment de Collore a ascensão de Franco como Presidente 
da República, as políticas habitacionais sofrem grandes mudanças, a começar pelo 
criação de conselhos comunitários que aumentaram o controle e a transparência no 
uso do dinheiro público, sendo os programas ‘carros chefes’ da política habitacional o 
Habitar-Brasil e Morar-Município (ALMEIDA, 2010, p. 41), que funcionavam a partir de 
financiamentos para construção de moradias sob o regime de ajuda mútua entre os 
entes federativos. Tais programas tinham como alvo as populações de baixa renda e 
eram mantidos com recursos do Imposto Provisório sobre Movimentações Financeiras 
(IPMF), entretanto não obtiveram sucesso em decorrência da burocracia estatal, 
apesar de mantidas pelos governos predecessores e servirem de modelo para novos 
programas. (BEZERRA, 2018, p. 125). 
O Governo de Fernando Henrique Cardoso, que durou de 1994 a 2002, 
condenou a má utilização de programas alternativos e a centralização da gestão 
desses programas pela falta de controle social. Segundo Almeida (2010, p. 42-43), o 
modelo proposto pelo governo tinha quatro premissas básicas: 
 
- a focalização das políticas públicas voltadas para a área habitacional no 
atendimento das camadas populacionais de baixa renda; 
- a necessidade de descentralizar e aumentar o controle social sobre a gestão 
dos programas federais de habitação; 
- o reconhecimento, por parte do governo, de sua incapacidade de resolver 
sozinho o problema habitacional do país e da necessidade de tentar melhorar 
o funcionamento do mercado de moradias no Brasil; 
- o reconhecimento de que as políticas públicas não devem negligenciar a 
grande parcela da população de baixa renda do país que trabalha no setor 
informal da economia e/ou habita moradias informais. 
 
30 
 
Conforme Moreira e Leme (2011, p. 10-11), até 1988 houve uma ausência 
de um projeto habitacional bem definido, e com o Governo FHC foram introduzidos 
princípios de mercado na provisão da habitação. Foram grandes conquistas durante 
este governo a promulgação do Estatuto das Cidades e da Lei nº 10.188/01, que 
instituiu o Programa de Arrendamento Residencial (PAR). 
No Governo Lula, que durou de 2003 a 2010, foi criado o Plano Nacional 
de Habitação, que constituía o primeiro pacote de projetos públicos habitacionais 
desde a falência do BNH, e dentro deste plano foi criado o Sistema Nacional de 
Habitação, que estabeleceu o desenho institucional da política. (MOREIRA; LEME, 
2011, p. 19). 
Em 2009 foi criado o pacote de programas do Minha Casa Minha Vida 
(MCMV) positivados pela Lei de n. 11.977/09 e posteriormente alterado pelas Leis de 
n. 12.424/11 e 13.173/15. Já no Governo Dilma, que durou do ano de 2011 até o ano 
de 2016, deu continuidade à política de seu predecessor. 
O MCMV é um programa instituído em larga escala e foi utilizado com dois 
propósitos: o primeiro foi de suprir o grave déficit habitacional que o país ainda tinha, 
e o segundo foi como uma forma de encarar a Crise Internacional de 2008 por meio 
de incentivos e subsídios governamentais (MOREIRA; LEME, 2011). O programa 
funcionava de forma que incumbia à iniciativa privada prover a construção de 
moradias, e tinha como população alvo as famílias de baixa renda, que conseguia 
alcançar o sonho da casa própria mediante financiamentos através da CEF, com 
recursos do FGTS e subsídios do Governo Federal. (BEZERRA, 2018, p. 126). 
Por fim, no Governo Temer, que durou de 2016 a 2018, foi editada a Medida 
Provisória de n. 759/2016 que sancionou regras para a regularização fundiária e criou 
novos formas de aquisição de propriedade, além é claro do direito real objeto de 
estudo do presente trabalho, o direito real de laje. Referida MP foi convertida, após 
discussão no congresso, na Lei n. 13.465/17, que lapidou a norma jurídica inovada 
pelo Executivo Nacional. 
Depreende-se, assim, que o legislador, em especial nos últimos anos, tem 
empreendido esforços no sentido de concretizar e assegurar o direito à moradia, o 
qual foi elevado ao status de direito fundamental por meio da Emenda Constitucional 
nº 26/2000, que alterou o art. 6º da Constituição Federal: “Art. 6º São direitos sociais 
a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o transporte, o lazer, a 
31 
 
segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência 
aos desamparados, na forma desta Constituição.” (BRASIL, 1988) 
Segundo Mendes e Branco (p. 944), a relação entre os direitos social de 
moradia e o Estado Social de Direito é inegável e é um dos seus elementos essenciais 
para a consolidação de uma democracia social efetiva. 
Ainda cabe salientar que a Constituição Federal institui que compete a 
todos os entes federativos a promoção e desenvolvimento de programa de construção 
de moradias, determinando inclusive como obrigação o progresso de políticas 
públicas de melhoria das condições habitacionais e de saneamento básico, em 
consonância com o direito fundamental à moradia digna. (BRASIL, 1988). 
Importante elencar também que os direitos e garantias fundamentais em 
geral decorrem do princípio geral da dignidade da pessoa humana, o qual constitui 
entre outros dispositivos como fundamento da República Federativa do Brasil. 
(MEDEIROS; SILVA, 2018, p. 92). 
Segundo Medeiros e Silva (2018, p. 94), “o direito à moradia digna revela-
se como um direito fundamental compreendido como essencial e impositivo tanto 
internamente quanto externamente”. Ser tratado dignamente como ser humano 
significa a garantia de direitos como educação, saúde, lazer, entre outros, sendo 
inclusive necessário que a pessoa tenha sua propriedade resguardada e uma moradia 
digna de se viver. 
 
32 
 
3 A LAJE NO ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO 
 
Visto o contexto histórico do nascimento da laje e a sua importante 
contribuição para a concretização do direito constitucional à moradia para inúmeras 
famílias, em especial em áreas de grande concentração populacional, se dará início à 
análise do direito real de laje, incluído no rol dos direitos reais do Código Civil brasileiro 
pela Lei n. 13.465/17. Contudo, antes de adentrarmos no estudo do direito de laje 
propriamente dito, importante tecer algumas breves considerações sobre os direitos 
reais, como forma de melhor compreender e situar o objeto do presente trabalho. 
 
3.1 DOS DIREITOS REAIS 
 
3.1.1 Conceito 
 
O direito das coisas, disciplinado no Livro III da Parte Especial do Código 
Civil de 2002, é o complexo de normas que trata das relações jurídicas entre pessoas 
e coisas, e como coisas podemos entender como tudo aquilo que não é humano e é 
suscetível de apropriação por pessoas. (TARTUCE, 2018, p. 862). 
Nos dizeres de Gagliano e Pamplona Filho, “consiste no conjunto de 
princípios e normas que regem as relações jurídicas relativas às coisas, que são os 
bens passíveis de apropriação pelo homem, segundo uma finalidade social.” (2019, p. 
27). 
Alguns doutrinadores, a exemplo de Orlando Gomes, Cristiano Chaves de 
Farias, Nelson Rosenvald e Pablo Stolze Gagliano, defendem que o termo “direito das 
coisas” é arcaico, preferindo utilizar a denominação “direitos reais”. Neste sentido, 
Gagliano e Pamplona Filho (2017, p. 971) definem direitos reais como “[...] o direito 
que traduz o poder jurídico direto de uma pessoa sobre uma coisa, submetendo-a em 
todos (propriedade) ou em alguns de seus aspectos.”. 
Outrossim, os direitos reais são considerados pela doutrina como um 
conjunto de categorias jurídicas relacionadas à propriedade, sendo que os direitos 
reais formam o principal conteúdo do direito das coisas (TARTUCE, 2018, p. 862). 
Por fim, como forma de melhor compreender a definição de direitos reais, 
importante diferenciá-los dos direitos pessoais, iniciando pelo fato de que os primeiros 
têm como conteúdo as relações jurídicas à coisa em si, sendo erga omnes a eficácia 
33 
 
dos atos relacionados, enquantoque os segundos têm por conteúdo as relações 
jurídicas estabelecidas entre duas ou mais pessoas, sendo o efeito relacionado inter 
partes. Outra importante diferença refere-se ao princípio norteador: enquanto para os 
direitos reais o princípio norteador é o princípio da publicidade, para os direitos 
pessoais o princípio norteador é o princípio da autonomia privada. (TARTUCE, 2018, 
p. 869-871). 
De outro turno, conforme leciona Tartuce (2018, p. 871), cabe salientar 
também que os direitos reais têm rol taxativo, geram direito de sequela e têm caráter 
permanente, enquanto que os direitos pessoais têm rol exemplificativo, geram 
responsabilidade patrimonial e têm um suposto caráter temporário. 
 
3.1.2 Características 
 
Entre as principais características dos direitos reais podemos citar sua a 
oponibilidade erga omnes, vinculada ao princípio do absolutismo, que se relaciona 
com a eficácia, que têm a sua validade oposta contra todos os membros da 
coletividade, e não apenas contra aqueles que se encontram na relação jurídica. 
(TARTUCE, 2018, p. 869). 
De outro turno, é necessário arguir sobre a existência de um direito de 
sequela nas relações advindas dos direitos reais, ou seja, trata-se da perseguição que 
ocorre do direito real sobre a coisa; tal característica se relaciona tanto com o princípio 
do absolutismo, quanto com o princípio da aderência (FARIAS; ROSENVALD; 
NETTO, 2018, p. 1.351). 
O princípio da aderência ou da inerência, por sua vez, pode ser 
conceituado, segundo Farias, Rosenvald e Netto (2018, p. 1.351), como a aderência 
do direito real à coisa, podendo então ser perseguida. 
Existe também a previsão de um direito de preferência em favor do titular 
de um direito real, consistente no “[...] privilégio do titular do direito real em obter o 
pagamento de um débito com o valor do bem aplicado exclusivamente à sua 
satisfação.”. (FARIAS; ROSENVALD; NETTO, 2018, p. 1.351). 
Segundo Tartuce (2018, p. 864), outro ponto importante na temática dos 
direitos reais refere-se à regência pelo princípio da publicidade dos atos e que se dá 
pela entrega da coisa, ou tradição (no caso de bens móveis) e pelo registro (no caso 
de bens imóveis). 
34 
 
Merece destaque também a suposta obediência a um rol taxativo de 
institutos, previstos em lei, o que, conforme Tartuce (2018, p. 864), consagra o 
princípio da tipicidade dos direitos reais. Gagliano e Pamplona Filho (2019, p. 47), a 
seu turno, afirmam que a tipicidade corresponde à legalidade, ou seja, os direitos reais 
somente podem existir se decorrentes de previsão legal correspondente, sendo que a 
taxatividade seria no sentido de que o rol dos direitos reais não admite ampliação por 
vontade das partes. 
Existe também, em relação aos direitos reais, a característica de previsão 
da usucapião como um dos meios de sua aquisição (TARTUCE, 2018, p. 864), 
podendo então serem adquiridos por meio deste instituto quaisquer direitos reais, 
exceto os de natureza de garantia. 
Por fim, outras características apontadas por Tartuce (2018, p. 864) são a 
possibilidade de abandono dos direitos reais, de renúncia a tais direitos e a viabilidade 
de incorporação da coisa por meio da posse. 
 
3.1.3 Classificação dos direitos reais 
 
De acordo com o art. 1.225 do Código Civil de 2002, são direitos reais: a 
propriedade, a superfície, as servidões, o usufruto, o uso, a habitação, o direito do 
promitente comprador do imóvel, o penhor, a hipoteca, a anticrese, a concessão de 
uso especial para fins de moradia, a concessão de direito real de uso, e a laje. 
(BRASIL, 2002). 
Tais direitos reais são tradicionalmente classificados pela doutrina civilista 
em direitos reais sobre coisa própria e direitos reais sobre coisa alheia. 
O direito real sobre coisa própria, segundo Gomes (2012, p. 17), resume-
se à propriedade, sendo uma inovação da nova Constituição Federal, que evidenciou 
a fragmentação principal da disciplina de direitos reais, que seria a propriedade. 
A propriedade é o mais amplo dos direitos reais, o direito real na coisa 
própria por excelência, sendo o proprietário capaz de usar de sua propriedade como 
lhe for conveniente, gozar de todos os rendimentos do seu bem, reivindicar se 
injustamente deposto de sua posse e dispor se for do seu agrado. (TARTUCE, 2018, 
p. 910). 
Já o direito real sobre coisa alheia conceitua-se como domínio estático do 
titular sobre a coisa, a relação de subordinação do objeto ao senhorio, trata-se de um 
35 
 
exercício de direito real limitado, onde os titulares desses direitos têm a obrigação de 
coordenar a satisfação de seus interesses com a do proprietário que cedeu parcelas 
de seu domínio. (FARIAS; ROSENVALD; NETTO, 2018, p. 1.592). 
Dentro dessa classificação, ainda podemos dividir os direitos reais sobre 
coisa alheia em três categorias, sendo elas: 1) direitos reais de uso e fruição (que 
englobariam o usufruto, o uso, a habitação, a servidão, a superfície e as concessões 
de uso); 2) direito real de aquisição (que incluiria somente o direito do promitente 
comprador); e 3) direitos reais de garantia (que incluiriam a hipoteca, o penhor e a 
anticrese). 
Quanto à laje, existe discussão doutrinária acerca de sua natureza jurídica: 
se direito real na coisa própria ou se direito real na coisa alheia (na categoria direito 
de gozo e fruição) – sendo que, a depender do entendimento adotado, diferentes 
serão as consequências de ordem prática, como se verá adiante. 
 
3.2 DO DIREITO REAL DE LAJE 
 
3.2.1 Conceito e natureza jurídica 
 
Nascido da necessidade de regularização das moradias verticalizadas, 
muito comuns em regiões favelizadas no Brasil, o direito de laje foi inserido em nosso 
ordenamento jurídico para possibilitar moradia regular acessível a todos os brasileiros. 
Conforme Farias, El Debs e Dias (2019, p. 28-29), o direito real de laje pode 
ser definido como uma lâmina da propriedade originária, cedida de forma onerosa ou 
gratuita, podendo ser referente à superfície concretada superior ou inferior de uma 
construção já existente, por parte de seu proprietário, para que o novo titular do direito 
possa edificar construção de uma unidade autônoma da construção original. 
No mesmo entendimento, Loureiro (2018, p. 1.533) define o direito real de 
laje como: 
 
Nova modalidade de propriedade, na qual o titular adquirente (lajeário) torna-
se proprietário de unidade autônoma consistente de construção erigida ou a 
erigir sobre ou sob acessão alheia, sem implicar situação de condomínio 
tradicional ou edilício. Cuida-se de direito real sobre coisa própria, nova 
modalidade proprietária sobre ou sob construção com a forma de unidade 
autônoma, desligada da propriedade sobre o solo. Não se trata de 
condomínio tradicional (arts. 1.314 e seguintes do CC/02) nem de condomínio 
edilício (arts. 1.331 e seguintes do CC/02), muito menos de direito de 
superfície temporário (arts. 1.369 e seguintes do CC/02). 
36 
 
As nomenclaturas das figuras participantes na constituição da laje como 
direito autônomo seguem a lógica civilista, sendo aquele que cede a laje da 
construção-base para a edificação de unidade autônoma denominado proprietário da 
construção-base ou somente lajeado, e aquele que titulariza o direito de laje em seu 
nome chamado de lajeário. 
A inovação legislativa está em total consonância com o disposto na Lei 
Maior do Brasil, já que o constituinte originário decidiu impor aos entes federativos 
(União, Estados, Municípios e Distrito Federal), em seu art. 23, inciso IX, a 
competência de promover programas de construção de moradias e o desenvolvimento 
de políticas que promovam melhores condições habitacionais. (BRASIL, 1988). 
Segundo Medeiros e Silva (2018, p. 97), pode-se constatar inclusive que o 
direito à moradia digna, disposto no art. 6º da Constituição Federal, está relacionado 
aos direitos e garantias fundamentais, sendo uma das cláusulas pétreas firmadasna 
Constituição Federal brasileira, constituindo então fundamento basilar do estado 
democrático de direito brasileiro, não podendo ser alvo de alterações. 
Nesse liame, dispõem Mendes e Branco (2012, p. 191): 
 
argui-se que os direitos sociais não podem deixar de ser considerados 
cláusulas pétreas. No Título I da Constituição (Dos Princípios Fundamentais) 
fala-se na dignidade da pessoa humana como fundamento da República e 
essa dignidade deve ser compreendida no contexto também das outras 
normas do mesmo Título em que se fala no valor social do trabalho, em 
sociedade justa e solidária, em erradicação da pobreza e marginalização e 
em redução de desigualdades sociais. Tudo isso indica que os direitos 
fundamentais sociais participam da essência da concepção de Estado 
acolhida pela Lei Maior. Como as cláusulas pétreas servem para preservar 
os princípios fundamentais que animaram o trabalho do constituinte originário 
e como este, expressamente, em título específico da Constituição, declinou 
tais princípios fundamentais, situando os direitos sociais como centrais para 
a sua ideia de Estado democrático, os direitos sociais não podem deixar de 
ser considerados cláusulas pétreas. 
 
A natureza jurídica do direito real de laje dentro do sistema dos direitos 
reais é motivo de divergência na doutrina. No que se refere à natureza jurídica do 
direito real de laje, a discussão hoje existente é no seguinte sentido: trata-se de direito 
real na coisa própria ou de direito real na coisa alheia (direito de gozo e fruição)? 
Os que defendem que o direito real de laje se enquadra como direito real 
sobre coisa alheia o fazem com base nos seguintes argumentos: a laje tem um caráter 
de subordinação para com a construção-base, sendo então um direito real limitado; 
para haver a construção de uma nova laje sobre uma já existente, faz-se necessária 
37 
 
a permissão do proprietário da construção-base; existe a necessidade de averbação 
da laje na matrícula da construção-base. 
Inclusive sobre o enquadramento da laje no sistema jurídico, Mazzei (2009, 
p. 345) defendia que o direito de laje seria somente uma variação do direito real de 
superfície, e seguindo esta lógica deveria ser enquadrado na mesma categoria, ou 
seja, nos direitos reais sobre coisa alheia. 
Em continuidade, Gagliano e Pamplona Filho (2017, p. 1.075) entendem 
que: 
 
diferentemente de outros direitos reais na coisa alheia, o direito de laje tem, 
em seu conteúdo, um singular animus, equiparável ao de domínio, embora 
não se caracterize, pela sua estrutura peculiar, como direito real na coisa 
própria (propriedade), na medida em que, derivando de mera cessão de uso, 
gratuita ou onerosa, da superfície do imóvel que lhe é inferior, resulta na 
coexistência de unidades autônomas em uma mesma área. 
 
Em sentido oposto, os que entendem que o direito real de laje trata-se na 
verdade de um direito real sobre coisa própria afirmam que, por se tratar de um direito 
autônomo e perpétuo, sua natureza jurídica não poderia ser diferente; além dessas 
características, destacam-se o fato da necessidade de abertura de matrícula para a 
laje e de seu usuário deter todos os quatro poderes que um proprietário teria, ou seja 
os direitos de gozar, reivindicar, usar e dispor. 
Ao defender este ponto de vista Farias, El Debs e Dias (2019, p. 65) 
entendem que não é necessariamente em decorrência da abertura da matrícula que 
o direito real de laje se enquadraria nesta categoria, mas sendo este a sua 
consequência: 
 
Secundos, não se pode negar que o reconhecimento ao titular da laje 
(lajeário) de poderes inerentes às titularidades próprias recomenda o seu 
afastamento dos direitos reais sobre coisa alheia. Usar, fluir, dispor livremente 
e reivindicar são poderes conferidos a quem exerce direito próprios e não a 
quem está em perspectiva de subordinação para com outrem. 
Até mesmo porque, enquanto direito real sobre a coisa alheia, o titular da laje 
dependeria da aquiescência expressa do proprietário para conferir a 
funcionalidade desejada à coisa – o que se mostra incompatível com a 
estrutura conferida pela normatividade legal. 
 
Por fim, lecionam Kümpel e Borgarelli (2017) que o direito real sobre coisa 
própria é aquele em que há uma unidade de poder, não havendo divisão do poder 
como ocorre sobre os direitos reais sobre coisa alheia, e é exatamente o caso da laje, 
onde não há dois titulares, pois o titular do imóvel-base não guarda vínculo jurídico 
38 
 
real com o titular da laje superior ou inferior, havendo entre eles direitos e deveres, na 
medida em que existem áreas comuns, tal qual ocorre nos direitos de vizinhança. 
Segundo Farias, El Debs e Dias (2019, p. 56), a relevância do debate 
acerca da natureza jurídica residiria, a título de exemplo, na questão relativa ao 
ajuizamento de ações: considerando-se como um direito real sobre coisa alheia, o 
lajeário ficaria impossibilitado de ajuizar ações petitórias para proteger o domínio da 
sua laje, enquanto que se considerado como direito real sobre coisa própria, o lajeário 
poderia ajuizar a ação reivindicatória. 
De acordo com o art. 1.510-A, § 3º, do Código Civil Brasileiro, o titular da 
laje pode dela usar como lhe aprouver, gozar da forma que lhe for conveniente e dispor 
deste direito se for do seu interesse, sendo a sua instituição no Ofício de Registro de 
Imóveis feita em matrícula própria. (BRASIL, 2015). 
Embora não esteja implícito na norma legal em questão, Loureiro (2018, p. 
1.536) defende que o direito de reivindicar a coisa de quem injustamente a detenha 
também integra o conjunto de direitos do lajeário. No mesmo entendimento, seguem 
Farias, El Debs e Dias (2019, p. 91), que afirmam: 
 
o art. 1.510-A, § 3º, da Lei Civil não menciona o direito de reivindicar, mas 
trata-se de uma clara situação em que a letra da lei traz mais do que olhos 
podem ver. Seguindo-se o posicionamento [...] de que o direito de laje 
pertence à classe dos direitos reais sobre coisa própria não há outra 
conclusão plausível do que legar ao lajeário o direito de se valer da tutela 
petitória. 
 
O direito de reivindicar o bem está entrelaçado com a característica de 
sequela dos direitos reais, cujo exercício é garantido pela ação reivindicatória, medida 
judicial de natureza real e que pode ser usada pelo lajeário para reaver a coisa de 
quem injustamente a possua ou a detenha. A ação reivindicatória não afasta outras 
medidas, podendo o lajeário utilizar de qualquer umas das três modalidades de ações 
possessórias, quais sejam, ação de manutenção de posse em caso de turbação, ação 
de reintegração de posse se houver esbulho possessório e, no caso de ameaça, o 
interdito proibitório. (FARIAS; EL DEBS; DIAS, 2019, p. 91). 
Em sentido oposto, conforme destaca Tartuce (2017, p. 1.088), aqueles 
que defendem que o direito de laje trata-se de um direito real sobre coisa alheia 
entendem que a omissão quanto ao direito de reivindicação foi proposital, já que este 
39 
 
direito em tese permaneceria com o lajeado, sendo então direito deste ajuizar ações 
reivindicatórias para reaver o bem imóvel de quem injustamente o detém. 
 
3.2.2 Distinção entre direito real de laje, direito de superfície e condomínio 
 
O direito de laje guarda muitas semelhanças com outros direitos reais 
identificados no Código Civil brasileiro, em especial com o direito real de propriedade 
e com o direito real de superfície. 
Em relação à superfície, por muito tempo os doutrinadores consideraram a 
laje como uma subespécie deste direito real. Mazzei (2007, p. 351) defendia que, por 
conta do silêncio legislador, seria possível utilizar, em razão dos princípios da 
operabilidade e sociabilidade, o mecanismo do legal da superfície para aplicação das 
cessões de sobrelevação. Esse mesmo autor (2007, p. 346) defende que o art. 21, § 
1º, do Estatuto da Cidade, autorizava a aplicação da sobrelevação: 
 
Art. 21. O proprietáriourbano poderá conceder a outrem o direito de superfície 
do seu terreno, por tempo determinado ou indeterminado, mediante escritura 
pública registrada no cartório de registro de imóveis. 
§ 1º O direito de superfície abrange o direito de utilizar o solo, o subsolo ou o 
espaço aéreo relativo ao terreno, na forma estabelecida no contrato 
respectivo, atendida a legislação urbanística. (BRASIL, 2001). 
 
Ao indicar a utilização do espaço aéreo, entendiam alguns doutrinadores 
que o legislador havia formalizado a sobrelevação no direito brasileiro, entendimento 
que não prosperou. 
Atualmente, o direito de laje se difere do direito de superfície por conta da 
sua independência da construção-base e da sua perpetuação, ou seja, não tem prazo 
para sua extinção, valendo por tempo indeterminado. 
 
 Tabela 1 – Principais diferenças entre os direitos reais de laje e superfície 
Laje Superfície 
Arts. 1.510-A e seguintes do CC/02 Arts. 1.369 e seguintes do CC/02 
Matrícula própria Matrícula alheia 
Caráter perpétuo Caráter temporário 
Construção vertical Indiferente 
Gozar, usar, dispor e talvez reivindicar Gozar e usar 
Fonte: O autor (2019). 
40 
 
No que tange ao direito de propriedade, o instituto da laje muito se 
assemelha com os condomínios, principalmente com a modalidade do condomínio 
edilício e do condomínio urbano simples, este sendo uma inovação trazida ao 
ordenamento jurídico junto com o objeto de estudo deste trabalho. 
 Entretanto, apesar de em um primeiro momento os institutos parecerem 
semelhantes, ao analisar o texto legal percebe-se que existem algumas diferenças 
que merecem destaque, a começar pelo fato de que no direito real de laje não há 
atribuição de fração ideal do terreno para o lajeário conforme art. 1.510-A, § 4 º, do 
Código Civil: 
 
Art. 1.510-A. O proprietário de uma construção-base poderá ceder a 
superfície superior ou inferior de sua construção a fim de que o titular da laje 
mantenha unidade distinta daquela originalmente construída sobre o solo. [...] 
§ 4º A instituição do direito real de laje não implica a atribuição de fração ideal 
de terreno ao titular da laje ou a participação proporcional em áreas já 
edificadas. (BRASIL, 2002). 
 
A divisão comum que existe em condomínios edilícios entre propriedade 
comum e propriedade privativa é muito mais simplificada. Sobre o tema advertem 
Farias, El Debs e Dias (2019, p. 40): 
 
Repise-se, a laje não se estabelece sobre um mix de propriedade comum e 
propriedade autônoma ou individual. Há uma propriedade individual com 
reflexos específicos sobre certas áreas, que servem a todo o conjunto, que 
terão manutenção custeada por todos os envolvidos [...]. Tais áreas, [...] 
servem a toda edificação [...], devendo ser mantidas por todos. 
 
Cabe ressaltar também que, a princípio, o instituto do direito real de laje foi 
criado com o objetivo de facilitar a regularização de imóveis, portanto a sua utilização 
não está ligada a aferição de lucro por construtoras, como ocorre com os condomínios 
edilícios. 
Acerca do tema, o Código de Normas e Serviços Extrajudiciais do Estado 
de São Paulo inovou ao dispor sobre essa característica intrínseca à intenção do 
legislador ao normatizar o direito real de laje: 
 
446. É vedada a abertura de matrícula correspondente a direito de laje para 
fins de implantação de empreendimentos imobiliários ou edificações de um 
ou mais pavimentos, em que haja divisão do terreno da construção-base, ou 
de partes comuns, em frações ideais, hipótese em que será aplicada a 
legislação específica de incorporações imobiliárias e de condomínios 
edilícios. (CGJ/SP, 1989). 
41 
 
De outro ângulo, também difere do condomínio urbano simples pelo fato 
deste ser caracterizado pela construção no plano horizontal, enquanto aquele só se 
caracterizará em construções verticais. Sobre a questão apresentada assevera 
Loureiro (2018, p. 1.534): 
 
não se admite a utilização do instituto para situações conhecidas como 
"condomínios deitados", consistentes de conjuntos de casas sem 
sobreposição de umas sobre as outras (art. 8° da Lei n. 4.591/64). De igual 
modo, casas de fundos e de frente em um mesmo terreno podem gerar 
condomínio urbano (arts. 61 e 62 da Lei n. 13.465/2017), mas não direito de 
laje. 
 
Com isso, depreende-se que o legislador, ao normatizar o direito real de 
laje, entendeu que, por conta de todas essas peculiaridades explanadas, havia a 
necessidade de criar um novo instituto diferente dos já existentes. 
O direito real de laje abrange o espaço aéreo e o subsolo, sendo o seu 
objeto terreno público ou privado edificado de forma vertical, como disposto no art. 
1.510-A do Código Civil do Brasil. 
Por conta do objeto do direito de laje ser imóvel público ou particular, 
Loureiro (2018, p. 1.534) faz uma crítica ao instituto, afirmando que, por tratar de 
direito real de imóvel público, deveria permanecer restrito à legislação especial. 
Inclusive, sobre a possibilidade de utilização de imóveis públicos, esta pode ocorrer 
mediante instrumento de regularização fundiária urbana (Reurb), tanto na sua 
modalidade de interesse social, ou seja, para munícipes de baixa renda (Reurb-S), 
quanto na modalidade de interesse específico (Reurb-E), conforme art. 13, incisos I e 
II da Lei de Regularização Fundiária Rural e Urbana. (BRASIL, 2017). 
 
3.2.3 Classificação 
 
Com a normatização do direito e com a possibilidade de constituição de 
modalidades diferentes de lajes, Farias, El Debs e Dias (2019, p. 30) classificam as 
diversas lajes da seguinte forma: a cessão da superfície lajeada superior, inovaram 
ao denominar como laje em sobrelevação; já em relação a constituição de laje a partir 
da superfície lajeada inferior, quando ocorre a cessão de porões e garagens para a 
constituição de unidade autônoma, denominaram como laje em infrapartição; e por 
fim, denominaram sobrelaje aquela que é constituída sobre outra laje. 
42 
 
 Figura 3 - Classificação das Lajes 
 
Fonte: o autor (2019). 
 
Sobre a constituição de sobrelajes (ou lajes sucessivas), assim disciplina o 
Código Civil: 
 
Art. 1.510-A. O proprietário de uma construção-base poderá ceder a 
superfície superior ou inferior de sua construção a fim de que o titular da laje 
mantenha unidade distinta daquela originalmente construída sobre o solo. 
[...] 
§ 6º O titular da laje poderá ceder a superfície de sua construção para a 
instituição de um sucessivo direito real de laje, desde que haja autorização 
expressa dos titulares da construção-base e das demais lajes, respeitadas as 
posturas edilícias e urbanísticas vigentes. 
 
Apesar de permitido, o legislador criou uma ressalva ao lajeado e aos 
demais lajeários, necessitando então o lajeário que quer ceder a sua superfície 
concretada a autorização dos demais proprietários. Salientam Farias, El Debs e Dias 
(2019, p. 155) que apesar da autonomia do lajeário no que tange a sua laje, deve o 
direito defender também os demais titulares. Assim, tem-se uma limitação da 
autonomia lajeária em prol da defesa dos interesses particulares dos demais 
moradores do prédio. 
Farias, El Debs e Dias (2019, p. 155) reforçam ainda: 
 
na hipótese vertente, não se pode perder do raio de visão o fato de que a 
constituição de uma sobrelaje pode, sim, despertar interesses legítimos do 
proprietário e de outros eventuais lajeários, relativamente, por exemplo a 
segurança da construção, os impactos urbanísticos, estéticos ou 
arquitetônicos e à valorização econômica do imóvel. Exatamente por isso, é 
43 
 
de se lhes facultar conceder anuência para que os novos titulares sejam 
agregados à construção-base. 
 
Para encerrar a discussão acerca da sobrelaje, observa-se que a 
autorização deve ser expressa e a sua rejeição justificada, já que no caso da rejeição 
da sobrelaje ser realizada com o objetivo de somente desagradar o outro, fica 
caracterizado um abuso de direito. 
Assim dispõe, inclusive,

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