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Raphaela Carvalho - 2024.2 HISTAMINA E ANTI-HISTAMÍNICOS 08/05/2020 - MARTA Fisiologicamente a histamina exerce papéis não só nos processos alérgicos como também na produção de secreção gástrica e na neurotransmissão/modulação. Os antagonistas competitivos dos receptores H1 têm diversas ações e são utilizados terapeuticamente para tratar alergias, urticária, reações anafiláticas, náuseas, cinetose, insônia e alguns sintomas de asma. Os antagonistas do receptor H2 são eficazes para reduzir a secreção ácida do estômago. As concentrações de histamina no plasma e nos outros líquidos corporais são geralmente muito baixas, mas o líquido cerebrospinal (LCS) humano contém quantidades significativas. O mastócito é o principal local de armazenamento da histamina na maior parte dos tecidos. A concentração de histamina é particularmente alta nos tecidos que contêm grandes quantidades de mastócitos, como a pele, a mucosa brônquica e a mucosa intestinal. Síntese e metabolismo Para que haja a síntese da histamina é necessário que haja uma conversão de histidina (aas) a histamina, através de uma descarboxilação, pela enzima L-histidina descarboxilase, presente não só nos mastócitos e basófilos - que não só sintetizam como também armazenam essa histamina dentro de grânulos, porém em locais diferentes: os mastócitos armazenam histamina nos tecidos e os basófilos no sangue -, como também nas células de tecidos como epiderme, da mucosa gástrica, dos neurônios e tecidos em que há um rápido crescimento/regeneração. A principal diferença entre os mastócitos e basófilos das outras células produtoras de histamina é a capacidade de armazenamento. Quando liberada a histamina rapidamente é metabolizada para ser eliminada, principalmente via urina. São duas vias de metabolização: 1. Via N-metiltransferase que converte histamina em N-metil-histamina, que é novamente convertida em ácido acético N-metilimidazol pela enzima MAO-B. (essa última reação pode ser bloqueada pelos inibidores da MAO). 2. Via diaminoxidase que converte histamina em ácido imidazolacético que é convertido em ribosídeo do ácido imidazolacético via fosforribosil-transferase. 1 Importante: ● A L-histidina-descarboxilase é uma enzima induzível, ou seja, sua expressão varia de acordo com as demandas de histamina pelo organismo. ● A histamina ingerida ou sintetizada pelas bactérias do trato GI não contribui para as reservas corporais; pelo contrário, ela é rapidamente metabolizada e seus metabólitos são eliminados na urina. ● A determinação do nível de N-metil-histamina na urina é um índice mais confiável da produção de histamina que a dosagem da própria histamina. Níveis artificialmente elevados de histamina na urina podem resultar da ação das bactérias do trato urinário, que podem descarboxilar a histidina. Liberação Depois da sua liberação dos grânulos de armazenamento, em consequência da interação do antígeno com anticorpos IgE presentes na superfície do mastócito, a histamina desempenha função primordial na hipersensibilidade imediata e nas respostas alérgicas. Hipersensibilidade do tipo I (alergia): pode ser gerada por diferentes patógenos potencialmente danosos que ativam mastócitos, como poeira, fumaça, vírus, etc. Mecanismo fisiopatológico (reação de degranulação): a partir do momento que IgE se liga à membrana do mastócito/basófilo ele é sensibilizado e ele consegue responder ao alérgeno liberando grânulos de histamina. A asma é um exemplo de hiper reatividade brônquica (aumento da broncoconstrição e da produção de muco) mediada pela histamina. - Os indivíduos atópicos são indivíduos que desenvolvem anticorpos IgE contra antígenos “comuns”. Esse traço é hereditário e é responsável pela predisposição à rinite, a asma e à dermatite atópica 2 A estimulação de receptores de IgE também ativa a fosfolipase A2, levando à produção de inúmeros mediadores, como o fator de ativação das plaquetas (PAF) e metabólitos do ácido araquidônico, como os leucotrienos C4 e D4, que causam contração dos músculos lisos da árvore brônquica. Assim, o mastócito secreta uma variedade de mediadores inflamatórios além da histamina, contribuindo cada um deles para os principais sintomas da resposta alérgica. Existem alguns medicamentos que liberam histamina/outros mediadores por meio da sensibilização direta do mastócito, geralmente são feitos via IV sendo eles as bases orgânicas, como amidas, amina, compostos de amônio quaternário, compostos de piridina, piperidinas e alcalóides. Mecanismo de ação Depois de liberada, a histamina vai atuar em diferentes órgãos e sistemas promovendo ações como regulação da secreção gástrica, vasodilatação, broncoconstrição e prurido. As substâncias que promovem a liberação de histamina ativam as respostas secretórias dos mastócitos e basófilos por meio do aumento do Ca2+ intracelular. Todos são acoplados à proteína G, não necessariamente o mesmo tipo de proteína G. A ação da histamina varia em cada local de acordo com o receptor histaminérgico presente, que pode ser de 4 tipos: H1, H2, H3 e H4. Tanto H1 quanto H2 visam a ativação das suas células. Já H3 e H4 estão acoplados à proteína Gi (inibitória). O H3 funciona como autor receptor, ou seja, possui um mecanismo de feedback negativo: quanto mais moléculas de histamina se ligarem a ele, significa que precisa haver um bloqueio da liberação de histamina pois entende-se que já tem muito. Quando não há interação com ele ou quando há um bloqueio do autorreceptor, a célula entende que tem pouca histamina no meio e precisa ser 3 liberada mais. Ainda, ele funciona como heteroreceptor, ou seja, regula a liberação de substâncias que não são a histamina. Atividade constitutiva do receptor: em repouso possui alguma atividade constitutiva (não fica totalmente inativo) e fica oscilando entre ativado e inativado. Se chega um agonista ele promove uma estabilização na forma ativa pelo aumento do influxo de íons. Agora se o receptor é travado no estado inativo, a droga representa um agonista inverso, no final tem mesmo efeito que o antagonista. É chamado de agonista inverso apenas por atuar em receptores com atividade constitutiva ➔ Secreção gástrica: a secreção de HCl pelas células parietais também é causada pela estimulação do nervo vago e pelo hormônio entérico conhecido como gastrina. Mas, a histamina é o mediador fisiológico mais importante na secreção ácida. O bloqueio dos receptores H2 não apenas antagoniza a secreção ácida em resposta à histamina, como também inibe as respostas à gastrina e à estimulação vagal. ➔ No SNC: como neurotransmissor, a histamina controla funções homeostáticas e cerebrais superiores, inclusive regulação do ciclo de sono-vigília, ritmos circadiano e alimentar, imunidade, aprendizagem, memória, ingestão de líquidos e temperatura corporal. A histamina, a histidina-descarboxilase e as enzimas que metabolizam a histamina e os receptores H1, H2 e H3 estão amplamente distribuídos no SNC. A histamina inibe o apetite e estimula a atenção por meio dos receptores H1 e isto explica a sedação causada pelos anti-histamínicos clássicos. Receptores e seus efeitos Os receptores H1 e H2 estão amplamente distribuídos nos tecidos periféricos e no SNC. A histamina pode produzir efeitos locais ou sistêmicos nos músculos lisos e nas glândulas e causa prurido, estimulando a secreção na mucosa nasal. Além disso, a histamina contrai alguns músculos lisos (p. ex., dos brônquios e do intestino) enquanto relaxa acentuadamente outros (p. ex., vasos sanguíneos). A broncoconstrição e a contração do intestino são mediadas pelos receptores H1. A secreção gástrica resulta da ativação dos receptores H2 e, consequentemente, pode ser inibida pelos antagonistas destes receptores. 4 H1 (Gq) ➔ Endotélio: vasodilatação (pela produção de NO através da NOs) e aumento da permeabilidade vascular -> edema. Essa vasodilatação via H1 é rápida e de curta duração. ➔ SNC: regulação do controle de fome e saciedade, padrõesde ventilação, percepção de dor e prurido, etc. ➔ Musculatura lisa: broncoconstrição e contração uterina e intestinal. A contração é causada pela ativação desses receptores do músculo liso, que aumenta o Ca2+ intracelular. ➔ Resposta tríplice de lewis (histamina injetada por via intradérmica): 1- vasodilatação (eritema local); 2- reflexo axônico (eritema periférico) devido à percepção de neurônios próximos que a área está vaso dilatada, então através da fibra C aumentam a liberação de histamina para esse local (transporte retrógrado) e é esse aumento que leva ao alargamento do eritema; 3- formação de pápula devido ao aumento da permeabilidade vascular que tem como resultado o edema (interrupção do equilíbrio coloidosmótico). O receptor H2 também pode participar nesse processo!!! ➔ Sistema cardiovascular: a ação vasodilatadora pode influenciar na PA - o aumento da vasodilatação -> diminuição da RVP -> diminuição da PA -> aumento de FC (reflexo barorreceptor tentando compensar a diminuição da pressão com taquicardia reflexa ou estimulação direta da histamina sobre o coração). A atuação da histamina no relaxamento dos esfíncteres pré capilares também é importante nesse mecanismo de redução de PA. H2 (Gs) ➔ A ação mais relevante do receptor H2 é sobre a secreção gástrica!!! Fisiologia: em uma célula parietal está presente a bomba de prótons que faz contra-transporte de H+ (efluxo) e K+ (influxo). Nas células enterocromafins ocorre a produção de histamina que vai se ligar ao H2 na célula parietal e com essa ligação ocorre uma potencialização da bomba, ou seja, mais H+ vai ser jogado para fora da célula parietal, vai se ligar ao Cl- e formar o ácido clorídrico. ➔ No endotélio também causa vasodilatação que diferentemente da vasodilatação via H1 é mais lenta e mais persistente. 5 ➔ SCV: aumenta a força contrátil dos músculos atrial e ventricular, porque facilita a entrada de Ca2+, e acelera a frequência cardíaca, porque abrevia a despolarização diastólica no nódulo sinoatrial (SA). ➔ Relaxamento da musculatura lisa sem ser do endotélio (extravascular). Os receptores H3 são expressos principalmente no SNC, em especial nos gânglios da base, no hipocampo e no córtex, funcionam como auto receptores nos neurônios histaminérgicos, de forma muito semelhante aos receptores α2 pré-sinápticos, inibindo a liberação de histamina e modulando a liberação de outros neurotransmissores. Os agonistas H3 estimulam o sono. Por esta razão, os antagonistas H3 facilitam a manutenção da vigília. Os receptores H4 são encontrados principalmente nas células de origem hematopoiéticas (eosinófilos, células dendríticas, mastócitos, monócitos, basófilos e linfócitos T), mas também são detectados no trato GI, nos fibroblastos da derme, no SNC e nos neurônios aferentes sensoriais primários. Anti-histamínicos Anti-H1 Todos os antagonistas do receptor H1 são agonistas inversos, que reduzem a atividade constitutiva do receptor e competem com a histamina. Embora a ligação da histamina ao receptor induza a conformação plenamente ativa, a ligação do anti-histamínico provoca uma conformação inativa ➔ Efeitos ● Broncodilatação leve; ● Bloqueiam fortemente o aumento da permeabilidade capilar e a formação de edema e das lesões urticadas produzidos pela histamina; ● Inibem as secreções salivares, lacrimais e outras secreções exógenas estimuladas pela histamina; ● Pode tanto excitar quanto deprimir o SNC: a estimulação ocorre nos pacientes tratados com doses convencionais e evidencia-se por inquietude, nervosismo e insônia; com relação a depressão central são observados efeitos como depressão da atenção, tempos de reação mais lentos e sonolência são manifestações comuns 6 ● Os de 2ª geração tem um efeito anti-inflamatório adicional (diminuição de citocinas inflamatórias, estabilização de mastócitos e basófilos, etc), que não é observado nos de 1ª geração. O polaramine é um fármaco de primeira geração. Em pH fisiológico ele apresenta grande lipossolubilidade, o que faz com que ele consiga atravessar a BHE e atue em receptores H1 e receptores que regulam o estado de alerta -> são os que causam sono!!! A loratadina é um fármaco de segunda geração. A diferença é que em pH fisiológico ela não ultrapassa a BHE, restringindo seus efeitos a nível periférico. Fármacos como a loratadina são substratos da glicoproteína P: transportador de efluxo presente na BHE com a função de proteger o encéfalo de possíveis invasores. A loratadina é metabolizada no fígado a um metabólito ativo pelas CYPs. Por essa razão, o seu metabolismo pode ser afetado por outros fármacos que competem pelas enzimas P450. Para crianças é mais recomendado os de 2ª geração porque seus efeitos sedativos podem dificultar a aprendizagem e comprometer o desempenho escolar. 1. Doxepina: pode causar sonolência e está associada aos efeitos anticolinérgicos. Esse fármaco é mais bem tolerado pelos pacientes com depressão que pelos indivíduos que não estão deprimidos, nos quais mesmo as doses pequenas podem causar desorientação e confusão mental. É comercializada como antidepressivo tricíclico. 2. Etanolaminas (difenidramina): exercem atividade antimuscarínica signifi cativa e mostram tendência marcante de causar sedação. 3. Etilenodiaminas (pirilamina): seus efeitos centrais são relativamente fracos, ocorre sonolência em uma porcentagem significativa dos pacientes. Os efeitos adversos GI são muito comuns. 7 4. Alquilaminas (clorfeniramina): esses fármacos estão entre os mais potentes antagonistas H1, têm menos tendência de causar sonolência e são mais apropriados para uso diurno. Os efeitos adversos de estimulação do SNC são mais comuns que com os outros grupos. Farmacocinética: boa absorção oral, concentrações máximas são atingidas dentro de 1 a 3h, a distribuição é ampla (serão encontrados em diferentes tecidos), metabolização hepática (produzem muitos metabólitos ativos que prolongam sua ação). os antagonistas H1 são eliminados mais rapidamente pelas crianças que pelos adultos e mais lentamente pelos pacientes com doença hepática grave. Os antagonistas dos receptores H1 também induzem as CYPs hepáticas o que acaba por facilitar seu próprio metabolismo. Farmacodinâmica: são antagonistas/agonistas inversos, ligação competitiva reversível (anti-histamínico e histamina competindo pelo mesmo sítio, porém se houver um aumento na concentração de qualquer um dos dois, o outro se desloca), baixa atuação nos demais receptores de histamina. Usos clínicos: rinite alérgica, conjuntivite alérgica, urticária, cinetose (apenas profilaxia), êmese gravídica. Efeitos adversos: os mais frequentes são a sedação, perda do apetite, náuseas, vômitos, desconforto epigástrico e constipação ou diarreia, mas também pode ocorrer tonturas, tinido, lassidão, perda da coordenação motora, fadiga, borramento visual, diplopia, euforia, nervosismo, insônia e tremores. Como os anti-histamínicos atravessam a placenta, deve-se ter cautela quando eles são administrados às gestantes ou a mulheres que pretendem engravidar. Anti-histamínicos como azelastina, hidroxizina e fexofenadina produziram efeitos teratogênicos em estudos em animais, enquanto outros como clorfeniramina, difenidramina, cetirizina e loratadina não demonstraram esses mesmos efeitos. Ainda, eles podem ser excretados no leite materno em pequenas quantidades. Intoxicação: os sintomas de intoxicação constituem alucinações, excitação, ataxia, perda da coordenação motora, atetose e convulsões. Pupilas fixas e dilatadas com face ruborizada, taquicardia sinusal, retenção urinária, boca seca e febre conferem à síndrome uma notável semelhança com a intoxicação por atropina. Na fase terminal, há aprofundamento do coma com colapso cardiorrespiratório e morte, em geral em 2-18 h. O tratamento consiste em medidas sintomáticas gerais e de suporte. 8 Interações medicamentosas: com álcool (potencialização da depressão do SNC); benzodiazepínicos (além de contribuircom a depressão do SNC, também são indutores das CYPs hepáticas que metabolizam o anti-H1 -> redução do efeito do anti-histamínico); eritromicina, cetoconazol e antidepressivos (inibem as CYPs -> potencialização dos efeitos). Anti-H2 Também são antagonistas competitivos reversíveis. Os mais usados são: cimetidina, ranitidina, famotidina e nizatidina. Ainda que sejam menos potentes no antagonismo de inibição da secreção gástrica do que os inibidores da bomba de prótons, eles possuem uma ação prolongada, o que faz com que em 24h cerca de 70% da secreção gástrica seja suprimida. Farmacocinética: são bem absorvidos via oral (podem ser utilizados por injeções IV que alcançam o nível terapêutico rapidamente e se sustentam por até 12h, como no caso da famotidina). Reações adversas (baixa incidência): com relação a efeitos menos específicos pode ocorrer diarréia, cefaléia, sonolência, fadiga, dor muscular, constipação, confusão, delírio, alucinações e fala arrastada; os efeitos específicos constituem galactorreia (lactação em homens ou em mulheres que não estão grávidas), ginecomastia, redução da contagem de sptz, impotência e trombocitopenia. Tolerância e resistência: pode ocorrer redução do efeito terapêutico caso haja uma administração contínua, aumento da resistência a doses maiores, pode gerar aumentos de rebote na acidez gástrica. As formas de resolver esses problemas são redução gradual do fármaco ou substituição por agentes alternativos (como antiácidos). Usos clínicos: cicatrização de úlceras gástricas e duodenais, tratamento de doença do refluxo gastroesofágico (DRGE) não complicada e para evitar a ocorrência de úlceras de estresse. Interações medicamentosas: a cimetidina inibe o metabolismo de outros medicamentos como benzodiazepínicos (aumento do efeito sedativo); anti hipertensivos como propranolol (hipotensão e bradicardia); lidocaína, quinidina, procainamida e antagonistas do cálcio (nistagmo, sedação e letargia, bradicardia, hipotensão e arritmias). Ela também pode potencializar os efeitos da varfarina, causando sangramentos indesejados. 9 anti-H3 Estão em estudos para tratamento de distúrbios do sono, TDAH, epilepsia, disfunção cognitiva, esquizofrenia, obesidade, dor neuropática e doença de Alzheimer. anti-H4 Estão sendo estudados para o tratamento de distúrbios inflamatórios, prurido, dor neuropática, asma persistente, dermatite e artrite reumatóide. 10
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