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- -1 PROCESSOS BIOLÓGICOS BÁSICOS UNIDADE 3 - DE ONDE VEM A ENERGIA PARA AS CÉLULAS FUNCIONAREM? Nicolas Murcial/ Vinícius Canato Santana - -2 Introdução Você já parou para pensar de onde vem a energia que as células utilizam para sobreviver? De onde vem a energia que nosso organismo necessita para realizar atividades diárias como caminhar, escovar os dentes e ir ao trabalho? A resposta para essas questões é simples: nossa energia vem da quebra dessas macromoléculas e sua degradação completa, até a formação de CO (gás carbônico) e (H O) água. 2 2 Para entendermos de forma mais simples, os aminoácidos, monossacarídeos e lipídios que ingerimos ao nos alimentarmos são macromoléculas complexas, compostas por muitos átomos de carbono, oxigênio, hidrogênio, nitrogênio etc. Esses átomos são unidos por ligações químicas e, durante a quebra dessas macromoléculas, parte da energia armazenada na forma dessas ligações químicas é liberada ou transferida para outras moléculas. Nesse processo, é possível formar outras moléculas, que carregam parte dessa energia e podem transferi-la para processos celulares que necessitem dela. Em termos gerais, dizemos que as macromoléculas advindas da nossa alimentação são oxidadas. Reações REDOX: a oxidação e a redução são fenômenos que ocorrem simultaneamente em reações em que há transferência de elétrons entre os átomos. Oxidação: a oxidação ocorre quando o elemento perde elétrons. Redução: a oxidação ocorre quando o elemento ganha elétrons. Tenha em mente que o ATP (adenosina trifosfato) é uma dessas moléculas que podemos formar. O ATP possui ligações que, quando hidrolisadas (quebradas), têm a capacidade de transferir grande quantidade de energia livre, funcionando como uma “moeda energética” da célula (RODWELL, 2017). Nosso organismo é capaz de utilizar a energia armazenada em ligações do ATP para realizar diversos processos celulares e reações químicas. Na verdade, há uma rede bastante complexa que descreve o conjunto de reações químicas que ocorrem em nossas células. O conjunto dessas reações químicas é conhecido como “metabolismo”. Nosso metabolismo funciona como um sistema que engloba dois processos distintos: o catabolismo e o anabolismo. Marzzoco (2015) desenvolve alguns conceitos sobre o tema. Metabolismo: pode ser definido como o conjunto de transformações que as substâncias químicas sofrem no interior dos organismos vivos, ou seja, todos os processos de síntese e degradação dos nutrientes na célula. Catabolismo: geralmente, pode ser definido como a quebra de macromoléculas em compostos menores, com liberação de energia. Anabolismo: ocorre síntese de compostos mais complexos, a partir de moléculas mais simples, geralmente envolvendo o consumo de energia. Nesta unidade, estudaremos as principais reações, ou conjunto de reações, chamadas de ,vias metabólicas envolvidas com produção de energia, degradação e síntese de macromoléculas no organismo humano. Aprender sobre essas reações irá ajudá-lo a entender melhor como nosso corpo se comporta no estado de jejum e no estado alimentado. Esperamos que você leia com atenção e aproveite bem o conteúdo. Bons estudos! 3.1 Glicólise e gliconeogênese Como você viu, nossas células produzem ATP a partir da energia liberada pela quebra de ligações químicas de macromoléculas. Em linhas gerais, as macromoléculas (monossacarídeos, ácidos graxos e aminoácidos), que possuem muitos átomos de carbono podem ser quebradas em compostos mais simples. Esses compostos mais simples vão sendo oxidados em diversas reações que ocorrem em sequências, chamadas de .vias metabólicas Como exemplo, podemos citar a glicose, o principal monossacarídeo presente em nossa dieta. Nossas células iniciam a quebra da glicose por meio da e, posteriormente, finalizam sua oxidação no ciclo do ácidoglicólise cítrico, ou . Essa oxidação completa dá origem ao CO , que será eliminado em nossa respiração,Ciclo de Krebs 2 - -3 cítrico, ou . Essa oxidação completa dá origem ao CO , que será eliminado em nossa respiração,Ciclo de Krebs 2 possibilitando, ainda, a formação direta de ATP para as células e originando carreadores (coenzimas) ativados como NADH (nicotinamida adenina dinucleotídeo) e FADH (flavina adenina dinucleotídeo). Estes últimos 2 doarão essa energia (na forma de ligações químicas) durante a , que conta com acadeia respiratória participação do oxigênio como aceptor final dos elétrons. Na cadeia respiratória, ocorre a transferência da energia dessas ligações químicas de “baixa energia” do NADH e FADH para ligações de “alta energia”, possibilitando a síntese do ATP. Antes de darmos início ao estudo das vias 2 metabólicas propriamente ditas, contudo, precisamos definir alguns conceitos sobre os carreadores e moléculas energéticas; NADH, FADH e ATP. É o que faremos neste tópico! 2 3.1.1 ATP (Adenosina Trifosfato) O ATP é formado por três grupos fosfato e uma adenina ligada a uma ribose (formando uma adenosina). Em especial, os dois últimos fosfatos da cadeia são de alta energia, e, quando suas ligações sofrem hidrólise, ocorre a liberação de um fosfato inorgânico (Pi) para o meio, ou, então, um grupo fosfato pode ser transferido para algum composto, formando-se o ADP e energia livre. Entenda que o ATP é a principal “moeda energética” das células. Para que moléculas de ATP sejam formadas, é necessário unir um ADP e um Pi por meio da energia gerada pela quebra das macromoléculas, como monossacarídeos e lipídios. Uma vez formado o ATP, a célula poderá utilizar a energia armazenada nessas ligações entre os grupos fosfato de alta energia a fim de realizar processos bioquímicos que necessitam de energia. Quando uma molécula de ATP sofre hidrólise, e um Pi é liberado, uma grande quantidade de energia livre poderá ser transferida para outra molécula, tornando possíveis diversos processos celulares, que até então eram termodinamicamente desfavoráveis. VOCÊ QUER VER? Você sabe o quão complexos são os processos metabólicos celulares? Acesse o site abaixo e explore a grandiosidade de reações químicas que ocorrem em nossas células. Prometemos que você vai se surpreender: http://biochemical-pathways.com/#/map/1. http://biochemical-pathways.com/#/map/1. - -4 Figura 1 - Estrutura da molécula de ATP. Em vermelho destaca-se uma das ligações de alta energia entre os fosfatos. Fonte: Elaborada pelo autor, adaptada de BIOLOGY DICTIONARY, 2019. Talvez você já tenha ouvido falar no ATP, porém NADH e FADH podem ser conceitos novos para você. Vamos 2 explorar o que são essas moléculas? Mantenha-se atento e siga em frente! 3.1.2 NADH e FADH2 NAD+ e FAD+ são agentes oxidantes, ou seja, que agentes que têm a capacidade de receber elétrons, agindo como coenzimas em diversas reações químicas envolvendo desidrogenases (enzimas que removem hidrogênio). Muitas vezes, esses elétrons são recebidos acoplados a um átomo de hidrogênio (H). Os átomos de hidrogênio liberados podem ser captados pelo NAD+ e FAD+, os quais, então, passam a ser chamados de NADH e FADH 2 (NAD+ é capaz de receber um átomo de Hidrogênio e FAD+, dois). Veremos, mais adiante, que NADH e FADH 2 doam seus elétrons sob a forma de átomos de hidrogênio. Esses, por sua vez, reagirão com o oxigênio em um processo chamado de “fosforilação oxidativa”, culminando com a síntese de ATP (RODWELL, 2017). Isso não é fantástico? Na imagem a seguir, visualize a forma reduzida e oxidada de NAD+/NADH. O mesmo raciocínio serve para FAD e FADH . 2 - -5 Figura 2 - Nicotinamida adenina dinucleotídeo (NAD+ / NADH). À esquerda da figura, observamos a forma oxidada de NAD+, já à direita, a forma reduzida de NADH. Destaca-se em vermelho o sítio de ligação ao átomo de hidrogênio (H). Fonte: OPENSTAX BIOLOGY, 1999-2019. Vamos iniciar o estudo sobre uma das principais vias metabólicas envolvidas com produção de energia em nosso organismo: a glicólise. Você sabe como os carboidratos da alimentação (doces, massas, grãos, frutas e laticínios, por exemplo) chegam até nossas células? Descubra a seguir.VOCÊ SABIA? Você sabe por que as vitaminas B3 e B2 são importantes? NAD+ e FAD+ são compostos derivados de vitaminas. Na verdade, as vitaminas niacina (vitamina B3) e riboflavina (vitamina B2), são precursores de NAD+ e FAD+, respectivamente. A ingestão adequada desses compostos na dieta auxilia a manutenção do metabolismo energético do organismo. O consumo inadequado desses compostos pode levar a doenças graves. As vitaminas do complexo B são muito importantes para a saúde. Saiba mais sobre elas lendo o texto “Vitaminas Hidrossolúveis”. Disponível em: <https://www.ufrgs.br/lacvet/site/wpcontent >./uploads/2013/10/vitam_hidroRodrigo.pdf https://www.ufrgs.br/lacvet/site/wpcontent/uploads/2013/10/vitam_hidroRodrigo.pdf https://www.ufrgs.br/lacvet/site/wpcontent/uploads/2013/10/vitam_hidroRodrigo.pdf - -6 3.1.3 Digestão e absorção de carboidratos O processo de digestão e absorção de carboidratos se inicia pela boca, com a ação da mastigação e de enzimas chamadas de “amilase”. Essas enzimas digerem o amido, polissacarídeo de origem vegetal encontrado em grãos, massas etc. A ação da amilase continua no intestino delgado. Lá também há outras enzimas, como sacarase e lactase, que degradam os dissacarídeos sacarose e lactose, deixando os monossacarídeos frutose, glicose e galactose na sua forma isolada. A glicose presente no amido e na sacarose é o principal carboidrato da nossa dieta. Dessa forma isolada, os monossacarídeos são absorvidos pelas células intestinais e são direcionados para a corrente sanguínea, podendo chegar aos músculos, fígado e cérebro, principalmente. Nas células, os monossacarídeos, inclusive a glicose, precisam de auxílio de transportadores específicos chamados de “GLUT”, pois eles não se difundem livremente pela membrana plasmática. Esses transportadores de membrana são classificados de GLUT-1 a GLUT-14 e possuem certa especificidade tecidual (HARVEY, 2015). Clique nos itens a seguir e aprenda mais sobre o tema. O GLUT-3 é o principal transportador da glicose no sistema nervoso central. O GLUT-4 é abundante no tecido adiposo, coração e no músculo esquelético. O GLUT-2 encontrado no fígado, pode tanto transportar a glicose para dentro dessas células (quando os níveis de glicose no sangue estão altos) quanto transportar a glicose das células para o sangue (quando os níveis sanguíneos de glicose estiverem baixos, por exemplo, no jejum). As células do tecido hepático, neurônios e eritrócitos não necessitam de insulina para transportar a glicose. Já as células que têm GLUT-4, como tecido adiposo e músculos, necessitam da insulina para que o transportador seja capaz de internalizar a glicose (NAVALE; PARANJAPE, 2016). A insulina é um hormônio produzido pelo pâncreas quando a concentração de glicose no sangue se eleva. Quando produzida, sensibiliza as células musculares e adipócitos a captar glicose, removendo-a da corrente sanguínea. Outro hormônio, também produzido pelo pâncreas, glucagon, tem efeito contrário; estimulando a liberação de moléculas de glicose para a corrente sanguínea, quando a glicemia começa a baixar. Essa liberação ocorre principalmente em condições de jejum, pela quebra do glicogênio hepático. A manutenção da glicemia é fundamental para nosso organismo, visto que alguns órgãos, como o cérebro, necessitam de um aporte constante de glicose para sua manutenção. Assista na videoaula a seguir, sobre a produção de energia (carboidratos). https://cdnapisec.kaltura.com/p/1972831/sp/197283100/embedIframeJs/uiconf_id/44388221/partner_id /1972831?iframeembed=true&playerId=kaltura_player_1567779243&entry_id=1_fox9xucs Agora, vamos dar início ao estudo da via glicolítica, uma das vias metabólicas mais importantes em nosso organismo! 3.1.4 Glicólise A glicólise é um processo que ocorre integralmente no citoplasma celular, e pode ser definida como a quebra de moléculas de glicose (seis carbonos) em duas moléculas de piruvato (um composto mais simples de três carbonos). De acordo com Nelson e Cox (2014, p. 544), na glicólise (do grego glykys, “doce” ou “açúcar”, e lysis, “quebra”), uma molécula de glicose é degradada em uma série de reações catalisadas por enzimas, gerando duas moléculas do composto de três átomos de carbono, o piruvato. Durante as reações sequenciais da glicólise, parte da energia livre da glicose é conservada na forma de ATP e NADH. Na verdade, a glicólise é um conjunto de dez reações químicas, que possui como produto final duas moléculas de piruvato. Durante essas reações químicas, são liberados ATP e NADH. O ATP pode ser imediatamente utilizado pela célula como fonte de energia, ao passo que o NADH seguirá para a fosforilação oxidativa quando houver https://cdnapisec.kaltura.com/p/1972831/sp/197283100/embedIframeJs/uiconf_id/44388221/partner_id/1972831?iframeembed=true&playerId=kaltura_player_1567779243&entry_id=1_fox9xucs https://cdnapisec.kaltura.com/p/1972831/sp/197283100/embedIframeJs/uiconf_id/44388221/partner_id/1972831?iframeembed=true&playerId=kaltura_player_1567779243&entry_id=1_fox9xucs - -7 pela célula como fonte de energia, ao passo que o NADH seguirá para a fosforilação oxidativa quando houver oxigênio disponível. Classicamente, as cinco primeiras reações da via glicolítica são chamadas de “ ”, sendo que,fase de preparação ao custo de duas moléculas de ATP, ocorre a fosforilação da glicose e sua conversão em gliceraldeído-3-fosfato. Já as cinco últimas reações são chamadas de “ ”, pois ocorre a conversão oxidativa do fase de pagamento em e formação de 4 ATPs e 2 NADH. Na imagem abaixo, observe umagliceraldeído-3-fosfato piruvato representação esquemática da glicólise. Figura 3 - Representação esquemática de glicólise. Perceba que há uma divisão didática entre a fase de preparação e de pagamento. Fonte: Elaborada pelo autor, adaptada de MARZZOCO, 2015, p. 120. No objeto interativo abaixo, você poderá aprender mais sobre etapas da Glicólise. Acompanhe! Um ponto importante a ser observado é que o saldo líquido de moléculas de ATP é dois (2 ATP). Isso se deve ao fato de que embora sejam produzidas quatro moléculas de ATP (4 ATPs) durante as etapas finais, duas moléculas de ATP (2 ATPs) são consumidas nas etapas iniciais de preparação. Essas duas moléculas são essenciais para a ativação da molécula de glicose, o que possibilita o início da glicólise. Na imagem abaixo, temos um resumo das moléculas consumidas e produzidas na glicólise. - -8 Figura 4 - Resumo da via glicolítica, na parte superior os compostos consumidos e na parte inferior os compostos produzidos. Os demais monossacarídeos da dieta, galactose e frutose, que representam a minoria dos carboidratos consumidos diariamente, são convertidos em grande parte no fígado, em intermediários da glicólise e, assim, são oxidados na via. A galactose é convertida em glicose 6-fosfato e a frutose é convertida a di-hidroxiacetona fosfato e gliceraldeído 3-fosfato. Ambos os produtos formados seguem a via glicolítica. 3.1.5 Destinos do piruvato Após a produção de piruvato, essa molécula pode ter três destinos. Clique nas abas abaixo e aprenda mais sobre o tema. Destino 1 Em tecidos com disponibilidade de oxigênio, a glicólise é apenas a primeira etapa de oxidação completa da glicose. Nesses tecidos, o piruvato irá sofrer uma descarboxilação (perder um carbono), na forma de CO2, dando origem ao Acetil-CoA. Esse processo ocorre na mitocôndria e direciona o Acetil-CoA para o Ciclo de Krebs para sua oxidação completa. Destino 2 Em tecidos com restrição de oxigênio (hipóxia), como, por exemplo, o músculo em contração vigorosa, o piruvato será reduzido a lactato por meio da fermentação láctica. Nesse processo, o NADH produzido durante a glicólise, pode ser reoxidado a NAD+, e desse modo a célula consegue continuar realizando glicólise. Essa é a chamada glicólise anaeróbia que ocorre em nosso organismo. Esse processo é pouco eficiente, o rendimento de energia (2 ATP por glicose) é muito menor frente ao que pode ser obtido pela oxidação completa do piruvato, passando pelo Ciclode Krebs (cerca de 30 ATP por glicose). Destino 3 Principalmente em microrganismos, como leveduras, na fabricação de cerveja e pão, o piruvato é convertido em etanol e CO2, um processo chamado de “fermentação alcoólica” (NELSON; COX, 2014). Até agora, pudemos perceber o papel fundamental da glicose no metabolismo. Alguns tecidos dependem, quase VOCÊ QUER VER? Assista ao vídeo “Steps of Glycolysis Reactions Explained - Animation - SUPER EASY”, para uma experiência incrível. Nele, você poderá visualizar de maneira bastante interativa as moléculas envolvidas em cada reação da glicólise. Disponível em: https://www.youtube.com/watch? v=uWOURkrxpH4. https://www.youtube.com/watch?v=uWOURkrxpH4. https://www.youtube.com/watch?v=uWOURkrxpH4. - -9 Até agora, pudemos perceber o papel fundamental da glicose no metabolismo. Alguns tecidos dependem, quase que exclusivamente da glicose para a produção de energia. São exemplos desses órgãos, o cérebro, os eritrócitos, os testículos e a medula renal. Saiba que somente o cérebro consome em média 120g de glicose/dia. Essa quantidade representa mais da metade das moléculas de glicose que temos estocadas na forma de glicogênio hepático e muscular (NELSON; COX, 2014). Em períodos de jejum, nosso organismo precisa suprir a necessidade de moléculas de glicose, independentemente dos estoques de glicogênio. Nosso organismo é capaz de regular a glicemia basicamente por meio de dois processos. Um deles é a glicogenólise (quebra do glicogênio em glicose e liberação para corrente sanguínea), e o outro é a gliconeogênese. Temos a capacidade de produzir novas moléculas de glicose a partir de compostos não glicídicos (que não são carboidratos). Em nossa corrente sanguínea, mesmo após um período de jejum, ou exercício físico prolongado, a concentração plasmática de glicose, chamada de glicemia, é sempre mantida dentro de uma faixa ideal. A via metabólica chamada de gliconeogênese é capaz de produzir novas moléculas de glicose a partir do piruvato e outros compostos. Saiba mais sobre ela a seguir. 3.1.6 Gliconeogênese Trata-se de uma via bioquímica que em mamíferos ocorre majoritariamente no fígado e utiliza quase o mesmo aparato enzimático da glicólise. Após as refeições, a absorção dos alimentos faz aumentar a glicemia (concentração de glicose plasmática). Neste período, a liberação de insulina pelo pâncreas permite a absorção de glicose por todos os tecidos. Gradativamente, a glicemia diminui e, ao ser atingido um nível basal, ocorre uma alteração na secreção pancreática: a insulina é substituída por glucagon. Este hormônio estimula a degradação do glicogênio hepático e a liberação de glicose do fígado mantém a glicemia basal. No entanto, a reserva hepática de glicogênio é limitada e insuficiente para manter níveis glicêmicos normais além de 8 horas de jejum. Depois deste período, a contribuição do glicogênio hepático decresce, ao mesmo tempo em que é acionada outra via metabólica de produção de glicose: a gliconeogênese (MARZZOCO, 2015, p. 174). As principais moléculas precursoras para a síntese de novas moléculas de glicose são: lactato; glicerol; e aminoácidos. Há três pontos, das dez reações da glicólise, em que se faz necessária a realização de um “contorno”. Isso se deve ao fato de que sete enzimas catalisam reações reversíveis, tanto na glicólise quanto na gliconeogênese, porém, três delas catalisam reações irreversíveis, sendo necessária ação de outras enzimas para que o processo ocorra. Abaixo, temos uma imagem que compara as etapas da glicólise e gliconeogênese. Observe que alguns pontos da VOCÊ QUER LER? A fadiga muscular relacionada ao exercício muscular intenso é associada a câimbras por muitos esportistas. Essa associação é equivocadamente realizada com base no excesso de ácido lático produzido, a partir do lactato, em condições de exercício físico extenuante, em que o músculo não é suprido por oxigênio adequadamente. Ou seja, alguns praticantes de exercícios atribuem suas câimbras ao ácido lático acumulado nos músculos após o exercício extenuante. Confira o texto produzido por Bordoni, Sugumar e Varacallo sobre o assunto em: < >https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK499895/ https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK499895/ - -10 Abaixo, temos uma imagem que compara as etapas da glicólise e gliconeogênese. Observe que alguns pontos da glicólise utilizam enzimas diferentes das reações correspondentes da gliconeogênese: • glicose – glicose 6-fosfato; • frutose 6-fosfato – frutose 1,6-bifosfato; • fosfoenolpiruvato – piruvato. · • • • - -11 Figura 5 - Etapas da glicólise (setas pretas) e gliconeogênese (setas azuis). As setas vermelhas mostram as necessidades energéticas da gliconeogênese. Fonte: HARVEY, 2015, p. 121. - -12 Para que novas moléculas de glicose se formem, a primeira reação que precisa ocorrer é a conversão de piruvato a fosfoenolpiruvato. Na glicólise, o fosfoenolpiruvato é convertido em piruvato pela enzima piruvato-cinase, porém essa enzima não é capaz de realizar a reação contrária. Assim, ao passo que na glicólise, em apenas uma reação, o fosfoenolpiruvato é convertido em piruvato, na gliconeogênese, são necessárias duas reações para converter o piruvato em fosfoenolpiruvato (número 1 e 2, em azul, na imagem acima). É necessário o transporte do piruvato do citoplasma para a mitocôndria, pois aí se encontram as enzimas que catalisam a reação. Uma vez na mitocôndria, o piruvato sofre ação da piruvato-carboxilase (1), e é convertido em oxaloacetato. Em seguida, o oxaloacetato é convertido em fosfoenolpiruvato (2) pela fosfoenolpiruvato-carboxicinase. Cada uma dessas duas reações consome um fosfato de alta energia, sendo gastas, ao todo, duas dessas moléculas por piruvato formado. Já na glicólise, a conversão de fosfoenolpiruvato em piruvato gera apenas um ATP por piruvato. O segundo desvio refere-se à etapa de fosforilação da frutose-6-fosfato pela fosfofrutocinase-1 (número 3, em azul, na imagem acima). A geração de frutose-6-fosfato a partir de frutose-1,6-bifosfato é catalisada por uma enzima diferente, a frutose-1,6-bifosfatase. Por fim, o terceiro contorno é a reação final da gliconeogênese, a desfosforilação da glicose-6-fosfato para formar glicose (número 4, em azul, na imagem acima). O inverso da reação da hexocinase é catalisado pela glicose-6-fosfatase. Como visão geral, é possível converter piruvato em moléculas de glicose novamente, porém esse processo é desfavorável energeticamente para a célula. Em outras palavras, a célula gasta mais energia para realizar a gliconeogênese do que efetivamente a glicólise forneceu. Como dito anteriormente, além do piruvato, há outros precursores para síntese de glicose. De acordo com Marzzoco (2015) esses compostos podem ser de diferentes tipos. Clique nas abas e confira! Glicerol O glicerol produto da quebra de triacilglicerol nos adipócitos é utilizado pelo fígado para produzir glicose. A fosforilação do glicerol pela glicerol-cinase, seguida pela oxidação do carbono central pela glicerol 3-fosfato-desidrogenase, gera di-hidroxiacetona-fosfato, intermediário da gliconeogênese no fígado. Lactato O lactato produzido pela glicólise nos eritrócitos ou no músculo em anaerobiose (por exemplo, em exercício vigoroso) é transportado pela corrente sanguínea até o fígado, em um processo conhecido como Ciclo de Cori. No citoplasma dos hepatócitos ele é convertido em piruvato pela ação da lactato-desidrogenase. O piruvato produzido segue a via gliconeogênica descrita acima. Aminoácidos No fígado, grande parte dos aminoácidos são convertidos em piruvato e outros intermediários da gliconeogênese. Um dos mais importantes é a alanina, que por meio da remoção de seu grupo amino (desaminação), no interior das mitocôndrias dos hepatócitos, produz diretamente moléculas de piruvato. Este então segue a via gliconeogênica descrita acima. Outro aminoácido relevante para gliconeogênese é a glutamina, que é convertida até oxalacetato e posteriormente em fosfoenolpiruvato. Acompanhe, na imagemabaixo, os precursores não glicídicos na gliconeogênese hepática. - -13 Figura 6 - Precursores não glicídicos na gliconeogênese hepática. Lactato é convertido em piruvato; muitos aminoácidos são catabolizados, direta ou indiretamente, em piruvato; glicerol e convertido em Di- hidroxiacetona-fosfato. Nossos estudos sobre a glicólise e gliconeogênese nos permitiram, até agora, saber que nosso organismo é capaz de produzir ATP e coenzimas (NADH) a partir da glicólise. Além disso, aprendemos que, em situações de jejum, nosso organismo é capaz de sintetizar novas moléculas de glicose a partir de outros compostos. No próximo tópico, vamos dar início ao estudo sobre o Ciclo de Krebs e a fosforilação oxidativa. Esse conjunto de reações permite a oxidação completa de carboidratos, aminoácidos e lipídios. Antes de seguirmos em frente, vamos testar seu conhecimento sobre os princípios gerais da gliconeogênese? Para tanto, realize a atividade proposta abaixo. 3.2 Ciclo de Krebs e cadeia respiratória Quando nossas células estão em condições aeróbias e oxidam os combustíveis orgânicos dióxido de carbono e água, a glicólise é apenas a primeira etapa para a oxidação completa da glicose. Quando nessas condições, o piruvato produzido pela glicólise é convertido em Acetil-CoA (um composto central no metabolismo energético) e posteriormente oxidado a H O e CO com consumo de oxigênio. A esse processo, damos o nome de “respiração 2 2 celular”. Veremos que o primeiro passo para continuação da oxidação do piruvato é o Ciclo de Krebs, também chamado de “ciclo do ácido cítrico”. Acompanhe! 3.2.1 Preparação para o Ciclo de Krebs Segundo Nelson e Cox (2014), a respiração celular acontece em três estágios principais. No primeiro, moléculas combustíveis orgânicas – glicose, ácidos graxos e alguns aminoácidos – são oxidadas para produzirem fragmentos de dois carbonos, na forma do grupo acetil da Acetil-coenzima A (Acetil-CoA). No segundo estágio, os grupos acetil entram no ciclo do ácido cítrico, que os oxida enzimaticamente a CO2; a energia liberada é conservada nos transportadores de elétrons reduzidos NADH e FADH2. No terceiro estágio da respiração, estas coenzimas reduzidas são oxidadas, doando - -14 NADH e FADH2. No terceiro estágio da respiração, estas coenzimas reduzidas são oxidadas, doando prótons (H+) e elétrons. Os elétrons são transferidos ao O2 – o aceptor final de elétrons – por meio de uma cadeia de moléculas transportadoras de elétrons, conhecida como cadeia respiratória (NELSON; COX, 2014, p. 633). Figura 7 - Processo geral da respiração celular, pelo qual macromoléculas são oxidadas totalmente em CO2 e H2O, com produção de ATP. Entre parênteses está destacado o número de carbonos de cada composto e em vermelho as etapas de saída de NADH/FADH2. Fonte: Elaborada pelo autor, adaptada de NELSON; COX, 2014. O piruvato, produto final da glicólise, deve ser transportado para o interior da mitocôndria antes que possa entrar no Ciclo de Krebs. Esse transporte é efetuado por um transportador específico para o piruvato, que o ajuda a cruzar a membrana mitocondrial interna. Uma vez na matriz, o piruvato é convertido em Acetil-CoA pelo complexo da piruvato-desidrogenase, um complexo formado por três enzimas (HARVEY, 2015). A ação do complexo enzimático ocorre na membrana interna da mitocôndria e a conversão de Piruvato em Acetil-CoA libera um CO e um NADH num processo de descarboxilação. 2 - -15 Figura 8 - Reação de conversão realizada pelo complexo da piruvato desidrogenase. Destacados em rosa estão os átomos removidos do piruvato que formam o CO2. Em verde, Coenzima A que irá se ligar ao Acetil (molécula de dois carbonos que resulta da remoção de CO2), formando Acetil-CoA. Fonte: Elaborada pelo autor, adaptada de NELSON; COX, 2014. Agora, assista a videoaula abaixo e amplie seus conhecimentos sobre o tema. https://cdnapisec.kaltura.com/p/1972831/sp/197283100/embedIframeJs/uiconf_id/44388221/partner_id /1972831?iframeembed=true&playerId=kaltura_player_1567779546&entry_id=1_ud57w06j Veremos, nos próximos tópicos, que os lipídios também podem ser convertidos em Acetil-CoA, e o mesmo ocorre com alguns aminoácidos. Outros aminoácidos vão dar origem a compostos intermediários do Ciclo de Krebs. Por enquanto, vamos focar nas reações que ocorrem no Ciclo de Krebs, e, posteriormente, abordamos de forma integrada como os diferentes combustíveis orgânicos alimentam o ciclo. https://cdnapisec.kaltura.com/p/1972831/sp/197283100/embedIframeJs/uiconf_id/44388221/partner_id/1972831?iframeembed=true&playerId=kaltura_player_1567779546&entry_id=1_ud57w06j https://cdnapisec.kaltura.com/p/1972831/sp/197283100/embedIframeJs/uiconf_id/44388221/partner_id/1972831?iframeembed=true&playerId=kaltura_player_1567779546&entry_id=1_ud57w06j - -16 Agora que já sabemos de onde vem o composto de partida para o Ciclo de Krebs, vamos explorar um pouco mais as reações que permitem a oxidação completa do Acetil-CoA. Continue atento! 3.2.2 Ciclo de Krebs O Ciclo de Krebs ocorre nas mitocôndrias, e se inicia com a condensação do Acetil (dois carbonos) proveniente do Acetil-CoA, com oxaloacetato (4 carbonos) para formar citrato (seis carbonos). Essa reação é catalisada pela enzima citrato-sintase e possui caráter irreversível (RODWELL, 2017). CASO Paciente masculino, 42 anos, lavrador, chegou ao setor de emergência com queixa de dor epigástrica em queimação, vômitos e fezes liquefeitas. Queixava-se também de dispneia aos moderados esforços de longa data, mas com piora recente. Acompanhando o quadro, referia edema de membros inferiores, há 15 anos, com piora importante nos últimos dias, tornando-se generalizado, inclusive com edema em face. Antecedentes pessoais: ex-etilista e tabagista atual (30 anos-maço); febre reumática aos 18 anos, evoluindo com dupla lesão mitral leve e estenose aórtica leve. Adicionalmente, apresentou quadro de insuficiência cardíaca de alto débito por Beribéri há oito anos, com melhora após tiamina. Faz uso de diuréticos de alça há 15 anos, para tratamento do edema. A tiamina (vitamina B1) é uma vitamina solúvel, essencial no metabolismo dos carboidratos. As principais fontes de tiamina são cereais, grãos, carnes (especialmente de porco), vegetais e laticínios. As principais causas de Beribéri são a baixa ingestão de tiamina, etilismo, uso de diuréticos de alça (por aumentar e excreção renal da tiamina), diálise e uso de nutrição parenteral. A Tiamina Pirofosfato (TPP) é um cofator importante para o complexo da piruvato- desidrogenase na conversão de piruvato em Acetil-CoA. Ele é sintetizado a partir da tiamina (vitamina B1). Deficiências de tiamina na dieta podem levar a uma doença grave chamada de Beribéri. Os sinais e sintomas, que inicialmente são leves, como insônia, nervosismo, irritação, fadiga, perda de apetite e energia, evoluem para quadros mais graves, como paralisia, edema de membros inferiores, dificuldade respiratória e cardiopatia. Para saber mais, leia o texto “Deficiência de Tiamina como Causa de Cor Pulmonale Reversível”, de Coelho et al. Disponível em: http://www.scielo.br/pdf/abc/v91n1/a13v91n1.pdf. http://www.scielo.br/pdf/abc/v91n1/a13v91n1.pdf. - -17 Figura 9 - Reação de condensação entre Acetil-CoA e Oxaloacetato formando citrato, primeiro composto do Ciclo de Krebs. Reação catalisada pela enzima citrato-sintase, consumindo uma molécula de água e liberando a coenzima A para o meio. Fonte: NELSON; COX, 2014, p. 640. Após a formação do citrato, ocorre uma série de reações que levam à liberação de dois CO , três NADH, um ATP e 2 um FADH . Após essa sequência de reações, forma-se novamente um oxaloacetato pronto para ser condensado 2 novamente com um novo Acetil-CoA. O processo é um tanto quanto lógico, visto que um composto com quatro carbonos (oxaloacetato) se condensa com outro, de dois carbonos (Acetil-CoA), formando um composto de seis carbonos (citrato). Assim, após duas descarboxilações, forma-se um composto com quatro carbonos novamente (oxaloacetato).Navegue pelo objeto interativo abaixo e aprenda mais sobre o Ciclo de Krebs. Confira! Chegamos, então, ao final do Ciclo de Krebs, no qual a partir da oxidação de um Acetil-CoA pode-se obter três NADH, um FADH , um ATP e dois CO . O ATP poderá ser utilizado como fonte de energia pela célula, ao passo 2 2 que as moléculas de NADH e FADH serão posteriormente direcionados para a cadeia respiratória, para síntese 2 de mais moléculas de ATP. Agora, vejamos se você compreendeu os conceitos mais importantes sobre o Ciclo de Krebs. Para isso, resolva com atenção a atividade proposta na sequência. Pudemos verificar até agora a capacidade de nossas células em metabolizar carboidratos, especialmente, a VOCÊ O CONHECE? Você sabe por que o Ciclo de Krebs recebe esse nome? Ele se deve a Hans Krebs, médico e bioquímico alemão (1900-1981), responsável por desvendar a sequência das reações do ciclo do ácido cítrico. Essa descoberta lhe rendeu o prêmio Nobel de Fisiologia, ou Medicina, em 1953 (compartilhado com Fritz Lipmann). Para conhecer melhor a história e os feitos desse cientista, acesse: https://www.nobelprize.org/prizes/medicine/1953/krebs/biographical/. https://www.nobelprize.org/prizes/medicine/1953/krebs/biographical/. - -18 Pudemos verificar até agora a capacidade de nossas células em metabolizar carboidratos, especialmente, a glicose, em uma via metabólica chamada de glicólise. O piruvato, produto da glicólise, é convertido em Acetil-CoA que avança para o Ciclo de Krebs e é totalmente oxidado. Não devemos esquecer que, pela glicólise, são produzidas duas moléculas de piruvato. Portanto, a partir de uma glicose, conseguimos “girar” o Ciclo de Krebs duas vezes. Então, temos que: • da glicólise são liberados dois ATPs (quatro liberados, menos dois consumidos) e dois NADH; • da descarboxilação do piruvato e síntese de Acetil-CoA são liberados dois NADH (uma para cada piruvato); • do Ciclo de Krebs (duas voltas): dois ATP (ou GTP), seis NADH e dois FADH2. • no total, a partir de uma glicose: quatro ATP, dez NADH e dois FADH2. Enfatizamos, aqui, a importância do ATP como fonte de energia para as células. Fica claro que, até agora, foram produzidas moléculas de ATP efetivamente, certo? Entretanto, para onde se destinam e qual a finalidade das coenzimas oxidadas NADH e FADH ? Elas são direcionadas para a cadeia respiratória, nas mitocôndrias. 2 Veremos, a seguir, que a partir de uma molécula de glicose, poderemos aumentar o número de moléculas de ATP produzidas para algo em torno de 30 ATPs, muito mais do que os quatro ATPs já produzidos. 3.2.3 Cadeia respiratória A cadeia respiratória é basicamente a combinação de eventos que ocorrem em dois processos: cadeia transportadora de elétrons e fosforilação oxidativa. A fosforilação oxidativa é precedida pela transferência de elétrons provenientes de NADH e FADH por meio da cadeia transportadora de elétrons. Basicamente, para que 2, a fosforilação oxidativa ocorra, é necessária uma força chamada de “próton-motriz”. Essa força só é formada graças à cadeia transportadora de elétrons. Vamos recordar que um átomo de hidrogênio é composto por um próton (no núcleo com carga positiva) e um elétron (na periferia com carga negativa). Aquilo que chamamos de H , na verdade, não é um átomo de+ hidrogênio completo, mas, sim, apenas o próton. É possível, também, que o hidrogênio exista na forma de um íon com carga negativa, chamado de hidreto, que possui um próton e dois elétrons ( H ). Observe!: - Figura 10 - Hidrogênio na sua forma atômica neutra (ao centro) e íon hidreto (a direita). Fonte: KHAN ACADEMY, 2019. A maior parte dos elétrons transportados pela cadeia de transporte de elétrons é proveniente da doação dos elétrons de íons hidretos ( H ) removidos do NADH, que ao perderem seus dois elétrons, tornam-se prótons (H ): - + e são bombeados para fora da matriz mitocondrial. Esse bombeamento de prótons gera uma diferença de concentração entre a matriz mitocondrial e o espaço intermembrana. Isso faz com que os H retornem à matriz+ por meio de canais específicos, fornecendo a energia necessária para a síntese de ATP. Vamos entender melhor como esses processos ocorrem? • Cadeia transportadora de elétrons: é formada por um conjunto de quatro complexos de transporte • • • • • - -19 • Cadeia transportadora de elétrons: é formada por um conjunto de quatro complexos de transporte inseridos na membrana interna da mitocôndria. Os complexos I e II catalisam a transferência de elétrons para a ubiquinona (coenzima Q, ou apenas “Q”) a partir de dois doadores de elétrons diferentes: NADH (complexo I) e succinato-FADH2 (complexo II). O complexo III carrega elétrons da ubiquinona reduzida para o citocromo c, e o complexo IV completa a sequência, transferindo elétrons do citocromo c para o O2. Os complexos I, III e IV, além de funcionarem como transportadores de elétrons, atuam também como bombeadores de prótons (H+) da matriz mitocondrial para o espaço intermembrana (RODWELL, 2017). • Fosforilação oxidativa: de acordo com o modelo quimiosmótico proposto por Peter Mitchell (apud NELSON; COX, 2014, p. 747), [...] a energia eletroquímica inerente à diferença de concentração de prótons e a separação de cargas através da membrana mitocondrial interna – a força próton-motriz – impulsiona a síntese de ATP, à medida que os prótons fluem passivamente de volta à matriz, por meio de um poro para prótons na ATP-sintase. A ATP-sintase (também chamada de complexo F F ) é a enzima que catalisa a formação de ATP a partir de ADP 0 1 + Pi. Em outras palavras, os prótons que foram bombeados para o espaço intermembrana retornam para a matriz. Durante sua passagem pela ATP-sintase, acoplados à membrana interna, eles fornecem a energia livre necessária para síntese de moléculas de ATP. Na figura a seguir, podemos observar que o início da cadeia transportadora de elétrons ocorre com a transferência de elétrons para o Complexo I e Complexo II pelo NADH e FADH , respectivamente. NADH e FADH 2 2 são provenientes do Ciclo de Krebs e outros processos metabólicos, como a glicólise. Concomitante a essa transferência, há bombeamento de H para fora da matriz, a partir dos Complexos I, III e IV.+ • • VOCÊ QUER LER? Os compostos de cianeto são utilizados em diferentes setores da indústria, sendo a maior parte utilizada na produção de tecidos, plásticos e fármacos. Uma pequena parte também é utilizada na indústria de mineração. Pode ser quimicamente sintetizado, mas também é encontrado em plantas de forma natural. Em 1924, um composto à base de cianeto, chamado de Zyklon B, foi desenvolvido, inicialmente utilizado como pesticida. Contudo, esse composto passou a ser utilizado como arma química em campos de concentração na Alemanha Nazista. O cianeto bloqueia a cadeia transportadora de elétrons, podendo levar à morte indivíduos expostos a elevadas concentrações desse composto. Leia o texto “A avaliação dos efeitos tóxicos do cianeto e do tiocianato no período perinatal. Estudo em ratos” e aprenda mais sobre esse composto. Disponível em: http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/10/10133/tde- 21052007-171727/publico/Altair_Benedito_Sousa.pdf. http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/10/10133/tde-21052007-171727/publico/Altair_Benedito_Sousa.pdf. http://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/10/10133/tde-21052007-171727/publico/Altair_Benedito_Sousa.pdf. - -20 Figura 11 - Etapas da cadeia transportadora de elétrons e fosforilação oxidativa. As setas indicam o fluxo de transporte dos elétrons e o bombeamento de H+. Fonte: OPENSTAX BIOLOGY, 2019. Esses primeiros elétrons que chegam ao Complexo I e II são transferidos para a Coenzima Q, que, por sua vez, por meio do Complexo III, os transfere para o citocromo c. Por fim, o citocromo c transfere esses elétrons para o Complexo IV. Em conjunto com átomos de oxigênio (que será o aceptor final desses elétrons) e H da matriz+ mitocondrial, esses elétrons possibilitam a síntese de moléculas de H O no Complexo IV. Os Hbombeados para 2 + o espaço intermembrana vão retornar pelo poro da ATP-sintase e fornecer a energia necessária para a síntese de ATP a partir de ADP + Pi, no processo conhecido como “fosforilação oxidativa”. A força próton-motriz, gerada a partir da oxidação completa de uma molécula de glicose durante a glicólise aeróbica, é suficiente para formar muitas moléculas de ATP. A razão entre ATP sintetizado é de cerca de 2,5 quando os elétrons entram na cadeia respiratória pelo Complexo I, e 1,5 quando os elétrons entram por meio da ubiquinona (Complexo III) (NELSON; COX, 2014). Assim, cada NADH rende 2,5 ATP e cada FADH rende 1,5 ATP. 2 Retomando o raciocínio da quantidade de ATP gerada por molécula de glicose completamente oxidada, temos VOCÊ QUER VER? Assista ao vídeo “Electron Transport Chain” e visualize o processo de transporte dos elétrons pelos complexos I – IV e a síntese de ATP (fosforilação oxidativa). Disponível em: https://www. youtube.com/watch?v=G3Y2Ig3YTL0. https://www.youtube.com/watch?v=G3Y2Ig3YTL0. https://www.youtube.com/watch?v=G3Y2Ig3YTL0. - -21 Retomando o raciocínio da quantidade de ATP gerada por molécula de glicose completamente oxidada, temos que: Figura 12 - Quantidade de ATP formado na oxidação da glicose e seus intermediários. Para concluir, você aprendeu que a partir dos doadores de elétrons iniciais NADH e FADH gera-se um fluxo de 2 elétrons pelos Complexos I, II, III e IV, o que resulta no bombeamento de prótons através da membrana mitocondrial interna. Esse bombeamento torna a matriz mitocondrial alcalina em relação ao espaço intermembrana (ácido, rico em prótons H ). Esse gradiente de prótons fornece a energia (na forma de força+ próton-motriz) para a síntese de ATP a partir de ADP e Pi pela ATP-sintase. 3.3 Metabolismo de lipídios e corpos cetônicos Até o momento, vimos que a glicose é um importante combustível energético para nosso organismo. Por meio dela, nossas células realizam a glicólise, o Ciclo de Krebs e a fosforilação oxidativa, produzindo ATP. Entretanto, além da glicose, é possível produzir ATP a partir dos ácidos graxos; os lipídios mais abundantes em nosso organismo, que são estocados na forma de triacilglicerol em nossos adipócitos. Os ácidos graxos são formados por longas cadeias carbônicas. Por meio da união de três ácidos graxos a uma molécula de glicerol, forma-se o triacilglicerol. Em alguns órgãos, como coração, os ácidos graxos fornecem até 80% da energia necessária para as células (NELSON; COX, 2014). A partir dos ácidos graxos, podemos obter Acetil-CoA, que será oxidado no Ciclo de Krebs. O processo pelo qual os ácidos graxos são convertidos em Acetil-CoA chama-se β-oxidação. Além disso, o Acetil-CoA obtido pode ser convertido em outros compostos, como os corpos cetônicos. Em condições de baixas concentrações de glicose no sangue, a síntese de corpos cetônicos pode suprir parte da necessidade cerebral por glicose. A β-oxidação e o metabolismo de corpos cetônicos serão nossos próximos objetos de estudo. Continue atento! - -22 3.3.1 Digestão, absorção e transporte de lipídios Antes de iniciarmos o conteúdo de metabolismo dos ácidos graxos, vamos explorar como eles são digeridos, absorvidos e transportados em nosso organismo. Agora, assista a videoaula abaixo e amplie seus conhecimentos sobre o tema. https://cdnapisec.kaltura.com/p/1972831/sp/197283100/embedIframeJs/uiconf_id/44388221/partner_id /1972831?iframeembed=true&playerId=kaltura_player_1567779635&entry_id=1_rg96khhv Basicamente, há três formas de obtenção de lipídios pelas células: gorduras na dieta mobilizam gorduras armazenadas em tecidos especializados (tecido adiposo, consistindo em células chamadas “adipócitos”) e, no fígado, convertem o excesso dos carboidratos da dieta em gordura para a exportação aos outros tecidos (NELSON; COX, 2014). A absorção de lipídios provenientes da dieta se inicia no intestino, com ação dos sais biliares e enzimas lipases que convertem as gorduras da dieta (na forma de triacilgliceróis) em glicerol e ácidos graxos livres para serem absorvidos. Eles são absorvidos e convertidos novamente em triacilgliceróis, incorporados em quilomícrons e transportados para diversos órgãos pela corrente sanguínea e sistema linfático. Ao chegar aos tecidos periféricos, enzimas lipase presentes nos capilares sanguíneos convertem os triacilgliceróis em ácidos graxos livres e glicerol, para que sejam absorvidos pelas células. Nas células, eles podem ser consumidos na produção de energia (como nos músculos), ou serem estocados na forma de triacilgliceróis novamente (como nos adipócitos). A imagem abaixo ilustra esse processo. Figura 13 - Digestão, absorção e transporte de lipídios provenientes da dieta. Fonte: NELSON; COX, 2014, p. 668. https://cdnapisec.kaltura.com/p/1972831/sp/197283100/embedIframeJs/uiconf_id/44388221/partner_id/1972831?iframeembed=true&playerId=kaltura_player_1567779635&entry_id=1_rg96khhv https://cdnapisec.kaltura.com/p/1972831/sp/197283100/embedIframeJs/uiconf_id/44388221/partner_id/1972831?iframeembed=true&playerId=kaltura_player_1567779635&entry_id=1_rg96khhv - -23 Em situações de jejum, ou quando a glicemia começa a baixar, há liberação do hormônio pancreático glucagon. Nesse cenário, há ativação de enzimas lipases no tecido adiposo (hormônio sensíveis) que fazem a quebra de triacilgliceróis em ácidos graxos livres e glicerol. Os ácidos graxos são liberados do adipócito para a corrente sanguínea, onde se ligam à proteína plasmática albumina. Ligados a essa proteína solúvel, os ácidos graxos são transportados aos órgãos, como coração e músculos. Já o glicerol, liberado pela ação das lipases, é utilizado como precursor da gliconeogênese no fígado (processo já discutido anteriormente). Aproximadamente 95% da energia disponível nos triacilgliceróis se concentra nos ácidos graxos e apenas 5% no glicerol (NELSON; COX, 2014). Uma vez transportados pela membrana plasmática, os ácidos graxos livres (provenientes da dieta ou dos estoques do tecido adiposo) chegam ao citoplasma das células. Entretanto, as enzimas necessárias para a degradação de ácidos graxos nas células encontram-se nas mitocôndrias. Os ácidos graxos mais comuns em nosso organismo possuem 16 átomos de carbono ou mais (por exemplo, ácido palmítico, com 16 carbonos, e ácido esteárico, com 18 carbonos), e não conseguem passar pela membrana mitocondrial livremente. Portanto, é necessária uma série de reações por meio do Ciclo da Carnitina. O ácido graxo é inicialmente convertido em Acil-CoA graxo. Nesse processo, o ácido graxo é ligado a uma coenzima A pela ação da enzima acil-coa sintetase com consumo de um ATP. Figura 14 - Conversão de um Ácido Graxo em um Acil-CoA graxo. Fonte: Elaborada pelo autor, adaptada de BAGGOTT, 1997-1998. A membrana interna da mitocôndria é impermeável para o Acil-CoA graxo, por isso, pela ligação a uma molécula de Carnitina, ele consegue ser transportado para a matriz mitocondrial, voltando à sua forma original de Acil- CoA graxo, posteriormente liberando a Carnitina para realizar outros transportes. Assim, a Carnitina desempenha papel essencial no metabolismo dos ácidos graxos para produção de energia (MARZZOCO, 2015). Uma vez na matriz mitocondrial, pode-se iniciar a β-oxidação, na qual a cadeia do ácido graxo (agora Acil-CoA graxo) poderá ser oxidada. A β-oxidação, ou Ciclo de Lynen, é um processo de oxidação dos ácidos graxos que ocorre na matriz VOCÊ SABIA? Você sabia que algumas pessoas utilizam suplementos à base de Carnitina para perder peso? Será que isso é eficiente? A Carnitina é um composto produzido pelo próprio organismo, a partir dos aminoácidos lisina e metionina, sendo considerado um micronutriente não essencial. Alguns indivíduos fazem uso de suplementos à base de Carnitina (L-carnitina ou derivados), buscando acelerar a perda de peso ou melhorar desempenho esportivo. De acordo com a International Society of Sports Nutrition, em uma publicação recente (KERKSICK et al., 2018), esse assunto ainda é controverso no meiocientífico, não havendo consenso entre o real benefício da suplementação de Carnitina para perda de peso e/ou melhora no rendimento esportivo. Confira em: https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6090881/. https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6090881/. - -24 A β-oxidação, ou Ciclo de Lynen, é um processo de oxidação dos ácidos graxos que ocorre na matriz mitocondrial. Muitos tecidos utilizam ácidos graxos como fonte de produção de energia na forma de ATP, como, os músculos e o coração. O cérebro e as hemácias não utilizam lipídios, fazendo uso exclusivamente de carboidratos para produção de energia. Graças ao transporte com auxílio de Carnitina, o Acil-CoA, agora no interior da matriz mitocondrial, sofrerá uma série de reações que culminarão com a formação de múltiplas moléculas de Acetil-CoA, com liberação de FADH 2 e NADH. Segundo Marzzoco (2015, p. 198), “esta via consta de uma série cíclica de quatro reações, ao final das quais a Acil-CoA é encurtada de dois carbonos, que são liberados sob a forma de Acetil-CoA, com produção de FADH e NADH.” 2 O objeto abaixo você poderá aprender outros aspectos relacionados ao Ciclo de Lynen ou β-oxidação. Fique atento e confira! Assim, perceba que em cada volta do ciclo de Lynen, há produção de um FADH , um NADH, um Acetil-CoA e um 2 Acil-CoA com dois átomos de carbono a menos que o ácido graxo original. Sempre que o número de átomos de carbono do ácido graxo for par, a última volta do ciclo de oxidação inicia-se com uma Acil-CoA de quatro carbonos. Nesse caso, são produzidas dois Acetil-CoA (além de FADH e NADH). O número de voltas percorridas 2 por um Acil-CoA graxo dependerá do número de carbonos que ele possui. Os ácidos graxos com número ímpar de carbonos (menos comuns em nossa dieta) possuem um mecanismo extra para a última volta no clico de Lynen, quando restam três carbonos na cadeia. Vamos tomar como exemplo o ácido palmítico, um ácido graxo de 16 carbonos. São necessárias sete voltas no ciclo, gerando um total de oito Acetil-CoA, já que na última volta formam-se duas moléculas de Acetil-CoA. Assumindo que no Ciclo de Krebs sejam formados três NADH, 1 FADH e um ATP por Acetil-CoA oxidado, temos 2 o resultado final apresentado no quadro a seguir: Figura 15 - Quantidade de ATP formado na oxidação (β-oxidação e ciclo de Krebs) do ácido palmítico e seus intermediários. Para calcular o rendimento “líquido” da oxidação, é importante lembrar que para a “ativação” inicial da molécula de ácido graxo (conjugação com Acil-CoA) foram consumidas duas ligações fosfato de alta energia a partir de um ATP. Por isso, daqueles 108 ATPs gerados, devemos diminuir dois. Assim, o saldo líquido seria de 106 mols de ATPs a partir de um mol de palmitato. Fica evidente que o rendimento em mols de ATP é muito maior a partir de uma molécula de ácido graxo do que a partir de uma molécula de glicose. Mesmo que esse ácido graxo tivesse - -25 uma molécula de ácido graxo do que a partir de uma molécula de glicose. Mesmo que esse ácido graxo tivesse apenas seis carbonos (o mesmo número de carbonos que a glicose), ainda assim seriam produzidos mais ATPs que os 32 produzidos pela oxidação total da glicose. A seguir, você estudará a síntese de ácidos graxos. Além disso, também conhecerá sobre o metabolismo de corpos cetônicos. Fique atento! 3.3.2 Síntese de ácidos graxos e metabolismo de corpos cetônicos Como visto até agora, o Acetil-CoA é um composto-chave nos processos metabólicos celulares. A partir dele, é possível produzir energia na forma de ATP, porém ele também pode ser utilizado para síntese de novas macromoléculas. De forma geral, a célula poderá se deparar com um excesso de Acetil-CoA em duas situações quase que opostas: 1) quando ingerimos muito carboidrato; e 2) quando estamos em jejum prolongado. • Ingestão elevada de carboidratos na dieta: em dietas muito ricas em carboidratos, a glicólise irá levar a produção de muitas moléculas de piruvato, que serão descarboxiladas a Acetil-CoA e endereçadas ao Ciclo de Krebs. Ao se unir com oxaloacetato, formam citrato em grande quantidade. O excesso de citrato por sua vez inibe a continuação do Ciclo de Krebs, por meio da inibição das enzimas que participam do ciclo. Além disso, nessas condições, há um balanço elevado de NADH e ATP nas células, o que favorece esse processo. Com isso o excesso de citrato passa a ser deslocado para o citoplasma das células, onde é convertido em Acetil-CoA e servirá como base para síntese de ácidos graxos, alongando a cadeia de dois em dois carbonos (MARZZOCO, 2015). Esse processo de síntese ocorre majoritariamente no fígado, em virtude das altas taxas de insulina produzidas, e então, os ácidos graxos são enviados ao tecido adiposo pela corrente sanguínea, a fim de serem armazenados na forma de triacilglicerol (gordura). O Acetil-CoA serve ainda como precursor para síntese de colesterol. Ele é produzido em partes pelo nosso organismo e, em partes, obtido da dieta. Embora seja um componente importante para nosso organismo, altos índices de colesterol, especialmente o colesterol LDL, são associados a doenças cardiovasculares (SORAN; DENT; DURRINGTON, 2017). VAMOS PRATICAR? Simule quanto renderia em ATPs a oxidação completa de ácidos graxos de 18 carbonos e compartilhe com os colegas no fórum de discussão. Compare o rendimento energéticos desses ácidos graxos com o rendimento energético da glicólise e tente justificar porque, há maior rendimento, por átomo de carbono, a partir de um ácido graxo do que uma glicose? Contribua com essa discussão. Sua participação é muito importante. • - -26 Figura 16 - Mecanismo de síntese de ácidos graxos a partir do excesso carboidratos da dieta. 2. Em caso de ingestão limitada de nutrientes, principalmente de carboidratos (como num estado de jejum prolongado ou em dietas restritivas), mediante a liberação do hormônio glucagon, nosso corpo inicia um processo de lipólise (quebra dos triacilgliceróis acumulados na forma de gordura) e liberação acentuada de ácidos graxos livre. Nesse sentido, o metabolismo dos ácidos graxos se acelera, dada a alta disponibilidade desses compostos nas células. Nas mitocôndrias das células hepáticas, esse catabolismo acentuado de ácidos graxos gera muitas moléculas de Acetil-CoA. Nessa situação, ocorre a conjugação de três Acetil-CoA em um composto chamado de Acetoacetato. Esse composto poderá ser exportado do fígado para corrente sanguínea e ser utilizado como fonte de energia (sendo quebrado em Acetil-CoA novamente) por outros órgãos, como músculo e cérebro. Particularmente, o Acetoacetato é importante para o cérebro, pois ele é produzido quando o organismo está em escassez de glicose, podendo ser uma forma alternativa de produção de energia para o sistema nervoso, já que esse não faz uso de lipídios. Do Acetoacetato deriva a acetona, um composto volátil, eliminado na respiração. O acetoacetato e seus derivados (acetona e β-hidroxibutirato) são chamados de corpos cetônicos. Quando a produção de corpos cetônicos ultrapassa o aproveitamento pelos tecidos extra-hepáticos, estabelece-se uma condição denominada “cetose”, caracterizada por uma concentração elevada (até centenas de vezes maior do que a normal) de corpos cetônicos no plasma (cetonemia) e na urina (cetonúria), podendo levar a um quadro de cetoacidose, estado de coma e até à morte (MARZZOCO, 2015). Neste tópico, você pôde entender melhor como funciona o metabolismo dos lipídios provenientes da dieta ou dos estoques corporais. Por meio da oxidação dos ácidos graxos, é possível produzir energia na forma de ATP. Além disso, nosso corpo é capaz de estocar lipídios, formados a partir de carboidratos da dieta, e também produzir corpos cetônicos em condição de jejum ou dieta restritiva. - -27 3.4 Catabolismo de aminoácidos e ciclo da ureia Além de carboidratos e lipídios, um terceiro grupo de macromoléculas se destaca do ponto de vista metabólico e energético: os aminoácidos, que talvez sejam as moléculas mais versáteisem nosso organismo. Podem ser oxidados para produção de energia, assim como as anteriores, e também são os blocos de construção de nossas proteínas, servindo como precursores para diversos outros compostos. Além disso, os aminoácidos funcionam como transportadores e sinalizadores celulares e auxiliam na manutenção e no equilíbrio osmótico/iônico nas células. Nosso organismo obtém a maior parte dos aminoácidos necessários a partir das proteínas da dieta, embora alguns possam ser sintetizados de forma endógena a partir de outros compostos. Em geral, os aminoácidos são classificados como essenciais e não essenciais, sendo os essenciais aqueles que nosso organismo não é capaz de sintetizar e cujo consumo se dá pela dieta. Descubra mais a seguir! 3.4.1 Oxidação de aminoácidos para produção de energia Figura 17 - Aminoácidos essenciais e não essenciais. Aqueles chamados de “essenciais condicionais” são usualmente classificados como não essenciais. Fonte: NELSON; COX, 2014, p. 709. A oxidação de aminoácidos para produção de energia ocorre em nossas células quando: 1) o aporte de - -28 A oxidação de aminoácidos para produção de energia ocorre em nossas células quando: 1) o aporte de aminoácidos diário excede a necessidade do organismo para síntese proteica; 2) durante a “reciclagem” normal de proteínas celulares, quando proteínas que estão perdendo suas funções biológicas estão sendo degradadas e outras estão sendo sintetizadas, os aminoácidos remanescentes são oxidados para produzir energia; 3) durante o jejum ou no diabetes não controlado, quando não está disponível uma fonte de carboidrato para ser oxidado, sendo utilizadas as proteínas celulares (NELSON; COX, 2014). Agora, assista a videoaula abaixo e amplie seus conhecimentos sobre o tema. https://cdnapisec.kaltura.com/p/1972831/sp/197283100/embedIframeJs/uiconf_id/44388221/partner_id /1972831?iframeembed=true&playerId=kaltura_player_1567779986&entry_id=1_0ca913qx A partir de agora, vamos explorar principalmente o mecanismo de catabolismo dos aminoácidos para produção de energia. Veremos que apenas os esqueletos carbônicos dos aminoácidos são utilizados para produção de energia. Quando os aminoácidos são mobilizados para serem oxidados, o grupo amino deve ser removido da molécula, sendo convertido em um composto excretado na urina; a ureia. 3.4.2 Digestão e absorção de aminoácidos O processo de digestão de proteínas da dieta se inicia no estômago com ação do ácido clorídrico (HCl). Esse age como um potente agente desnaturante, desfazendo boa parte dos dobramentos internos das cadeias polipeptídicas, deixando-as mais susceptíveis às próximas etapas de degradação. Ainda no estômago, sob a ação da enzima pepsina, inicia-se a quebra das ligações peptídicas e as proteínas são convertidas em peptídeos curtos e aminoácidos livres. Conforme segue o trânsito gastrointestinal, ao chegar no intestino delgado, sob ação das enzimas tripsina, quimotripsina e outras enzimas líticas, o processo de degradação de peptídeos em aminoácidos se completa. Esse “ ” de aminoácidos pode, então, ser absorvido pelas células da mucosa intestinal, sendo direcionadospool para os capilares sanguíneos. Independentemente do tipo ou fonte de proteínas consumidas, elas sempre serão totalmente hidrolisadas e os aminoácidos disponibilizados para o organismo somente na sua forma isolada (HARVEY, 2015). Uma vez na corrente sanguínea, eles podem ser transportados para dentro das células, sendo que existem sistemas de transporte específicos para aminoácidos na membrana plasmática das células. Para que qualquer aminoácido possa ser utilizado com finalidades oxidativas, é necessário que seu grupo amino seja removido, sendo esta uma etapa obrigatória para o catabolismo de todos os aminoácidos. A seguir, vamos conhecer melhor esse mecanismo. 3.4.3 Transaminação e desaminação A presença do grupo amino mantém os aminoácidos a salvo da degradação oxidativa. O primeiro passo no catabolismo da maioria dos aminoácidos é a transferência de seus grupos amino para o α-cetoglutarato, formando glutamato. Esse processo é chamado de “transaminação”, sendo realizado por uma classe de enzimas chamadas de “transaminases”. Cada enzima transaminase possui especificidade para um ou poucos aminoácidos. Entretanto, ao realizarem a transferência do grupo amino, todas elas formam um α-cetoácido correspondente ao aminoácido utilizado (NELSON; COX, 2014). Todas as transaminases necessitam de um derivado da vitamina B6 (piridoxal-fosfato) como coenzima dessa reação. Os α-cetoácidos são moléculas bastante diversas, caracterizados pela presença de uma carbonila e um grupo ácido carboxílico. São exemplos de α-cetoácidos: piruvato e oxalacetato. Na imagem abaixo, observe uma representação geral desse processo: https://cdnapisec.kaltura.com/p/1972831/sp/197283100/embedIframeJs/uiconf_id/44388221/partner_id/1972831?iframeembed=true&playerId=kaltura_player_1567779986&entry_id=1_0ca913qx https://cdnapisec.kaltura.com/p/1972831/sp/197283100/embedIframeJs/uiconf_id/44388221/partner_id/1972831?iframeembed=true&playerId=kaltura_player_1567779986&entry_id=1_0ca913qx - -29 Figura 18 - Transaminação de um aminoácido hipotético, formando glutamato e um α-cetoácido correspondente. Fonte: HARVEY, 2015, p. 250. Mais adiante, vamos apresentar quais os destinos possíveis dos esqueletos carbônicos liberados na forma desses α-cetoácidos. Por enquanto, vamos focar no destino do grupo amino transferido ao α-cetoglutarato, que deu origem ao glutamato. VOCÊ QUER LER? As transaminases são enzimas intracelulares. A presença de níveis plasmáticos elevados de aminotransferases indica lesão em células ricas nessas enzimas. Por exemplo, traumas físicos ou processos patológicos podem causar lise celular, resultando na liberação de enzimas intracelulares para o sangue. Duas aminotransferases — AST (alanina aminotransferase) e ALT (aspartato aminotransferase) — são de especial valor diagnóstico quando aparecem no plasma, sendo úteis no diagnóstico de doenças hepáticas, infarto do miocárdio e doenças musculares. Saiba mais em: https://lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/26834 /000758693.pdf. https://lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/26834/000758693.pdf. https://lume.ufrgs.br/bitstream/handle/10183/26834/000758693.pdf. - -30 Como descrito anteriormente, os grupos amino da maioria dos aminoácidos são, no final, afunilados na síntese de glutamato, por meio de transaminação com o α-cetoglutarato. O glutamato sofre uma desaminação oxidativa final, que nada mais é do que a remoção do grupo amino numa reação catalisada pela enzima glutamato- desidrogenase. Essa desaminação forma novamente o α-cetoglutarato, que poderá ser novamente utilizada para a reação de transaminação com outros aminoácidos. Essa desaminação culmina com a produção de uma molécula de amônia livre (NH ). A amônia produzida nos tecidos extra-hepáticos é transportada até o fígado, 4 + onde será convertida em ureia, que é a principal forma de eliminação dos grupos amino pela urina (HARVEY, 2015). 3.4.4 Ciclo da ureia A conversão de amônia em ureia ocorre no fígado, em parte no citoplasma, em parte na mitocôndria da célula hepática, por um processo chamado de Ciclo da Ureia. Resumidamente, a amônia combina-se com bicarbonato (HCO ), formando um composto chamado de carbamoil-fosfato, em uma reação química que consome dois ATP. 3 - Por sua vez, o carbamoil-fosfato combina-se com ornitina, formando citrulina. A partir da citrulina ocorrem diversas reações químicas que culminam com a liberação de ureia e formação de nova molécula de ornitina (recomeçando o ciclo). Na imagem a seguir, observe as reações gerais do ciclo da ureia: - -31 Figura 19 - Ciclo da ureia. Após a ligação de uma amônia (NH4+) e um bicarbonato (HCO3-), forma-se carbamoil- fosfato, que então se combina com ornitina, formando citrulina. Após diversas reações químicas, libera-se uma ureia. Fonte: MARZZOCO, 2015, p. 226. Na figura, a numeração indica a ação das enzimas (1) carbamoil-fosfatosintetase I e (2) ornitina transcarbamoilase, ambas encontradas nas mitocôndrias, e (3) argininossuccinato sintetase, (4) argininossuccinato liase e (5) arginase, enzimas citoplasmáticas. Como você pode observar, ocorre o transporte mediado por translocases da ornitina e da citrulina entre o citoplasma e o interior das mitocôndrias, sendo o ciclo da ureia um conjunto de reações que ocorrem em partes no citoplasma, e em partes na mitocôndria. - -32 3.4.5 Destino dos esqueletos carbônicos dos aminoácidos Em conjunto, os 20 α-cetoácidos produzidos a partir da transaminação dos 20 aminoácidos podem convergir na produção de seis produtos, entre eles Acetil-CoA, Piruvato, Oxaloacetato e outros intermediários do Ciclo de Krebs. Nesse ponto, eles podem ser consumidos e oxidados totalmente em gás carbônico e água, ou podem ser convertidos em outras macromoléculas. Aqueles aminoácidos cujos esqueletos carbônicos (na forma de α-cetoácidos) se destinam à síntese de Acetil-CoA são chamados de “cetogênicos”, pois, posteriormente, esse Acetil-CoA vai dar origem a corpos cetônicos. Já aqueles aminoácidos cujos esqueletos carbônicos (na forma de α-cetoácidos) se destinam à síntese de piruvato, oxaloacetato e outros intermediários do Ciclo de Krebs são chamado de “glicogênicos”, pois podem ser convertidos em glicose pela gliconeogênese (HARVEY, 2015). A imagem a seguir ilustra esse processo. Figura 20 - Destino dos esqueletos carbônicos dos 20 aminoácidos. Fonte: NELSON; COX, 2014, p. 711. Assim, comprova-se a versatilidade metabólica dos aminoácidos em nosso organismo, que podem ser muito mais do que apenas blocos de construção das proteínas. Vamos verificar se você foi capaz de compreender os principais conceitos associados ao metabolismo - -33 Vamos verificar se você foi capaz de compreender os principais conceitos associados ao metabolismo energético? Para tanto, realize a atividade proposta na sequência. 3.5 Regulação hormonal do ciclo absortivo e de jejum Basicamente, os processos bioquímicos vistos até agora são regulados a depender do momento em que seu organismo se encontra: alimentado ou em jejum. Saiba mais a seguir! 3.5.1 Estado alimentado e estado de jejum No estado alimentado, o hormônio predominante é a insulina. Nesse estado, a glicose advinda da alimentação é absorvida no intestino, e, pela corrente sanguínea, chega ao fígado onde poderá ser estocada na forma de glicogênio. Ainda no fígado, sob influência de insulina, essa glicose é degradada pela glicólise até piruvato, formando Acetil-CoA, que será utilizado como substrato para síntese de ácidos graxos (lipogênese), para serem estocados no tecido adiposo. Ainda no estado alimentado, a glicose é o principal combustível para o cérebro, e também é captada pelos músculos para produção de energia. Já os lipídios são absorvidos pelo sistema linfático e direcionados ao fígado, sendo acondicionados nas lipoproteínas (VLDL, LDL e HDL), e transportadas pelo organismo até o tecido adiposo para serem estocados e até os músculos para serem consumidos como fonte de energia. Já os aminoácidos advindos da dieta são absorvidos no intestino e via corrente sanguínea direcionados também ao fígado, utilizados principalmente como fonte para síntese proteica. Em linhas gerais, sob influência da insulina, as vias glicólise, lipogênese e glicogênese (síntese de glicogênio) estão ativadas. - -34 Figura 21 - Metabolismo geral no estado alimentado (absortivo). Fonte: NELSON; COX, 2019, p. 931. No estado de jejum, nosso organismo está sob influência do glucagon majoritariamente. Nesse momento, os estoques de lipídios e carboidratos são mobilizados. Os triacilgliceróis estocados no tecido adiposo sofrem lipólise intensa, liberando ácidos graxos livres na corrente sanguínea (lipólise). Esses ácidos graxos são captados pelos músculos para produção de energia e pelo fígado, onde sofrem beta-oxidação. No fígado, esse processo dá origem aos corpos cetônicos, posteriormente consumidos pelo cérebro e outros tecidos. O glicerol liberado da quebra dos triacilgliceróis serve como precursor da gliconeogênese, bem como muito aminoácidos provenientes da proteólise endógena no fígado. Associado à gliconeogênese, a glicogenólise hepática (quebra de glicogênio) auxilia na manutenção da glicemia, a fim de garantir um aporte de glicose constante ao cérebro. - -35 Figura 22 - Metabolismo geral no estado de jejum. Fonte: NELSON; COX, 2019, p. 934. Como observado, em linhas gerais, no estado de jejum, as vias da lipólise, da gliconeogênese e da glicogenólise estão ativadas, provendo substratos que, nas células, serão convertidos em energia para manutenção das suas funções. Antes de continuar seus estudos sobre os processos biológicos, reveja os principais temas abordados nesta unidade. Síntese Concluímos esta unidade sobre o metabolismo energético. Agora, você já conhece as principais macromoléculas energéticas e as principais vias metabólicas produtoras de energia em nosso organismo. Nesta unidade, você teve a oportunidade de: • Conhecer o conceito de metabolismo e entender como nossas células obtêm energia por meio dos alimentos; • Identificar os principais intermediários energéticos relacionados à conservação de energia nas células (ATP, NADH e FADH2); • Identificar as principais macromoléculas que podem ser utilizadas para produção de energia; • Conhecer como ocorre a digestão, absorção e transporte das principais macromoléculas; • Conhecer o rendimento energético e as etapas para a completa oxidação de carboidratos, lipídios e • • • • • - -36 • Conhecer o rendimento energético e as etapas para a completa oxidação de carboidratos, lipídios e aminoácidos.; • Conhecer as principais vias metabólicas na manutenção da glicemia nos períodos de jejum e alimentado. Bibliografia BAGGOTT, J. General Features of Fatty Acid Structure, 1997-1998. Disponível em: https://library.med.utah.edu . Acesso em: 27/08/2019./NetBiochem/FattyAcids/3_3.html BIOLOGY DICTIONARY. Adenosine Triphosphate (ATP). Disponível em: https://biologydictionary.net/atp . Acesso em: 27/08/2019./#prettyPhoto BORDONI, B.; SUGUMAR, K.; VARACALLO, M. Myofascial Pain. Treasure Island, FL: StatPearls Publishing, 2019. Disponível em: Acesso em: 29/08/2019.https://www.ncbi.nlm.nih.gov/books/NBK535344/. COELHO, L. S. et al. Deficiência de Tiamina como Causa de Cor Pulmonale Reversível. Arq. Bras. Cardiol. v. 91, n. 1, p. 7-9, 2007. GONÇALVES, R. S. Vitaminas Hidrossolúveis. In: Bioquímica do Tecido Animal. Programa de Pós-Graduação em Ciências Veterinárias. Porto Alegre: Universidade Federal do Rio Grande do Sul, 2013. Disponível em: . Acesso em: 27/08https://www.ufrgs.br/lacvet/site/wp-content/uploads/2013/10/vitam_hidroRodrigo.pdf /2019. HARVEY, A. R. Bioquímica Ilustrada. 5. ed. 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