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DOENÇA DE CHAGAS

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TBL 4 – DOENÇA DE CHAGAS 
DANIELA FRANCO 
EPIDEMIOLOGIA, ETIOLOGIA E TRANSMISSÃO 
EPIDEMIOLOGIA 
Acomete cerca de 6 a 7 milhões de infectados, 
principalmente na América Latina. Apenas a doença aguda 
e a reativação da doença de Chagas são de notificação 
compulsória. Devido ao elevado número de pacientes na 
forma crônica cardíaca, causa importante absenteísmo, e 
morbidade e mortalidade consideráveis. A urbanização e a 
globalização da doença de Chagas atingiram não só os países 
endêmicos como vários países não endêmicos, para cujas 
metrópoles migraram contingentes de pessoas infectadas 
em zonas rurais. Nos centros urbanos, deve-se atentar para 
o risco de reintrodução de mecanismos de transmissão, 
como transfusão de sangue e derivados, transplante de 
órgãos ou transmissão congênita, e a reativação da 
tripanossomíase, face à coinfecção com o vírus de 
imunodeficiência humana (HIV). 
A doença de Chagas ocorre endemicamente na América – 
do norte do México até a Argentina, e ao sul do Chile. De 
2000 a 2010, 138 surtos foram registrados, envolvendo mais 
de mil casos agudos, principalmente na Amazônia Brasileira, 
estando 71% deles associados à ingestão de bebidas e 
alimentos contaminados e 7% à transmissão vetorial. 
Dados recentes demonstram que a doença de Chagas se 
tornou problema de saúde pública em 19 países endêmicos, 
nas regiões rurais e nas grandes cidades, devido aos grandes 
movimentos migratórios, atingindo também países antes 
não endêmicos da Europa (Espanha, França, Itália, 
Inglaterra), Ásia (Japão), Austrália e América do Norte (EUA, 
Canadá), nos quais milhares de migrantes passaram a 
configurar fonte de infecção para transmissão por sangue e 
hemoderivados, transplante de órgãos e transmissão 
vertical, além da ocorrência da reativação em pacientes 
imunodeprimidos com a forma crônica da doença. 
AGENTE ETIOLÓGICO 
O T. cruzi é um protozoário hemoflagelado que parasita 
indivíduos ou animais infectados, na forma de 
tripomastigota, no sangue periférico e na forma de 
amastigota, nos tecidos. Utiliza a hematina obtida da 
hemoglobina sanguínea para respiração aeróbia. É 
transmitido por insetos (barbeiro) hematófilos do gênero 
Triatoma (vetores) para um hospedeiro vertebrado. 
O triatomíneo (barbeiro) injeta o parasito quando se 
alimenta do sangue do vertebrado. O protozoário se 
mantém no intestino do inseto do sexto ao 15 o dias 
seguintes, sob a forma de epimastigotas, que se multiplicam 
e migram para o intestino grosso ou reto, onde evoluem para 
a forma de tripomastigotas metacíclicos. Essas formas são 
eliminadas pelas fezes do inseto, enquanto ele se alimenta 
de sangue na pele do hospedeiro vertebrado, e penetram na 
pele com erosão ou com mucosas intactas. 
TRANSMISSÃO 
Vetorial Os vetores mais importantes são os triatomíneos 
dos gêneros Triatoma, contaminação após a picada, com 
deposição das formas infectantes após o repasto sanguíneo 
e inoculação destas após o ato de coçar a pele lesada no local 
da picada. Considerada a via mais comum de transmissão no 
país – antes do controle de T. infestans no estado de São 
Paulo, desde a década de 1970, e nacionalmente, desde 
junho de 2006. 
Oral Mecanismo de manutenção do ciclo do parasito na 
natureza, onde ocorre a ingestão de vetores e reservatórios 
infectados. Tem sido registrada na Amazônia, sob a forma de 
surtos epidêmicos desencadeados pelo consumo de 
alimentos acidentalmente contaminados (caldo de cana, 
açaí, bacaba, sucos) 
Transfusão de sangue e hemoderivados Uma das mais 
importantes vias de transmissão após o controle vetorial da 
doença no Brasil. A transmissão por via transfusional ocorre 
na ausência de triagem sorológica adequada dos doadores, 
preconizando-se atualmente no país apenas uma técnica de 
alto desempenho para triagem em bancos de sangue. 
Vertical Ocorre principalmente por via transplacentária, em 
qualquer fase da doença: aguda, indeterminada ou crônica. 
Transplante de órgãos Relevante quando não se realiza 
triagem adequada dos doadores, por meio de pelo menos 
duas provas sorológicas de altas sensibilidade e 
especificidade. Deve-se ressaltar que, sendo o receptor 
imunodeprimido, a doença aguda primária, caso ocorra, 
pode ter apresentação grave e disseminada. 
Acidentes perfurocortantes Transmissão por picada com 
agulha contaminada com sangue de paciente com elevada 
parasitemia ou acidentes laboratoriais foram registrados por 
inoculação em pele sã ou contato de mucosas com formas 
infectantes do parasito. 
FISIOPATOLOGIA 
O protozoário é fagocitado por macrófagos e se multiplica 
sob a forma de amastigotas no interior da célula até a sua 
ruptura, com liberação das formas íntegras ou degeneradas 
de epi, tripo e amastigotas, que se disseminam para o 
sangue e os tecidos, parasitando quaisquer células do 
organismo, exceto as hemácias. 
FORMA AGUDA 
Ocorre disseminação a partir do local da entrada para os 
gânglios linfáticos regionais, disseminando via vasos 
linfáticos e sanguíneos para todos os órgãos do organismo. 
A parasitemia por tripomastigotas é elevada, com resposta 
anticórpica em sangue periférico, migrando os parasitos 
para os tecidos, particularmente miocárdio e plexo 
mioentéricos. Além dos gânglios linfáticos regionais e 
generalizados e do miocárdio, a doença pode se disseminar 
para o tubo digestivo e os sistemas nervosos central e 
periférico (SNC e SNP), havendo ninhos de amastigota em 
todos os tecidos. Também pode ocorrer denervação intensa. 
Há resposta inflamatória devido ao parasito, sugerindo-se 
que, após a primeira semana, a amplificação da resposta de 
hipersensibilidade tardia aos antígenos do parasito 
contribua para a manutenção do infiltrado inflamatório em 
nível do miocárdio. 
FORMA CRÔNICA 
Nesta fase, a parasitemia é baixa e intermitente, estando os 
parasitos em infiltrados linfomononucleares focais no 
miocárdio e nos plexos mioentéricos, sob a forma de 
amastigotas. Epítopos comuns entre o parasito e a fibra 
cardíaca ou nervosa, e a escassez de parasitos, sugerem que 
a inflamação, na forma crônica, também se deva à 
reatividade cruzada entre tais epítopos, além da resposta ao 
parasito. Tem-se demonstrado a presença do parasito, e 
mesmo do seu DNA, nos focos inflamatórios no miocárdio, 
embora, na doença humana, ainda não se tenha 
estabelecido relação quantitativa entre sua presença, a 
intensidade do foco inflamatório e a evolução da 
cardiopatia. A parasitemia é baixa, e a multiplicação de 
amastigotas na fibra cardíaca deve facilitar a liberação de 
antígenos, que se incorporarão novamente às células 
cardíacas, servindo de alvo às células citotóxicas. 
Em função disso, o tratamento mais eficiente na forma 
crônica seria aquele que eliminasse as formas amastigotas 
nos tecidos, não sendo suficiente a supressão temporária da 
parasitemia. Propõe-se que, na forma crônica, haja 
predomínio de diferentes perfis, conforme a forma clínica. 
Na forma indeterminada, predomina a secreção de citocinas 
do tipo Th2, e na forma cardíaca, as do tipo Th1. Na 
miocardiopatia chagásica crônica, linfócitos T CD8+ 
citotóxicos, com poucos macrófagos, expressão de fator de 
necrose tumoral e moléculas de classe 1 do complexo 
principal de histocompatibilidade sugerem a participação de 
mecanismos citotóxicos destruindo a fibra cardíaca. 
Ocorrem fibrose no miocárdio e intensa denervação 
neuronal no plexo mioentérico. Também podem ocorrer 
cardiomegalia, dilatação e hipertrofia das câmaras, 
aneurismas e tromboses apicais, insuficiência mitral e 
tricúspide. Na forma digestiva, em consequência da 
destruição neuronal, ocorre dilatação do esôfago 
(megaesôfago) e/ou dilatação (megacolo) e alongamento 
(dolicolo) do colo. 
QUADRO CLÍNICO 
O período de incubação desde a infecção até os primeiros 
sinais e sintomas varia de acordo com a via de transmissão: 
• Transmissão vetorial: 5 a22 dias, mais 6 a 10 dias 
• Transmissão transfusional: de 20 a 30 dias 
• Transmissão vertical: transmitida em qualquer período 
da gestação, leite é raro 
• Transmissão oral: de 3 a 22 dias 
• Transmissão acidental: até 20 dias após exposição. 
Os indivíduos com infecção por T. cruzi podem apresentar o 
parasito no sangue, nos tecidos e órgãos por toda a vida, mas 
a parasitemia é mais elevada na fase aguda ou em fase de 
reativação da doença. 
FASE AGUDA A parasitemia dura de 1 a 3 meses e diminui 
espontaneamente com o aparecimento de anticorpos, 
independentemente de terapêutica antiparasitária. Na 
maior parte dos pacientes, a fase aguda pode ser 
oligossintomática, com desaparecimento dos sintomas após 
4 a 12 semanas, mas pode apresentar grave 
comprometimento miocárdico, meningoencefálico ou 
sistêmico (hepatoesplenomegalia, comprometimento do 
tubo digestivo) em neonatos, lactentes e pacientes idosos ou 
imunodeprimidos. A letalidade é de 5 a 10% em indivíduos 
sem imunodepressão conhecida; em imunodeprimidos, a 
letalidade pode atingir 100%, na ausência de tratamento 
precoce. 
Os chagomas de inoculação constituem a porta de entrada 
do parasito e são observados em cerca de 50% dos pacientes 
que adquiriram a infecção por vetor. O mais conhecido é o 
sinal de Romaña (edema indolor unilateral nas pálpebras 
superior e inferior, de cor róseo-violácea, acompanhado de 
hiperemia e congestão conjuntival), podendo também 
manifestar-se como lesão infiltrativa em rosto, tronco ou 
membros superiores e inferiores, acompanhada de 
aumento de linfonodos satélites. Esse edema tem sido 
atribuído a reações de hipersensibilidade à saliva do 
triatomíneo. Na transmissão por via transfusional, não são 
conhecidos sinais de porta de entrada, e na transmissão VO, 
hemorragias digestivas têm sido registradas como lesões de 
porta de entrada dos parasitos. 
➢ Síndrome febril com adenomegalia, hepato e 
esplenomegalia, exantema cutâneo e edema não 
inflamatório. síndrome similar à mononucleose 
infecciosa sem faringite, com adenomegalia regional, 
cervical e generalizada. O exantema pode ser variável, 
com máculas, pápulas, vesículas, petequial, purpúrico, 
ou apresentar características de outros exantemas. 
Após o aparecimento do sinal de Romaña, ocorre edema 
não inflamatório, inicialmente em face, bipalpebral e 
bilateral, que pode acometer os membros superiores e 
inferiores, e comumente é registrado na fase aguda da 
doença de Chagas, não tendo causa conhecida. 
➢ Miocardite. Ocorre sob a forma de taquicardia sinusal, 
arritmias, com ou sem sopro sistólico mitral, com ou 
sem cardiomegalia. O exame mais sensível é o 
eletrocardiograma de repouso (ECG), com alterações 
primárias na repolarização ventricular, complexos QRS 
de baixa voltagem, bloqueio atrioventricular de 
primeiro grau e arritmias atriais ou ventriculares. 
➢ Meningoencefalite. Ocorre nas formas graves, com 
parasitos no liquor e hipercelularidade, com predomínio 
de células linfomononucleares e hiperproteinorraquia. 
 
FASE CRÔNICA parasitemia é baixa e intermitente. 
Inicialmente, assintomática e sem sinais de 
comprometimento cardíaco e/ou digestivo. Pode se 
apresentar: 
➢ Forma indeterminada: Representa o início da fase 
crônica da doença, mas pode permanecer pelo resto da 
vida, afetando cerca de 40 a 60%, 20 a 30 anos após a 
contaminação. Paciente assintomático, normal ao 
exame físico, com ECG de repouso sem alterações e 
radiografias do coração, esôfago e colo normais. Esse 
quadro pode perdurar por toda a vida do indivíduo 
infectado ou evoluir para a forma cardíaca, digestiva ou 
associada 
➢ Forma cardíaca: 
Ocorre em 30 a 40% dos pacientes nas áreas endêmicas do 
Brasil, sendo mais comum em adultos jovens (geralmente 
homens, com idade superior aos 25 anos). 
As síndromes mais comumente observadas são: (a) 
insuficiência cardíaca congestiva (ICC), (b) arritmias; (c) 
distúrbios de condução, com bloqueios atrioventriculares 
(d) acidentes tromboembólicos. 
O ecocardiograma sugere miocardiopatia com disfunção 
ventricular (fração de ejeção – FE < 55%), estando associada 
à insuficiência cardíaca com ou sem sinais de congestão. 
Classes funcionais da insuficiência cardíaca: 
Classe funcional I (indivíduo assintomático a limitação para 
esforços, similarmente aos indivíduos normais); Classe 
funcional II (sintomas ao exercer atividades cotidianas como 
tomar banho, lavar louça); 
Classe funcional III (sintomas causados por atividades menos 
intensas que as cotidianas ou aos pequenos esforços); 
Classe funcional IV (sintomas encontrados inclusive ao 
repouso). 
 
Outro fator é o surgimento de áreas discinéticas/acinéticas 
com a formação de aneurismas na região apical dos 
ventrículos, que funcionam como focos de arritmia e 
embolias. O ECG mostra alterações na condução no ritmo e 
na morfologia. Podendo ter: Bradicardia sinusal (menor de 
50 bpm) Taquicardia sinusal, Extrassístoles ventriculares 
polifocais, Fibrilação e flutter atrial, Alteração de condução, 
Bloqueio completo de ramo direito, Bloqueio da divisão 
anterossuperior entre outros. 
Em geral, a insuficiência cardíaca ocorre com miocardiopatia 
dilatada com falência do miocárdio, podendo ocorrer 
pericardite; costuma evoluir insidiosa ou rapidamente para 
a morte. O estudo radiológico de área cardíaca pode mostrar 
o seu aumento, o ecocardiograma mostra hipomotilidade de 
todo o coração ou da região apical e os trombos podem ser 
vistos na superfície do endocárdio, podendo originar 
êmbolos no coração e em outros órgãos. 
➢ Forma digestiva 
Megaesôfago O paciente com megaesôfago apresenta 
dificuldade de deglutição ou disfagia progressiva a sólidos e 
depois a líquidos, dor retroesternal (causada pela esofagite 
de refluxo), regurgitação, hipersalivação e hipertrofia da 
glândula parótida. Desnutrição e caquexia com 
broncoaspiração são registradas nas formas mais graves, e, 
como complicação, a broncopneumonia pode levar ao óbito. 
O megaesôfago pode ser classificado conforme o grau de 
dilatação, coordenação motora e tempo de trânsito, em 
quatro grupos: 
Grupo I: ausência de estase, com tempo de trânsito 
aumentado da boca ao estômago, embora o diâmetro do 
esôfago esteja dentro dos limites normais 
Grupo II: dilatação moderada do esôfago e incoordenação 
motora 
Grupo III: dilatação e tempo de trânsito mais pronunciados, 
e atividade motora diminuída 
Grupo IV: formas avançadas com grande dilatação e 
alongamento do esôfago (dolicomegaesôfago). 
Em geral, grande parte dos casos de megaesôfago se 
encontra nos grupos II e III. Alongamento de vísceras (dolico) 
e dilatação do órgão são descritos principalmente no 
esôfago e no colo. 
Megacolo há obstipação de grau variável de 6 dias a 6 meses, 
com fecaloma. Como complicação do colo alongado 
(dolicocolo), pode ocorrer torção do colo sobre a sua própria 
raiz, bloqueando a circulação e causando quadro grave 
conhecido por vólvulo, associado a abdome agudo, que pode 
causar o óbito do paciente. 
 
DOENÇA DE CHAGAS EM IMUNODEPRIMIDOS 
Em pacientes imunodeprimidos com doença de Chagas 
crônica e infecção por vírus HIV, doenças linfoproliferativas 
– sob uso de terapêutica imunossupressora, ou com doença 
de Chagas crônica, submetidos a transplante de órgãos, há 
risco de reativação da parasitose (20 a 30% em transplantes 
e 10% em coinfecção HIV/T. cruzi) por causa da deficiência 
dos mecanismos de controle de parasitemia, em geral 
associados à deficiência de resposta T mediada com 
deficiência de macrófagos. 
 
DIAGNÓSTICO 
Na forma aguda, o leucograma apresenta linfocitose e 
atipia; na meningoencefalite, são encontradas formas 
tripomastigotas, além de pleocitose e hiperproteinorraquia 
no liquor. Para o manejo do paciente em casos em que 
ocorra icterícia ou hemorragia digestiva, são necessárias 
avaliações funcionais hepáticase exames laboratoriais, se 
esse apresentar hipotensão, choque etc. Para avaliação da 
função cardíaca, o ECG mostra alterações de ritmo, 
condução e morfologia, e a eletrocardiografia dinâmica 
detecta melhor as alterações de ritmo. Embora o estudo 
radiológico de tórax possa evidenciar cardiomegalia e 
congestão pulmonar, o ecocardiograma é mais fidedigno 
para avaliação dos aspectos funcionais das aurículas e 
ventrículos, e de áreas de hipomotilidade. Para avaliação 
dos megas, o estudo radiológico contrastado do esôfago e 
do colo orienta sobre a morfologia e a função dos diversos 
órgãos, e a endoscopia digestiva alta e 
colonoscopia/retossigmoidoscopia complementam 
informações sobre a mucosa digestiva e outras alterações 
funcionais ou anatômicas. 
DIAGNÓSTICO ETIOLÓGICO 
O diagnóstico etiológico da doença de Chagas pode ser feito 
por meio dos exames parasitológico, sorológico, histológico 
e molecular. 
FASE AGUDA Microscopia direta no sangue periférico ou 
líquidos biológicos. A pesquisa é inicialmente realizada no 
sangue a fresco. Esses exames podem ser repetidos 
mediante suspeita clínica ou epidemiológica de doença de 
Chagas aguda, principalmente nas primeiras 3 a 4 semanas, 
a partir das quais a positividade diminui. O teste de gota 
espessa tem sido útil na região amazônica, onde 10% dos 
casos febris sem a identificação de Plasmodium foram 
positivos para T. cruzi. Na ausência do parasito em exame 
direto do sangue periférico, o exame histopatológico da 
lesão suspeita também pode confirmar o diagnóstico, caso 
indique ninhos de amastigota em meio a infiltrado 
inflamatório nos tecidos. 
Histopatologia Nos casos de reativação, a pesquisa por 
ninhos de amastigotas em meio a infiltrado inflamatório 
agudo nos tecidos (achado sugestivo de fase aguda) é mais 
sensível nos tecidos em que ocorreu a reativação do que no 
sangue periférico (miocárdio, encefalites). 
Provas sorológicas A partir do final da terceira semana, 
ensaio imunoenzimático, reação de imunofluorescência 
indireta e de hemaglutinação indireta. Anticorpos da classe 
IgM podem sugerir fase aguda, mas, devido à falta de padrão 
positivo e à ocorrência de reatividade cruzada em várias 
infecções, só podem ser investigados com confiabilidade em 
poucos laboratórios no Brasil. Para se confirmar um caso 
agudo por IgG são necessárias duas coletas, com intervalo de 
21 dias entre elas, com demonstração de soroconversão. Na 
fase aguda, o diagnóstico por meio da PCR é de uso restrito, 
sendo útil nos pacientes previamente não imunes 
(sorologicamente negativos) devido à sua elevada 
sensibilidade. Essa prova é positiva na fase crônica, mas não 
diferencia pacientes nesta fase dos de fase aguda, exceto se 
previamente não infectados. 
FASE CRÔNICA Provassorológicas ELISA, reação e 
imunofluorescência indireta e reação de hemaglutinação 
indireta O padrão-ouro para o diagnóstico é representado 
pela descoberta de anticorpos IgG anti-T. cruzi por 
imunoensaio (ELISA), imunofluorescência indireta ou 
hemaglutinação indireta, com elevada sensibilidade 
(embora sem a especificidade ideal), ocorrendo reatividade 
cruzada com outras doenças, conforme referido. 
Recomenda-se a utilização de duas técnicas distintas ou o 
imunoensaio com antígenos diferentes. Considera-se que há 
infecção mediante exame positivo por duas técnicas ou pela 
mesma técnica em duas amostras diferentes. Não há 
obrigatoriedade de notificação compulsória dos pacientes 
na fase crônica da doença de Chagas. Diante de pacientes 
que apresentam provas sorológicas inconclusivas (uma 
positiva e uma negativa ou duvidosa, ou duas duvidosas) ou 
resultados contraditórios em diferentes amostras (uma 
positiva e outra negativa ou duvidosa). 
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL 
O diagnóstico diferencial, na fase aguda, deve considerar o 
sinal de Romaña, devidamente diferenciado das picadas do 
inseto. Doenças que evoluem como síndrome similar à 
mononucleose infecciosas (toxoplasmose, mononucleose 
infecciosas por vírus Epstein-Barr [EBV] e por CMV), que 
evoluem com hepatoesplenomegalia (leishmaniose visceral, 
malária, febre tifoide, sepse e doenças autoimunes), 
doenças febris com exantema e/ou icterícia, hemorragia 
(leptospirose, dengue, febre amarela e outras arboviroses, 
meningococcemia, sepse, hepatites virais, febre purpúrica 
brasileira, hantaviroses e riquetsioses), e outras causas de 
miocardite (vírus Coxsackie) e meningoencefalite também 
devem ser consideradas, sendo excluídas, porém, na 
ausência de porta de entrada. 
Em pacientes com AIDS, devem ser consideradas outras 
causas de encefalite (neurotoxoplasmose, linfoma, 
tuberculose e micoses do SNC). 
O diagnóstico diferencial de cardiomiopatia crônica deve 
incluir doenças isquêmicas e hipertensivas, outras 
cardiomiopatias e derrame pericárdico. 
Na forma digestiva, o diagnóstico diferencial deve considerar 
também outras formas de megas (congênito) e carcinoma 
associado aos megacolo, causando quadros obstrutivos. 
TRATAMENTO 
Tratamento antiparasitário O medicamento disponível no 
país é um benzimidazólico (benznidazol). Na fase aguda e 
nas formas de reativação, o tratamento deve ser indicado 
em todos os casos, e o mais rápido possível após a 
confirmação diagnóstica. O tratamento antiparasitário é 
seguido de resposta terapêutica sugestiva de cura 
(soroconversão negativa) na maioria dos casos agudos (> 
60%) e congênitos (> 95%), apresentando ainda boa eficácia 
em 50 a 60% em casos crônicos recentes (com até 5 anos de 
infecção). 
Em virtude da toxicidade dos fármacos disponíveis, não é 
recomendado o tratamento durante a gestação, a menos 
que se trate de caso agudo e grave. Na forma indeterminada 
e cardiopatia não grave por longo período e observação de 
controle da evolução de alterações cardíacas, tem-se 
proposto o tratamento de todas as formas crônicas, exceto 
as graves e descompensadas, e em pacientes idosos com 
mais de 50 anos de idade. 
Tratamento de suporte A internação hospitalar é indicada 
em casos de maior comprometimento geral, cardiopatia de 
moderada a grave, quadros hemorrágicos e formas agudas 
graves, e reativação da doença de Chagas. O tratamento 
sintomático da insuficiência cardíaca deve ser realizado com 
dieta com restrição hídrica e sódica, sintomáticos e 
diuréticos, sendo por vezes indicados os cardiotônicos em 
doses baixas. Pode-se utilizar amiodarona e outros 
antiarrítmicos. Refluxo esofágico deve ser tratado com 
orientação sobre postura e dieta. Educação intestinal, dieta 
e supositórios podem ajudar o paciente com obstipação, 
estando indicado esvaziamento de fecaloma mediante 
orientação específica, com esvaziamento mecânico quando 
localizado no reto, ou lavagem intestinal (clister) em outras 
localizações. 
Tratamento cirúrgico Técnicas não invasivas (dilatação do 
segmento inferior) ou ressecção cirúrgica são indicadas para 
a correção do megaesôfago, particularmente em graus 
avançados. O tratamento cirúrgico do megacolo é indicado 
para as formas mais graves (casos avançados) e quando há 
vólvulo. 
REFERÊNCIA 
1- Salomão, Reinaldo. Infectologia: bases clinicas e 
tratamento – 1. Ed – Rio de Janeiro: Guanabara 
Koogan, 2017.

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