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PÓS-GRADUAÇÃO 
LATO SENSU 
ÉTICA E VALORAÇÃO 
AMBIENTAL 
 
SUMÁRIO 
 
ÉTICA E VALORAÇÃO AMBIENTAL ....................................................................... 
VALORIZAÇÃO DA VIDA NA ÉTICA AMBIENTAL .............................................. 
PANORAMA ÉTICO ..................................................................................................... 
ÉTICA E O MEIO AMBIENTE ..................................................................................... 
ECOLOGIA PROFUNDA .............................................................................................. 
QUESTIONANDO OS FUNDAMENTOS FILOSÓFICOS DA ECOLOGIA 
PROFUNDA .................................................................................................................... 
ÉTICA AMBIENTAL: PRINCIPAIS PERSPECTIVAS TEÓRICAS E A RELAÇÃO 
HOMEM-NATUREZA ................................................................................................... 
ANTROPOCENTRISMO ............................................................................................... 
AÇÃO MORAL FACE À NATUREZA NA TEORIA ANTROPOCÊNTRICA .......... 
CRÍTICAS DO ANTROPOCENTRISMO AO ECOCENTRISMO .............................. 
Crítica do Antropocentrismo ao Personalismo ............................................................... 
ECOCENTRISMO .......................................................................................................... 
AÇÃO MORAL FACE À NATUREZA NA TEORIA ECOCÊNTRICA ..................... 
CRÍTICAS DO ECOCENTRISMO ................................................................................ 
Crítica do Ecocentrismo ao Antropocentrismo ............................................................... 
Crítica do Ecocentrismo ao Personalismo ....................................................................... 
ECOLOGISMO PERSONALISTA ................................................................................ 
AÇÃO MORAL FACE À NATUREZA NO ECOLOGISMO PERSONALISTA ....... 
CRÍTICAS DO ECOLOGISMO PERSONALISTA ...................................................... 
 
Crítica do Ecologismo Personalista ao Antropocentrismo ............................................. 
Crítica do Ecologismo Personalista ao Ecocentrismo ..................................................... 
CONCLUSÃO ................................................................................................................. 
REFERÊNCIAS .............................................................................................................. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
ÉTICA E VALORAÇÃO AMBIENTAL 
 
 
 
 
Uma das principais questões debatidas atualmente quando se trata das relações entre 
os sistemas econômicos e os sistemas ecológicos ou ambientais refere-se ao processo 
de se associar valores econômicos aos bens e serviços ambientais. O processo de 
valoração econômica do meio ambiente tem-se constituído em um amplo e 
importante campo de pesquisas teóricas e trabalhos empíricos. Claramente, por tratar-
se de um ramo da ciência que envolve o comportamento humano, não é desprovido 
de controvérsias, advindas de preferências teóricas e metodológicas. 
Em um esforço de síntese identifica-se duas áreas de conhecimento onde os estudos e 
exercícios sobre valoração tem evoluído – a economia do meio ambiente e a 
economia ecológica. 
 
Os estudos da economia do meio ambiente e dos recursos naturais baseiam-se 
no entendimento do meio ambiente como um bem público e dos efeitos ambientais, 
como externalidades geradas pelo funcionamento da economia. Assim, os valores dos 
bens e recursos ambientais e dos impactos ambientais, não captados na esfera de 
funcionamento do mercado, devido a falhas em seu funcionamento, podem ser 
 
estimados, na medida em que se possa descobrir qual a disposição da sociedade e dos 
indivíduos a pagar pela preservação ou conservação dos recursos e serviços 
ambientais. De forma geral, o valor econômico dos recursos ambientais tem sido 
desagregado na literatura da seguinte maneira: Valor econômico total (VET) = Valor 
de uso (VU) + valor de opção (VO) + Valor de Existência (VE). 
 
O valor de uso (VU) representa o valor atribuído pelas pessoas pelo uso, 
propriamente dito, dos recursos e serviços ambientais. O VU é composto pelo valor 
de Uso Direto (VUD) e pelo Valor de Uso Indireto (VUI). O VUD corresponde ao 
valor atribuído pelo indivíduo devido a utilização efetiva e atual de um bem ou 
serviço ambiental, por exemplo, extração, visitação ou alguma outra forma de 
atividade produtiva ou consumo direto, com relação às florestas, e VUI representa o 
benefício atual do recurso, derivado de funções ecossistêmicas como, por exemplo, a 
proteção do solo, a estabilidade climática e a proteção dos corpos d’água decorrentes 
da preservação das florestas. O Valor de Opção (VO) representa aquilo que pessoas 
atribuem no presente para que no futuro os serviços prestados pelo meio possam ser 
utilizados. Assim, trata-se de um valor relacionado a usos futuros que podem gerar 
alguma forma de benefício ou satisfação aos indivíduos. Por exemplo, o benefício 
advindo de fármacos desenvolvidos com base em propriedades medicinais ainda não 
descobertas de plantas existentes nas florestas. O terceiro componente, o Valor de 
Existência (VE), se caracteriza como um valor de não-uso. Esta parcela representa um 
valor atribuído à existência de atributos do meio ambiente, independentemente, do 
uso presente ou futuro. Representa um valor conferido pelas pessoas a certos recursos 
ambientais, como florestas e animais em extinção, mesmo que não tencionem usá-los 
ou apreciá-los na atualidade ou no futuro. A atribuição do valor de existência é 
derivada de uma posição moral, cultural, ética ou altruística em relação aos direitos de 
existência de espécies não-humanas ou da preservação de outras riquezas naturais, 
mesmo que estas não representem uso atual ou futuro para o indivíduo. 
 
Existem diversos métodos de valoração que objetivam captar estas distintas 
parcelas do valor econômico do recurso ambiental. Todavia, cada método apresenta 
limitações em suas estimativas, as quais estarão quase sempre associadas ao grau de 
sofisticação metodológica, a necessidade de dados e informações, às hipóteses sobre 
comportamento dos indivíduos e da sociedade e ao uso que se será dado aos 
resultados obtidos. 
 
A Economia Ecológica, por sua vez, constitui-se em uma abordagem que 
procura compreender a economia e sua interação com o ambiente a partir dos 
princípios físicos e ecológicos, em meio aos quais os processos econômicos se 
desenvolvem. Em termos gerais, os métodos de valoração baseados nesta abordagem 
utilizam o montante de energia capturada pelos ecossistemas como uma estimativa do 
seu potencial para a realização do trabalho útil para a economia. Este processo de 
valoração, geralmente, utiliza do conceito de Produção Primária Bruta de um 
ecossistema. A Produção Primária Bruta é uma medida da energia solar utilizada 
pelas plantas para fixar carbono. Assim, a energia solar capturada pelo sistema é 
convertida em equivalente de energia fóssil. Posteriormente, faz-se a transformação 
deste equivalente em energia fóssil em unidades monetárias, utilizando-se uma 
relação entre o Produto Interno Bruto e o total de energia usada pela economia. O 
método da análise energética propõe definir os valores ecológicos dos ecossistemas 
em função dos custos da energia envolvida na sua produção: a quantidade de energia 
necessária para a organização de estrutura complexa, como o ecossistema, pode servir 
como medida de seu custo de energia, de sua organização e de seu valor. 
 
Outro método que adota, em termos gerais, os mesmos princípios, chama-se 
análise emergética que considera todos os fluxos de energia, materiais e informação 
que ocorrem emum sistema, e os transforma em uma única base, em unidades de 
 
energia solar, e posteriormente também utiliza o Produto Interno Bruto para encontrar 
valores econômicos para os sistemas ambientais. 
 
Cada abordagem e método apresenta vantagens e desvantagens, compreender 
suas limitações e procurar avanços na compreensão dos fenômenos naturais e do 
entendimento econômico orientados pelo objetivo maior, que é o desenvolvimento 
sustentável, é o desafio presente para todas as correntes de pensamento. 
 
 
VALORIZAÇÃO DA VIDA NA ÉTICA AMBIENTAL 
 
 
 
 
Práticas devastadoras foram feitas pelo homem ao longo de toda história da 
humanidade e causaram, inclusive, a diminuição de muitos recursos naturais e várias 
espécies. Com o advento da Revolução Industrial essas práticas se tornaram 
agressivas e incontroláveis. A preocupação com a qualidade de vida deu lugar à 
concorrência desenfreada pelo mercado, por sua vez, cada vez mais consumista. A 
 
cultura capitalista fez com que houvesse uma completa inversão de valores. Como 
adverte Jean Dorst: 
Pode-se constatar cada vez mais nitidamente que as atividades humanas estão 
prejudicando nossa própria espécie. O homem intoxica-se envenenando, no sentido 
literal do termo, o ar que respira, a água dos rios e o solo de suas culturas. Práticas 
agrícolas deploráveis empobrecem a terra de forma por vezes irrecuperável, e uma 
exploração excessiva dos mares está reduzindo os recursos que deles poderiam ser 
extraídos. 
 
Historicamente falando: 
Poderíamos dizer que o homem desde o primeiro ato dirigido à domesticação, 
à sujeição, a subjugação da natureza iniciou o processo de manipulação do ambiente 
natural, transformando comportamentos e paisagens, processo este que durante 
séculos não resultou na reflexão humana sobre seu próprio ato. 
É preciso haver uma mudança cultural da sociedade em relação à visão do 
meio ambiente ecologicamente equilibrado. Não somente à sociedade brasileira, mas 
à população mundial em geral, pois o Planeta Terra, contrariamente aos interesses 
políticos e econômicos, deve ser visto como um todo, pertencente à humanidade, das 
presentes e futuras gerações, direito constitucionalmente garantido através do caput 
do artigo 225, da Constituição Federal de 1988. 
Embora esse preceito constitucional venha 
para assegurar o respeito para com o meio 
ambiente, há nele, resquícios da supremacia da 
raça humana sobre o resto do planeta, como se 
existisse uma relação de domínio, uma 
“serventia” a favor do homem no intuito de suprir 
suas necessidades, segundo Olmiro Ferreira da Silva. 
 
No decorrer dessas últimas décadas, o homem finalmente está percebendo que 
a Terra é finita, que seus recursos, que vêm sendo utilizados de maneira 
descontrolada vão necessariamente esgotar-se. Porém, somente com a possibilidade 
de ver a vida humana ameaçada é que realmente parece conseguir atingir a 
consciência da população para que o rumo dos acontecimentos seja modificado. 
 
Depois da década de 70, mais especificamente com a Conferência Mundial 
sobre o Meio Ambiente, realizada em Estocolmo, na Suécia, de 5 a 16 de junho de 
1972, a preocupação com o meio ambiente cresceu consideravelmente. Mobilizações 
não só governamentais como também da própria população vêm ocorrendo em 
diversos pontos do mundo. 
 
 
 
Também observam-se vários ramos da ciência preocupados com o meio 
ambiente, como é o caso das engenharias, da arquitetura e, até mesmo do direito. A 
 
tecnologia, que durante muito tempo voltou-se para a produção em larga escala e 
quase sem nenhum controle de biossegurança, está agora dirigida para uma produção 
que seja economicamente sustentável, ou seja, de acordo com a possibilidade de 
recomposição dos recursos naturais. Por isso, ocorrerá naturalmente a busca por 
recursos renováveis ao invés dos esgotáveis. 
 
A educação ambiental em todas as camadas sociais tem que acontecer, desde a 
infância, nas escolas, dentro dos lares, enfim, nos mais diversos setores da sociedade. 
Então, aos poucos, a visão do homem como soberano sobre tudo e todo poderá 
modificar-se e passaremos a ver-nos como somente mais uma espécie que habita esse 
Planeta, uma espécie importante por justamente ter a possibilidade de desenvolver 
uma consciência sobre os seus atos e, portanto, ter o dever, mais do que nenhuma 
outra, de proteger todas as demais. No Brasil, já temos garantido 
constitucionalmente, conforme estabelece o artigo 225, VI, da Constituição Federal 
de 1988, como dever do Poder Público “[...] promover a educação ambiental em 
todos os níveis de ensino e a conscientização pública para preservação do meio 
ambiente; [...]” 
 
Por algum tempo, foram deixadas de lado as preocupações de primordial 
importância para o homem como 
ser humano, que são seus valores 
éticos. Porém, é cada vez mais 
evidente a tentativa de resgate, a 
necessidade de convivência 
harmônica com os demais 
indivíduos e destes com o 
ambiente em que estão inseridos, 
 
sem que isso se contraponha com a luta por condições de vida financeiramente 
melhores. 
 
Este artigo surge no sentido de demonstrar a necessidade de atitudes 
eticamente corretas na relação do homem com os demais seres vivos e com o 
Planeta. 
 
Na tentativa de demonstrar mais especificamente a preocupação com a vida, a 
biossegurança será abordada, por representar a necessidade de assegurar toda forma 
de vida. Para fundamentá-la teoricamente o princípio da precaução será exposto 
como uma forma de garantir que as atitudes só sejam tomadas quando se tenha a 
certeza de que não trarão consequências maléficas para o meio ambiente e todas as 
espécies nele existentes. 
 
O tema está estruturado em três capítulos. O panorama ético é abordado no 
primeiro título, relacionando a ética com o meio ambiente. A Ecologia Profunda, 
como corrente ética mais radical é analisada no segundo título e questionada, 
evidenciando o conflito teórico existente, já no terceiro título. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
PANORAMA ÉTICO 
 
 
 
 
 
 
 
 
Em busca da solução para os problemas enfrentados na atualidade é necessária 
uma reflexão ética sobre o que importa para a nossa sociedade confrontado com o 
que realmente deveriam ser tomados como valores. 
 
Como ponto de partida dessa reflexão há o questionamento da superioridade da 
raça humana sobre as demais espécies, pois essa crença aparece como base em 
muitas áreas de pensamento e tem consequências desastrosas e ilimitadas nas 
relações com o todo. 
 
Trata-se de uma discussão ética, pois tal crença da superioridade do ser 
humano está enraizada em nossa cultura e não pode ser discutida somente no caso a 
caso, conforme as contradições apareçam. 
 
É certo que os costumes da moderna sociedade de consumo têm ligação direta 
com a maneira como elas agem, mas nada impede que ocorra justamente uma 
oposição a eles. Daí a importância da reflexão sobre as atitudes e não a simples 
continuação delas pelo fato de “sempre ter sido assim”. Pôr em dúvida práticas 
comuns, mas que possam vir a ser consideradas erradas, justamente por serem 
questionadas, é o que traz a evolução. Estas crenças têm como fundamento a 
 
inesgotabilidade do ambiente e a incontrolável busca de satisfação dos desejos de 
consumo. 
 
 
 
 
 
Ao contrário do que muitos pensam, a ética não se resume a teorias distantes 
do que acontece na realidade, seus juízos servem, fundamentalmente, para orientar 
nossa prática. De acordo com o filósofo Peter Singer, em sua obra Ética Prática, 
1998, existem várias teorias. Há quem entenda que a ética se resuma a um sistema de 
normas, os deontologistas, que só conseguem salvar seu ponto de vista quando 
encontram normas mais complexas e específicas que não sejam conflitantes. Existem 
também os consequencialistas, cujos adeptos ao invés de partirem de regras morais 
partem deobjetivos, assim, a qualidade das atitudes é diretamente proporcional ao 
favorecimento de seus objetivos. 
 
Ainda segundo o referido autor, dentro do consequencialismo existem várias 
teorias, dentre essas, a utilitarista é a mais conhecida. Para a visão clássica do 
utilitarismo, agir corretamente significa trazer um aumento da felicidade dos que são 
atingidos por essa atitude e erroneamente se ela não conseguir trazê-lo. 
 
Seguindo conforme a análise do mesmo autor, há também as teorias subjetivas, 
segundo as quais os juízos éticos dependem da aprovação ou desaprovação da pessoa 
que está emitindo o juízo, e não da sociedade na qual vive essa pessoa. Porém, nem 
 
todas, mas algumas formas de subjetivismo ético não conseguem solucionar os 
problemas que se apresentam. Como, por exemplo, a tentativa de explicar as 
divergências éticas. 
 
Questiona-se se os juízos éticos expressam normativamente comportamentos 
ao invés de descrevê-los, e, então discorda-se sobre a ética porque, ao demonstrar 
certa atitude, tentasse fazer com que aqueles que a ouvem adotem uma atitude de 
acordo, é o que acredita C.L. Stevenson. Diferentemente para R. M. Hare, os juízos 
éticos são preceitos e, portanto, estão mais diretamente relacionados a ordens do que 
a enunciações de fatos. Ou ainda, para J.L. Mackie, talvez o legado da crença em que 
a ética é um sistema de leis de Deus, ou, talvez, apenas mais um exemplo de nossa 
tendência a objetivar as necessidades e preferências pessoais. 
 
A questão do papel que a razão pode representar na ética é o ponto principal 
colocado pela afirmação de que a ética é subjetiva. Portanto, o que se deve mostrar 
para colocar a ética em prática em bases sólidas, é o fato de que o raciocínio ético é 
possível. 
 
Segundo Peter Singer, a ética diz respeito a uma concepção. Ela deve ser 
universal, afinal, se pretendo defender uma determinada conduta eticamente, é 
preciso que ela se justifique como um bem para um alvo maior do que somente ao 
indivíduo. Portanto, de um ponto de vista utilitário, a ética exige que os limites do 
individual sejam transpassados e cheguem a uma lei universal, tendo como 
espectador um observador ideal. 
 
Sua posição é utilitarista, para ele o aspecto universal da ética leva a assumir 
uma posição francamente utilitária. Assim, a preocupação com os próprios interesses 
deve ser estendida aos interesses dos outros no pensamento ético. “E a postura 
 
utilitária seria uma posição mínima, uma primeira base na qual chegamos quando 
universalizamos a tomada de decisões com base no interesse próprio”. 
 
Toda essa reflexão serve de auxílio na tentativa de agir corretamente ou pelo 
menos, coerentemente, em relação ao todo que cerca a pessoa, aos semelhantes, às 
demais espécies, ao ambiente de um modo geral. 
 
 As atitudes do homem não podem ser baseadas somente naquilo que é 
confortável para ele mesmo. É preciso que as consequências dos atos sejam também 
avaliadas num âmbito universal. Por isso costuma-se dizer que deve a ação ser local, 
mas a perspectiva global. 
 
 
ÉTICA E O MEIO AMBIENTE 
 
 
Desde a Antiguidade, as culturas hebraicas e gregas fizeram o ser humano o 
centro do universo moral, e não somente o núcleo, mas a preferência totalitária das 
características moralmente significativas do mundo. 
 
Para o antropocentrismo clássico o homem é o centro do mundo, o limite de 
cada coisa, de onde emanam todos os valores. Tem como base filosófica o 
humanismo que, de acordo com um dicionário especializado possui dois significados 
distintos: I) o movimento literário e filosófico que teve suas origens na Itália, na 
segunda metade do séc. XIV e da Itália difundiu-se para os demais países da Europa, 
constituindo a origem da cultura moderna; II) qualquer movimento filosófico que 
tenha como fundamento a matéria humana ou os limites e interesses do homem. 
 
 
Esta posição humana vem sendo questionada e suas práticas consideradas não 
mais aceitas, trata-se da superação do paradigma antropocêntrico, por uma nova 
visão de mundo, com valores recentes. 
 
Contudo, para uma reflexão inicial sobre essas mudanças, faz-se necessária 
uma análise do conceito de paradigma. Dentro desse exame, Thomas Kuhn, definiu: 
 
Paradigmas (do grego, parádeigma) são realizações científicas universalmente 
reconhecidas que, durante um período de tempo, fornecem problemas e soluções 
modelares para uma comunidade de praticantes da ciência. Nessa concepção, um 
primeiro sentido sociológico do conceito de paradigma indica toda a constelação de 
crenças, valores, procedimentos e técnicas partilhadas no consenso de uma 
comunidade determinada. Num segundo e mais profundo sentido, denota um tipo de 
elemento dessa constelação: as soluções concretas de quebra-cabeças que, 
empregadas de forma modelar ou exemplar, podem substituir regras explícitas como 
base para a solução dos demais problemas da ciência normal. 
 
Somente após a devida articulação das experiências e teoria experimental 
ratificando a novidade relativa aos fatos, ou seja, de descoberta é que a simples teoria 
dá passagem à nova síntese: o paradigma. 
 
O novo paradigma traz consigo uma ética preocupada com a universalidade, 
que considera as consequências dos atos humanos em relação ao todo. E mais, tira o 
homem do centro das preocupações e quer trazer o ambiente para o foco principal, 
sem é claro, desconsiderar o primeiro, mas conseguindo definir preocupações que 
não atinjam-no de modo direto, somente como parte do meio. Nisso encontra-se o 
grande desafio de como atribuir importância à preservação dos animais, das espécies, 
 
das árvores e do ecossistema, sem considerarmos os interesses dos seres humanos, 
sejam eles econômicos, de lazer ou científicos. 
 
 
ECOLOGIA PROFUNDA 
 
Há cerca de quarenta anos nasceu a ecologia profunda, através dos escritos de 
Aldo Leopold que criou uma “nova ética”, uma ética que trata da relação do homem 
com a terra, os animais e as plantas que nela vivem”. Essa ética ampliaria “as 
fronteiras da comunidade de modo a incluir o solo, a água, as plantas e os animais, 
ou, coletivamente falando, a terra”. 
 
Nos anos 70 iniciou uma onda de preocupações ambientais, em 1972 ocorreu a 
Conferência Mundial sobre o Meio Ambiente, realizada em Estocolmo, como já 
anteriormente mencionado. Esse movimento levou a um renascimento dos interesses 
ecológicos, uma busca pela conexão com a Terra, perdida de longa data, desde o 
marco judaico-cristão, quando o principal interesse passou a ser a busca 
inescrupulosa por valores econômicos. 
 
Dentro do movimento ecológico, segundo o filósofo norueguês Arne Naess, 
mencionado por Peter Singer em sua obra Ética Prática, existem tendências 
“superficiais” e “profundas”. O primeiro estaria ligado à estrutura moral tradicional, 
ou seja, suas raízes seriam antropológicas, o interesse em conservar o ambiente 
estaria intimamente ligado à necessidade do ser humano em tê-lo intacto, tanto pela 
sobrevivência da espécie quanto para desfrutar seus prazeres. Já a ecologia profunda 
tem raízes mais biocêntricas, seria a preservação pela valorização da natureza em si, 
sem interesses nos benefícios eventualmente trazidos para os seres humanos. 
 
 
Leopold sintetizou os fundamentos de sua Ética da terra dizendo que: “Uma 
coisa é certa quando tende a preservar a integridade, a estabilidade e a beleza da 
comunidade biótica; é errada quando apresenta a tendência contrária”. 
 
Através de um trabalho publicado em 1984 por Arne Naess e George Session, 
filósofo norte-americano também envolvido com o movimento de ecologia profunda, 
foram estabelecidos alguns princípios para uma ética ecológica profunda. Tais como: 
 
1. O bem-estar e o florescimento da vida humana e não-humana na Terra 
têm valor em si mesmos (sinônimo; valor intrínseco, valor inerente). Esses valores 
são independentesda utilidade do mundo não-humano para finalidades humanas. 
 
2. A riqueza e a diversidade das formas de vida contribuem para 
concretização desses valores, e também são os valores em si mesmas. 
 
3. Os seres humanos não têm o direito de reduzir essa riqueza e a 
diversidade, a não ser para a satisfação de necessidades vitais. 
 
Naess e Sessions vão além, pois esses princípios só remetem à vida, mas eles 
afirmam que a ecologia profunda quando se refere à “biosfera” é mais abrangente, 
incluindo ainda as coisas inanimadas como rios, paisagens e ecossistemas. 
 
Dois autores australianos, chegando ao extremo de profundidade da ética 
ambiental, Richard Sylvan e Val Plumwood, igualmente levam a sua ética além das 
coisas vivas, nela incluindo a obrigação de “não pôr em risco o bem-estar de objetos 
ou sistemas naturais sem uma boa razão para fazê-lo”. 
 
 
Em Deep Ecology, Bill Devall e George Sessions defendem uma forma de 
“igualitarismo biocêntrico”: 
 
A intuição da igualdade biocêntrica é a de que, na biosfera, todas as coisas têm 
o mesmo direito de viver e florescer, bem como de alcançar as suas forças 
individuais de desenvolvimento e auto-realização dentro da Auto-realização maior. 
Esta intuição básica é a de que, enquanto partes do todo interligado, todos os 
organismos e todas as entidades da ecosfera são iguais em termos de seu valor 
intrínseco. 
 
Muitos outros autores do mesmo modo escreveram sobre a ecologia profunda. 
No Brasil, Nancy Mangabeira Unger trabalha sobre a nova ética capaz de permitir o 
resgate da cordialidade e respeito com o ambiente. Desenvolvendo sua definição, 
afirma que a ecologia profunda questiona a concepção utilitarista e antropocêntrica 
da relação do ser humano com o ecossistema. Professa que alguns ecologistas 
percebem nas atuais reformas ambientais institucionais, a concessão de direitos sem 
o rompimento com a postura de superioridade, a animais, florestas e rios. De maneira 
idêntica ao ocorrido com mulheres, negros, índios, escravos e crianças, a natureza 
recebe o status de ser humano inferior. Citando Zimmerman, menciona que o ethos 
heideggeriano respeita todos os seres não pelo valor ou utilidade, mas pelo que são. 
Nesse ethos, a lei vem da razão humana e de uma dimensão da totalidade do real. 
 
Entre estas posições, há uma riqueza de reflexões a respeito do lugar do 
homem na Natureza e a elaboração de uma ética correspondente. A ética biocêntrica, 
por exemplo, se fundamenta essencialmente na ideia de que a natureza possui valor 
intrínseco, independente de sua utilidade para fins humanos. Nós os humanos não 
somos superiores aos outros seres, mas “simples cidadãos” da comunidade de seres 
 
vivos. Como todo vivente tem direito à vida, só temos o direito de destruir algum ser 
da natureza para satisfazer necessidades vitais. 
 
“A prevalência por mais de três séculos da visão do homem como centro do 
universo, sustentada pelo paradigma antropocêntrico está atualmente eivada por 
contradições próprias e impotentes perante os recentes desafios”. Este parecer vem 
de Roberto Crema que o complementa conceituando com precisão a atitude humana 
como sombria, destrutiva e determinado pela concepção moderna do mundo, 
racionalista, mecanicista e reducionista. Em contradição a esse comportamento, 
Fritjof Capra aduz o surgimento de um “paradigma ecológico, mas num sentido 
ecológico profundo, propondo uma expansão não apenas das percepções e da 
maneira de pensar, mas também de valores”. Em uma de suas obras, encontra-se a 
seguinte passagem: 
Enquanto o velho paradigma está baseado em valores antropocêntricos 
(centralizados no ser humano), a ecologia profunda está alicerçada em valores 
ecocêntricos (centralizados na Terra). É uma visão de mundo que reconhece o valor 
inerente da vida não-humana. Todos os seres vivos são membros de comunidades 
ecológicas ligadas umas às outras numa rede de interdependências. Quando essa 
percepção ecológica profunda torna-se parte de nossa consciência cotidiana, emerge 
um sistema de ética radicalmente novo. E, então, estaremos (em oposição a 
deveríamos estar) inclinados a cuidar de toda a natureza viva. A mudança de 
paradigma na ciência, em seu nível mais profundo, implica uma mudança da física 
para as ciências da vida. 
 
A ecologia profunda, que não unifica os seres humanos a natureza e reconhece 
o valor intrínseco de todos os seres vivos, fornece uma base filosófica, e até mesmo, 
espiritual, para mudar o paradigma científico nos dizeres de Capra. Citando 
novamente os seus pensamentos: 
 
 
Os princípios sobre os quais se erguerão as nossas futuras instituições sociais 
terão de ser coerentes com os princípios de organização que a natureza fez evoluir 
para sustentar a teia da vida. Para tanto, é essencial que se desenvolva uma estrutura 
conceitual unificada para a compreensão das estruturas materiais e sociais. A 
sustentabilidade não implica uma imutabilidade das coisas. Não é um estado estético, 
mas um processo dinâmico de co-evolução. 
 
É dever do homem ter cuidado com a natureza, proteger o ambiente onde ele 
vive, por ser sua morada, mas também por ser a Terra o conjunto quase infinito de 
seres vivendo em harmonia como um grande sistema em que a atitude de cada 
elemento tem efeito direto no ciclo de vida de outro. 
 
A ética superficial em relação à profunda, segundo esses autores, postula a 
necessidade de referencial independente de axiomas humanísticos. Sua própria 
existência conferiria aos seres da natureza o direito de existir; sendo direito 
inalienável e transcendente às necessidades humanas. Diante desse valor essencial de 
preservar os seres da natureza, todos os outros referentes à continuidade da espécie 
humana poderão ser incorporados. 
 
Antônio Carlos Wolkmer aprofunda o tema dizendo que: “a necessidade de 
uma nova ética universal, voltada para a dignidade do outro, a Ética da Alteridade, a 
crise atual da ética, questionando os novos valores da sociedade humana, 
promovendo propostas para crise ética da modernidade. 
 
Também, Roberto Crema defende o surgimento do novo paradigma como 
resposta à crise, atuando como oportunidade para crescer, evoluir e transformar os 
dogmas legais. Sendo uma oportunidade para trazer de volta os antigos conceitos e as 
 
tradições anteriores que ressaltavam as obrigações dos seres humanos para com a 
natureza, assim como uma justiça mais ampla, buscando a harmonização de todos os 
elementos do ecossistema, segundo Zimmerman. Além disso, ele destacou que 
diversamente no presente momento, a noção de justiça está centrada na pessoa e nos 
seus direitos. Nessa corrente filosófica há o esquecimento da dependência existente 
com o Ambiente, considerando como importante apenas a humanidade e 
desvalorizando os demais objetos naturais. 
Para Albert Schweitzer o importante é o “respeito a vida”: 
 
A verdadeira filosofia deve começar pelos fatos mais imediatos e abrangentes 
da consciência, e isso pode ser formulado da seguinte maneira: “Sou vida que quer 
viver e existo em meio à vida que quer viver... Do mesmo modo como em minha 
vontade de viver existe um anseio por mais vida e por aquela misteriosa exaltação da 
vontade que se chama de prazer, e o terror diante do aniquilamento e daquele insulto 
à vontade de viver a que chamamos dor, tudo isso também predomina em toda a 
vontade de viver que me cerca, e predomina por igual, quer consiga expressar-se a 
minha compreensão, quer permaneça não expresso. 
 
A ética, portanto, consiste nisto; no fato de eu vivenciar a necessidade de pôr 
em prática o mesmo respeito pela vida, e de fazê-lo igualmente, tanto com relação a 
mim mesmo quanto no que diz respeito a tudo que deseja viver. Nisso já tenho o 
necessário princípio fundamental de moralidade. É bom conservar e acalentar a vida; 
é ruim destruir e reprimir a vida. Um homem só será realmente éticoquando 
obedecer ao dever que lhe é imposto de ajudar toda a vida que for capaz de ajudar e 
quando se der ao trabalho de impedir que se causem danos a todas as coisas vivas. 
Ele não pergunta se esta ou aquela vida é digna de solidariedade enquanto dotada de 
valor intrínseco, nem até que ponto ela é capaz de sentimentos. Para ele, a vida é 
sagrada enquanto tal. Ele não estilhaça os cristais de gelo que reluzem ao sol, não 
 
arranca uma folha ou uma flor de sua árvore, e tem o cuidado de não esmagar insetos 
enquanto caminha. Se, numa noite de verão, precisa de luz para trabalhar, prefere 
deixar a janela fechada e respirar um ar sufocante a permitir que os insetos venham 
cair sobre a sua mesa de trabalho com as asas feridas e chamuscadas. 
Essa teoria de Schweitzer é “herança” da filosofia moral Jainista, que consiste 
no exemplo mais radical, no oriente, de respeito aos seres. Sua doutrina é 
denominada de ahimsa. Ela está fundamentada na não violência perante toda vida e 
no ascetismo rígido com a finalidade de limitar os desejos humanos. O apreço pelas 
demais criaturas vem do fato da alma, segundo eles, evoluir de um animal a outro. 
Ela passaria por essa transmigração até chegar ao ser humano. Seus símbolos seriam 
a vassoura e a vasilha. O primeiro ícone serviria para afastar os insetos do caminho 
para não serem esmagados e a segundo para a arrecadação de comida doada. 
Além disso, outro ponto de vista semelhante foi defendido pelo filósofo 
norteamericano contemporâneo Paul Taylor. Em seu livro Respect for Nature, ele 
afirma que toda coisa viva está “em busca do seu próprio bem, de uma maneira que 
lhe é única”. Quando compreendermos isso, passaremos a ver todas as coisas vivas 
“da mesma maneira que vemos a nós mesmos”, portanto, “estaremos aptos a atribuir 
à sua existência o mesmo valor que atribuímos à nossa”. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
QUESTIONANDO OS FUNDAMENTOS FILOSÓFICOS DA ECOLOGIA 
PROFUNDA 
 
Para Peter Singer, tanto Albert Schweitzer quanto Paul Taylor utilizam-se de 
linguagem metafórica, o que dificulta o modo como devem ser interpretados. Para 
ele, em determinadas situações é possível oferecer uma explicação exclusivamente 
física do que acontece, e, na ausência de consciência, não existe um bom motivo pelo 
qual devam ter maior respeito pelos processos físicos que regem o crescimento e a 
decadência das coisas vivas do que o que se tem pelos que regem as coisas 
inanimadas. 
Ele avalia as ações e decisões humanas como moralmente aceitáveis ou não 
analisando se elas possam causar dor a outro ser, mas para tanto este outro ser precisa 
ser senciente, ou seja, passível de sentir dor. Portanto, as demais espécies, as não-
sencientes, podem ser protegidas, somente se tiverem alguma utilidade estética, 
científica, para as presentes e futuras gerações. 
E por que não ver o valor em si da natureza, independentemente de sua 
utilidade para as criaturas sencientes? Por que para “ver” o “valor” é preciso ser 
dotado de razão. Portanto, no final das contas, todo valor sempre depende de uma 
razão que o estabelece. Não há, para Singer, “valores em si” somente para alguma 
razão capaz de os estabelecerem. 
Singer acredita que ultrapassando essa barreira dos seres sencientes o limite 
entre objetos naturais vivos e inanimados fica mais difícil de entender. 
Para Peter Singer, a ética da ecologia profunda é incapaz de solucionar os 
questionamentos a respeito do valor intrínseco de seres vivos individuais. “Talvez só 
tenham valor por serem necessários à existência do todo, e o todo talvez só tenha 
valor porque sustenta a existência de seres conscientes”. 
 
Ele acredita que ao tentar extrair valores da ética ecológica nesse nível 
encontrase alguma forma de holismo, que é muito bem explicitado em A Morally 
Deep World, de Lawrence Johnson. Para esse autor, os interesses de uma espécie, ou 
de um ecossistema, devem ser levados em conta, juntamente com os interesses 
individuais, nas deliberações morais. Em The Ecological Self, Freya Mathews diz 
que qualquer “sistema auto-realizador” tem valor intrínseco, no sentido de que 
procura manter-se ou preservar-se. Esses dois autores incluem as espécies e os 
ecossistemas como entidades holísticas, ou individualistas, como forma própria de 
realização. 
Já Peter Singer acredita que o fato de uma espécie ou um ecossistema 
poderem, ou não, ser vistos como o tipo de indivíduo que pode ter interesses, ou um 
“eu” a realizar-se, representa problemas para a ética profunda: 
Pois é necessário não apenas que se possa afirmar, com propriedade, que 
árvores, espécies e ecossistemas têm interesses, mas que têm interesses moralmente 
significativos. Para que os vejamos como “individualidades”, será preciso mostrar 
que a sobrevivência ou a realização desse tipo de individualidade tem um valor 
moral, independentemente do valor que possui devido a sua importância para a 
manutenção da vida consciente. 
Trata-se de rejeitar a base ética de uma ética da ecologia profunda, mas isso 
não significa que o argumento a favor da preservação da natureza não seja forte. O 
autor apenas afirma que esse tipo de argumento, o do valor intrínseco das plantas, das 
espécies ou dos ecossistemas apresenta contradições. E vai além, acredita que: 
“devemos restringir-nos aos argumentos baseados nos interesses das criaturas 
sencientes presentes e futuras, humanas e não-humanas”. Para ele tais argumentos 
servem para demonstrar que “o valor da preservação do que resta de regiões naturais 
significativas excede em muito os valores econômicos obtidos através de sua sua 
destruição”. 
 
 
ÉTICA AMBIENTAL: PRINCIPAIS PERSPECTIVAS TEÓRICAS E A 
RELAÇÃO HOMEM-NATUREZA 
 
 O ser humano é definitivamente o animal que mais transforma o seu ambiente. Esta 
capacidade humana de interferir no ambiente, de alterá-lo, nós chamamos de 
antropogenia. 
Ao gerar cultura o homem encontra uma nova forma de relacionamento com a 
natureza. O Homo sapiens é uma espécie única capaz de uso de uma linguagem 
articulada (Homo loquens), capaz de fabricar instrumentos e artefatos (Homo faber), 
capaz de criar e fazer uso de símbolos (Homo symbolicus) e capaz de fazer uso de 
sua criatividade, de seu imaginário (Homo ludens). Por óbvio não se esquece de seu 
equipamento biológico, todavia quando se trata de uma espécie como a nossa, com 
características totalmente diversas das demais, não se pode reduzir a relação com o 
ambiente como mera relação entre organismos biológicos. 
Ao usar sua capacidade de usar símbolos e o imaginário, as sociedades humanas vão 
construindo códigos culturais e formas específicas de representações da realidade, 
imprimindo “ao meio que habitam, com base na sua percepção de mundo, toda sorte 
de transformações. Tais representações [...] são decisivas para a modelagem do 
espaço habitado e a ordenação do tempo social”. O meio natural é percebido então 
através do conjunto de símbolos que integram essas representações em cada 
sociedade. Toda sociedade cria uma forma de se relacionar com a natureza, dá 
significado ao meio natural conforme seus valores. “Toda sociedade possui uma 
teoria da natureza que lhe é própria, que se expressa em suas configurações 
intelectuais, senão igualmente em complexos de símbolos, de instrumentos e de 
práticas”. 
As formas de se relacionar com o meio ambiente podem variar entre as diferentes 
culturas. 
 
Não existe uma “ecologia humana” única. Pelo contrário, podemos notar “uma 
multitude de distintas ecologias, cada uma das quais, incluindo a que pertence à 
ciência ocidental, foi gerada por uma experiência distinta de mundo, cada uma das 
quais encarnando por si mesma seu próprio e único modo de compreendê-lo”. 
 Sem a pretensão de listar as mais variadas formas de ver a natureza ou mesmo de 
esgotar o tema, o presente trabalho propõe-se a investigar a relação entre o ser 
humano e a naturezaatravés das principais perspectivas teóricas que fundamentam a 
ética ambiental. 
 
 
 ANTROPOCENTRISMO 
 
Na perspectiva antropocêntrica o homem é o centro das preocupações ambientais. Os 
entes gravitam ao redor do ser humano, ganhando importância para o Direito 
Ambiental conforme se tornam mais úteis e necessários à vida humana. Anthropos, 
termo grego, significa homem, no sentido de ser humano, homem como espécie. 
Centrum, centricum, do latim, significa o centro, o cêntrico, o centrado. 
De acordo com esta visão, um bem que não seja vivo, material ou imaterial, assim 
como uma vida que não seja humana, poderá ser tutelado pelo direito ambiental na 
medida em que for relevante para a garantia da sadia qualidade de vida do ser 
humano, visto ser este o único animal racional e por isto, destinatário das normas 
jurídicas. Cabe ao homem a preservação das espécies, incluindo a espécie humana. 
Faz-se importante notar que o ser humano é considerado o centro devido à sua 
capacidade de pensar, capacidade esta que o torna, dentro do panorama 
antropocêntrico, superior aos outros seres. Nesse sentido Fiorillo assevera: “Não há, 
por assim dizer, como não se ver que o direito ambiental possui uma necessária visão 
antropocêntrica. Necessária pelo motivo de que, como único animal racional que é, só 
o homem tem possibilidades de preservar todas as espécies, incluindo a sua.” É da 
 
capacidade de raciocínio que deriva a capacidade humana de refletir, tomar 
consciência e, em razão de seu poder de abstração, dar significado aos símbolos, 
reconhecer “o outro” (como um fim em si mesmo), criar, aprender e transmitir 
hábitos, comportamentos e conhecimentos, reconhecer-se como indivíduo, 
diferenciando-se dos outros seres e de tudo o que está no seu entorno, inclusive 
afirmar-se como diferente da natureza, possibilitando o surgimento da cultura. À 
medida que o ser humano se desenvolve intelectualmente, reconhece-se como 
indivíduo e integrante da sociedade, atribui assim aos significantes, significado. Neste 
processo de individuação, a reflexão faz com que o ser humano dê ao significante 
natureza, significado. Baseado nesse processo ele formula conceitos de natureza, para 
que possa elaborar um sistema de relacionamento entre ambos. A humanidade 
sempre buscou auxílio no conceito de natureza para solucionar os problemas 
humanos e para que esse conceito seja formulado, é necessário que o ser humano 
tenha atingido um grau de desenvolvimento intelectual, um grau de reflexão e 
especulação intelectual que viabilize a compreensão de que a humanidade participa e 
compõe o meio “natural” de maneira diferenciada dos outros seres animados. 
A noção de natureza é fundamental para que, mais recentemente (século XX), seja 
introduzido o conceito de meio ambiente e com ele seus respectivos desdobramentos 
jurídicos. Esse conceito de natureza se transforma conforme a cultura. No 
pensamento helênico, o conceito filosófico de natureza era adaptado em razão da 
evolução das relações mantidas entre o homem grego e a natureza. Conforme essas 
relações se modificavam, modificava-se também o conceito de natureza. 
Inicialmente, para os gregos, a natureza como conjunto de flora, fauna e os outros 
elementos do mundo físico, não foi alvo de cuidados especiais, porquanto imperava a 
ideia da infinitude de recursos naturais em função da pouco presente degradação 
ambiental. Porém, foi na Grécia Antiga que se pensou sobre os fenômenos naturais e 
seus desdobramentos em relação ao ser humano. Posteriormente, esse pensamento 
influenciaria o mundo ocidental. 
 
Nas antigas obras poéticas gregas, a natureza desempenhava um papel de 
fundamental importância. Homero coloca o ser humano como incapaz de lidar com a 
imensa força do destino. O mundo mítico mostra um ser humano sem condição de 
prever acontecimentos e sem aptidão para controlá-los, buscando explicações em um 
passado remoto, podendo-se dizer até mesmo hipotético, que colaborava para 
conservar situações que desde sempre estavam estabelecidas. A natureza era um fato 
demasiado extraordinário, incompreensível, cabendo à humanidade aceitar os 
desígnios do destino. Até esse ponto, não há condições para uma construção racional 
pois “um dos principais elementos que definem a racionalidade é a capacidade de 
previsão e controle” . Foi necessária uma atitude filosófica diante da natureza para 
que houvesse a possibilidade de formular regras gerais. A busca pela universalidade, 
busca por aquilo que há em comum em diferentes pessoas e diferentes sociedades, 
busca pela essência da vida, exigiu uma postura filosófica que questiona a realidade a 
partir da intensa observação dos fenômenos físicos. No momento que esses 
fenômenos físicos puderam ser generalizados tornou-se possível a formulação de 
regras gerais que permitiam a previsão de acontecimentos, previsão esta ausente no 
momento anterior à indagação filosófica. Portanto, podemos afirmar que para a 
cultura grega desenvolver o conceito de natureza, foi necessária a generalização (dos 
fenômenos físicos) e a universalização (do ser humano e da natureza, tomando 
consciência das suas respectivas necessidades, particularidades e exigências). Para 
que a noção de natureza tornasse-se viável era imprescindível que o ser humano 
tomasse consciência de seu papel especial na natureza, e essa tomada de consciência 
só é possível através da filosofia. Assim o ser humano descobre que, conquanto 
integre o meio “natural”, integra-o diferenciadamente dos outros seres. Reconhece-se 
como diferente. Quanto a essa diferença, Bessa escreve que: “O Homem é o único 
dos seres vivos dotado de capacidade para alterar conscientemente o ‘status quo’ do 
mundo natural.” 
 
Continua Bessa acerca do mesmo assunto, citando célebre afirmação de Hegel: “O 
que o homem possui de mais nobre do que o animal, possui-o, graças ao pensamento: 
tudo quanto é humano, de qualquer forma que se manifeste, é-o na medida em que o 
pensamento age ou agiu”. [grifo nosso] O ser humano, criando um conceito de 
natureza como elemento integrante do mundo da Cultura, já não é mais refém do 
destino, tranforma o mundo natural conforme suas necessidades. Através da filosofia 
ele “descobre” a natureza, reconhece-se como diferente, reconhece o outro como 
diferente e descobre a natureza ao pensar a sua sociedade. O conceito de natureza só é 
possível quando o ser humano consegue diferenciar-se dela. A Filosofia era então 
baseada na experiência concreta, em fenômenos sensíveis e verificáveis na realidade. 
Com a criação do conceito de natureza, viabilizou-se a construção de modelos sociais 
de acordo com a natureza observada. A natureza que fala a filosofia grega não é mais 
um conjunto de leis, elementos físico-químicos, flora e fauna. “A natureza era para os 
gregos a análise das leis que universalmente podiam ser extraídas da observação do 
mundo natural e a sua aplicação ao mundo político, à pólis.” 
Essa posição possibilita a construção do conceito de um direito natural, que adquiriu, 
anteriormente, significação social e cultural na tragédia Antígona, de Sófocles, onde a 
introdução de termos como equilíbrio e justo termo dão à humanidade uma nova 
dimensão, onde o ser humano começa a esboçar sua posição de senhor do mundo 
natural. Ele começa a ser o elemento central. Supera-se as explicações míticas, 
buscando, na razão, as origens primeiras das coisas. 
Sófocles mostra a luta de Antígona como uma luta pela liberdade e dignidade do ser 
humano, buscando fundamentos na natureza. Na obra citada, o autor expressa essa 
ideia quando o Coro afirma: “De tantas maravilhas, mais maravilhoso de todas é o 
homem.” 
Com Platão e Aristóteles, o privilegiamento do ser humano e da ideia de 
superioridade em relação à natureza ganha maior consistência. Os termos como 
sofista e retórica, a arte da argumentação tão cultivada pelos sofistas, passama ser 
 
termos pejorativos. Para Aristóteles (384-322 a.C.), que seria retomado e relido 
posteriormente por Tomás de Aquino (1225-1274), “o homem está no vértice de uma 
pirâmide natural, em que os minerais (na base) servem aos vegetais, os vegetais 
servem aos animais que, por sua vez, e em conjunto com os demais seres, servem ao 
homem”.23 
Posteriormente, a separação entre ser humano e natureza ganhará maior dimensão 
com a tradição judaico-cristã. A assimilação aristotélico-platônica pelo cristianismo 
cristalizará a separação entre espírito e matéria. A perfeição de Deus fará oposição ao 
imperfeito mundo material. Com o cristianismo, os deuses não habitam este mundo 
como acontecia na concepção dos filósofos pré-socráticos. Foi durante a Idade Média 
que se iniciou a dissecação de cadáveres, decorrente da concepção de que após o 
falecimento, o corpo pode ser visto como objeto de estudo, pois aquilo que o anima 
(do grego ânima, alma), já não está mais presente no corpo sem vida. Aquilo que dá 
vida ao corpo foi para outro lugar (céu, inferno, purgatório), podendo então o corpo 
virar objeto. 
Os avanços científicos e tecnológicos ganham proporções até então inimagináveis, 
especialmente a partir da revolução científica (associada aos nomes de Copérnico, 
Galileu, Descartes, Bacon e Newton), séculos XVI e XVII. A visão de mundo 
medieval, aristotélicocristã, sofreu imensa e radical mudança. O universo que até 
então era visto como orgânico, vivo e espiritual, deu lugar a uma visão de um mundo 
equiparado a uma máquina. Máquina esta, que se tornaria a metáfora da era moderna. 
O elemento primordial da razão renascentista era a glorificação do ser humano e 
estando ele no ápice da cadeia da vida, deveria dominar o conhecimento sobre a 
natureza da forma mais ampla possível. É pelo domínio do conhecimento que será 
possível a preservação do gênero humano. Era natural para esse pensamento que ele 
voltasse os frutos do conhecimento para si mesmo. A ciência começa a se tornar uma 
nova religião, prometendo um mundo novo a todos os seres humanos. Visto que os 
 
recursos naturais eram entendidos como infinitos, não havia motivo para uma visão 
crítica desta atitude. 
A oposição homem-natureza, espírito-matéria, sujeito-objeto se tornará mais plena 
em Descartes e se constituirá no centro do pensamento moderno e contemporâneo. 
Através do método científico Descartes afirma que seria possível chegar a 
conhecimentos muito úteis à vida. O objetivo do conhecimento era dominar 
incondicionalmente a natureza que agora é fonte de recursos para a satisfação 
humana, um objeto, diante daquele que seria o verdadeiro sujeito, a alma (mente, 
pensamento), a res cogitans. Fica evidente a relação de subordinação entre res 
cogitans e natureza. O corpo é parte da natureza, e dentro deste contexto, o ser 
humano se distancia da natureza, percebendo o corpo como res extensa.27 Há assim 
uma característica dualista. 
O caráter pragmático e antropocêntrico que marcará a modernidade ficará manifesto 
quando Descartes afirma que Antropocentrismo x ecocentrismo na ciência jurídica. 
 “[...] significa ainda algo mais do que a independência recíproca entre corpo e 
espírito: significa a separação entre sujeito e objeto”. SILVA, Franklin Leopoldo e. 
Descartes: A metafísica da modernidade. 2. ed. São Paulo: Moderna, 1993, p. 6. 
Além do dualismo, o idealismo e a subjetivismo também são características do 
pensamento cartesiano. É a partir do sujeito, entendido como pensamento, que 
Descartes diz que é possível constituir o verdadeiro conhecimento. Temos 
primeiramente representações que posteriormente serão atestadas pela realidade. 
Ao invés dessa filosofia especulativa ensinada nas escolas, pode-se encontrar uma 
filosofia prática, mediante a qual, conhecendo a força e as ações do fogo, da água, do 
ar, dos astros, dos céus e de todos os outros corpos que nos rodeiam, tão 
distintamente como conhecemos os diversos ofícios de nossos artesãos, poderíamos 
empregá-las do mesmo modo em todos os usos a que são adequadas e assim nos 
tornarmos como que senhores e possessores da natureza. Isso é de se desejar não 
somente para a invenção de uma infinidade de artifícios que nos fariam usufruir, sem 
 
trabalho algum, os frutos da terra e de todas as comodidades que nela se encontram, 
mas também, principalmente, para a conservação da saúde, que é, por certo, o bem 
primordial e o fundamento de todos os outros bens desta vida. [grifo nosso] 
 Ao contrário da filosofia especulativa, o conhecimento cartesiano tem característica 
pragmático-utilitarista, útil às aspirações e anseios do ser humano que assimila a 
natureza como um instrumento, um meio para atingir uma finalidade. O ser humano 
como centro do mundo é o sujeito em oposição ao objeto, usufruindo o método 
científico para desvendar os mistérios da natureza e à imagem e semelhança de Deus, 
poderia realizar qualquer feito. Tornar-se-ia o todo poderoso. Encontra-se aqui 
influência do pensamento medieval, visto que existe certo desprezo pela matéria, 
baseado na separação entre alma humana e o mundo material. Descortinava-se um 
novo mundo, o Ocidente racionalista e mecanicista, onde o artifício é considerado por 
muitos, superior ao mundo natural. 
Com o desenvolvimento do mercantilismo e a ascensão da burguesia, notadamente o 
movimento que proclama triunfo do ser humano sobre a natureza ganha força, 
sobretudo depois das revoluções industrial e francesa. 
Para Locke o direito de propriedade faz parte da natureza humana. Exalta o homo 
faber enquanto produtor de mercadorias que através do trabalho agrega valor à 
matéria bruta, à natureza. O ser humano é capaz de criar riqueza mediante a 
acumulação de bens que adiante poderão ser trocados conforme a vontade de cada 
um, afirmando o uso privado das coisas. O intercâmbio de mercadorias é uma forma 
de diferenciação entre o homem e os animais. O trabalho é a fonte de riqueza do 
indivíduo e neste sentido, Locke antecipa Adam Smith e Marx. 
Adam Smith lança as bases econômicas para uma sociedade engajada em um 
processo de desenvolvimento contínuo através da competição entre os indivíduos. 
Eles agiriam em interesse próprio tornando o progresso inevitável através do 
investimento, do aumento da produtividade e do acúmulo de riqueza material. A 
riqueza material traria a melhora da sociedade e o bem da sociedade seria alcançado 
 
através da busca do bem individual. Se o ser humano estava no centro do universo, a 
produção de bens estava no centro da economia que em constante crescimento 
atenderia às necessidades humanas. 
Com Adam Smith, a teoria de formação do valor, que até então concebia a natureza 
como fonte de valor e a agricultura como meio de produção, passou-se a negar a 
prioridade do trabalho agrícola e também da natureza exterior. Desse modo, a 
natureza deixou de ser o elemento central da Teoria Econômica, pois passou a ser 
vista como um obstáculo ao desenvolvimento econômico. 
 O pensamento tecnocrático também se manifesta em Saint-Simon que entende a 
sociedade industrial como o caminho para o domínio da natureza. Assim a sociedade 
atingiria um ponto que implicaria o fim da luta do homem contra o homem. 
Portanto eventual problema ecológico de caráter ético será resolvido pelo sistema 
econômico, da mesma forma que a técnica e a ciência superarão todas as questões 
que se apresentam ou se apresentarão. A ciência como expressão da razão, daquilo 
que torna o ser humano diferente dos outros seres, recebe toda a confiança da 
sociedade que projeta para o futuro a solução de qualquer dificuldade ambiental 
encontrada na realidade. 
 
AÇÃO MORAL FACE À NATUREZA NA TEORIA ANTROPOCÊNTRICA 
 
Para o antropocentrismo somente o ser humano será sujeito moral. Nesta concepção, 
unicamente ele é capaz de realizar atos morais e ser sujeito de direitos. A ação moral 
com relação ànatureza considera o interesse do próprio ser humano visto que por ter 
características próprias, razão e o poder de liberdade de vontade, exclusivas à espécie 
humana, sua vontade não pode ser comparada a uma suposta vontade da natureza, já 
que somente ele tem a capacidade de reconhecer valores morais nos comportamentos 
alheios e adequar a própria conduta a um determinado tipo de racionalidade. Em 
verdade não há que se falar em “vontade da natureza” no que tange ao 
 
antropocentrismo, porquanto a natureza não é provida de razão, de pensamento, não é 
livre, não delibera. À natureza é atribuído um valor instrumental à proporção que o 
ser humano é livre para impor sua vontade que encontrará limites nas liberdades de 
outras pessoas. 
A legitimidade humana para atos morais, também se expressa em outros fenômenos 
culturais além do reconhecimento de valores morais, “tais como a linguagem, a 
liberdade de decisão, o conhecimento científico, o desenvolvimento e o uso da 
técnica, a reciprocidade de deveres e obrigações”. 
 
 
CRÍTICAS DO ANTROPOCENTRISMO AO ECOCENTRISMO 
 
O antropocentrismo é uma característica encontrada nas diferentes sociedades 
humanas não sendo assim característica exclusiva da cultura ocidental. A suposta 
prepotência do homem ocidental não se sustenta já que dificilmente alguma 
sociedade se constituiu acreditando ser inferior às demais. A forma de perceber o ser 
humano como centro pode variar entre diferentes sociedades contudo em relação à 
natureza “[...] não se conhece organização social que tenha atribuído ao Homem um 
papel subalterno”. Essa característica antropocêntrica muitas vezes se manifesta 
através de um padrão etnocêntrico. 
O conceito de natureza e meio ambiente são necessariamente antropocêntricos, já que 
“sem a existência do Ser Humano não seria possível a existência de nenhum dos dois 
conceitos, pois não existiria a racionalidade capaz de elaborá-los”. 
Os argumentos ecocêntricos atacam a forma ocidental de pensar por considerar esta 
como contrária ao meio ambiente e declaram algumas vezes um “holocausto 
ambiental” que seria evitado com uma série de medidas, entre elas, a redução do 
consumo. Esse pensamento biocêntrico pode ser considerado na verdade 
antropocêntrico porque corresponde ao pensamento de quem já superou as 
 
necessidades materiais básicas e impõe sacrifícios a quem vive em países em vias de 
desenvolvimento. É uma visão do mundo natural feita por quem não habita o mundo 
natural. 
A redução de consumo proposta pela concepção ecocêntrica significa que o indivíduo 
precisa privar-se de sua liberdade. Ao antropocentrismo essa privação não precisa ser 
radical de tal maneira que afete o desenvolvimento econômico. O mercado pode se 
adaptar às novas necessidades. 
 
 Crítica do Antropocentrismo ao Personalismo 
 
Para o pensamento anterior a Descartes, mais precisamente o pensamento 
aristotélico-tomista (influência determinante do personalismo), o conhecimento segue 
a trajetória que vai das coisas para o intelecto. A representação que aspire à realidade 
precisa ser primeiramente uma representação sensível. Em Descartes, ao contrário, 
parte-se primeiramente da ideia onde o conhecimento deve ser investigado ampla e 
internamente no que diz respeito à mente, para, posteriormente, sair da representação 
para as coisas. Como a experiência sensível é questionável o corpo não é confiável 
como fonte de percepção da realidade. 
Para o antropocentrismo é a liberdade do indivíduo, é autonomia de vontade do ser 
humano que o faz ser verdadeiramente humano, exercer a sua humanidade. A 
liberdade individual está acima das relações sociais que podem simbolizar uma 
barreira para a vontade do indivíduo. O que fundamenta uma obrigação moral 
antropocêntrica é a razão enquanto o que fundamenta uma obrigação moral para o 
personalismo é a pessoa (eu mesmo e o outro), o que significa na visão 
antropocêntrica um retrocesso no processo de evolução da humanidade. 
 
 
 
ECOCENTRISMO 
 
“Nós não estamos no entorno, ‘nós somos o entorno’.” O ecocentrismo, também 
denominado fisiocentrismo (concede valor intrínseco aos indivíduos naturais, na 
maior parte também coletividades naturais como biótipos, ecossistemas, paisagens ) e 
biocentrismo (onde o enfoque está apenas nos seres com vida, sejam individuais e 
coletivos ), considera que a natureza tem valor intrínseco: a proteção à natureza 
acontece em função dela mesma e não somente em razão do homem. Tendo a 
natureza valor em si a sua proteção muitas vezes se realizará contra o próprio homem. 
Os ecocentristas buscam justificar a proteção à natureza afirmando que “dado à 
naturalidade um valor em si, a natureza é passível de valoração própria, independente 
de interesses econômicos, estéticos ou científicos.” 
Toda sociedade humana constitui um conjunto de símbolos que dão sentido à própria 
sociedade. A ordem social da modernidade, emergida na Europa a partir do século 
XVII, tem como símbolos as diversas racionalidades advindas de um modelo 
industrial que compõe a sociedade de consumo e de risco. A lógica do progresso, 
individualismo, a noção antropocêntrica de mundo e a noção instrumental da natureza 
são elementos do que chamamos de modernidade. Esse modelo é imediatista e tem a 
racionalidade econômica orientada para a acumulação de capital. 
O ritmo da sociedade moderna é de constantes mudanças. Contemporaneamente a 
realidade nos permite avaliar que “as interações do homem moderno com seu meio, 
munido pelo manancial da ciência e da técnica, foram de tal forma incríveis que 
acabaram gerando um potencial destrutivo de risco em larga escala em relação ao 
meio ambiente material”. 
A crise da sociedade contemporânea é uma crise de seus magmas de significações. O 
conjunto de símbolos que representam a sociedade contemporânea está sendo abalado 
em seus fundamentos. A questão ambiental é um dos componentes que integram esta 
 
crise. As ideias de crescimento econômico, desenvolvimento, ciência, técnica e 
dominação da natureza estão abaladas. A relação sociedade-natureza se insere neste 
contexto de crise visto que se acreditava que desenvolvimento acarretava sair da 
natureza, dominá-la. 
A deflagração da crise ambiental expõe a necessidade de uma nova forma de relação 
entre o ser humano e natureza, uma nova postura ética diante do meio ambiente. 
A consideração do valor intrínseco do mundo do mundo natural e dos excessos do 
antropocentrismo é fundamental, um pressuposto, para se pensar a Ética da Vida que, 
em última análise, se apresenta como condicionadora da Ética do Meio Ambiente, um 
dos seus mais expressivos aspectos. 
 
Nesta ética do meio ambiente as demais formas de vida apresentam um valor 
intrínseco e um significado próprio já que a natureza precede o homem. São 
expressões da criação, da vida, da natureza ou de Deus, conforme a crença de cada 
um. Ademais, “nem tudo o que existe foi criado para a utilidade imediata do homem; 
há outros fins, outras razões criadoras que escapam à nossa sensibilidade a aos nossos 
cálculos”. 
O conceito de natureza já foi completamente diferente ao conceito formulado e 
atribuído às épocas moderna e contemporânea. Para os pensadores pré-socráticos a 
natureza (physis) está imbuída do elemento anímico, há espiritualidade na natureza, 
ela não se contrapõe ao psíquico como ocorre em nossos dias. O psíquico também 
pertence à physis. Os deuses não estão em um lugar distante, separado. Eles habitam 
a physis como forças misteriosas, se apresentam em tudo que está ao redor do ser 
humano, conferem inteligência à natureza que já não pode mais ser dividida em 
animada ou inanimada porque tudo tem alma. Esse princípio inteligente é 
reconhecido através de manifestações que chamamos de espírito, inteligência, 
pensamento, logos, etc. Physis também é gênese, é o princípio e o processo de 
surgimento e desenvolvimentodas coisas. Em outro aspecto physis é a totalidade de 
 
tudo o que é. Pensar a physis é pensar o ser e a partir disso compreender a totalidade 
do real: “do cosmos, dos deuses e das coisas particulares, do homem e da verdade, do 
movimento e da mudança, do animado e do inanimado, do comportamento humano e 
da sabedoria, da política e da justiça”. 
A natureza (Fisis), para os gregos, era compreendida como um grande organismo 
formado por um corpo material distendido no espaço, penetrado pelo movimento no 
tempo, homogêneo, vivo e dotado de uma alma imanente (Logos), que era o princípio 
do movimento de diversas substâncias, cada qual dotada de sua natureza qualitativa 
própria e de seu próprio modo de atuar. 
 
Posteriormente é que a separação entre homem e natureza se consolidaria conforme a 
visão antropocêntrica. O conhecimento seria extremamente fragmentado e as 
consequências dessa forma de relação é que gerariam a necessidade de repensar o 
paradigma mecanicista. 
No século XIX, fruto de interações interdisciplinares principalmente entre biologia, 
biofísica e química surge a ecologia. Traz consigo referenciais que proporcionam 
uma nova compreensão do ser humano, contrastando com a visão antropocêntrica 
(unidimensional), o homem não está mais hierarquicamente acima dos demais seres 
ou em uma posição apartada deles. Faz agora parte de uma série de relações de 
interdependência entre os mais variados tipos de entes ambientais. O ser humano 
agora participa da teia da vida (web of life). 
Em um contexto de interdisciplinaridade as ciências se influenciam e realizam um 
diálogo entre os conhecimentos, superando a anterior forma fragmentada de saberes. 
É neste sentido que a ciência do Direito também sofre influência de outros campos do 
conhecimento, incluindo a ecologia e de seus conceitos correlatos. 
Em 1874, “ecologia” aparece na obra Anthropogénie de Haeckel, onde podemos 
entender que ela, “pelo menos em parte, constitui-se no quadro científico e ideológico 
 
da economia da natureza, dos equilíbrios naturais e da adaptação dos seres vivos às 
suas ‘condições de existência’.” 
O conjunto de grupos de indivíduos de qualquer tipo de organismo que ocupam a 
mesma área é denominado pela ecologia como comunidade. A comunidade e o 
ambiente não vivo se articulam, funcionam juntos como um sistema ecológico ou 
ecossistema. O conceito de ecossistema privilegia o todo colaborando assim para a 
superação da concepção atomísticoindividualista. O ecossistema é constituído pelo 
biótopo, que é o meio geofísico, e pela biocenose, que são as interações entre todos 
os seres vivos que ocupam o espaço chamado biótopo. Constituem assim uma 
unidade complexa com caráter organizador, ou simplesmente, um sistema. 
Os ecossistemas são sistemas abertos, sempre havendo entrada e saída de energia. 
São espaços de qualquer dimensão onde se processam as interações entre os seres 
vivos e os outros componentes do meio, “mediante transporte e troca de matéria, 
energia e informação, tudo isto submetido a um processo de auto-regulação de modo 
a garantir a estabilidade ou equilíbrio daquele sistema”. Nessas interações é que se 
verifica a cadeia trófica, “sequência concatenada de seres que alimentam uns aos 
outros ou são por eles nutridos”. Referente às interações ecossistêmicas é relevante 
explicitar que “cada ecossistema é um todo que se organiza a partir das interações dos 
seres que o constituem. Assim, o todo, o ecossistema, só existe pelas interações entre 
as partes e são essas complexas interações que o constituem”. 
Em meio a todas essas trocas e interações em busca de equilíbrio e estabilidade há 
ainda a interferência humana. Além dos fatores abióticos (ar, água, minerais e 
energia) e bióticos (plantas, vegetais em geral, os animais e os microorganismos) que 
compõem um ecossistema natural, pode ainda haver o fator cultural, ou seja, o 
sistema ambiental pode sofrer a influência da ação humana. Assim, no ecossistema 
cultural as alterações ocorrem pela combinação da ação da natureza com a 
intervenção humana, seja ela consciente ou inconsciente. 
 
O ser humano é integrante das íntimas relações que existem em todo o mundo 
natural. A ecologia despertou nele a compreensão na qual o homem é apenas mais um 
ente entre tantos outros, ele é mais um elo do repertório ecológico. Há uma inter-
relação de mútua dependência entre os entes da natureza. 
A cadeia trófica, bem como a mútua dependência dos entes ambientais, apontam para 
as inter-relações na forma de interdependência ou interconvivialidade, assim entende-
se que há paridade entre os entes do repertório ambiental que caso seja 
desconsiderada causará prejuízo ao inter-relacional ambiental. Em suma, 
interconvivialidade é um inter-relacional que sofreu interferência humana organizada 
na busca da sobrevivência possível e ideal.75 
Nesse contexto notamos que o direito vai ao encontro de outras ciências para auxiliar 
e ser auxiliado no intuito de superar conceitos que não colaboram para a solução de 
questões atuais. É imperioso constatar nesse sentido o quão amplo e complexo é o 
conceito de meio ambiente . Envolve “todos os tipos de relações estabelecidas entre 
os homens individualmente considerados e, na relação entre os mesmos e o espaço 
onde vivem”. “É um todo que engloba elementos naturais, artificiais, culturais e do 
trabalho”. Pode-se dizer que existem vários “meio ambientes” que interagem, são 
interdependentes. 
É na dimensão da transdisciplinaridade e interdisciplinaridade que o direito se socorre 
de outras áreas do conhecimento para compreender o que é meio ambiente, de que 
forma ele funciona e como o ser humano deve relacionar-se com seus elementos 
constituintes. Tendo instrumentos conceituais que permitam reorganizar os 
conhecimentos podemos compor um quadro com os diversos saberes das mais 
diversas ciências, percorrendo permanentemente um trajeto que vai das partes ao todo 
e do todo às partes a fim de descobrir um conhecimento global. O direito se insere 
nessa dinâmica uma vez que “se o direito se nutre de outros saberes e precisa 
interagir com outras ciências, deve forçosamente metabolizar conquistas e aceitar as 
 
transformações que se impõem na cadeia de evolução do mundo. [...] Não pode 
avançar tortuosamente.” 
Inseridos nesse diálogo entre conhecimentos a cisão do pensamento que interroga 
deve ser refutada. A cisão implica dualismo, fracionando o objeto a ser apreendido 
pelo sujeito que na verdade comporta o dualismo. O dualismo está na verdade na 
cisão interior do sujeito. As divisões entre mente e corpo, sujeito e objeto, natureza e 
cultura, já não fazem sentido quando na realidade estes se relacionam, são 
interdependentes. 
Entende-se que pelo ponto de vista do sujeito, objeto é quem emite a informação. O 
sujeito é aquele que recebe as informações sendo então sujeito do conhecimento. 
Inconcebível torna-se a ideia de puro sujeito visto que se este apenas recebesse 
informações não teria nem a si mesmo como objeto de seu conhecimento. Admitindo-
se como sujeito cognoscente afirmaria que apenas receberia informações, nunca 
emitiria, não seria objeto. Tão inconcebível quanto o puro sujeito é a ideia de puro 
objeto, que seria um eterno irradiador de informações e nunca receptor delas. Na 
realidade sujeito e objeto se exigem complementar e reciprocamente, emitem e 
recebem informação, se unem e essa unificação deve ser buscada “na constituição de 
cada um deles (nas suas relações interiores), vale dizer, nas constituições recíprocas 
dos entes que são, cada um, por si mesmos, inseparavelmente sujeitos e objetos”. 
“Ambiente [...] é relação. Ambiente – no sentido de meio ambiente – pode ser 
definido como um lugar de encontro.” Encontrar é descobrir, achar, disputar. É neste 
lugar de encontro (de descoberta, de disputa, de tomada de consciência) que o 
sujeito/objeto (agora emunião) encontra o outro, com ele se relaciona, interage e 
interdepende. Encontra o outro no ambiente e encontra no outro o ambiente. 
Ecologia é relação, interação e dialogação de todas as coisas existentes (viventes ou 
não) entre si e com tudo o que existe, real ou potencial. A ecologia não tem a ver 
apenas com a natureza (ecologia natural), mas principalmente com a sociedade e a 
cultura (ecologia humana, social, etc.). Numa visão ecológica, tudo o que existe 
 
coexiste. Tudo o que coexiste preexiste. E tudo o que coexiste e preexiste subsiste 
através de uma teia infinita de relações omnicompreensivas. Nada existe fora da 
relação. Tudo se relaciona com tudo em todos os pontos. 
 Encontrar o outro é também encontrar o ambiente e nessa relação de 
complementaridade e reciprocidade, o outro é todo organismo de toda espécie, 
orgânico ou inorgânico com quem o ser humano está vinculado ao relacionar-se com 
o ambiente. 
Essa visão ecocêntrica concebe o mundo natural em sua holodimensão, em sua 
complexa totalidade, como um ser vivo. Une todas as espécies em um sistema único 
atribuindo à natureza um valor em si mesma. 
São relações de complementaridade que unem todas as espécies num único sistema 
de sustentabilidade do mundo, onde a responsabilidade de todos e de cada um está na 
satisfação de necessidades atuais sem fraudar as perspectivas das gerações futuras, 
pois é nelas que reside a compreensão da nossa geração, e é desde elas que nos 
atormenta a angustia da incompletude em preservá-las. 
 
AÇÃO MORAL FACE À NATUREZA NA TEORIA ECOCÊNTRICA 
 
 Esta cosmovisão “concede um valor próprio à natureza (natureza como fim em si 
mesma) e busca ultrapassar as fronteiras da visão antropocêntrica, fazendo emergir 
uma nova ética, a ética da natureza.” 
A ética da natureza confere ao ser humano responsabilidades em relação ao meio 
ambiente e dentro de uma concepção dialética da relação homem-natureza, a questão 
da oposição entre a necessidade de restabelecer equilíbrios naturais e salvaguardar 
interesses humanos mostra-se resolvida porquanto equilíbrios naturais são interesses 
humanos. O ser humano está ligado à natureza em um equilíbrio simbiótico.92 O 
homem “não se situa no exterior da natureza, mas é dela um componente essencial. O 
 
logos reencontra a oikos num enlace, numa dialética fundamental que liga o homem à 
natureza de maneira indissociável”. 
À natureza é atribuída relevância moral capaz de justificar uma ação moral em seu 
benefício. Já que o equilíbrio natural é um interesse humano, a ação ética considera 
os elementos que constituem o ambiente com todas as suas inter-relações e ainda os 
“interesses humanos atuais e futuros, que reclamam proteção erga omnes”. 
Baseado nessa forma de relação o ambiente pode ser considerado sujeito e objeto do 
direito, afirmação esta que pode ser recebida com certa estranheza, contudo podemos 
lembrar que no direito encontramos “muitos sujeitos que não são humanos, as 
pessoas jurídicas, as universalidades de direito, os órgãos formais destituídos de 
personalidade jurídica, e outros”.95 Enquanto sujeito de direito o ambiente “é uma 
universalidade de bens naturais e culturais que são [...] adjetivações da relação 
natureza/cultura”;96 como objeto, “está representado por um conjunto de recursos 
naturais, renováveis e não renováveis, e pelo agir humano sustentado pela relação 
natural/cultural”. 
A preservação do ambiente mostra-se relevante e a produção normativa pode garantir 
condições para a continuidade e renovação de sistemas naturais promovendo um 
ambiente equilibrado e sustentável para as atuais e futuras gerações. 
Enquanto bem jurídico a ser tutelado, o ambiente recebe da visão ecocêntrica uma 
dignidade autônoma. O direito fixaria os limites da ação humana vedando 
arbitrariedades que possam impedir que a relação ecológica/ambiental seja 
interrompida. Uma tutela qualificada desta forma promove “a proteção jurídica da 
natureza por seu próprio valor, onde subjace [...] 
respeito à vida em toda a sua manifestação [biótica-abiótica], e também, [...] a vida da 
natureza em si”. 
 
 
 
CRÍTICAS DO ECOCENTRISMO 
 
Crítica do Ecocentrismo ao Antropocentrismo 
 
O ecocentrismo responsabiliza a visão antropocêntrica por dar ao homem o papel de 
dominador da natureza que dela pode usufruir sem limites uma vez que ele foi 
colocado em um pedestal e “[...] nenhuma cultura colocou o ser humano em pedestal 
tão elevado quanto a ocidental”. “Enquanto o humanismo supervalorizou a posição 
do ‘homem’ no universo, o mecanicismo coisificou e instrumentalizou a natureza 
não-humana.” 
Vivemos uma crise de paradigma. É na ausência de limites que o indivíduo se 
hipertrofia e consequentemente a crise ambiental se alicerça. Já não conseguimos 
discernir o que nos distingue do animal, do que tem vida, da natureza. Também não 
conseguimos discernir o que nos une a eles, vivendo também uma crise de vínculo. 
O modelo mecanicista nos impõe uma visão fragmentada da realidade, do 
conhecimento, seja do conhecimento dos outros ou de nós mesmos. A crise da 
civilização é também uma crise existencial, do indivíduo. A visão 
instrumentalizadora da natureza condiciona o comportamento humano de tal forma 
que à relação ser humano/ser humano é conferida a mesma dinâmica que é dada à 
relação ser humano/natureza, ou seja, a relação ser humano/ser humano tornar-se uma 
relação sujeito/objeto. O ser humano passa a ser coisa, é reificado. O homem não 
reconhece o outro e não se reconhece no outro. É um indivíduo em busca de “coisas” 
que lhe proporcionam satisfação. 
Daí derivam também as formas de dominação exercidas por uma cultura sobre a 
outra, sobretudo da civilização ocidental antropocêntrica, como o domínio do 
europeu branco sobre os outros povos, o domínio do homem sobre as mulheres, 
 
preponderância das classes mais abastadas sobre as menos favorecidas, entre outros 
exemplos. 
Exposta dessa forma a crise ambiental supera a questão da crise ecológica, é uma 
crise de valores, é uma crise de uma sociedade e sua cosmovisão. A questão 
ambiental também engloba preocupações sociais visto que bilhões de pessoas da 
comunidade global têm necessidade de desenvolvimento socioeconômico para ter 
acesso ao ambiente sadio que viabilize o desenvolvimento humano e uma vida digna. 
Como é ilusório pensar que toda a humanidade poderá viver conforme os padrões do 
primeiro mundo, a humanidade, levada pelo desenvolvimento da ética do meio 
ambiente, deverá adotar mudanças no estilo de vida e de civilização. 
Para aqueles que pensam a questão ecológica [...] tal ética somente poderá surgir a 
partir da superação da visão de mundo que tentou reduzir todos os seres à condição 
de objetos cujo valor reside no lucro que podem produzir. Essa ética [...] implica uma 
mudança radical em nossa maneira de compreender a nossa identidade enquanto 
humanos e o nosso lugar no Cosmos, o nosso lugar entre os outros seres. 
 
As propostas do liberalismo, do conservadorismo e do socialismo por uma 
perspectiva ecocêntrica são variantes de um mesmo projeto político iluminista, que 
por sua vez era uma versão sofisticada do mecanicismo, expressam “um naturalismo 
mecanicista, reducionista, dualista e utilitarista que tratava os ecossistemas como 
entidades inanimadas postas a serviço das antropossociedades”. 
Mesmo considerando outros elementos da crise do paradigma atual, a questão 
ambiental é que “colocou em xeque os pensamentos e as ações humanas, do foro 
íntimo até os grandes sistemas em vias de globalização”. Podemos dizer então que a 
maior contradição do antropocentrismo ocidental é a longa guerra travada contra a 
natureza não-humana. “Da guerra de todos contra todos, presumida por Hobbes, 
passou-se ao que Michael Serres chamou de guerra de todos contra tudo.” 
 
 
Crítica do Ecocentrismo ao Personalismo 
 
No que diz

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