Prévia do material em texto
1 Eva Gabryelle | INTERNATO 2021| PEDIATRIA GERAL Meningite • É a infecção ou inflamação aguda das meninges causada por bactérias ou vírus – outras etiologias são mais raras; • Trata-se de uma doença grave e, mesmo quando tratada corretamente, a mortalidade é cerca de 10%; • Causa sequelas significativas em >10%, sobretudo déficit auditivo, convulsões, déficits cognitivos, intelectuais ou motores; MENINGITE BACTERIANA • Geralmente secundária a uma bacteremia silenciosa por germes frequentemente encontrados na orofaringe – mais raramente ocorre por extensão de um foco próximo como sinusite ou otite. • Incidência MAIOR em < 5 anos, com pico entre 6 meses e 1 ano. • Crianças > 2 meses, cerca de 90% dos casos de meningite bacteriana são causados por pneumococo, meningococo ou Haemophilus influenzae do tipo B, mas a proporção entre elas mudou recentemente com o avanço das imunizações, o que tornou raros os casos por Haemophilus B e reduziu cerca de metade dos casos de meningococo e pneumococo. QUADRO CLÍNICO ➢ Em todo quadro infeccioso grave com febre e prostração, sobretudo quando associado a qualquer sintomatologia neurológica como irritabilidade, sonolência, rigidez de nuca ou convulsão. Nesses casos, a possibilidade de meningite deve ser afastada mesmo quando tiver sido diagnosticado outro foco. ➢ A doença pode ter um início insidioso (mais frequente na pneumocócica) ou fulminante (mais frequente na meningocócica). Principais achados na meningite bacteriana: Principais sinais/sintomas Frequentes Menos frequentes Raros ou tardios ✓ Febre alta ✓ Hipotermia ✓ Prostração ✓ Rigidez de nuca ✓ Kernig, Brudzinski ✓ Fontanela abaulada ✓ Estupor ou coma ✓ Vômitos ✓ Gemência ✓ Taquicardia ✓ Irritabilidade ✓ Cefaleia ✓ Sonolência ✓ Dor cervical ✓ Agitação ✓ Delírios ✓ Hiperestesia difusa ✓ Hipotensão ✓ Dor nas pernas ✓ Paralisia de NC ✓ Fotofobia ✓ Mialgia, artralgia ✓ Opistótono ✓ Rash purpúrico – meningococo ✓ Exantema maculopapular (viral) ✓ Choque séptico ✓ Edema de papila 2 Eva Gabryelle | INTERNATO 2021| PEDIATRIA GERAL ✓ Convulsões Neonatos (negrito)** | 1 – 6 meses (itálico) | Acima de 6 meses (grifado) **Meningite neonatal→ No RN e nos < 3 meses, o quadro é INESPECÍFICO sobrepondo-se ao de um quadro de sepse neonatal com febre ou hipotermia, depressão do sensório, irritabilidade à manipulação, hipotonia, vômitos, alterações do sono, icterícia, sucção débil, apneia, cianose, convulsão. Nos RN só eventualmente existem sinais que apontam par ao comprometimento do SNC, como sinais meníngeos, convulsões e abaulamento de fontanela. A incidência geral de meningite bacteriana caiu em cerca de 30% nos últimos anos – e continua caindo. Etiologia bacteriana por faixa etária Neonato 1 a 3 meses 3 meses a 9 anos 10 a 18 anos Streptococcus grupo B → 50-60% Escherchia coli → 20-30% Pneumococo → 1-4% Meningococo → 1-3% Listeria monocytogenes → rara Streptococcus grupo B → 39% Pneumococo→ 14% Meningococo →12% Pneumococo→45% Meningococo→34% Streptococcus grupo B→ 5-11% Haemophilus B → raro pós-vacina Pneumococo→21% Meningococo→55% Streptococcus grupo B→8% Os principais fatores que aumentam o risco de meningite bacteriana na criança: Fatores de risco para meningite bacteriana Neonato Idade > 1 mês 1. Prematuridade e baixo peso 2. Infecção no periparto 3. Colonização materna por Streptococcus B 4. Parto laborioso 5. Hipóxia neonatal 6. Galactosemia 7. Uropatia congênita 8. Malformações congênitas craniofaciais 1. Vacinação incompleta 2. Contato prévio com caso de meningite 3. Asplenia anatômica ou funcional 4. Imunodeficiência 5. Infecção respiratória recente 6. Crianças institucionalizadas 7. Frequentar berçário/creche 8. Hospitalização prolongada 9. Falta de amamentação 10. Fístula pós-TCE 11. Disrafismo medular 12. Otite/sinusite de repetição 13. Família numerosa 14. Anemia falciforme (asplenia) 15. Neurocirurgia 16. Implante coclear MENINGITE E ENCEFALITE VIRÓTICA • A maioria dos casos de meningite em que nenhuma bactéria pode ser identificada no líquor é causada por VÍRUS ou o líquor é estéril devido ao uso prévio de antibióticos antes da punção. 3 Eva Gabryelle | INTERNATO 2021| PEDIATRIA GERAL • A evolução das meningoencefalites viróticas não herpéticas é favorável e sem sequelas em > 90% dos casos. • A principal etiologia da meningite virótica são os enterovírus (Coxsackie, Echovirus) e, menos frequentemente, caxumba, arbovírus, herpes simples e varicela-zóster. • A principal etiologia das encefalites são herpes simples – alguns casos são graves e evoluem de forma catastrófica, sobretudo as causadas por herpes simplex. Etiologia de meningite asséptica Infecciosas comuns Infecciosas incomuns Não infecciosas ✓ Coxsackie ✓ Echovirus ✓ Parechovirus ✓ Arbovírus ✓ Borrelia burgdoferi ✓ Varicela- zóster ✓ Herpes simplex ✓ Caxumba ✓ Sarampo ✓ HIV ✓ Epstein-Barr ✓ CMV ✓ Adenovírus ✓ M. tuberculosis ✓ Mycoplasma ✓ Fungos ✓ Protozoários ✓ Helmintos ✓ TCE ✓ Medicamentos (AINE, SMZ-TMP, isoniazida, imunoglobulina) ✓ Doença autoimune ✓ Neoplasias ✓ Efeito colateral de vacina tríplice viral • Outras causas raras de meningites são as causadas por: tuberculose, sífilis, cisticercose, Nocardia, Borrelia (doença de Lyme), fungos (Cryptococcus, Coccidioides, Histoplasma, Blastomyces, Cândida, Aspergillus), toxoplasmose, E. histolytica, Mycoplasma, Leptospira sp., Riquetsias, doença da arranhadura do gato. → maioria desses casos associados a imunodepressão. QUADRO CLÍNICO ➢ Na meningite virótica, os sintomas são os mesmos da meningite bacteriana, com sintomatologia sistêmica mais leve, mas o meningismo e os sinais neurológicos tendem a ter a mesma gravidade. ➢ Nas encefalites viróticas, os sintomas predominantes são a prostração, confusão mental, estupor ou coma. Podem estar presentes cefaleia, vômitos, convulsão, sinais focais, distúrbios motores, manifestações psiquiátricas, meningismo, exantemas. ATENÇÃO Meningococcemia grave sem meningite → o meningococo pode causar um quadro séptico com choque de evolução fulminante. Deve ser suspeitada em todo paciente grave com febre de início abrupto acompanhada de petéquias ou equimoses (exantema purpúrico) e abordada como emergência, inclusive com ATB na primeira hora. QUADRO CLÍNICO ➢ Manifesta-se com febre, palidez, prostração, alteração do sensório, sudorese, hipotonia, taquicardia, pulsos finos. ➢ Um exantema purpúrico ou petequial é um sinal de alerta presente em 20-50% dos casos. 4 Eva Gabryelle | INTERNATO 2021| PEDIATRIA GERAL ➢ Todo paciente com febre, prostração e púrpura aguda deve ser abordado como suspeita de sepse meningocócica até provar-se o contrário. ➢ A doença pode evoluir muito rápido para choque séptico grave, coagulação intravascular disseminada, necrose de extremidades, falência de múltiplos órgãos. A mortalidade e o risco de sequelas graves são altos. ATENÇÃO PARA OS SINAIS DE IRRITAÇÃO MENÍNGEA ➢ Ocorre na maioria dos casos de meningite em maiores de seis meses ➢ Rigidez de nuca, sinal de Kernig – com quadril e joelhos fletidos 90º (A EXTENSÃO DO JOELHO PROVOCA DOR NA NUCA, COLUNA) e Brudzinski – flexão involuntária das pernas quando o examinador provoca uma flexão rápida do pescoço. ➢ Para diferenciar a rigidez voluntária do meningismo, pode-se deitar a criança na beirada do leite ou da mesa de exame e deixar a cabeça pender pela gravidade antes de fletir a cabeça do paciente. Em alguns, a queixa inicial é de dor nas costas com redução da mobilidade da coluna. Opistótono é mais raro. A ausência de rigidez de nuca não exclui infecção do SNC e a necessidade de fazer uma punção lombar, sobretudo nos casos em que predomina a encefalite em relação ao comprometimento meníngeo. Em casosem que o meningismo é questionável e o quadro não parece grave, considerar as alternativas de fazer a punção lombar imediata ou internar e observar o paciente antes de definir a conduta. Causas de sinais meníngeos sem meningite 1. Abscessos retrofaríngeos 2. Faringite ou adenite cervical grave 3. Hipernatremia 4. Pneumonia em lobo superior 1. Artrite ou osteomielite em vértebras cervicais 2. Drogas intratecais ou cirurgia 3. Intoxicação por metais pesados 4. Tumores do SNC 1. Infiltração de leucoses 2. Pielonefrite grave 3. Tétano 4. Hemorragia subaracnoide 1º EPISÓDIO DE CONVULSÃO DURANTE QUADRO FEBRIL DE QUALQUER OR IGEM • O diagnóstico diferencial entre convulsão febril e meningite é difícil. • Nos menores de 6 meses, a punção lombar é obrigatória. • Entre 6 meses e 12 meses → punção lombar nos pacientes com as vacinas para meningococo, pneumococo e Haemophilus incompleta ou desconhecida. • O exame do líquor é mandatório para todos os casos em que houver algum sinal meníngeo ou outra sintomatologia neurológica não atribuível à própria convulsão, • Entre 1-5 anos → só puncionar se houver meningismo ou quadro neurológico sugestivo de meningite ou encefalite. Obs: como uma convulsão pode provocar leucocitose, o hemograma é de pouca ajuda para fazer a diferenciação nos pacientes que precisam da punção lombar. Um PCR negativo aumenta a chance de que a convulsão seja só febril. Entretanto, o PCR elevado ajuda pouco, pois pode estar relacionado à causa da febre. EXAMES QUE PODEM SER SOLICITADOS • Punção lombar e exame do líquor • Hemocultura 5 Eva Gabryelle | INTERNATO 2021| PEDIATRIA GERAL • TC ou RM • RT-PCR e sorologia para agentes etiológicos específicos TRATAMENTO OBS: Exceto por negativar rapidamente a cultura, o início do tratamento altera pouco os demais parâmetros do exame do líquor, feito poucas horas após. RN E < 2 MESES ➢ Cefotaxima (evitar Ceftriaxona na primeira semana ou se houver hiperbilirrubinemia) → a associação de Ampicilina + Gentamicina ou Amicacina é adequada para a maioria dos casos, mas as cefalosporinas de 3ª geração são mais eficazes para infecções do SNC. ➢ Nos casos de suspeita ou confirmação de Listeria sp., deve-se associar Ampicilina + cefalosporina de 3ª geração. MAIORES DE 2 MESES ➢ Ceftriaxona ou cefotaxima → uma alternativa é a associação da Ampicilina + Cloranfenicol. ➢ O Cloranfenicol é eficaz contra algumas cepas de pneumococo resistente e uma boa opção como monoterapia nos casos de pacientes alérgicos a penicilina e as cefalosporinas. ACIMA DE 5 ANOS E NAS VACINADAS CONTRA HAEMOPHILUS B ➢ Ampicilina em monoterapia até o resultado da cultura – porém esse dado é bem controverso, tendo a maioria dos protocolos preferência por utilizar: Ceftriaxona ou Cefotaxima. ➢ Em caso de suspeita de resistência bacteriana, associar às medicações supracitadas: Vancomicina até o resultado das culturas e antibiograma. MENINGITE PÓS-TCE, NEUROCIRURGIA, IMPLANTE COCLEAR OU VENTRICULITE ASSOCIADA A DVP ➢ Vancomicina (ou oxacilina, após afastar estafilococo resistente) + Ceftazidima ou Cefepima. ➢ Se houver suspeita de bactéria multirresistentes: Meropenem + Vancomicina até resultado de antibiograma e cultura. AJUSTE DO TRATAMENTO APÓS RESULTADO CONCLUSIVO DA CULTURA: 1. Meningococo → Penicilina G cristalina ou Ampicilina em monoterapia 2. Pneumococo → Se for cepa sensível: Penicilina ou Ampicilina, como no meningococo, ou manter a Ceftriaxona, se esta foi a primeira escolha e observar a evolução clínica e da febre. Se a febre se mantiver além do 3 º- 5º dia ou apresentar piora a qualquer momento, afastar complicações supurativas e fazer nova punção para o exame do líquor. Se o líquor for pior ou igual ao inicial → associar vancomicina (embora pneumococo resistente a Ceftriaxona seja raro em nosso meio). Se a TC mostrar complicações supurativas, manter o tratamento instituído, pois a febre será realmente mais prolongada devido a isso. 6 Eva Gabryelle | INTERNATO 2021| PEDIATRIA GERAL 3. Haemophilus → Ceftriaxona – alternativa para 1ª escola ou alérgicos: Cloranfenicol. 4. Listeria → Ampicilina + Gentamicina OU Ampicilina + Ceftriaxona 5. Infecção hospitalar ou suspeita de germes multirresistentes → Cefepima OU Meropenem associado a Vancomicina. Em imunodeprimidos ou neutropênicos: Ceftazidima + Amicacina ou Cefepima isolada – considerar fungos.