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Interpretação e Produção de Texto Linguagem e Cotidiano Material Teórico Responsável pelo Conteúdo: Profa. Ms. Elizabeth Maria Ziliotto Revisão Textual: Profa. Esp. Márcia Ota 5 Esta unidade traz: o material teórico para leitura, anotações, pesquisa e produção de atividades. A primeira atividade a realizar deve ser a leitura do texto-base que se encontra no livro. Em seguida, há uma apresentação narrada (ppt) que é mais uma oportunidade de trabalhar o conteúdo. Como atividades práticas há exercícios em forma de questões de múltipla escolha (AS) com correção automática e pontuação para compor a nota de aproveitamento da unidade em questão, esse é o momento de verificar as dúvidas sobre o conteúdo. · Nesta unidade, vamos abordar os fundamentos e os conceitos que estruturam as bases teóricas do conteúdo da disciplina IPT de modo a identificá-la no âmbito da leitura e produção dos sentidos textuais de acordo com as possibilidades de expressão na linguagem verbal escrita. Linguagem e Cotidiano · Linguagem e Cotidiano · Que objeto é a Palavra-língua? · E o cotidiano, que importância tem? · A formação da Consciência Sociocultural · O que é Ideologia ou Visão de Mundo? 6 Unidade: Linguagem e Cotidiano Contextualização A disciplina Interpretação e Produção de Textos se insere no campo da Comunicação, cujo caráter interdisciplinar e até mesmo multidisciplinar permite uma abrangência bastante ampla, não só nas áreas do saber, mas também nos mais variados campos de atuação, seja no âmbito da vida pessoal, seja na interação social e cultural dos processos de comunicação entre as pessoas. Nesse sentido, faremos,primeiramente, uma abordagem dos fundamentos e dos conceitos que estruturam as bases teóricas do conteúdo da disciplina IPT de modo a localizá-la no âmbito da leitura e produção dos sentidos textuais de acordo com as possibilidades da expressão na linguagem verbal escrita no cotidiano da vida profissional. Antes de iniciar a leitura da primeira unidade, indicamos a leitura do discurso de Bryan Dyson, ex-presidente da Coca-Cola, pelo link a seguir para uma experiência de leitura reflexiva do texto motivacional: Explore http://amigosletras.blogspot.com.br/2012/07/despedida-do-presidente-da-coca-cola.html Família SaúdeAmigos Trabalho Espírito Depois de lido o texto, indique três ideias-chave que chamaram a sua atenção,durante a leitura do discurso do ex-presidente da Coca-Cola, explique a razão disso. http://amigosletras.blogspot.com.br/2012/07/despedida-do-presidente-da-coca-cola.html 7 Linguagem e Cotidiano São objetivos de estudo desta unidade: compreender que a consciência humana é verbalmente constituída bem como o papel dos veículos de comunicação para o entendimento da vida cotidiana e inter-relacioná-la à globalidade da qual emerge, a partir da qual se configura e para qual converge, de forma a intervir cientificamente nos processos de comunicação que se estabelecem, adequando a práxis do cotidiano a uma prática profissional, a partir do instrumental teórico específico dos processos comunicacionais. Ao compreender a importância da palavra como matéria-prima do processo do pensamento que se constitui na prática social humanado cotidiano, produzindo e reproduzindo os sentidos nos discursos da história humana, inter-relacionando-os na construção da vida (passado, presente, futuro), podemos afirmar que a palavra é a própria vida, é pela linguagem que nos constituímos como pessoas. A palavra é o princípio, o meio e o fim desse universo que envolve cada um em relação com a realidade. É através da palavra que o sujeito conhece a si e a realidade que o rodeia, podendo através desse processo de conhecimento produzir novos outros processos de conhecimento. Cada sujeito é um indivíduo concreto que se constitui na interação social. É a partir daí que ele interage com o objeto do conhecimento, que, por sua vez também possui uma existência concreta, exterior e autônoma, através da linguagem, sobretudo da verbal, carregando consigo o processo social da educação, do sistema de valores marcado pela classe social a que pertence. A linguagem está em tudo que existe no mundo. O diálogo entre nós e o mundo acontece por meio de vários tipos de linguagem, entre os quais se destaca o verbal, que se chama de língua, e anão verbal, que pode ser identificada a partir dos sentidos empregados na percepção do mundo: o visual, o auditivo, o tato, o olfativo, o gustativo. A expressão pela linguagem não é vista como uma representação da realidade, mas resultado das intenções de quem a produziu e do impacto que terá no interlocutor. Os sentidos só se produzem nas relações entre pessoas, seja no diálogo face a face, seja nas produções verbais dos diversos gêneros e tipos de textos verbais ou não verbais nas diversas situações da vida cotidiana. Quem é esse sujeito? Como ele se constitui? Este sujeito é resultado da influência das muitas vozes que recebe e tem a condição de reproduzire ou de reelaborar. Como lembra Bakhtin, “o ser, refletido no signo1, não apenas nele se reflete, mas também se refrata” (1988, p. 46). Portanto, é da natureza da palavrareproduzir- se, ao mesmo tempo em que reflete, desviandopouco ou muito o sentido da realidade. 1 Signo é toda unidade portadora de sentido. Possui uma face sonora ou gráfica ligada a outra face de significado ou conteúdo. Signos são instrumentos de comunicação e representação, na medida em que, com eles, construímos, linguisticamente, a realidade e distinguimos os objetos entre si. 8 Unidade: Linguagem e Cotidiano Enquanto manifesta alguma expressão, reproduzou reelabora os diversos discursos sociais, cada indivíduoatua comunicativamente nas relações sociais; quando inova os discursos da sociedade, produzindo outros, ele é um ser ativo. É dessa condição que ele pode ser designado indivíduo-sujeito. A articulação de estruturas sociais e processos de comunicação se dão nesse eu plural. Nesse dialogismo, estão presentes tanto os resultados do percurso histórico do grupo ou classe social, que condicionam as ações e os comportamentos, quanto os processos das ações e a efetivação dos comportamentos dos indivíduos-sujeitos. Nessa inter-relação, estabelece-se a subjetividade, o eu plural, isto é, o indivíduo-sujeito é capaz de escolher e decidir entre as várias possibilidades da realidade cotidiana de acordo com interesses e necessidades do grupo ou classe social a que pertence. De acordo com esse processo de concepção de linguagem, a nossa língua é o nosso melhor retrato. Pela língua, revelamos quem somos, como pensamos, quais são nossos valores, nossas crenças, como agimos, nos vários espaços das cenas da vida. A língua nos constitui como seres de linguagem, capazes de construir a nossa história de vida. Para ilustrar a reflexão temática, apresentamos, no poema seguinte, sem título/autoria, o fantástico poder de expressão e representação que a palavra-língua nos confere. Quem se identifica em alguma ou várias dessas situações do cotidiano da vida? Quais são as principais influências desse eu leitor/escritor que você se reconhece hoje? Nesta altura da vida, já não sei mais quem sou Na ficha do médico, apareço como cliente. No restaurante, sou freguês. Quando alugo uma casa, sou inquilino. Na condução, sou passageiro. Nos correios, sou remetente. No supermercado, sou consumidor. Para a Receita Federal, sou contribuinte. Com prazo vencido, sou inadimplente, e se não pago, sou sonegador. Para votar, sou eleitor; mas no comício, sou massa. Em viagem, sou turista. Na rua, caminhando, sou pedestre, e se me atropelam, viro acidentado. No hospital, transformo-me em paciente. Para os jornais, sou vítima. Se compro um livro, viro leitor. Se ligo o rádio, sou ouvinte. Para o Ibope, sou espectador. No futebol, eu, que já fui torcedor, virei galera. E, quando morrer, ninguém vai-se lembrar do meu nome. Vão-me chamar de finado, extinto, defunto e, emcertos círculos, até desencarnado. E pensar que, no meu apogeu, já fui mais eu... 9 Desde a década de 80, no Brasil, o ensino das práticas de leitura e produção de texto vem sendo modificado pela concepção de linguagem apresentada por uma importante referência no campo da filosofia da linguagem: o filósofo da linguagem de origem russa, Mikhail Bakhtin (1895-1975). Um dos aspectos inovadores dessa reflexão foi conceber a linguagem como um constante processo de interação mediado pelo diálogo entre os sujeitos, ou seja, por alguma forma de expressão de conteúdo que pode ser a língua em que falamos/escrevemos, os gestos visuais, os sinais, os símbolos, os códigos e todas as formas de expressão e comunicação que nos unem ao mundo pelos sentidos. A linguagem como uma forma de atividade humana, mais especificamente uma atividade verbal, envolve todo o conjunto organizado de sinais usado para expressar ideias e sentimentos cuja finalidade é fazer com que os indivíduos se comuniquem entre si. Comunicar é transmitir o que está em nossa cabeça para a cabeça de nosso interlocutor por meio de um veículo de transmissão do código/linguagem. Dentre todos os tipos de linguagem usados pelos seres humanos: corporal, visual, sonora, gestual, etc., a fala é a mais utilizada. A essa linguagem falada, também conhecida como articulada, se dá o nome de língua, conjunto de signos e de formas de combiná-los que pertence a um determinado grupo de indivíduos. A linguagem é inseparável do homem, segue-o em todos os seus atos. A linguagem é o instrumento graças ao qual o homem modela seu pensamento, seus sentimentos, suas emoções, seus esforços, sua vontade, seus atos, o instrumento graças ao qual ele influencia e é influenciado, a base mais profunda da sociedade humana (HJELMSLEV, Louis. Prolegômenos a uma teoria da linguagem. São Paulo, Perspectiva,1975). Diálogo com o Autor Para Bakhtin, o filósofo da linguagem, não é a atividade mental que organiza a expressão, ao contrário, é a expressão que organiza a atividade mental, que a modela e determina sua orientação. A língua materna, seu vocabulário e suaestrutura gramatical, não conhecemos por meio de dicionários ou manuais de gramática, mas graças aos enunciados concretos que ouvimos e reproduzimos na comunicação efetiva com as pessoas que nos rodeiam. O dialogismo de Bakhtin é a relação em que a palavra, o signo, o enunciado ou discurso, carregados de significação, levam consigo os sentidos que perpassam as relações e interações entre os sujeitos, agentes das práticas sociais. O enunciado/texto/discurso(termos usados aqui como sinônimos) é produzido por um enunciador para um enunciatário no contexto social, histórico, cultural e ideológico em que vive, para compreensão e construção de sentido. A linguagem ou a língua como forma de interação social deixa de ser apenas a expressão do pensamento para ser um instrumento de comunicação e de significação entre interlocutores que trocam mensagem a qual precisa ser compreendida. W ik im ed ia C om m on s 10 Unidade: Linguagem e Cotidiano Que Objeto é a Palavra-Língua? A palavra é: o objeto do conhecimento, a realidade, o signo polivalente que carrega a prática social solidificada e o recorte com o qual nos posicionamos no mundo. A palavra materializa uma representação e possibilita que uma ideia, ou conteúdo, surja como a coisa representada e sua representação (forma). É a articulação entre a coisa e os atributos dela; é a mediação como força que impele o indivíduo-sujeito a perceber a realidade (objeto) de certo modo; a palavra traz consigo o sistema de valores da ideologia constituída e em constituição. De acordo com Bakhtin, “a palavra é a arena privilegiada onde se desenvolve a luta de classes”. A palavra enquanto “língua”, supõe, portanto, indivíduos socialmente organizados que fazem um “contrato” entre si e instituem os significados. É a base comum dos processos discursivos, das manifestações ideológicas. A palavra dirige-se a um interlocutor presente ou ausente (outro). Há, pois, um auditório estabelecido: procede de alguém (alguém fala); dirige-se a alguém (o outro); procura persuadir, convencer em maior ou menor grau. Enquanto “fala” é a concretização individual, material e concreta do sistema linguístico, é a apropriação de um processo coletivo, o indivíduo-sujeito apropria-se da cultura já dada e nesse processo poderá reproduzir ou inovar. A enunciação refere-se à escolha do indivíduo-sujeito no universo de palavras à disposição. Ao combiná-las, compõe seu enunciado/texto, manifesta suas concepções, suas ideias, as quais foram formadas a partir desse conjunto de interações. Assim, nasce o discurso. Nesse sentido, Guimarães (em Texto e Discurso: confluências. São Paulo: editora Mackenzie, 2008.) propõe considerar texto como processo organizacional do pensamento e discurso, processo interacional de produção de sentido. O indivíduo-sujeito está cercado de formações discursivas de toda a sociedade, formações que regem seus comportamentos no cotidiano, suas atividades, procurando moldá-las. E a reelaboração desses discursos vai encaminhá-lo no sentido da reprodução/conservação e/ou no sentido da transformação/mudança desses sentidos. Ao enunciar ou discursar, selecionam-se e combinam-se palavras, frases ou orações, apropriadas para formular uma mensagem que provoque uma resposta no destinatário, isto é, aquele que ouve ou lê. Por outro lado, o interlocutor compreende, interpreta e responde com postura ativa àquele enunciado, internamente por meio de seus pensamentos, ou, externamente, por meio de um novo enunciado oral ou escrito. Todo esse processo se dá pela interação social, na relação dialógica entre os sujeitos e por meio da linguagem constituída pelo verbal ou não verbal. A criação das mensagens de comunicação requerum formato, um modo de configurar o produto textual. Ao conjunto de propriedades formais que delineiam o texto quanto ao tipo de construção, conteúdo temático e estilo é que se chama de gênero. Os gêneros textuais são importantes instrumentos de transmissão de mensagens, são gerados a partir das necessidades da vivência dos sujeitos. A opção pelo gênero, ou seja, a escolha de um formato de texto e do tipo de conteúdo é uma atividade em processo que considera os sujeitos nas práticas sociais: em casa, na escola, no trabalho, na igreja, no clube, entre amigos, na política, etc., para gerar o produto que reflita as condições específicas e as finalidades da interação entre os interlocutores envolvidos no ato de comunicação. 11 Para Pensar Era uma vez um escritor que morava numa praia tranquila, junto a uma colônia de pescadores. Todas as manhãs ele passeava beira-mar, para se inspirar, e de tarde ficava escrevendo. Um dia, caminhando na praia, ele viu um vulto que parecia dançar. Quando chegou perto, era um jovem pegando na areia as estrelas-do-mar, uma por uma, e jogando novamente de volta ao oceano. — Por que você está fazendo isso? - perguntou o escritor. — Você não vê? - disse o jovem. A maré está baixa e o sol está brilhando. Elas vão secar no sol e morrer, se ficarem aqui na areia. — Meu jovem, existem milhares de quilômetros de praia por esse mundo afora, e centenas de milhares de estrelas-do-mar espalhadas pelas praias. Que diferença faz? Você joga umas poucas de volta ao oceano, a maioria vai perecer de qualquer forma. O jovem pegou mais uma estrela na areia, jogou de volta ao oceano, olhou para o escritor e disse: — Pra essa, eu fiz diferença. Naquela noite o escritor não conseguiu dormir nem sequer escrever. De manhãzinha foi para a praia. Reuniu-se ao jovem e, juntos, começaram a jogar estrelas-do-mar de volta ao oceano. Esperamos que você seja um dos que querem fazer deste Universo um lugar melhor devido a sua presença. Vamos juntos jogar estrelas-do-mar de volta ao oceano? E o Cotidiano, que importância tem? O cotidiano é o cenário onde tudo acontece,é a vida, é onde o homem inteiro/ indivíduo- sujeito participa com todos os aspectos de sua individualidade, de sua pessoa, de seu singular e genérico, ao menos no sentido teórico deveria ser assim. Entretanto, é também no cotidiano que estão todos os problemas, as questões que não permitem que o homem se realize como pessoa inteira e se manifeste, muitas vezes, como espécie genérica, sobrevivendo, apenas. É nesse ponto que o cotidiano pode interessar para uma análise mais atenta, contribuindo para a busca de algumas saídas para a compreensão dos problemas comunicacionais.A vida cotidiana é heterogênea e hierárquica, isto é, caracteriza-se por um conjunto de ações e relações de diferentes naturezas que contêm em seu bojo certa hierarquia. Altera-se em razão dos valores de uma dada época histórica, das particularidades e interesses de cada um e nas diferentes etapas de vida. A rotina, sucessão linear e repetitiva de gestos, atos e atividades, demonstra uma heterogeneidade hierarquizada. Hoje, o imediatismo e a funcionalidade fazem do útil o verdadeiro valor. O verdadeiro valor e tudo aquilo que favorece o desenvolvimento da essência humana pode permanecer abafado no cotidiano: o sensível, o vivido, a subjetividade fugitiva, as emoções, os afetos, os hábitos e os comportamentos, as imagens e o imaginário. 12 Unidade: Linguagem e Cotidiano É justamente nessas inúmeras e diferentes possibilidades da vida cotidiana que se encontra a força motora das transformações da sociedade, com foco a partir do cotidiano vivido pelas pessoas. A vida cotidiana se insere na história, modifica-se e modifica as relações sociais. Mas a direção dessas modificações depende basicamente do grau de consciência que os homens portam de sua “essência” e dos valores presentes ou não ao seu desenvolvimento. Essa consciência individual pode ser ainda fruto, em maior ou menor grau, de opiniões (conhecimento não verificado) ou de estereótipos (pensamento preconcebido acerca de atributos do mundo exterior, apenas como reflexo generalizado da realidade com intervenção do subjetivo - emoções, valores, desejos) ou até falsos juízos provisórios ou ultrageneralizações (deformidade da realidade) que se realizam pela economia do pensamento e organização da experiência e expectativa do homem. Além de tudo isso, as novas condições da existência social (modernização, progresso, desenvolvimento tecnológico, globalização), o ritmo acelerado impresso à vida cotidiana cria uma complexidade e confusão que afetam o comportamento dos indivíduos e sua relação social. Dessa forma, o comportamento do homem está condicionado por seu autoconhecimento e conhecimento do mundo, manifestado em seu pensamento e, consequentemente, na sua atividade consciente, pela atividade da linguagem verbal interativa, sofrendo forte influência da relação emocional com as coisas do mundo por se sustentar mais nos estereótipos do conhecimento e menos no conceito real. As falas emitem um produto mascarado pela sociedade. São as máscaras ditadas pela ideologia. Ao falar, o indivíduo-sujeito leva em conta o que pode dizer ou não dizer. Esse poder é ditado pelas conveniências, desempenhando seu papel social de acordo com os comportamentos que a sociedade espera dele (conformismo, acomodação). Não deve transgredir; convém não criticar. Assim, praticam mais sua condição de indivíduos e menos a de sujeitos, vivendo nessa incompletude num grande vazio que se forma e permanece. O processo do conhecimento supõe um indivíduo que escolhe sua posição ideológica e assume a palavra. Quanto maior for a consciência de que sua elaboração é a apropriação individual de um processo coletivo do qual ele é o ator e resultado e de que o produto de sua construção discursiva voltará a essa coletividade, melhor será sua decisão para escolher entre a reprodução e ou mudança. A formação da Consciência Sociocultural Somos seres culturais, não só sociais. Tudo o que é cultural, carregado de sentido, tem um valor. As coisas inertes, prosaicas ganham sentido social, cultural pela maneira como são utilizadas, o ser humano é sempre ser social, envolvendo cultura e comunicação (códigos, linguagens) na interação social, verbal, cultural. Somos atores de uma realidade, inseridos numa relação política, econômica, cultural e religiosa, pela comunicação. Organizamo-nos a partir da observação da existência dessas várias dimensões mescladas entre si, sendo a cultural sempre subjacente em todas. A cultura, portanto, é elemento decisivo na formação da consciência pessoal e coletiva. 13 Na sociedade contemporânea, a formação da consciência individual ou coletiva se faz sob fortes influências dos meios de comunicação de massa, da tecnologia da informação. A razão comunicativa é substituída pela razão instrumental, prática, produzindo na sociedade a busca de referenciais que justifiquem as mudanças por que passa a humanidade. É o predomínio da tecnologia (o real se converte no virtual) e da informação. O desenvolvimento tecnológico permitiu que a informação represente, hoje, a chave dos processos de produção de bens e de serviços, não só de natureza física como também de natureza simbólica. As tecnologias da informação constituem verdadeiramente um dos elementos mais dinâmicos da moderna economia mundial. Expandem-se, penetram e inundam tudo: o entretenimento, a informação monopolizada, a educação; interferem no cotidiano de milhares de pessoas; têm um grande impacto na organização do trabalho e uma nova manipulação do poder mundial. Com a era da informação tudo muda muito rapidamente, desde as visões de mundo que alimentam o imaginário social e cultural das pessoas até a forma como os seres humanos se relacionam entre si. Apesar de tudo, da rapidez, do pluralismo e diversidade de imagens do mundo, da aproximação de tantas realidades, há um crescente aumento das dúvidas, das incertezas, da fragmentação e da alienação das pessoas. Sob a ampla e a irrestrita influência da dinâmica poderosa das linguagens dos meios de comunicação de massa, da indústria cultural, que age fortalecendo a razão instrumental, difundindo tecnologias, que visam o mercado capitalista, o consumismo e a alienação das mentes e corações humanos, encontra-se a cultura e a educação. A escola, o livro e a crença na razão iluminista perdem seu lugar para a razão instrumental, para a realidade virtual, para a comunidade virtual em que tudo é fugaz, transitório, superficial, efêmero, nada fica, nada permanece. Há um vazio muito grande entre o que pensamos e o que sentimos. Nossa linguagem/expressão do mundo está sendo ameaçada por forças estranhas à nossa natureza. O mundo da vida sofre sob as pressões do mundo da razão instrumental. O homem não pode perder aquilo que é mais precioso em sua natureza: sua razão e sua sensibilidade. Só conseguiremos resultados saudáveis de transformação da ação sociocultural do homem e da sociedade como um todo, se houver uma verdadeira integração entre as partes que compõem esse todo de interesses tão plural e tão diversificado. Será uma utopia? O que é Ideologia ou Visão de Mundo? A atribuição de sentidos que damos às coisas do mundo nas várias linguagens que representam as coisas depende do conhecimento, das nossas vivências e da elaboração intelectual sobre a realidade, feita pelos pensadores, filósofos, cientistas, professores, escritores, jornalistas, artistas e sacerdotes, que descrevem e explicam o mundo, a partir do ponto de vista da classe a que pertencem. Essa elaboração incorporada pelo senso comum social que forma nossa memória discursiva é a ideologia. 14 Unidade: Linguagem e Cotidiano A ideologia ou visão de mundo é responsável por nossa forma de atuar em relação aos nossos direitos e deveres de cidadãos. Pode, dessa forma, nos conduzir a atitudes de reprodutibilidade, de alienação ou à mera ilusão ou fantasia. As palavras criam conceitos e esses conceitos ordenam a realidade, categorizam o mundo. Ideologiaé um conjunto lógico, sistemático e coerente de representações (ideias e valores) e de normas ou regras (de conduta) que indicam e preservam aos membros da sociedade o que devem pensar e como devem pensar, o que devem valorizar e como devem valorizar, o que devem sentir e como devem sentir, o que devem fazer e como devem fazer (CHAUÍ, Marilena. O que é ideologia. 1984). Cabe ainda ressaltar o importante papel da mídia na produção de sentido do mundo contemporâneo. A mídia não é apenas um meio poderoso de criar e fazer circular conteúdos simbólicos, mas possui um poder transformador de reestruturação dos espaços de interação, propiciando novas configurações aos esforços de produção de sentido. A capacidade de traduzir em palavras, pensamentos, gestos e atitudes é o que nos distingue como ser. A competência linguística de falar, escrever, ler e ouvir proporciona a possibilidade de organização em sociedade, e a convivência com o outro em certo período de tempo, e em determinado lugar, nas mais diversas situações e circunstâncias, para construir, por meio da língua natural, uma história de vida, a história de cada um e a do mundo. Investigar os sistemas e as formas de linguagem, especialmente da nossa língua, é desvendar os pensamentos, as emoções, as razões, e chegar aos conteúdos que organizam a mente movida pela inteligência comunicativa e pela capacidade de perceber o mundo em que vivemos. Aperfeiçoar cada vez mais as possibilidades de usar o poder de representação e significação da língua é o que nos impele a buscar o desenvolvimento da habilidade comunicativa da linguagem. Em síntese, estudar a produção de sentido através das práticas discursivas é fazê-lo em torno de três dimensões: da linguagem verbal, da história e da pessoa. Essas três dimensões se inter-relacionam dialogicamente e se processam como fenômenos sociais através das tensões entre a universalidade e a particularidade, entre o consenso e a diversidade, produzindo as transformações da ordem social. 15 Leia o seguinte texto: Decifrando a escrita da vida Todas as pessoas tendem a atribuir um poder mágico à palavra escrita. A tradição judaico- cristã repousa sobre um livro, a Bíblia, que vem sendo lido com unção e respeito há milhares de anos. A expressão árabe Maktub, “estava escrito”, diz que o Destino, para ser verdadeiramente Destino, deve estar escrito. Adivinhos, por sua vez, leem o futuro nas linhas das mãos, nas folhas do chá, nos búzios, que passam então a adquirir o significado de mensagens. São crenças de natureza religiosa ou mágica, mas às quais a ciência acabou recorrendo, ainda que em caráter de metáfora, para responder à pergunta que sempre intrigou a humanidade: como se transmitem os caracteres hereditários? De que maneira o ser que vai nascer é “informado” – no sentido de receber uma forma? Difícil questão. Muito mais difícil que decifrar os hieróglifos, por exemplo. Neste caso, o achado da pedra de Rosetta, com os misteriosos caracteres egípcios ao lado da familiar escrita grega, resolveu o problema. No caso da hereditariedade, era preciso, em primeiro lugar, achar onde estava a mensagem, o que só ocorreu no século vinte, com a descoberta dos cromossomas e dos gens. E aí se constatou que a escritura da vida é dada pela disposição de substâncias químicas dentro da grande molécula do ácido desoxirribonucleico, o DNA. Cada gene é, portanto, um texto. Um texto que, decifrado, permite responder por que uma pessoa tem tal ou qual defeito congênito. E permitirá também corrigir defeitos, mediante a engenharia genética. “No começo era o verbo.” Exatamente: no começo, era a palavra, o texto. O que está escrito – não no Livro do Destino, mas em nossas células – condiciona nossa existência. Estamos aprendendo a nos comunicar com a natureza, mas na linguagem desta. Mil histórias poderão ser agora contadas. Histórias para as quais o final feliz não é só um exercício ficcional, mas é uma gloriosa possibilidade. SCLIAR, Moacyr. In: Omint fala com você. São Paulo: Omint Assistencial. nº 10, out. 2000. Agora, vamos interpretar o texto lido? 1. Moacyr Scliar é médico e escritor. Talvez isso justifique a forma como ele aborda a questão da hereditariedade genética. a) Que frase(s) contém(êm) a ideia central do texto? Ou seja: de que exatamente ele trata? b) Que aspectos do texto nos mostram o ponto de vista do escritor a respeito do assunto? 2. Podemos compreender com esse texto que a linguagem faz parte do universo humano: o homem cria linguagens para representar dados do seu mundo; ele interpreta dados desse mundo como linguagens. a) Identifique passagens que mostram esses dois procedimentos. b) Esses dois procedimentos mostram também a variedade de linguagens presente no universo humano. Indique algumas delas. c) Dê outros exemplos de linguagens utilizadas pelo homem para explicar a vida. 16 Unidade: Linguagem e Cotidiano 3. Podemos deduzir, ainda, que a descoberta científica muitas vezes está associada à identificação de uma linguagem. Enquanto essa linguagem não é identificada, o problema permanece indecifrável. a) Que passagem comprova essa afirmação? b) Qual foi a “pedra de Rosetta” da ciência, nesse caso? 4. Pensando nas características de um código, explique como a escrita grega pôde auxiliar na decifração dos hieróglifos. 5. Destaque do último parágrafo um exemplo de dialogismo (diálogo entre textos), ou seja, de expressão reveladora de outra voz, que provém de outro texto, outra autoria. Justifique sua resposta. 6. Comente as afirmações: “cada gene é um texto”; “quando nascemos, temos um livro escrito dentro de nós, um livro que fala sobre o (nosso) futuro”. Expectativa de respostas: 1. R.: a)A ideia central do texto,ou seja, de que exatamente ele trata está na frase: “... como se transmitem os caracteres hereditários? De que maneira o ser que vai nascer é informado? O assunto está claro também no título. b) O ponto de vista do escritor a respeito do assunto é a comparação da leitura da escrita com a leitura do DNA: linguagem verbal e não verbal. 2. R.: a) As passagens que mostram esses dois procedimentos: A tradição judaico-cristã sobre a Bíblia, expressão “Maktub”, estava escrito. b) A variedade de linguagens presente no universo humano, entre algumas delas: linguagem verbal escrita da tradição judaico-cristã, o grego, os caracteres egípcios; a linguagem não verbal: a leitura das linhas das mãos, das folhas de chá, dos búzios, das células. c) Outros exemplos de linguagens utilizadas pelo homem para explicar a vida:astrônomo lendo o mapa de estrelas; arquiteto lendo a planta da casa; lendo a partitura da música. 3. R.: a) A passagem que comprova:Qual é o código para ser decifrada a mensagem: onde estava a mensagem? b) A “pedra de Rosetta” da ciência foi: o DNA, a descoberta dos cromossomas e dos genes. 4. R.: A escrita grega pôde auxiliar na decifração dos hieróglifos ao representar com palavras legíveis os desenhos dos hieróglifos. 5. R.: Um exemplo de dialogia, ou seja, de expressão reveladora de outra voz, que provém de outro texto, outra autoria é: “No começo era o verbo.”referente usado na Gênesis bíblica,está entre aspas por ser uma citação. 6. R.: Pessoal 17 Ideias-Chave da unidade: Linguagem & Cotidiano Coluna A Coluna B 1. Cada unidade de enunciação 11. Processo de seleção e combinação para enunciar - dizer ou escrever. 2. Cada enunciado/discurso/texto 12. Um produto do dizer - é o falado ou escrito. 3. Dialogismo 13. Princípio constitutivo da linguagem, da língua e do texto. Diálogo entre dois seres sociais em interação que constrói os sentidos. 4. Enunciado/Texto/Discurso 14. Unidade de sentido e de comunicação, constituído por um conjunto de elementos em linguagem verbal para expressar conteúdo e forma. 5. Gêneros 15. Formatos variados de textos para expressar determinados conteúdos e situações. 6. Ideologia/Visão de mundo 16. Conjunto de ideias, valores e normas que orientam a condutahumana. 7. Intrepretar 17. Reproduzir o conteúdo de um texto de forma resumida, mantendo as ideias originais. Explicar ou esclarecer o sentido de uma palavra, texto, lei, etc. 8. Ler 18. Atribuir sentidos a partir do conhecimento de texto, da língua e da visão de mundo. 9. Língua 19. Instrumento de comunicação e geração de sentidos pela interação entre os sujeitos. 10. Linguagem 20. Forma de interação social, expressão do pensamento, instrumento de comunicação e de significação entre interlocutores que trocam mensagem a qual precisa ser compreendida 18 Unidade: Linguagem e Cotidiano Material Complementar Nossa língua em uso Resumo: Breve estudo sobre as variedades linguísticas evidencia que o importante é saber identificá-las, avaliar sua adequação ao ambiente e ao contexto e nos livrar de todo e qualquer preconceito linguístico. Disponível em: https://bb.cruzeirodosulvirtual.com.br/bbcswebdav/courses/backup_ int_pro_tex_grad_content/backup_int_pro_tex_grad_content/un_I/mat_comp/mat_ comp1.pdf https://bb.cruzeirodosulvirtual.com.br/bbcswebdav/courses/backup_int_pro_tex_grad_content/backup_int_pro_tex_grad_content/un_I/mat_comp/mat_comp1.pdf https://bb.cruzeirodosulvirtual.com.br/bbcswebdav/courses/backup_int_pro_tex_grad_content/backup_int_pro_tex_grad_content/un_I/mat_comp/mat_comp1.pdf https://bb.cruzeirodosulvirtual.com.br/bbcswebdav/courses/backup_int_pro_tex_grad_content/backup_int_pro_tex_grad_content/un_I/mat_comp/mat_comp1.pdf 19 Referências BAKHTIN, M. Marxismo e filosofia da linguagem. São Paulo: Hucitec, 1988. ___________. Estética da criação verbal. 4ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 2003 ZILIOTTO, Elizabeth Maria. Diálogos Inovadores. Trabalho de Conclusão de Curso. (Gestão da Comunicação) – ECA/USP, São Paulo, 2001. 20 Unidade: Linguagem e Cotidiano Anotações www.cruzeirodosulvirtual.com.br Campus Liberdade Rua Galvão Bueno, 868 CEP 01506-000 São Paulo - SP - Brasil Tel: (55 11) 3385-3000
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