Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Economia Solidária e Assentamento Rurais 02 1. Introdução 4 2. Importância da Economia Solidária no Brasil 7 3. O Quadro Teórico Sobre a Comercialização da Produção Agrícola dos Assentamentos da Reforma Agrária 12 Desafios, Possibilidades e Armadilhas da Economia Popular Solidária 19 Aspectos Teóricos Quanto à Comercialização em Assentamentos Rurais 23 4. Políticas Públicas para os Assentamentos Rurais 28 Autogestão e Deliberação Democrática 30 5. Referências Bibliográficas 35 03 4 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS 1. Introdução Fonte: Veja Abril1 Brasil possui uma das mais injustas distribuições de terras do mundo. Segundo dados da FAO/INCRA ba- seados no censo agropecuário 1995/1996 do IBGE, 11,4% dos proprietários de terra detêm 67,9% das terras. Toledo (2002) discute as vantagens e desvantagens da produção rural e analisa sua relação com o tamanho da propriedade agrícola, conclu- indo que a produtividade das pequenas propriedades é maior que das grandes pro- priedades (apud, CARVALHO, et al.; 2006). Por outro lado, com o avanço da reforma agrária demanda que a questão não seja avaliada exclusiva- mente como acesso à terra, todavia, sobretudo como a probabilidade de 1 Retirado em http://veja.abril.com.br afiançar a sustentabilidade do ho- mem no campo, o que solicita a pro- trusão com o modelo vigente, uma vez que o que se averígua nos assen- tamentos rurais é as aquisições em monoculturas, com elevados valo- res, a não produção para subsistên- cia, a deficiência de postos de traba- lho e por consequente êxodo de jo- vens e financiamentos inconciliáveis com a realidade do agricultor fami- liar, fazendo com que os lotes econô- mico sejam socialmente inviáveis Uma das formas de viabilizar a permanência das famílias nos assentamentos pode ser por meio da organização e estrutu- ração de Empreendimentos O 5 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS Econômicos Solidários (EES), definidos por Gaiger et ai (1999 citado por EID & PIMENTEL, 2001) como sendo organizações coletivas de trabalhadores vol- tados para a geração de traba- lho e renda, regidos idealmen- te, por princípios de autoges- tão, democracia, participação, solidariedade, igualitarismo, cooperação no trabalho, autos- sustentação, desenvolvimento humano e responsabilidade so- cial (apud, CARVALHO, et al.; 2006). Logo, a Economia Solidária exibe outro modo de organizar esse conjunto de consumo, produção, mercador, finanças, informação e a educação, tendo como núcleo “o ho- mo, seu trabalho, seu saber social- mente acumulado e sua criativida- de”, de forma que as precisões mate- riais e imateriais do homem sejam versados individualmente e ou em grupo de forma justa, fraterna e sus- tentável. No que tange sobre as organi- zações solidárias, 50 % se localizam tão-somente na parte área rural do país, cuidadosamente envolvidos no debate da sustentabilidade entre o homem e claro a conservação dos re- cursos naturais. Nesse sentido, os princípios da Economia Solidária aproxi- mam-se dos princípios da Agro- ecologia, por entender que existe compatibilidade dessas abordagens com a emancipação socioeconômica, a segurança alimentar e com a preservação ambiental. De modo mais am- plo, verifica-se a consonância entre a Economia Solidária e a Agroecologia, pois compreen- dem o homem na sua dimensão sócio-histórica, ou seja, como um ser capaz de refletir, intervir e mudar sua realidade constan- temente (apud, CARVALHO, et al.; 2006). Desse modo, a Agroecologia compõe uma área de estudos que busca deter as maneiras degradan- tes e exploradoras da natureza e da sociedade por meio de atuações so- ciais coletivas de costume participa- tivo na procura com aplicação de modelo agricultor com alternativos potencializadores da biodiversidade ecológica e da multiplicidade socio- cultural. 7 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS 2. Importância da Economia Solidária no Brasil Fonte: Sebrae - sc2 m diferentes localizações do país, algumas com maior in- tensidade, tem se desenvolvido, es- pecialmente nos últimos quinze anos, por conta das experiências de geração de trabalho, assim melho- rando a renda, de forma mais solidá- ria e associativa. Logo, as iniciativas isoladas deram espaço para uma realidade que se amplia e se dinamiza, deri- vando em atuação de entidades de classe e bem como criação de políti- cas públicas no campo popular, diri- gidas para uma economia alternati- va sólida que está em procedimento de gestação. 2 Retirado em https://atendimento.sebrae-sc.com.br/blog/economia-solidaria-o-que-e/ Gaiger et al., ao analisarem a vi- abilidade e as perspectivas da Economia Solidária no estado do Rio Grande do Sul mostra- ram que, se antes, as experiên- cias de geração de trabalho e renda eram consideradas pelos pesquisadores como circuns- tanciais e efêmeras, de difícil registro, a partir da década de 90, aumenta ano a ano, o inte- resse por investigações científi- cas sobre iniciativas solidárias, algumas com mais de dez anos de atividade contínua. Isso não quer dizer que dissoluções não ocorram, mas o que se observa de novo, é a busca pela sobrevi- vência e mesmo o crescimento de algumas, procurando garan- tir, simultaneamente, o equilí- brio entre o econômico e o so- cial (apud; EID & PIMENTEL, 2001). E 8 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS É nesse contexto que um novo comentário sobre experiências soli- dárias e ações de apoio analisa que, para sobreviverem e desenvolverem, tenderiam a evolucionar para atua- ções propositivas, destacando-se a criação de novas maneiras de orga- nização da produção e do trabalho, com aplicações diretos no campo das políticas públicas, assim como nas organizações da sociedade. Os empreendimentos econômi- cos solidários (EES) são defini- dos por Gaiger et al. (1999) co- mo sendo organizações coleti- vas de trabalhadores voltados para a geração de trabalho e renda, regidos, idealmente, por princípios de autogestão, de- mocracia, participação, iguali- tarismo, cooperação no traba- lho, auto-sustentação, desen- volvimento humano e respon- sabilidade social. Entende-se por Economia Solidária (ES), segundo Singer (1999), o con- junto de experiências coletivas de trabalho, produção, comer- cialização e crédito organizadas por princípios solidários, espa- lhadas por diversas regiões do país e que aparecem sob diver- sas formas: cooperativas e asso- ciações de produtores, empre- sas autogestionárias, bancos comunitários, ‘clubes de tro- cas’, “bancos do povo” e diver- sas organizações populares ur- banas e rurais (apud; EID & PI- MENTEL, 2001). Desenvolvem especialmente trabalhos econômicos como: Plantio, Beneficiamento e comerciali- zação de produtos primários, Prestação de serviços, Confecções, Alimentação, Artesanatos, Entre outras. Fonte: http://facip.ufu.br Note que para possibilitar a expansão da ES, vários desafios são encarados, desde a aprovação de no- vas políticas e organizações públicas e populares regressadas à represen- tação e base, à incubação de EES, ao acompanhamento constante dos processos de formação, crédito, tec- nologia, comercio, administração e outras. Desse modo, por meio de pes- quisa de campo em trinta cinco EES, urbanos e rurais, os autores averi- guaram que pelo menos três obser- vações tangíveis: Garantem sobrevivência imedi- ata; 9 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS Criam oportunidades para o de- senvolvimento intelectual e aprendizado de um ofício e rompem com o padrão paterna- lista e clientelista, ainda predo- minante, na assistênciaàs po- pulações pobres (Gaiger et al., 1999). Note que os pesquisadores no- taram que em algumas iniciativas solidárias conseguiram resistir e atingiram planos de acumulação e crescimento. Nesse aspecto, a eco- nomia solidária, sem ignorar o capi- talismo como singular sistema eco- nômico mundial na contemporanei- dade, parte de estimações assinala- das, dentre outras, autonomia, de- mocratismo, solidariedade, igual- dade e fraternidade. Os pesquisadores analisam que o termo empresarial aqui pro- posto “deve ser dissociado da semântica que o vincula apenas ao empresário capitalista.” (p. 25). A diferença estaria no fato de que a busca por maior racio- nalidade está fundamentada na cooperação com a exploração coletiva das potencialidades profissionais, em benefício dos próprios produtores. Essa raci- onalidade é distinta da lógica capitalista - não solidária e ex- cludente - e distingue-se tam- bém da solidariedade comuni- tária para a qual faltam instru- mentos gerenciais. Nos EES o trabalho é o elemento central. A manutenção de cada posto de trabalho tem prioridade maior do que a lucratividade. Confor- me Razeto apud Gaiger et al., “a valorização do trabalho próprio define a racionalidade destas pequenas empresas de traba- lhadores.” (1999:36). É nesse sentido que se pode identificar o vínculo entre acumulação e cooperação. A acumulação está subordinada ao atendimento das necessidades definidas pelo coletivo de trabalhadores, aos objetivos da cooperação. Talvez por isso pode-se compreender porque, apesar de levarem em consideração problemas en- frentados, praticamente todos os trabalhadores entrevistados na pesquisa de Gaiger et alii não cogitam voltar a trabalharem para um patrão ou a arrisca- rem-se sozinhos com um negó- cio próprio (apud, EID & PI- MENTEL, 2001). Note que embora conseguirem identificar as complexidades e incer- tezas, apontam benefícios se compa- rado ao trabalho do assalariado, des- tacando-se: Renda monetária próxima ao valor obtido no mercado de trabalho; Condição de coproprietário e gestor do negócio, com poder de decisão em benefício dos próprios trabalhadores; Valorização da autoestima; de- senvolvimento intelectual e potencialidades profissionais; Viver o trabalho como algo digno e não como atividade penosa (EID & PIMENTEL, 2001). 10 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS Desse modo, a conjectura de que a força das organizações solidá- rios habita o fato de ajustarem a con- figuração original, o espírito empre- sarial ao lado do espírito solidário fi- ca evidenciada. Em abreviação, a co- operação e a eficácia no trabalho que se desenvolvem dentro das EES onde haja similitude de empenhos e motivações dos participes; emprego de uma maior capacidade de traba- lho em grupo, por meio de acordo no coletivo; procura pelo aumento do conhecimento técnico e profissional adequado ao grupo e incorporado à produção e repartição equitativa dos resultados do trabalho, de acordo com a contribuição real de cada in- divíduo e do coletivo. 12 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS 3. O Quadro Teórico Sobre a Comercialização da Produção Agrícola dos Assentamentos da Refor- ma Agrária Fonte: NPR3 inda, temos que discorrer so- bre as teorias contemporâneas que fundamentam as pesquisas so- bre as táticas de produção e comer- cialização dos produtos originários dos assentamentos rurais, avaliando os aspectos que a simplificam ou di- ficultam. Em nosso país, o trabalho dos pequenos produtores rurais para a 3 Retirado em htttp://www.npr.org economia do Brasil é bem represen- tativo. Entretanto, essa representa- tividade embora não está metodica- mente calculada, porquanto as in- formações mais sólidas sobre a te- mática não possuem como foco essa mensuração. Guanziroli (2007, p. 12), afirma que “pelos dados do censo do A 13 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS Instituto Brasileiro de Geogra- fia e Estatística - IBGE de 2006, que é uma fotografia rica da re- alidade rural, ainda não permi- tem separar a agricultura fami- liar da agricultura patronal”. Paralelamente, as mudanças ambientais de negócios decor- rentes do crescimento dos mer- cados globalizados, com os pa- radoxos estabelecidos por uma política agrícola, que na visão de Schlachta (2008) é inconsis- tente, delineiam uma série de barreiras que oprimem o cresci- mento e o desenvolvimento do pequeno produtor rural, em es- pecial os oriundos da agricul- tura campesina. Essas barreiras relacionam-se à baixa escolari- zação, dificuldades econômi- cas, de acesso ao mercado, de política governamental de aces- so ao crédito e à informação. Na época em que os assentamentos da reforma agrária foram cria- dos, na segunda metade do sé- culo XX, predominavam no Brasil os parâmetros da “Revo- lução Verde” em detrimento do modelo convencional de produ- ção agrícola. Devido a essa con- turbada transição e também às articulações entre a globaliza- ção e as particularidades de ca- da localidade, há a necessidade de articulação de novos mode- los produtivos para os assenta- mentos, que considerem suas especificidades (PONTES E DOS SANTOS; 2015). Dessa forma, a advertência de sua organização interna, do começo dos paradigmas de produção endó- genos e exógenos apresentam que a consolidação de maneiras alternati- vas de produção com o desígnio de subsistência e da conservação dos fatores socioculturais dos seus agen- tes estará sujeito a superação dos empecilhos que danificam a pereni- dade da agricultura familiar. Quanto aos aspectos exóge- nos, indispensável considerar que as políticas governamentais de assis- tência técnica, assim como as de cré- dito, logo, o cargo do mercado que demanda produção na escala das de- senvolvidas técnicas agrícolas e a juntura com o manufaturamento. Dessa maneira, a agricultura provinda da “Revolução Verde” pro- cura meios de fazer com que os pro- dutos agrícolas conectados ao circui- to mercantil sejam utilizado a alta tecnologia empregada aos insumos, máquinas, desenho de comercializa- ção e metodologia da produção nos complexos agroindustriais. Schlachta (2008) conclui que essas externalidades exigem alta competitividade de seus agentes, portanto para acompa- nhar a nova dinâmica o agricul- tor deve focar sua produção em produtos comercializáveis e na produção em escala. Essa com- petitividade é possível somente com o domínio de técnicas in- tensivas e pouca utilização de mão-de-obra. Este é o cenário pertinente à agricultura capita- lista contemporânea. Outras formas de produção são aquelas pautadas nos paradigmas endó- genos, ou seja, práticas efetiva- 14 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS das no âmbito local, observan- do os recursos e meios disponí- veis na localidade. Dentro de suas realidades (espaços de ma- nobra), os agricultores desen- volvem suas atividades tendo como fator limitante os recur- sos disponíveis. O resultado apresentado na produção arti- culada no modelo endógeno vem de encontro com as políti- cas de garantia da subsistência e promoção da segurança ali- mentar, o oposto do paradigma exógeno de produção, que foca apenas o mercado, que é sim- plesmente um elo dessa cadeia (Schlachta, 2008, apud, PON- TES E DOS SANTOS; 2015). Desse modo, pode-se observar que o sistema produtivo utilizados nos assentamentos da reforma agrá- ria é atinente aos paradigmas e dis- posições macroeconômicas de um trabalho regressada para o agrone- gócio, ou se está focalizando na con- servação de usos, costumes e infor- mações produtivos locais. O autor aventa a possibilidade de constituição de mecanismos de produção relacionados à as- sociação de aspectos das duas perspectivas, produzirpara o mercado sem agressão à cultura de seus agentes, nem contribuir para degradação do meio ambi- ente a segunda. Nesta ótica os assentados tornam-se agricul- tores e também agentes trans- formadores da cultura local se envolvendo nas transformações das dimensões ideológica, polí- tica, social e econômica. A for- ma como se articula a produção agroalimentar demonstra as opções de desenvolvimento de uma região ou até mesmo de um país, e também determina as condições em que os produ- tos são ofertados ao consumi- dor final em termos de quali- dade, preço e disponibilidade (Gorgen, & Stédile, 1991, apud, PONTES E DOS SANTOS; 2015). 15 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS Fonte: http://journls.openeedition.org De acordo com Bergamasco & Norder (1996), apresentam que no Brasil, os assentamentos começa- ram por meio da luta dos trabalha- dores rurais, e são acentuados como a “criação de novas unidades de pro- dução agrícola por meio de políticas governamentais, visando o reorde- namento do uso da terra, em benefí- cio de trabalhadores rurais sem ter- ra ou com pouca terra”. Desse modo, todos esses combates e conflitos, formaram a “política de criação de assentamentos rurais”, de maneira desordenada, ao paladar dos comba- tes e das veemências políticos/eco- nômicos de momento. Assim, a partir de 2004, o au- mento de conflitos rurais, alia- do ao grande número de ocupa- ções, “impulsionou” a reforma agrária. Segundo dados do go- verno federal (INCRA, 2012), no período 2004-2011, o núme- ro de assentamentos aumentou 48%; a área total ocupada por projetos da reforma agrária no Brasil foi ampliada em 88%, e o número de famílias assentadas cresceu 72% (OLIVEIRA, 16 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS 2013). Atualmente encontra- mos assentamentos rurais es- palhados por todo o território nacional. De acordo com o IN- CRA, em 2015, havia no Brasil, 8.763 assentamentos rurais, ocupando aproximadamente 86 milhões de hectares e com 924 mil famílias assentadas (MEDINA et al., 2016). Estes dados demostram o avanço da política agrária e a relevância dos assentamentos no contexto atual do rural brasileiro (GOSCH, 2020). Entretanto, os assentamentos rurais no Brasil estão difundidos de maneira dessemelhantes em meio as regiões do país, como pode ser visto na imagem a seguir: Fonte: GOSCI (2020). 17 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS Note que a inserção nos mer- cados concebe um campo para a pro- dução e venda da pequena e da mé- dia propriedade de estirpe familiar, e coopera para que ampla parte dos produtores permaneça excluída do método produtivo. Vejamos que as relações con- servadas pela agricultura familiar com os comércios de alimentos são marcadas e incorporando o critério espacial que se depara com o apre- sentado na imagem a seguir. Pode- se assegurar que esse modelo de produção conserva dois modelos de vínculos com os comércios dos seus produtos: um dirigindo forma inte- gradas nacional e internacionalmen- te; e por outro lado, com ciclos regi- onais/locais de produção, repartição e consumo de produção de alimen- tos. Fonte: Adaptado de Maluf (2004) Ainda, observe que as cadeias integradas são simuladas pelas gra- des cooperativas, do campo alimen- tício, as organizações agroindustri- ais, bem como as trades mercantis e ainda as grandes redes de supermer- cados. Logo, podemos dizer que os seus objetivos são os mercados naci- onal e internacional. Logo, a integração é o princi- pal modo de conexão da agricultura 18 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS familiar a essas cadeias. Assim, a in- clusão da agricultura familiar nesses conjuntos integrados mostra o con- dicionamento ao capital das empre- sas que gerenciam o agronegócio no Brasil. Deste forma, efetivasse uma correlação de dependência do agri- cultor em relação ao agronegócio, o que atém categoricamente as proba- bilidades de alternativas dos produ- tores integrados. É possível afirmar que a inte- gração permite as empresas ex- pandirem sua produção e sua força de trabalho a custos mais reduzidos, pois os agricultores são remunerados como presta- dores de serviços e não como trabalhadores empregados di- retamente por seus contratan- tes. Os produtos da matriz pro- dutiva que transitam por essas cadeias são: a soja, o milho, o trigo, o leite destinado aos lati- cínios, os animais destinados à agroindústria de carnes, as fru- tas para consumo in natura. Quanto à produção oriunda dos circuitos regionais/locais de produção, sua distribuição e consumo de alimentos são arti- culados no âmbito das regiões de inserção ou no entorno dos centros urbanos. Além dos pro- dutores individuais, esses cir- cuitos são compostos por asso- ciações de pequenos agriculto- res, cooperativas e ainda por empreendimentos industriais e comerciais de pequeno porte, ligados ao processamento, transformação, distribuição, consumo de produtos alimentí- cios tais como: pequenos super- mercados, pequena indústria alimentar, armazéns, empórios, quitandas, padarias, açougues, feiras livres, varejões e sacolões (PONTES E DOS SANTOS; 2015). Dessa forma, os circuitos regi- onais/locais se implantam também a venda direta aos consumistas rea- lizada pelos próprios produtores. Com relação às maneiras de ofício do território, é subentendido que a preferência desse modelo de produ- zir em ampla escala é desfavorável a adequação dos circuitos regional/lo- cal e mais maléfico até mesmo para a promoção dessas redes com a as- pecto de desenvolvimento regional e local. A produção diferençar-se de pequena escala, que do mesmo mo- do, permite o estabelecimento de co- nexões produtivos e mercantis em domínio regional/local, enfocados para a produção de mantimentos di- ferenciados. Inversamente da produção vinculada as organizações agroin- dustriais, porquanto sua divisão em diferentes propriedades integradas não decompõe a meta de se plantar em larga escala para os mercados pertinentes ao consumo dos empre- endimentos controladores do agro- negócio. Sendo volúveis em sua constru- ção, os circuitos regionais/lo- cais são passíveis de dominação 19 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS e controle por parte dos comer- ciantes ou intermediários que se propõe a organizá-los. Essa construção não resulta em be- nefícios para os pequenos pro- dutores e para os consumido- res. Também por causa dessa vulnerabilidade, cabe a inter- venção de ações públicas visan- do incentivar a produção e o consumo de alimentos de quali- dade, sob a forma de programas governamentais e desvincula- dos da lógica das corporações agroindustriais. Os produtos com maior incidência nos cir- cuitos regionais/locais são as carnes de aves, farinhas de mandioca, milho, trigo, queijos, frutas, hortaliças, pescados, conservas, condimentos e doces em geral. Esses produtos são, quase sempre, reflexos de di- versidades produtivas pautadas pelo cultivo tradicional e refle- tem maneiras de consumo pró- prias de um lugar ou região. Os mercados alvos desse circuito são de âmbito local e regional, apesar de terem potenciais de horizontes mais longínquos com a produção, com ênfase na agroecologia que é tida como al- ternativa de agricultura susten- tável com ênfase na sustentabi- lidade plena da agricultura. Re- sultando em produtos com identificação de origem artesa- nal ou orgânicos, com potencial de atração de consumidores in- teressados em produtos social- mente considerados mais sau- dáveis e sustentáveis sob os as- pectos social e ambiental (PON- TES E DOS SANTOS; 2015). As alterações estruturais, de ordem econômica e social, advindas sobre o mercador nas últimas déca- das, demandam o questionamento do processo tradicional de relação capitalista de produção rural,“sen- do a economia solidária bastante in- centivada e disseminada por orga- nismos governamentais e não gover- namentais através das cooperativas de produção e consumo, das associ- ações de produtores, redes de pro- dução, comercialização e consumo voltadas para empreendimentos po- pulares solidários” (Singer, 2002, apud, PONTES E DOS SANTOS; 2015). Desafios, Possibilidades e Armadilhas da Economia Popular Solidária Note que o crescimento da Economia Popular Solidária passa por em dificuldades, que advém de suas origens, além de outros aspec- tos, como as comunidades não orga- nizadas, também no gerenciamento das organizações em complexidades técnicas descobertas ao longo do processo produtivo. 20 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS Fonte: http://cirandas.net Isso significa que escasseiam à Economia Popular Solidária meto- dologias efetivas da autogestão no dia-a-dia, o que induziria a maior parte desses empreendimentos a re- sistirem em circunstâncias difíceis, com complexidades no gerencia- mento, comercialização, elevação a recursos financeiros e a informações tecnológicos. Inda, percebe-se um conflito entre as extensões mercantil e soli- dária na administração de uma or- ganização solidária, ou seja, do mes- mo modo em que a EPS procura a promoção de uma “outra economia”, ela precisa se relacionar com o mer- cado tradicional competidor. Do mesmo jeito em que a EPS se funda- 21 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS menta em uma dialética não mone- tária substantiva e associativa, ela precisa ter uma administração mo- derna e racionalidade instrumental para resistir ao mercado. Ao mesmo tempo em que a EPS preza pela valorização do traba- lho e a autonomia, buscando a eliminação das desigualdades, ela está inserida em um con- texto econômico e social em que há precarização do trabalho e constante busca pela sobrevi- vência econômica. Apesar de existirem diferentes políticas e ações de estímulo à criação de empreendimentos solidários, tais como aqueles relacionados ao microcrédito, à incubação de empreendimentos cooperati- vos/associativos e à formação de quadros para a gestão de co- operativas, dentre outros, este tipo de apoio, apesar de rele- vante, não ajudaria os associa- dos a desenvolverem endoge- namente instrumentos de ges- tão cotidiana (técnicas admi- nistrativas e econômicas), com- prometendo a sustentabilidade dessas iniciativas. Neste cená- rio, os empreendimentos soli- dários precisariam lidar com estratégias mais competitivas para sobreviverem no mercado. Esta realidade parece impor às iniciativas no campo da Econo- mia Popular Solidária impor- tantes dilemas e desafios, tanto de ordem econômica, quanto com relação à própria identida- de e dinâmica constitutiva que se enuncia como fundamental- mente cooperativa e solidária (TEODÓSIO E MUNDIM, 2011). Outro motivo da complexida- de de sustentabilidade dessas orga- nizações estaria conexo a “pouca so- lidariedade” em meio a eles. Embora não se desenvolveu um ciclo de rela- ções entre as organizações de auto- gestão, associações e cooperativas que procure aprimorar a produção pela união de veemências e de com- plementaridades técnicas e de no- ções de gestão, aquisição de maté- rias-primas e insumos, fornecimen- to de produtos e bom emprego dos restos ou compartilhamento de re- des de negociação. Segundo a esse contexto, per- cebe-se a precisão de desenvolver tecnologias e ferramentas para ad- ministração, além disso, para a pro- dução que possibilita irromper os li- mites técnicos das organizações soli- dárias (desenvolvimento de novos produtos, direito sobre novas opor- tunidades do mercado, ampliação da escala de produção, avanço da quali- dade, etc). Segundo Rutkowski e Lianza (2002), as universidades po- dem contribuir, e muito, se dis- puserem a discutir as dificulda- des de sobrevivência dos em- preendimentos solidários, questionando sobre as causas e buscando soluções de gestão e produção que lhes permitam dar respostas efetivas aos pro- blemas que esses empreendi- mentos se propõem a resolver. Para Wellen (2008), os produ- 22 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS tos comercializados na Econo- mia Popular Solidária teriam como um diferencial o fato de agregarem um valor próprio, originários de sua forma de produção, cujos mecanismos se distanciariam do sistema capi- talista, que exalta apenas o lu- cro em detrimento dos indiví- duos envolvidos na produção. Mas, em última análise, a que público serviriam esses produ- tos? (apud, TEODÓSIO E MUNDIM, 2011). Com certeza os beneficiários da força do capital, estes que não se abespinham-se em saldar um pouco mais pela solidariedade sucedida pela produção desses produtos, o que enquadra ainda para mitigar o peso da culpa por conviver do lado mais favorecido de uma sociedade desigual. Em outras palavras, o efeito da Economia Solidária na socieda- de séria, ao revés de benéfico, apenas uma maneira de enalte- cer e justificar a forma de pro- dução capitalista, favorecendo apenas para a sua manutenção e perpetuação de suas desigual- dades. Na visão de Gaiger (2006), embora o tema Econo- mia Popular Solidária desperte crescente interesse, são ainda infrequentes os estudos empíri- cos sistemáticos sobre as práti- cas de autogestão e cooperação introduzidas e vivenciadas por essas experiências. A falta de uma análise interna dos empre- endimentos, do seu momento de gênese à sua evolução ulte- rior, dificulta a identificação dos fatores materiais, sociais e culturais que impulsionam os indivíduos a aderirem e, sobre- tudo, a permanecerem nessa empreitada (apud, TEODÓSIO E MUNDIM, 2011). Com isso, as apreciações ficam por conta de constatar aquelas con- junturas que, à revelia e a contragos- to desses colaboradores, os impeli- ram a procurar alternativas de ofício e renda, como se a vivência dessas pressões significasse ser suficiente para dirigi-los, passivamente, em al- guma direção, para quase todos sem conhecimento e incerta. Relações de gênero e Economia Popular Solidária: análise de um caso em um assentamento rural. Gaiger (2006) ainda en- fatiza que neste tipo de econo- mia o trabalho tem um papel central, por ser fator preponde- rante a favor do empreendi- mento. Ou seja, as formas de produção deveriam sofrer mu- danças significativas a ponto de se identificar um novo modelo de relações com o trabalho, cujo valor principal deixa de ser o monetário, passando a focar no indivíduo, no espírito coorpora- tivo e na comunidade (TEODÓ- SIO E MUNDIM, 2011). E avigora: a sorte da economia solidária está sujeito de igualmente com um novo sistema de regulação, adequado de ordenar de modo dinâ- mico as regras do jogo econômico, de forma a generalizar seus exercí- 23 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS cios ao contíguo da sociedade e via- bilizar uma adaptação de escala das ações que proliferam em pequeno calibre. Note que as organizações soli- dárias estariam auferindo novo va- lor de forma em que surgem adotan- do o princípio de fortalecimento da competência produtiva da casta mais pobre. Ainda, observa-se que certas experiências não estão per- manecendo somente no patamar do sustento e jazeriam aos porcos mu- dando para empreendimento econô- micos solidários. Apesar dessa nova configura- ção, esses empreendimentos ainda seriam vulneráveis, o que dificulta a permanência das pessoas nessa forma de organi- zação do trabalho e da vida em sociedade. Ao se trabalhar com empreendimentos de caráter solidário, deve-se buscar rom- per com o padrão paternalista e clientelista que predomina na assistência às populações po- bres, fomentando o desenvolvi- mento de uma atitude cidadã por parte das pessoas envolvi- das nessas experiências, valori-zando o livre arbítrio, a consci- ência dos direitos civis e o en- volvimento ativo na sociedade. Nesse quadro de desafios dos empreendimentos solidários, uma questão que emerge e que nem sempre é discutida com a devida profundidade que exige é a condição da mulher, visto que, em muitas experiências de associativismo, a luta para so- brevivência econômica acaba por deixar em segundo plano outras dimensões de emancipa- ção, sobretudo aquelas ligadas à condição feminina nesses em- preendimentos com relação à organização social, política e até mesmo cultural dessas cole- tividades (TEODÓSIO E MUN- DIM, 2011). Para se progredir nessa alter- cação, é necessário analisar as díspa- res abordagens que se comparecem sobre o fato da condição de gênero na sociabilidade atual. Aspectos Teóricos Quanto à Comercialização em Assenta- mentos Rurais Note que a expansão das rela- ções capitalistas na área rural exci- tou o processo de expropriação/ex- pulsão dos trabalhadores do campo. No final da década de 70, com o co- meço do Movimento dos Trabalha- dores Rurais Sem-Terra (MST), lo- go, passaram se organizar e realizar ações como a luta pela conquista da terra. Assim, a conquista por exten- sões de terra e o desenvolvimento econômico não constituem somente na compreensão do sem-terra no mundo produtivo, todavia na con- quista de direitos, consciência polí- tica, bem como a cidadania. Então, o termo assentamento são atuações que procuram ordenar ou reordenar soluções fundiárias para abastecer 24 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS as populações e proporcionar solu- ções para os problemas socioeconô- micos. As ações do Estado são, portan- to, concebidas como de ordem técnica e não tão somente polí- tica, por outro lado, os benefici- ários estão destituídos de cará- ter ativo. O MST, fomentado pela Confederação das Coope- rativas de Reforma Agrária do Brasil (CONCRAB), defende a necessidade da implantação de cooperativas agrícolas nos as- sentamentos como uma das maneiras para fortalecer a luta pela transformação da socieda- de. Cooperativas não devem se organizar somente com objeti- vos econômicos, mas também com desígnios políticos em lon- go prazo, capazes de promover conscientização dos trabalha- dores para o fortalecimento de suas lutas em prol do desenvol- vimento social. As consequên- cias e a estima das cooperativas residem na capacidade de mo- bilização de trabalhadores em prol do alcance dos objetivos relacionados à produção e à luta pela terra e a liberação de membros das cooperativas para atuar na luta pela reforma agrá- ria (FABRINI, 2001).O termo assentamento rural, no âmbito das políticas públicas para no- mear um tipo de intervenção fundiária, unifica e, por vezes, encobre compras de terras, de- sapropriação de imóveis rurais ou utilização de terras públicas (apud, CARDOZO, et al.; 2018). Note que os assentamentos tendem a trazer um fortalecimento aos movimentos de luta pela classe, porquanto são prova da potência de pressões intensas, de maneira espe- cial em ocupações de terra e cam- pings; demandam rearranjos insti- tucionais, provocando a precisão de um aparelhamento de Estado para desenvolver a criação de novas polí- ticas ou reformulação nos governos federais, estaduais e municipais, afora de regulamentação e novas leis; permitem a criação de empre- gos e acrescente o nível de renda dessas famílias assentadas, além de ajudar nas economias municipais e regionais; tem potencial para modi- ficar as correlações entre os poderes locais, em menor ou maior medida. Existe o reconhecimento dos assentados em torno da produ- ção e dimensão econômica arti- culada à dimensão política. Desta perspectiva emerge uma das principais propostas de produção dos assentados, já que a organização da produção e a manutenção na terra en- quanto trabalhadores rurais as- sentados são tomadas por sua própria capacidade de organi- zação e mobilização política. Por acreditarem na importân- cia da dimensão política na or- ganização da produção agrícola no interior dos assentamentos, os sem-terra passaram a desen- volver ações como a organiza- ção de trabalhos associativos/ cooperativos/coletivos. Entre- tanto, não se limitam apenas a uma organização artesanal e as- sociações semelhantes às “roças 25 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS comunitárias”. A operação agrí- cola dos sem-terra, em sua con- cepção, é semelhante a um em- preendimento que apresenta inserção mercantil, regras e có- digos formais. Os camponeses sem-terra concebem a organi- zação associativa como uma sa- ída para a sua manutenção no campo (FABRINI, 2001, apud, CARDOZO, et al.; 2018). Desse modo, a reforma agrária é uma resposta não somente para os problemas do meio rural, entretanto para toda a sociedade inclusive do meio urbano. A reforma agrária, conceituada por Stedile (2005, p. 188), possui os seguintes alvos: Garantir o trabalho para todos os trabalhadores rurais Sem Terra, combinando distribui- ção de renda e desenvolvimen- to cultural; Produzir alimentação farta, barata e de qualidade a toda população brasileira, especial- mente a urbana em prol de se- gurança alimentar para a soci- edade; Garantir o bem-estar social e a melhoria das condições de vi- da de maneira igualitária para todos os brasileiros, em espe- cial aos trabalhadores e priori- tariamente aos pobres; Buscar permanentemente a justiça social, a igualdade de direitos em todos os aspectos: econômico, político, social, cultural e espiritual; Difundir a prática de valores humanistas e socialistas nas relações entre indivíduos, eli- minando-se as práticas de dis- criminação racial, religiosa e de gênero; Contribuir para criar condi- ções objetivas de participação igualitária da mulher na socie- dade, garantindo-lhes direitos iguais; Preservar os recursos naturais, como águas, solos, florestas, entre outros, em prol de de- senvolvimento sustentável; Implementar a agroindústria e a indústria como principal meio de se desenvolver o inte- rior do país; Gerar emprego para todos que queiram trabalhar na terra (apud, CARDOZO, et al.; 2018). Os assentamentos possuem a preocupação primária de garantir a conservação e reprodução do assen- tado. O alvo é a afiançar\sobrevivên- cia através da organização da produ- ção dentro dos assentamentos. Para isso, a produção agrícola passa ser o centro de discussões, porquanto o sem-terra assentado quer terra pois, dessa forma, consegue afiançar as precisões básicas de sua família, deste modo, procura-se a benesse pela vida e não para o lucro. Muito além de refletir na produção para o mercado, os moradores dos assenta- dos idealizam a organização produ- tiva para a vida. 26 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS Por meio de trabalho organiza- do em lotes individualmente ou coletivamente, os sem-terra co- locam na prática as experiên- cias adquiridas, não somente na agricultura, mas experiências de luta pela terra, onde se des- taca o aspecto da dimensão po- lítica, implícita na organização da produção agrícola no assen- tamento. O mercado, por sua vez, não é reconhecido como um mecanismo para a garantia de sua permanência na terra, uma vez que os segmentos do- minantes da sociedade (capital mercantil, industrial, financei- ro) subtraem os benefícios re- sultantes do trabalho e renda. A lógica, por conseguinte, não prioriza o trabalho e, dessa ma- neira, elaboram-se propostas de organização da produção pa- ra subverter a ordem desigual da economia de mercado e do modo de produção capitalista (FABRINI, 2001; apud, CAR- DOZO, et al.; 2018). Na prática a reforma agrária proporciona: Desconcentração e democrati- zação da estrutura fundiária; Produção de alimentos bási- cos; Geração de ocupação e renda; Combate à fome e à miséria; Interiorização dos serviços públicos básicos; Redução da migração campo- cidade; Promoção da cidadania e da justiça social; Diversificação do comércio e dos serviços no meio rural; Democratização das estrutu- ras de poder (INCRA, 2017). 27 28 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS 4. Políticas Públicas para os Assentamentos Rurais Fonte: Veja Abril4 Síntese das Políticas Públicas da Agricultura Familiar, por Área de Atuação (Em 2013) Pronaf Tem por objetivo facilitar a execução das atividades agropecuárias, a aquisi- ção de equipamentos e a elevação da renda. Os financiamentos podem ser acessados individualmente ou coletivamente, com taxas de juros abaixo da inflação. PNFC Financia a aquisição de imóveis rurais não passíveis de desapropriação, áreas insuficientes para a produção, investimentos em infraestrutura da unidade produtiva e de projetos Comunitários. Executado principalmente nas áreas do Semiárido. Assistência Técnica Ater Presta serviços de assistência técnica com o objetivo de ampliar o conheci- mento e a tecnologia dos agricultores e de elevar a produtividade e a renda. Articulado com outras políticas públicas, como o PAA, o Pnae e o PBSM. Mercados Institucionais PAA Prevê a aquisição de alimentos da agricultura familiar por órgãos públicos federais, estaduais e municipais para o atendimento de populações em si- tuação de insegurança alimentar e nutricional. Também objetiva a inclusão social dos produtores e o fortalecimento da agricultura familiar. 4 Retirado em http://veja.abril.com.br 29 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS Pnae Os alimentos adquiridos são direcionados para o abastecimento da rede pública de ensino, que deve comprar pelo menos 30% de alimentos consu- midos da agricultura familiar. Infraestrutura Terra Legal Engloba ações interministeriais por meio de programas como Luz para To- dos, Água para Todos, Minha Casa Minha Vida, e investimentos em estradas vicinais em parceria com o poder municipal. Proinf Repassa recursos para projetos de implantação de agroindústrias e arma- zenamento de produtos. Também fomenta obras de infraestrutura, como a abertura ou a recuperação de estradas vicinais. Trabalho e Renda Terra Forte Visa apoiar o incremento de renda nos assentamentos por melo de recur- sos financeiros direcionados ao financiamento de projetos de cooperati- vas/associações, aquisição de equipamentos e suporte para a gestão das iniciativas coletivas. Educação e Cidadania Pronera Objetiva garantir a alfabetização e a educação fundamental, média, superior e profissional de jovens e adultos nos assentamentos. É realizado em parceria com movimentos sociais e sindicais de trabalhadores rurais, instituições co- munitárias de ensino sem fins lucrativos e governos estaduais e municipais. Pronatec Oferece cursos de educação profissional para a qualificação de jovens e adul- tos das áreas rurais. Compõe o Programa Nacional e é executado em parceria entre o MDA e o MEC. PNDTR Direcionado para os trabalhadoras rurais que não possuem documentos ou necessitam fazer a segunda via. O programa vai até os municípios, onde são feitos mutirões, para emitir a documentação, como Registro de Nascimento, CPF, Carteira de identidade, CTPS, DAP, ou registro no INSS. Territórios da Cidadania Visa a promoção do desenvolvimento económico e a universalização de pro- gramas básicos de cidadania, integrando as ações dos governos à participa- ção da sociedade civil por meio da identificação dos principais problemas que contribuem para a estagnação econômica e a não superação dos níveis de pobreza. É coordenado pela Casa Civil em conjunto com o MDA. Fonte: Meio (2015) com informações de MDA (2013). Para entendermos sobre as re- percussões das políticas públicas pa- ra as táticas organizativas das coo- perativas, tendo como exemplo um caso concreto a participação de uma cooperativa no PAA, estará sujeito as expressões que são lançadas a partir da relação de influência mú- tua constituída entre pesquisador e o homem do campo baseado na ex- periência e, para tanto, as políticas públicas devem ser estruturadas a partir desse método. 30 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS Dessa forma, podem ser reali- zadas em três estratégias para a construção das informações: Exploração do referencial teó- rico para a compreensão dos fenômenos ligados à relação estabelecida entre cidadania, exclusão e subjetividade e do referencial bibliográfico e do- cumental sobre cooperativis- mo e implantação do PAA em assentamentos rurais; Observação das reuniões men- sais da cooperativa, a fim de compreender a dinâmica orga- nizativa estabelecida pelo grupo; e Entrevistas semiestruturadas realizadas com nove associa- dos, um membro do MST e um prestador de serviço de assis- tência técnica e extensão rural (Ater), cujos tópicos-guia con- templaram assuntos relacio- nados à participação da coope- rativa no PAA (estratégias de organização e comercialização da produção, vantagens e difi- culdades) (MELO E SCOPI- NHO, 2018). Autogestão e Deliberação De- mocrática Note que a autogestão é o prin- cípio basilar da economia solidária. O que significa que a organização so- lidária é administrada por seus tra- balhadores. Não existe um cargo co- mo de patrão, e os colaboradores são proprietários e administradores de suas atividades. O princípio demo- crático, cujo todos possuem voz e possibilita que as decisões sejam to- madas em grupo, consolidando um apoio aos empreendimentos solidá- rios. Todos os trabalhadores partici- pam de forma igualitária na empresa que tem por base a au- togestão. Temos, neste modelo, a substituição do trabalho assa- lariado pelo associado, um rompimento com a visão de “subordinação”. Contudo, para que isto ocorra é necessária uma profunda mudança nas re- lações sociais de produção, ou seja, todos os trabalhadores passam a ser responsáveis pela gestão e deliberação das deci- sões da empresa solidária. Nes- te contexto, pode-se falar de uma “educação para a autoges- tão”, ou seja, de processos de formação que resgatem valores de coletividade e que rompam com práticas individualistas por meio de uma cultura de participação, diálogo e demo- cratização dos processos de de- cisão (TIMÓTEO, et al; 2019). Vejamos que ao realizar os exercícios educativas para a auto- gestão constitui em investir no tra- balho para certificar e desenvolver o coletivo para que as disposições e o controle pertençam, dessa forma, aos próprios colabores que integram a organizações. Ou seja, trabalha-se 31 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS não somente no nível das informa- ções, todavia, especialmente, no de- senvolvimento de novos valores so- ciais e culturais. Deste jeito, é plausível fomen- tar práticas solidárias e de autoad- ministração a partir de métodos educativos que analisem a capacita- ção continuada, sistêmica, com as- pecto pedagógico e metodológico que conserve os espaços e disposi- ções democráticas. Quando articulamos sobre a gestão democrática, discorremos de um empreendimento que é conduzi- do e dirigido com apoio em decisões coletivas, com reparte, respeito à igualdade, direito e responsabilida- des de todos os membros. Há, neste sentido, uma ruptura com formatos tradicionais de planejamento e de ação - com decisões tomadas de “cima para baixo” - tendo a economia soli- dária uma horizontalidade nas ações, o que acaba por garantir a participação de um conjunto de atores sociais. Com isto, não desconsideramos a existência de conflitos inerentes a um pro- cesso de aprendizagem relacio- nal, mas estes podem dar lugar ao consenso em prol da coletivi- dade e de interesses mais fortes (TIMÓTEO, et al; 2019).Do mesmo modo, a concepção de aprendizagens, sintonia e de rela- ções de parceria entre os comedian- tes sociais, o que os aponta para a autonomia e ao estruturamento ou ainda melhor, a um método de cons- trução, legitimação e consideração aos poderes compartilhados impres- cindíveis à atuação econômica, polí- tica e social. Note que por autogestão su- bentende a vivência de autonomia e implica na habilitação para o geren- ciamento coletivo do negócio. Auto- nomia tanto nas integrações produ- tivas quanto em sua veemência re- presentativa, ou seja, sem atrela- mento dos órgãos governamentais ou mesmo os paraestatais. Confia- mos que quando se fala sobre a au- togestão necessita-se afiançar o di- reito ao conhecimento e democracia nas disposições. Democracia não apenas como voto ou mera representação, mas, principalmente, como partilha de poder e controle da vida do empreendimento cole- tivo. Por conta disso, educar para a autogestão significa pro- mover autonomia e a inteligên- cia coletiva dos trabalhadores (ADRIANO, 2010, p. 128). Niti- damente, pode-se observar que a participação é essencial neste arranjo, considerando que cada um contabiliza um voto essen- cial nas decisões a serem toma- das. O poder sobre o empreen- dimento é compartilhado e a autogestão é praticada por meio de assembleias gerais, forma- ção de comissões gestoras e, principalmente, pela garantia de eleição dos representantes destas comissões entre todos os 32 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS associados. Sob essa ótica, a economia solidária produz uma solidariedade interna: “a soli- dariedade é promovida entre os membros dessas iniciativas, que estabelecem entre si um vínculo social de reciprocidade como fundamento de suas rela- ções de cooperação” (LAVILLE & GAIGER, 2009, p. 167; apud, TIMÓTEO, et al; 2019). Para além desta, também é de- senvolvida uma solidariedade exter- na: claramente, o empreendimento solidário é um espaço de contes ta- ção ao sistema dominante, de eman- cipação social, de inserção social e comunitária, de discussão política, e, assim, um modelo democrático di- alógico e de construção de uma cida- dania ativa. 33 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS Materiais Complementares Links “gratuitos” a serem con- sultados para um acrescentamento no estudo do aluno de assuntos que não poderão ser abordados na apos- tila em questão: Assentamento rural Economia Solidária e Desenvolvi- mento Social Agroecologia https://repositorio.ufscar.br/bitstream/handle/ufscar/1410/1838.pdf?sequence=1&isAllowed=y https://uenf.br/dic/editora/wp-content/uploads/sites/5/2019/10/economia-solidária-e-desenvolvimento-social.pdf https://uenf.br/dic/editora/wp-content/uploads/sites/5/2019/10/economia-solidária-e-desenvolvimento-social.pdf https://www.agencia.cnptia.embrapa.br/recursos/AgrobCap2ID-upGSXszUrp.pdf 34 34 35 ECONOMIA SOLIDÁRIA E ASSENTAMENTO RURAIS 35 5. Referências Bibliográficas BERGAMASCO, S. M., Norder, L. A. C. 1996. O que são assentamentos rurais. Ed. Brasiliense, São Paulo, 87 pp. CARDOZO, Bruno Diego Alcantara; et al. COMERCIALIZAÇÃO NO AGRONEGÓ- CIO: UM ESTUDO SOBRE ASSENTA- MENTOS DA REFORMA AGRÁRIA NO CONTEXTO DA ECONOMIA SOLIDÁ- RIA. Revista em Agronegócio e Meio Am- biente, Maringá (PR), 2018. CARVALHO, Carolina Delgado de; et al. AGROECOLOGIA E ECONOMIA SOLI- DÁRIA. 'Embrapa Meio Ambiente, Jagua- riúna - SP, 2006. EID, Farid & PIMENTEL, Andréa Eloisa Bueno. ECONOMIA SOLIDÁRIA: DESA- FIOS DO COOPERATIVISMO DE RE- FORMA AGRÁRIA NO BRASIL. Artigo publicado na Revista Travessia, São Paulo, 2001. Versão modificada do trabalho apre- sentado e publicado nos Anais do: Taller Internacional de Ordenamiento Territo- rial y Desarrollo Socioeconómico, Havana, Cuba, 10 a 12 de novembro de 1999; X World Congress of Rural Sociology e XXXVIII Congresso Brasileiro de Econo- mia e Sociologia Rural, Rio de Janeiro, Brasil, 30 de julho a 5 de agosto de 2000. GAIGER, L. et al., “A economia solidária no RS: viabilidade e perspectivas”. Cader- nos CEDOPE - Série Movimentos Sociais e Cultura, 15:1999. MELO, Thainara Granero de E SCOPI- NHO, Rosemeire Aparecida. Políticas pú- blicas para os assentamentos rurais e coo- perativismo: entre o idealizado e as práti- cas possíveis. Revista Sociedade e Estado - Volume 33, Número 1, Janeiro/Abril 2018. PAIVA, Camila Capacle E SILVA, Edinho. A POLÍTICA PÚBLICA DE ECONOMIA CRIATIVA E SOLIDÁRIA DO MUNICÍ- PIO DE ARARAQUARA/SP. IPEA, São Paulo, 2020. PONTES, Alzair Eduardo; DOS SANTOS, Moacir José. Produção e comercialização em assentamentos rurais: estudo do caso do assentamento São Domingos dos Olhos D’Água. Mundo Agrário, vol. 16, núm. 33, 2015. TEODÓSIO, Armindo de Sousa Santos E MUNDIM, Fernanda de Lazari Cardoso. Relações de gênero e economia popular solidária: análise de um caso em um assen- tamento rural. GESTÃO. Org - Vol. 10, Nº. 02 p. 278 - 296 maio/ago. 2012. TIMÓTEO, Geraldo Márcio, et al. Econo- mia Solidária e Desenvolvimento Social. Economia solidária e desenvolvimento so- cial: perspectivas e desafios no contexto da educação ambiental / coordenação de Ge- raldo Márcio Timóteo. - 1. ed. - Campos dos Goytacazes, RJ: EdUENF, 2019. 03 6
Compartilhar