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Tutoria 5: M3- Jeovanna Miranda Doença Renal Crônica Objetivos: • Definir e classificar insuficiência renal crônica • Diagnosticar a fisiopatologia da insuficiência renal crônica (HAS/SM) • Evidenciar as manifestações clinicas na IRC • Descrever as medidas farmacológicas e não farmacológicas para o tratamento da insuficiência renal crônica e de suas complicações. Definição e classificação A doença renal crônica está inserida em um contexto clínico amplo que inclui desde a presença isolada de fatores de risco, como hipertensão arterial sistêmica e diabetes mellitus, passando por alterações que denotam injúria renal (microalbuminúria), ainda que com preservação de função, até a redução progressiva da filtração glomerular. Dá-se a esse conjunto de situações o nome de “doença renal crônica”. Define-se, assim, DRC como lesão renal por tempo igual ou maior que três meses, caracterizada por anormalidades estruturais ou funcionais dos rins, manifestada por alterações histopatológicas ou por anormalidades nos testes de imagens ou na composição da urina e do sangue, ainda que se tenha preservação da filtração glomerular. A definição de DRC também engloba a redução na taxa ou no ritmo de filtração glomerular (RFG) abaixo de 60 mL/min/1,73 m2, por um período superior a três meses, independentemente da presença ou ausência de lesão renal supracitada. • O- Função renal normal, sem lesão renal Importante do ponto de vista epidemiológico, inclui pessoas integrantes dos chamados grupos de risco para o desenvolvimento da DRC (hipertensos, diabéticos e portadores de história familiar de hipertensão, diabetes e doença renal), que ainda não desenvolveram lesão renal. Tutoria 5: M3- Jeovanna Miranda • 1 - Lesão renal estabelecida, com função renal normal. Corresponde às fases iniciais de lesão renal com filtração glomerular normal ou aumentada (hiperfiltração), ou seja, o RFG está acima de 90ml/min/1,73m2. • 2 - Lesão renal estabelecida, com insuficiência renal funcional ou leve. Ocorre no início da perda de função dos rins. Os níveis de ureia e creatinina plasmáticos ainda são normais, não há sinais ou sintomas clínicos importantes de insuficiência renal, e somente métodos acurados de avaliação da função do rim (depuração, por exemplo) detectam essas anormalidades. Os rins conseguem manter razoável controle do meio interno. Compreende RFG entre 60 e 89ml/min/1,73m2. • 3 - Lesão renal estabelecida, com moderada perda de função renal. Embora os sinais e os sintomas da uremia possam estar presentes de maneira discreta, o paciente mantém-se clinicamente bem. Na maioria das vezes, há somente sinais e sintomas ligados à causa básica da doença renal (nefrite lúpica, hipertensão arterial, diabetes mellitus, infecções urinárias, nefropatia obstrutiva, glomerulopatias, entre outros). A avaliação laboratorial simples já nos mostra, quase sempre, níveis elevados de ureia e creatinina plasmáticos. Corresponde a RFG compreendido entre 30 e 59ml/ min/1,73m2. • 4 - Lesão renal estabelecida, com acentuada perda de função renal. O paciente apresenta sinais e sintomas marcados de uremia, dentre eles anemia, hipertensão arterial, edema, fraqueza e mal-estar, e sintomas digestivos são os mais precoces e comuns. Corresponde à faixa de RFG entre 15 e 29mL/min/1,73m2 • 5- Fase terminal: Como o próprio nome indica, corresponde à faixa de função renal na qual os rins perderam o controle do meio interno, tornando-se este tão alterado que pode ser incompatível com a vida. O paciente encontra-se intensamente sintomático. Suas opções terapêuticas são os métodos de depuração artificial do sangue (diálise peritoneal ou hemodiálise) ou o transplante renal. Compreende RFG inferior a 1Sml/min/1,73m2. Fisiopatologia Independentemente da etiologia, se de origem imunomediada ou não, na fase de progressão das doenças renais, tanto mecanismos hemodinâmicos quanto imunológicos estão presentes na fisiopatologia da DRC. A doença renal crônica é uma fase final comum a diversas doenças renais de etiologias heterogêneas, tais como a nefroesclerose hipertensiva, a nefropatia diabética, as glomerulonefrites crescênticas por diversas causas, a doença renal policística autossômica dominante, as doenças urológicas etc. Ante a redução da massa renal, os néfrons remanescentes sofrem mudanças adaptativas na hemodinâmica glomerular que levam à hipertensão e hipertrofia glomerulares, com aumento na taxa de filtração por glomérulo. No entanto, em longo prazo, esse mesmo mecanismo de adaptação aparentemente benéfico torna-se lesivo, gerando proteinúria, esclerose glomerular e agravamento na perda de massa renal funcionante. De que maneira o aumento da pressão no capilar glomerular leva à progressiva injúria renal tem sido objeto de inúmeros estudos experimentais, que têm permitido postular algumas teorias. Para explicar a chamada teoria hemodinâmica, a hipertensão intracapilar e a hipertrofia glomerular seriam os deflagradores da agressão mecânica ao glomérulo. A tensão mecânica constante sob a parede do capilar gera dano glomerular progressivo, com lesão de podócitos, aumento da permeabilidade e perda da seletividade da barreira glomerular. Além disso, o estiramento mecânico de células mesangiais e endoteliais gera alterações fenotípicas celulares, com síntese aumentada de TGF-beta, de componentes da matriz extracelular e angiotensinogênio, com consequente produção aumentada de angiotensina II. Tutoria 5: M3- Jeovanna Miranda Na progressão das nefropatias, a angiotensina II, ao menos em grande parte, é responsável não só pelas alterações hemodinâmicas intraglomerulares, como também inflamatórias. Os efeitos da angiotensina II sob a hemodinâmica renal já são bem conhecidos, com sua ação vasoconstritora maior na arteríola eferente levando à hipertensão intraglomerular para manter a pressão de perfusão glomerular. A angiotensina II tem efeito imunomodulador, estimulando a síntese de diversos fatores de crescimento como PDGF (platelet-derived growth factor), TGF-beta (transforming growth factor beta) e FGF (fibroblast growth factor), induzindo a proliferação de células mesangiais e o acúmulo de matriz extracelular. Receptores de angiotensina II estão presentes na superfície dos podócitos, e sua ativação pode alterar as propriedades contráteis do complexo citoesqueleto dessas células; portanto, a angiotensina II pode alterar, de forma direta e não somente via alterações hemodinâmicas, a permeabilidade seletiva do capilar glomerular, permitindo escape de proteínas à luz tubular. A sobrecarga protéica no túbulo também pode gerar mudanças fenotípicas na célula tubular com maior secreção de substâncias vasoativos, citocinas e fatores de crescimento na membrana basolateral, com consequentes inflamação e fibrose intersticial. Os mecanismos fisiopatolológicos envolvidos com a progressão das nefropatias são complexos e estão ilustrados no Algoritmo 1. Nos últimos anos, têm-se acumulado evidências do importante papel dos eventos imunológicos também nas nefropatias não-imunomedidas, a exemplo da nefropatia diabética, da nefroesclerose hipertensiva e da glomerulosclerose segmentar focal (GESF). Em modelos experimentais, a administração do micofenolato mofetil, um imunossupressor de ação antilinfocitária através da inibição da síntese “de novo” das purinas, parece atenuar a lesão glomerular e intersticial, e surge como perspectiva no tratamento das nefropatias progressivas. Mais do que um simples marcador de injúria renal, o ultrafiltrado de proteínas parece ser lesivo ao rim, com base em evidências experimentais e em observações clínicas que correlacionam o grau da proteinúria com a progressão das nefropatias. Embora ainda não esteja esclarecido em definitivo na literatura médica se a proteinúria é causa ou marcador de gravidade para nefropatia crônica, estudos clínicos têm mostrado um efeito de proteção renal com a redução da proteinúriapor estrito controle pressórico, dieta com restrição protéica e terapia farmacológica para inibição da angiotensina II. Alterações metabólicas parecem desempenhar importante contribuição na progressão da nefropatia diabética; na prática clínica, a hiperglicemia persistente é o distúrbio metabólico reconhecido como fator de progressão na nefropatia diabética. A glicação não- enzimática de proteínas circulantes ou estruturais em decorrência da exposição à glicose leva à produção aumentada dos AGE (advanced glycation endproducts). No rim, já foram identificados receptores dos AGE na célula mesangial, nos podócitos, nas células do túbulo proximal e nos macrófagos, e a ativação desses receptores poderia desencadear uma resposta inflamatória. Tutoria 5: M3- Jeovanna Miranda Hipertensão ↝ É quase universal nos pacientes com DRC, e frequentemente é o primeiro indício clínico da doença; ↝ A coincidência da DRC e da alta pressão arterial é em particular importante, já que a hipertensão contribui para o desenvolvimento de doenças cardiovasculares, sendo as principais causas de morbidade e mortalidade nos pacientes acometidos pela DRC; A hipertensão em pacientes com DRC reflete, em grande parte, a expansão do volume extracelular devido a uma dieta rica em sal em conjunto com o comprometimento da capacidade de excretar sódio; a ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona também desempenha um papel. A resposta normal ao sódio retido é um aumento do volume extracelular, que eleva a pressão arterial e aumenta a excreção de sódio, provocando um equilíbrio entre a ingestão de sódio e excreção de sal. No novo estado estável dinâmico, no entanto, o equilíbrio de sal pode apenas ser mantido enquanto a pressão arterial for alta. Duas implicações práticas advêm destas relações. Em primeiro lugar, o tratamento de pacientes hipertensos com vasodilatadores isolados é, muitas vezes, ineficaz; quando os vasodilatadores reduzem a pressão arterial, a diminuição inicial da excreção de sódio leva à retenção de sódio, expansão do volume extracelular e uma nova elevação na pressão arterial. Em segundo lugar, a hipertensão nos pacientes com DRC pode não responder à terapia diurética, pois uma dieta rica em sal pode anular os efeitos benéficos da administração de diuréticos, mesmo em adultos normais; ↝ Outro mecanismo para o desenvolvimento da hipertensão em pacientes com DRC é a ativação do sistema renina-angiotensina-aldosterona e do sistema nervoso simpático, conforme evidenciado pelos níveis circulantes de renina e aldosterona que estão muito altos para indivíduos que são hipertensos. Os inibidores do sistema renina-angiotensina-aldosterona retardam a perda da função renal. As evidências para a ativação do sistema nervoso simpático incluem níveis circulantes mais elevados de norepinefrina, que não apenas é responsável pela vasoconstrição, como também suprime a produção de óxido nítrico. Doenças Endócrinas ↝ A DRC, mesmo em pacientes com valores de creatinina sérica de até 2,5 mg/dL, reduz a capacidade da insulina de estimular a captação de glicose pelos músculos e por outros órgãos, uma anormalidade conhecida como resistência à insulina. O resultado é um aumento transitório da glicemia, que causa uma elevação compensatória na liberação da insulina para manter a glicemia quase normal; ↝ Em pacientes com DRC resistentes à insulina, a insuficiência deve-se a um defeito pós-receptor na sinalização celular, incluindo um comprometimento da capacidade de fosfatidilinositol 3-quinase e sua cinase a jusante Akt. A importância desta anormalidade é que a função reduzida dessas enzimas nas células musculares prejudica o metabolismo tanto de glicose quanto de proteína, causando a perda de proteína muscular. A resistência à insulina em pacientes não diabéticos com DRC é geralmente associada a valores de glicemia dentro da faixa normal; os níveis de glicose no sangue raramente excedem a 200mg/dL; ↝ Uma possível causa da resistência à insulina na DRC é a acidose metabólica. A acidose também ativa a degradação da proteína muscular, prejudica a capacidade do hormônio de crescimento de estimular o fator de crescimento semelhante à insulina tipo I (IGF-I), reduz os níveis circulantes de tiroxina (T4) e triiodotironina (T3) e aumenta os níveis do hormônio estimulante da tireoide. Felizmente, a maioria dessas alterações metabólicas pode ser revertida simplesmente pelo tratamento de pacientes com DRC com bicarbonato de sódio ou outros agentes alcalinizantes; Tutoria 5: M3- Jeovanna Miranda ↝ Outro mecanismo que afeta o estado endócrino do paciente com DRC é o comprometimento da capacidade do rim de degradar as proteínas de pequeno porte, incluindo vários hormônios. Por exemplo, os pacientes diabéticos com DRC podem progressivamente perder a capacidade de degradar a insulina e podem até mesmo desenvolver hipoglicemia se forem tratados com sua dose habitual de insulina. A degradação prejudicada de peptídeos pelo rim danificado também pode afetar a interpretação da concentração circulante de PTH, já que o PTH não é completamente degradado quando a função renal está comprometida; o imunoensaio de PTH pode reconhecer um ou mais fragmentos de PTH, que pode ser mal interpretado como representando níveis excessivamente elevados de PTH; ↝ Em pacientes com DRC de estágio 4, a anemia normocítica normocrômica é quase universal, principalmente em decorrência de uma produção prejudicada de eritropoetina pelos rins. Entretanto, a anemia pode ser detectada até mesmo em pacientes com DRC de estágio 2 e com valores de creatinina sérica pouco acima da faixa da normalidade. Outros fatores que contribuem para o desenvolvimento da anemia em pacientes com DRC incluem uma menor meia-vida dos eritrócitos e as deficiências vitamínicas e de ferro. Quadro clinico A progressão insidiosa é a característica clínica da DRC, de modo que o rim mantém a capacidade de regulação da homeostase até fases avançadas da doença. A noctúria, decorrente da perda da capacidade de concentração urinária, costuma ser um dos primeiros sintomas da DRC mas dificilmente é valorizada pelo paciente. Posteriormente, surgem os sintomas decorrentes dos distúrbios hidroeletrolíticos e do acúmulo de escórias nitrogenadas, acometendo diversos sistemas do organismo. A DRC pode ter como primeira manifestação situações emergenciais como tamponamento pericárdico, edema agudo de pulmão, parada cardiorrespiratória, acidose metabólica e hipercalemia graves, convulsões e estados comatosos. Nessas circunstâncias, é comum surgir dúvida sobre a natureza aguda ou crônica da nefropatia. Os distúrbios hidroeletrolíticos, a anemia e os sintomas urêmicos são comuns tanto à insuficiência renal aguda quanto à DRC; para o diagnóstico diferencial, devem-se pesquisar: 1) achados ultra-sonográficos compatíveis com nefropatia crônica, como o aumento da ecogenicidade do parênquima renal e a redução do diâmetro renal e da espessura do córtex renal; 2) exame de fundo de olho com evidência de retinopatia diabética ou hipertensiva; 3) a presença de sinais de osteodistrofia renal como a elevação dos níveis séricos de paratormônio. Tutoria 5: M3- Jeovanna Miranda Diagnóstico Habitualmente pacientes assintomáticos, até que a insuficiência renal esteja avançada; ✓ Quando a TFG cai para aproximadamente 10 a 15 ml/min, começam a aparecer sintomas inespecíficos, como: • mal-estar; • fraqueza; • insônia; Tutoria 5: M3- Jeovanna Miranda • incapacidade de concentração; • náuseas e vômitos; ✓ Por fim, outros sinais e sintomas, que refletem uma disfunção orgânica generalizada, surgem como parte da síndrome urêmica. Exames de Imagem: • A ultrassonografia renal mostra-se particularmente útil ao diagnóstico de alguns casos de DRC [doença renal policística (DRP) e uropatia obstrutiva], bem como para diferenciar a doença renal aguda da crônica. Rins simetricamente pequenos(< 8,5 cm) sustentam o diagnóstico de DRC, enquanto a observação de rins de tamanho normal favorece um processo agudo mais do que crônico. Entretanto, existem exceções, visto que algumas causas de DRC estão associadas a rins de tamanho normal ou mesmo aumentado, incluindo diabetes, DRP e amiloidose; ↝ Outros exames de imagem podem ajudar a estabelecer a causa da DRC. A ultrassonografia com Doppler dúplex das artérias renais, cintigrafia renal e angiorressonância magnética são úteis aos pacientes com suspeita de doença isquêmica renovascular; • A uretrocistografia miccional mostra-se útil para afastar a possibilidade de nefropatia de refluxo; • A tomografia computadorizada possibilita avaliar a atividade dos cálculos renais, bem como evidências de necrose papilar. Exames Especiais: • Biopsia Renal deve ser reservada a pacientes com rins de tamanho quase normal, nos quais não é possível estabelecer um diagnóstico bem definido através de métodos menos invasivos e quando há suspeitas de causa potencialmente tratável. Tratamento Os tratamentos dirigidos às causas específicas da DRC incluem, entre outros, o controle rigoroso da glicemia dos pacientes diabéticos, o uso de agentes imunossupressores na glomerulonefrite e a utilização das novas modalidades de tratamento específico para retardar a cistogênese na doença renal policística. Em geral, a ocasião ideal para iniciar o tratamento, específico e não específico, é muito antes que haja declínio detectável da RFG e certamente antes que a DRC esteja bem estabelecida. Em todos os pacientes, é útil medir sequencialmente a RFG e colocar os resultados em um gráfico que expresse a velocidade de declínio. Qualquer aceleração na velocidade de declínio deve levar a uma busca de algum processo agudo ou subagudo sobreposto, o qual pode ser reversível. Isso inclui depleção do VLEC, hipertensão descontrolada, infecção do trato urinário, uropatia obstrutiva de início recente, exposição a fármacos nefrotóxicos, como AINEs ou contraste radiográfico, e reativação ou agravamento da doença original, por exemplo lúpus ou vasculite. Para reduzir a progressão da doença a taxa de declínio da RFG varia nos diferentes pacientes com DRC. Entretanto, as intervenções descritas adiante devem ser consideradas na tentativa de estabilizar ou retardar o declínio da função renal. Dieta Devem ser considerados cuidados nutricionais gerais para os pacientes portadores de DRC. A dieta deve ser hipossódica (até 2g de sódio ou 5g de NaCl), hipopotassêmica, dieta hipofosfatêmica (até 800mg/dia) – evitar alimentos industrializado e embutidos. Para pacientes a partir do estágio 4 da DRC, deve-se ter uma dieta hipoproteica, para evitar a hiperfiltração glomerular e a sobrecarga renal. Tutoria 5: M3- Jeovanna Miranda Hipertensão arterial sistêmica A redução da hipertensão intraglomerular e da proteinúria é imprescindível. As pressões de filtração intraglomerular elevadas e a hipertrofia dos glomérulos ocorrem como uma resposta à perda quantitativa dos néfrons em razão de diferentes doenças renais. Essa resposta é mal adaptativa porque estimula o declínio persistente da função renal, mesmo que o processo desencadeante tenha sido tratado ou tenha regredido espontaneamente. O controle da hipertensão glomerular é importante para retardar a progressão da DRC. Além disso, a pressão arterial elevada agrava a proteinúria porque aumenta o fluxo através dos capilares glomerulares. Por outro lado, o efeito nefroprotetor dos agentes anti-hipertensivos é aferido pela redução subsequente da proteinúria. Desse modo, quanto mais efetivo for determinado tratamento na redução da excreção proteica, maior o impacto subsequente na proteção contra o declínio da RFG. Essa observação constitui a base das diretrizes terapêuticas que estabelecem o nível de 130/80 mmHg como meta de pressão arterial para pacientes com DRC e proteinúria. Os inibidores da ECA e os bloqueadores de receptores da angiotensina II (BRAs) inibem a vasoconstrição das arteríolas eferentes da microcirculação glomerular, que é induzida pela angiotensina. Essa inibição possibilita a redução da pressão de filtração intraglomerular e da proteinúria. Vários estudos controlados demonstraram que esses fármacos foram efetivos em retardar a progressão da insuficiência renal nos pacientes com estágios avançados da DRC diabética ou de outras etiologias. Esse retardo da progressão da DRC está diretamente associado ao efeito redutor da proteinúria. Quando não há resposta antiproteinúrica com a utilização isolada de um desses fármacos, pode-se tentar o tratamento combinado com inibidores da ECA e BRAs. Essa combinação está associada à redução mais expressiva da proteinúria, quando comparada com o uso isolado de um desses fármacos. Embora a redução da proteinúria seja um indicador substituto de melhora do prognóstico renal, a combinação poderia ser vantajosa. No entanto, há uma incidência maior de insuficiência renal aguda e complicações cardíacas com esse tratamento combinado. Por essa razão, ainda não está claro se a combinação de inibidores da ECA com BRAs pode ser recomendada rotineiramente. Entre os efeitos adversos desses fármacos estão tosse e angioedema com os inibidores da ECA e anafilaxia e hiperpotassemia com as duas classes. O aumento progressivo da concentração sérica de creatinina com o uso desses fármacos pode sugerir a existência de doença renovascular das artérias de pequeno ou grande calibre. A ocorrência desses efeitos colaterais pode exigir a utilização dos agentes anti-hipertensivos de segunda linha em vez dos inibidores da ECA ou dos BRAs. Os IECA devem ser utilizados com cautela em pacientes com níveis de creatinina acima de 3 mg/dL e naqueles propensos a desenvolver hiperpotassemia. Entre os bloqueadores dos canais de cálcio (BCC), o diltiazem e o verapamil podem reduzir a proteinúria e causar efeitos nefroprotetores mais eficazes, quando comparados com as di- hidropiridinas. No mínimo dois tipos de resposta podem ser observados: um no qual a progressão está diretamente associada à hipertensão sistêmica e intraglomerular, bem como à proteinúria (p. ex., nefropatia diabética, doenças glomerulares) e no qual os inibidores da ECA e os BRAs provavelmente são a primeira opção; e outro no qual a proteinúria é leve ou indetectável nos Tutoria 5: M3- Jeovanna Miranda estágios iniciais, por exemplo na doença renal policística do adulto e em outras doenças tubulointersticiais, e no qual a contribuição da hipertensão intraglomerular é menos proeminente; neste último grupo, os outros agentes anti-hipertensivos podem ser úteis para controlar a hipertensão sistêmica. Os diuréticos tiazídicos e a clortalidona podem ser úteis no início da doença renal crônica, porém, à medida que a insuficiência renal progride, em uso isolado tendem a perder a eficácia. Caso o paciente apresente níveis ascendentes de creatinina, chegando a 2mg/dl, recomenda-se o uso de diuréticos de alça. Assim, associa-se a furosemida nesses casos. Os vasodilatadores não apresentam bons resultados, e o minoxidil deve ser reservado apenas para casos de hipertensão arterial grave. Diabetes mellitus Já o manejo da nefropatia diabética consiste em prevenção por meio de controle da glicemia. O bom controle da glicemia e da hemoglobina glicada reduz o ritmo com que a microalbuminúria aparece e progride no DM tipo 1 e 2. Entretanto, quando ocorre macroalbuminúria, não está bem definido se a melhora do controle glicêmico irá reduzir a velocidade de progressão da doença renal. Durante a fase posterior de declínio da função renal, as demandas de insulina podem cair, pois o rim é um local de degradação da insulina. À medida que a RFG diminui com a nefropatia progressiva, o uso e a dose dos agentes que reduzem a glicose devem ser reavaliados. Alguns desses medicamentos (sulfonilureias e metformina) estão contraindicadosna insuficiência renal avançada. Em comparação com o que ocorre nos indivíduos que não são diabéticos, a hemodiálise nos pacientes com DM está associada a complicações mais frequentes, tais como hipotensão, decorrente de neuropatia autonômica ou da perda da taquicardia reflexa, um acesso vascular mais difícil e uma progressão acelerada da retinopatia. As complicações da aterosclerose constituem a principal causa de morte em indivíduos diabéticos com nefropatia, e a hiperlipidemia deve ser tratada de modo agressivo. O transplante renal proveniente de um doador vivo aparentado constitui a terapia preferida, mas torna necessária a imunossupressão crônica. O transplante combinado de pâncreas-rim oferece a promessa de normoglicemia e de liberdade da diálise. Anemia A anemia, definida como valores de hemoglobina <13,0 g/dL no homem e <12,0 g/dL na mulher, é uma das complicações mais frequentes e precoces no curso da DRC. Sempre que o diagnóstico de anemia for feito, deve-se dosar a ferritina, o índice de saturação de transferrina, ácido fólico e B12. Devem ser considerados a reposição de ferro, vitamina B12 e ácido fólico e o uso de agentes estimuladores da eritopoese, a eritopoetina. A reposição de eritropoetina só deve ser feita após o fornecimento dos substratos, caso haja carência de ferro, B12 e ácido fólico. Distúrbio mineral ósseo Deve-se considerar como parâmetros para o tratamento os valores de fósforo, PTH e vitamina D, apenas para pacientes com DRC nos estágios 3, 4 e 5. Os níveis séricos de fósforo de PTH devem ser mantidos na faixa de normalidade, de acordo com o estágio da DRC. Tutoria 5: M3- Jeovanna Miranda Os quelantes de fósforo (carbonato de cálcio, hidróxido de alumínio, acetato de cálcio e sevelamer) devem ser prescritos se, apesar da restrição dietética, o fósforo sérico ou o PTH estiverem acima dos níveis recomendados, pois além de serem quelantes de fósforo, aumentam o aporte de cálcio ao paciente. A elevação do PTH deve ser tratada com pulsos de calcitriol ou outro metabólito da vitamina D, caso o produto cálcio x fósforo não esteja elevado. O calcitriol (0,25 μg/dia) aumenta a reabsorção intestinal de cálcio e fósforo, podendo gerar valores proibitivos de fosforemia e calcemia; os novos análogos sintéticos de vitamina D são mais seletivos para as paratireóides, sem interferir nos níveis séricos de cálcio e fósforo, pois não têm ação sob o receptor intestinal da vitamina D. Caso o tratamento medicamentoso com vitamina D sintética não obtenha os efeitos desejados, está indicado o tratamento cirúrgico, com a realização de paratireoidectomia subtotal, total ou total com auto-implante. Existem ainda os calcimiméticos, agonistas de receptores cálcio-sensíveis que atuam nas glândulas paratireóides, aumentando a sensibilidade desses receptores ao cálcio. Como aumenta a sensibilidade das glândulas paratireóides aos níveis de cálcio sérico, essa nova classe de droga pode levar à redução na produção do PTH. Acidose A progressão da DRC, leva a uma excreção de H+ insuficiente para manter a homeostasia e o paciente desenvolve acidose metabólica, com concentração sérica de bicarbonato variando de 12 a 18 mEq/L. O tratamento deve ser instituído para prevenir a osteopenia e o catabolismo muscular. Nos casos de acidose, recomenda-se o uso de bicarbonato de sódio via oral na dose de 0,5 a 1,0 mEq/kg/dia, para manter o bicarbonato com dose próxima a 22 mEq/L. Outras complicações No manejo de outras complicações da DRC, principalmente as que não respondem a diálise, deve- se atentar ao ajuste na dose de medicamentos. Embora a dose de ataque da maioria dos fármacos não seja afetada pela DRC, porque a eliminação renal não entra nos seus cálculos, as doses de manutenção de muitos fármacos precisam ser ajustadas. Como os fármacos cujas doses são excretadas por vias não renais são mais de 70%, os ajustes de dose podem ser desnecessários. Mas alguns fármacos que devem ser evitados incluindo metiformina, meperidina e hipoglicemiantes orais eliminados por via renal. Os AINEs devem ser evitados em vista do risco de agravar ainda mais a deterioração renal. Alguns antibióticos, anti-hipertensivos e antiarrítmicos podem exigir reduções da dose ou alteração dos intervalos entre as doses. Como mencionado antes, os contrastes radiológicos e o gadolínio devem ser evitados ou utilizados de acordo com diretrizes estritas conforme a necessidade médica. Em alguns casos, o alívio transitório dos sinais e dos sintomas da uremia iminente, como anorexia, náuseas, vômitos, fraqueza e prurido, pode ser conseguido com a restrição da ingestão proteica. Entretanto, essa intervenção acarreta risco significativo de desnutrição e, desse modo, devem ser planejadas medidas terapêuticas de longo prazo. A diálise de manutenção e o transplante renal prolongaram a vida de centenas de milhares de pacientes com DRC em todo o mundo. Tutoria 5: M3- Jeovanna Miranda Terapia de substituição renal As indicações para a instituição da terapia renal substitutiva para pacientes com DRC estão na tabela. Em vista da variabilidade individual da gravidade dos sintomas urêmicos e da função renal, não é recomendável atribuir um valor arbitrário de ureia ou creatinina recomendado para o momento ideal do início da terapia renal substitutiva. Além disso, os pacientes podem ficar acostumados à uremia crônica e negar seus sintomas, embora logo descubram que se sentem melhor com a diálise e percebam retrospectivamente como se sentiam mal antes de iniciar o tratamento. Estudos pregressos sugeriram que o início da diálise antes do aparecimento de sinais e sintomas graves de uremia estaria associado ao prolongamento da sobrevida. Isso originou o conceito de “início saudável” e é compatível com a filosofia de que é melhor manter o paciente sempre se sentindo bem, em vez de deixar que doença em razão da uremia, antes de tentar recuperar suas melhores condições de saúde com a diálise ou transplante. Embora estudos recentes não tenham confirmado uma correlação entre diálise precoce e aumento da sobrevida dos pacientes, ainda existe mérito com essa abordagem em alguns indivíduos. Na prática, a preparação antecipada pode ajudar a evitar problemas com o próprio processo de diálise, por exemplo uma fístula que não funciona adequadamente para a hemodiálise ou um cateter peritoneal mal funcionante e, desse modo, impedir a morbidade associada à necessidade de criar um acesso temporário para a hemodiálise com seus riscos inerentes de sepse, sangramento, trombose e associação com mortalidade acelerada. Hemodiálise A hemodiálise é a terapêutica mais utilizada para tratamento, controle e manutenção vital de pacientes portadores de DRC em estado avançado. A hemodiálise remove os solutos urêmicos anormalmente acumulados e o excesso de água, e restabelece o equilíbrio eletrolítico e ácido-básico do organismo. A hemodiálise se baseia na transferência de solutos e líquidos através de uma membrana semipermeável que separa os compartimentos sanguíneos do “banho de diálise” (dialisado) no hemodialisador (filtros capilares). Essa membrana permite a passagem de moléculas de pequeno peso molecular (eletrólitos, uréia, creatinina, potássio etc.) e ao mesmo tempo impede a transferência de moléculas maiores e de elementos figurados (como as proteínas séricas, elementos figurados do sangue, bactérias e vírus). Essa passagem de solutos pode ser feita através da difusão ou através da convecção (gradiente pressórico exercido por meio da membrana semipermeável do dialisador). Tutoria 5: M3- Jeovanna Miranda As vantagens dessa técnica são: retirada rápida de volume, correção de distúrbios hidroeletrolíticos e menor chance de falhas. As complicações da hemodiálise consistem de: hipotensão, câimbra, infecção de corrente sanguínea associada à cateter e queda da função renal residual.Diálise peritoneal É especialmente indicada para crianças e para pacientes com dificuldade na obtenção de um acesso vascular, além de ser uma opção para pacientes com instabilidade hemodinâmica durante as sessões de hemodiálise. A diálise é feita através de um cateter inserido dentro da cavidade abdominal. O peritônio visceral é o responsável pela maior área afetiva de troca. Quando se infunde solução de diálise no espaço peritoneal, ocorre transferência de soluto entre o sangue e a solução dialisadora. A troca se faz por meio de três estruturas distintas: capilar, interstício peritoneal e mesotélio. O transporte de líquidos através da membrana peritoneal se faz por ultrafiltração, gerada pelo gradiente de pressão osmótica e criado pela elevada concentração de glicose nas soluções de diálise. O transporte de solutos realiza-se de maneira passiva, segundo dois processos: difusão (gerado pelo gradiente de concentração entre o sangue e o dialisado) e convecção (arraste de solutos por ocasião da ultrafiltração). A difusão é o processo responsável pela transferência da grande massa dos solutos. As vantagens do método incluem: menor chance de hipotensão, melhor qualidade de vida, já que o paciente pode realizar o procedimento em casa, além de maior preservação da função renal. As desvantagens do método incluem: maior chance de falha técnica, peritonite (infecção da cavidade peritoneal) e esclerose do peritônio.
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