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AULA 1 NEUROCIÊNCIA E COMPORTAMENTO HUMANO Profª Angela Christine Gosch 2 TEMA 1 – NEUROCIÊNCIA A neurociência é a ciência que estuda o sistema nervoso nos mais diversos níveis de complexidade, buscando abranger as suas funções na íntegra, bem como suas relações com as funções orgânicas, desde a célula até o corpo como um todo e com o comportamento humano (Kandel; Schwartz; Jessell, 2000). A neurociência é um estudo complexo e é uma tendência da evolução, pois envolve uma questão multidisciplinar, englobando tudo que cerca o sistema nervoso e suas implicações na vida de uma pessoa. Há que se considerar que o sistema nervoso está no comando de tudo: do pensamento, da memória, de nossos movimentos, das paixões, afetos e desafetos e tudo o mais que envolve o ser humano (Kandel; Schwartz; Jessell, 2000). Observa-se um campo de conhecimento e estudo muito amplo, pois envolve a compreensão do sistema nervoso em cada um de seus pormenores e suas correlações com as funções do corpo humano, quer sejam motoras, quer sejam cognitivas ou emocionais (Kandel; Schwartz; Jessell, 2000). Considerado atual, complexo e interdisciplinar que envolve a integralidade do ser humano, o conteúdo abrangido por esse tema envolve a biologia com a composição básica do corpo humano em nível celular; a anatomia e a neuroanatomia, que nos mostram a morfologia do corpo e cérebro; a fisiologia e neurofisiologia, que explicam o funcionamento, regulação e modulação das estruturas que compõem o corpo humano; bem como a psicologia, que correlaciona todos esses conhecimentos ao comportamento humano e às reações emocionais (Kandel; Schwartz; Jessell, 2000). A mente humana é, sem sombra de dúvidas, uma maravilhosa obra de engenharia, dotada de uma capacidade de análise, de resolver processos interpretativos e de comando de uma forma fascinante. Mas quanto se conhece do cérebro humano? Apesar do imenso conhecimento, ainda existem muitas coisas a serem desvendadas sobre a estrutura e funcionamento do sistema nervoso. Por que somos como somos? Por que nos comportamos de forma diferente frente a determinadas situações? Por que, diante de certas situações, somos capazes de nos adequar e, frente a outras, ficamos totalmente sem reação? Por que gostamos de determinadas coisas e outras simplesmente detestamos? Por que temos facilidade de aprender determinadas disciplinas na escola enquanto que outras nos são extremamente difíceis? Conseguimos lidar 3 adequadamente com nossas emoções? Essas são questões muito amplas que uma só disciplina não consegue responder. A neurociência, por meio da junção de diversas áreas de conhecimento, busca responder não apenas a essas questões, mas a muitas outras dúvidas que estão por trás do funcionamento de nossa mente, nosso comportamento e de nosso corpo (Myers, 1998). TEMA 2 – HISTÓRIA DA NEUROCIÊNCIA Nossa curiosidade pelo conhecimento da mente humana vem das eras mais longínquas. Nós sempre quisemos saber como a mente interage com nosso corpo e como ela pode comandar e modular nossos comportamentos. Como acontece a relação entre a mente e o corpo? Como nossos pensamentos são formados? Onde são armazenadas nossas memórias? E nossas emoções e sentimentos possuem um lugar preciso em nosso corpo? Essas e muitas outras dúvidas perscrutam o nosso íntimo e são feitas pelos pesquisadores na área de neurociência na busca incessante do conhecimento e de respostas sobre si mesmo e dos que nos cercam (Myers, 1998). A história da neurociência começa nos primórdios da medicina com os estudos de anatomia e fisiologia, que eram feitos no princípio de forma bastante rudimentar. Devemos considerar que não havia exames de imagens e que nos primórdios era proibido dissecar os corpos humanos sob pena de heresia (Rooney, 2018). Nas civilizações mais antigas, como as egípcias e outras, admitia-se que a mente humana achava-se no interior do crânio. E não apenas a mente habitava o crânio, mas também os espíritos (Rooney, 2018). Ainda sem comprovação científica, pois os estudos eram feitos com base na observação e não na experimentação científica, a maioria dos filósofos da Antiguidade (tais como Alcmeon, Demócrito, Hipócrates e outros) afirmavam que o cérebro é o local onde se encontra a mente com todas as nossas emoções, pensamentos e sentimentos. Hipócrates, considerado o “Pai da Medicina”, afirmou isto em seu livro A arte da cura. Ele trabalhou empiricamente, sempre comparando pacientes que apresentassem lesões cerebrais com as sequelas apresentadas (que podiam ser de diversas naturezas: cognitivas, motoras, de memória, de consciência ou outras). Com esses estudos realizados, ainda que de maneira frágil, Hipócrates concluiu que o cérebro é a morada da mente humana. Alguns discordavam dessa teoria, como Aristóteles, que afirmava que o coração era a 4 sede de nosso intelecto, de nossas percepções e o centro de nossas emoções. Embora incorretas, das teorias de Aristóteles perduraram algumas expressões até o dia de hoje, tais como “saber de cor” (saber com o coração). Mas novamente aqui as observações eram feitas com base na observação e no pensamento, sem experimentação científica (Rooney, 2018). Já na Idade Média Galeno dissecou animais e fez comparações entre a anatomia animal e a humana. No entanto esse confronto de anatomias mais tarde mostrou-se carregada de erros, pois nem sempre elas podem ser comparadas. Independente disso, ele reafirmou as teorias de Hipócrates de que o cérebro é o domínio da mente humana (Rooney, 2018). Em 1543, Andreas Versalis publicou um dos primeiros livros em que descreveu com incrível precisão o sistema nervoso. Em 1664, Thomas Willis publicou uma obra que tratava especificamente da anatomia do cérebro: Anatomy of the brain. No entanto nessa época ainda não se entendia como eram feitas as conexões, não se entendia a atividade elétrica do sistema nervoso. O conceito de sinapse nervosa ainda não existia (Rooney, 2018). René Descartes foi um filósofo importante, que publicou diversas obras, tais como As paixões da alma. Foi o criador da teoria do dualismo, na qual considerava a mente e o corpo como estruturas distintas, de tal forma que um não pode influenciar o outro. Em seu célebre livro Discurso do método, escreveu a famosa frase “Penso, logo existo”, a qual faz referência à importância da mente e do corpo. Questiona a dúvida absoluta, em que as verdades não podem apresentar questionamentos e responde sobre a existência do ser e da mente, duvidando delas, mas, segundo ele, se o pensamento existe, também existimos. Por fim, Descartes também elaborou a teoria da ação reflexa, que relaciona os estímulos recebidos do meio externo com a interpretação por parte do sistema nervoso (Rooney, 2018). TEMA 3 – A NEUROCIÊNCIA NA ATUALIDADE Um grande avanço científico surgiu quando se descobriu que o sistema nervoso funciona por meio de um sistema elétrico e que esses impulsos elétricos é que conduzem as informações. Novas descobertas começaram a surgir de forma rápida, tais como o potencial de ação, o potencial de membrana e os potenciais elétricos do sistema nervoso, Estudou-se a velocidade de propagação desses potenciais e sua influência no estímulo nervoso e muscular. Foi também 5 desenvolvido o eletroencefalograma, demostrando o registro gráfico da atividade elétrica cerebral. Foi o início de uma nova era em que a eletrofisiologia científica e sua funcionalidade predominaram (Kandel; Schwartz; Jessell, 2000). Quanto à função das áreas cerebrais, inicialmente deduziu-se que o cérebro era divido em várias áreas e que cada área era responsável por uma função. No entanto o padrão que foi atribuído a essas funções foi feito de maneira aleatória e não correspondia à realidade.Mais tarde, foram descobertas algumas funções relacionadas à fala. Broca, por exemplo, descreveu a área motora da fala e Wernick descreveu a área cognitiva da fala (Kandel; Schwartz; Jessell, 2000). Claude Bernard, considerado o pai da fisiologia moderna experimental, descobriu o conceito fundamental da fisiologia denominado homeostasia, que é o equilíbrio dinâmico entre os meios corporais. A vida dentro de um corpo muda a cada instante, e a busca pelo equilíbrio ocorre constantemente comandada pelo sistema nervoso (Kandel; Schwartz; Jessell, 2000). A classificação citoarquitetural de Brodmann dividiu o córtex cerebral segundo a organização de suas células, e cada área recebeu um número e várias dessas regiões podem ser correlacionas com uma função. Dentre as mais conhecidas, temos as áreas 1, 2 e 3, que representam o córtex somatossensorial, que permite ao indivíduo perceber as sensações nas diversas partes do corpo; a área 4, que caracteriza o córtex motor primário; a área 17, que mostra o córtex visual primário; e as áreas 41 e 42, que representam o córtex auditivo primário. Muitas outras correlações entre as regiões de Brodmann e as funções equivalentes ainda estão sendo descobertas até hoje (Kandel; Schwartz; Jessell, 2000). Até bem pouco tempo atrás era impossível estudar o cérebro do indivíduo vivo, mas, com a evolução dos exames de imagens, isso já é possível. A tecnologia atual permite um melhor diagnóstico, prognóstico e tratamento tanto de doenças neurológicas quanto de patologias psiquiátricas. Além disso, diversas doenças podem ser detectadas ainda em fase inicial, o que propicia um melhor tratamento com maiores chances de sucesso. Os diferentes exames, tais como a ressonância magnética e a tomografia computadorizada, trouxeram uma nova luz para a dinâmica dos diagnósticos e prognósticos. A cada dia, o conhecimento das funções do sistema nervoso se fez possível com a evolução da ciência e da tecnologia (Kandel; Schwartz; Jessell, 2000). 6 Conforme os estudos foram evoluindo, as conexões entre as diversas disciplinas começaram a se tornar obrigatórias. Cada vez mais surgiu uma ciência que abrange diversas disciplinas, que integra todos os conhecimentos que envolvem o corpo humano. A relação entre a mente e o corpo passa a ser estudada de forma ampla e abrange desde o conhecimento celular e molecular até o desenvolvimento de softwares que facilitem a compreensão das funções. (Kandel; Schwartz; Jessell, 2000). TEMA 4 – NEUROCIÊNCIA ESTRUTURAL A neurociência é multidisciplinar, pois envolve muitas áreas de conhecimento. O cérebro é o foco central que coordena todas essas áreas de conhecimento, sendo considerado o elo que irá realizar a ligação entre todas as neurociências (Bear; Connors; Paradiso, 2010). No entanto é necessário dividir os campos que especificam a complexidade do sistema nervoso e suas relações para facilitar o estudo. Dessa forma, cada uma das áreas estudadas pode ser correlacionada com as demais, montando assim uma grande teia de conhecimento sobre o sistema nervoso, suas funções e relações com nosso comportamento (Bear; Connors; Paradiso, 2010). 4.1 Neuroanatomia Uma das partes mais complexas e difíceis da neurociência, ela tem por objetivo compreender toda a estrutura do sistema nervoso. Atualmente ainda existem muitas áreas não estudadas no nosso cérebro, mas, com os exames de imagens, esses conhecimentos se tornam a cada dia mais precisos. A neuroanatomia é o estudo de cada uma das partes que compõe tanto o sistema nervoso central quanto o sistema nervoso periférico a fim de compreender suas respectivas funções e correlações clínicas. É necessária a compreensão da estrutura, para poder analisar como cada parte interage uma com as outras. Nosso sistema nervoso age em conjunto: um segmento interfere na função do outro. Sem o conhecimento das estruturas que compõem o sistema nervoso, torna-se impossível o estudo das funções cerebrais (Bear; Connors; Paradiso, 2010). Atualmente o desenvolvimento dos exames de imagens permitiu um grande avanço no conhecimento da neuroanatomia e da neurofisiologia. As técnicas 7 avançadas levam a uma maior precisão diagnóstica e de tratamentos, cujo conhecimento vem evoluindo a cada dia (Bear; Connors; Paradiso, 2010). 4.2 Neurofisiologia A neurofisiologia estuda as funções ligadas às várias áreas do sistema nervoso central e periférico. A correlação entre a estrutura, a função e as patologias é fundamental, pois, para compreender a patologia, é necessário primeiramente conhecer o fisiológico para que se possa traçar um perfil comparativo. O conhecimento da forma é essencial para a compreensão do funcionamento, formando-se uma tríade entre a anatomia, a fisiologia e a patologia (Bear; Connors; Paradiso, 2010). A neurofisiologia é o elo que realiza a ligação entre a forma e as aplicações clínicas, pois, para compreender qualquer processo de doença, primeiramente precisamos conhecer a estrutura saudável tanto no que se refere à forma quanto no que se refere à função. A função do cérebro está relacionada com suas interações com o comando do corpo, mas como acontece esse comando? De que forma o sistema nervoso regula as nossas funções corporais? Como ocorre a coordenação para que nosso corpo tenha um equilíbrio dinâmico entre os meios corporais? Quais são as influências do sistema endócrino no sistema nervoso, na fisiologia corporal e no comportamento humano? (Bear; Connors; Paradiso, 2010). 4.3 Neurociência celular e molecular O sistema nervoso, assim como todo nosso corpo, é formado por células, as quais são as unidades que dão início à vida. As células são a menor unidade do nosso corpo e são dotadas de independência, cumprindo as funções celulares que as mantêm vivas (Bear; Connors; Paradiso, 2010). Os neurônios e a neuróglia são as células que compõem o sistema nervoso. Os neurônios são considerados a unidade anátomo-funcional. São eles que recebem as informações e as conduzem para o sistema nervoso central, onde é feita a interpretação. As respostas elaboradas por nosso corpo são levadas pelos neurônios até o órgão efetor (Bear; Connors; Paradiso, 2010). A neuróglia (ou células da glia, como também podem ser chamadas) tem a missão de dar suporte aos neurônios para que estes possam cumprir suas funções. Dentre as principais atividades da neuróglia, estão a nutrição, o suporte 8 de oxigênio, a limpeza com a remoção de células mortas e a formação da bainha de mielina, cuja função é melhorar a condução do impulso nervoso, pois quanto maior a quantidade de mielina, melhor e mais rápida será a transmissão da informação (Bear; Connors; Paradiso, 2010). Atualmente existem diversas pesquisas que discutem se o papel da neuróglia verdadeiramente se restringe ao suporte aos neurônios ou se esta tem uma atuação na composição das funções cerebrais como pensamento, memória e interpretação (Gomes; Tortelli; Diniz, 2013). 4.4 Neurociência do desenvolvimento Sempre quisemos saber como o cérebro humano se desenvolve. Como criamos as conexões cerebrais? Qual é a relação com os mecanismos biológicos e como isso afeta o desenvolvimento do ser humano como um todo? Esse desenvolvimento, quando não acontece de forma integral, pode afetar a pessoa por toda a vida, interferindo no comportamento, nas emoções, na aprendizagem e até mesmo na saúde (Myers, 1998). Durante a vida intrauterina, ocorre a formação do sistema nervoso e isso se dá a partir da terceira semana de vida. A má formação do embrião pode levar a diversas patologias que podem causar um comprometimento do desenvolvimento e que podem afetar desde a parte motora até a parte intelectual (Myers, 1998). O desenvolvimento dos seis anos iniciais de vida é essencial para a formação e é influenciado pelos aspectos físicos, psicológicos e sociais. Uma primeirainfância bem desenvolvida interfere na adolescência e até mesmo na vida adulta, formando indivíduos mais saudáveis do ponto de vista emocional e cognitivo (Myers, 1998). Desde a gravidez, o bebê já interage com o ambiente externo e interno bem como com as atitudes da mãe. Depois do parto, crianças que sejam privadas de contato físico podem ter comprometimento de suas funções cerebrais em qualquer âmbito, por exemplo, emocional, cognitivo e até mesmo de desenvolvimento físico (Myers, 1998). O toque para o bebê tem papel fundamental na formação, trazendo informações de conforto, bem-estar e segurança, que permitem ao indivíduo desenvolver-se adequadamente, estimulando suas sensações e reações orgânicas. Embora sua memória ainda não esteja bem desenvolvida e essas 9 lembranças não perdurem, a ausência dos estímulos impede o correto desenvolvimento e pode formar lacunas no desenvolvimento da personalidade, bem como interferir no desenvolvimento dos processos cognitivos e emocionais (Myers, 1998). 4.5 Neuroimagem Embora uma grande parte do cérebro ainda seja desconhecida com o avanço da tecnologia e os exames de imagens, hoje é possível detectar com muita precisão quando as estruturas que compõem o sistema nervoso estão íntegras ou alteradas por uma patologia ou trauma. Isso se torna de suma importância nos diagnósticos e prognósticos de cada indivíduo frente a uma patologia (Kandel; Schwartz; Jessell, 2000). A criação de imagens por meio de exames é cada dia mais utilizada e pode ser utilizada como recurso tanto na atenção primária quanto no acompanhamento de um tratamento ou monitorização de sequelas já existentes. As imagens são também amplamente utilizadas como forma de estudo em que é possível analisar as estruturas e correlacioná-las com as funções cerebrais e verificar como o cérebro reage frente a uma atividade específica (Kandel; Schwartz; Jessell, 2000). 4.6 Neurociência computacional Assim como todas as áreas da neurociência, a área computacional também tenta compreender o comportamento humano. Trabalha de forma teórica, utilizando-se de programas de computação para tentar recriar situações que envolvem o sistema nervoso. Simulando e modulando as funções cerebrais, cria modelos de estudo para que se possam aprimorar os conhecimentos e testar hipóteses que serão analisadas em experimentos fisiológicos (Kandel; Schwartz; Jessell, 2000). 4.7 Neuroengenharia A neuroengenharia vem criando modelos que podem ser aplicados no conhecimento da estrutura e no seu funcionamento para que, com essa compreensão, possam se prevenir alterações. O conhecimento dos mecanismos fisiológicos nos permite entender quando algo está errado e, dessa forma, buscar uma correção (Kandel; Schwartz; Jessell, 2000). 10 Essa ciência se utiliza de técnicas de engenharia para tentar compreender o funcionamento da mente, recriando situações por meio de componentes expressivos, buscando entender e reparar os circuitos neuronais (Kandel; Schwartz; Jessell, 2000). TEMA 5 – NEUROCIÊNCIA APLICADA O envolvimento e a integração das diversas áreas é que permite a neurociência aprofundar os estudos do cérebro e suas relações com o comportamento humano. O sistema nervoso integra todas as pesquisas e coordena os diversos níveis de relação entre o comportamento humano e suas aplicabilidades. Pode-se dividir os estudos em diversas áreas de conhecimento com o intuito de facilitar e aprofundar o aprendizado (Kandel, 2000). 5.1 Neuropsicologia A neuropsicologia estuda a interação entre a psicologia e o cérebro humano, preocupando-se com a conexão que há entre o funcionamento das estruturas que compõem o sistema nervoso e de suas funções ligadas à área comportamental, cognitiva e psíquica, o que envolve a relação entre o comportamento e as funções cerebrais. Por que pessoas agem de formas diferentes frente a situações similares? Se considerarmos apenas a neuroanatomia e a neurofisiologia, todos deveriam ter um mesmo comportamento, no entanto não é isso o que ocorre, pois além da estrutura básica que compõe o cérebro humano, existem os pensamento, os sentimentos, as memórias, enfim, as vivências e os aprendizados vividos por todas as pessoas. Essas experiências é que nos tornam indivíduos únicos capazes de tomar decisões diferentes frente a cada uma das situações. Como compreender essas relações entre o material e o abstrato e torná-las papáveis do ponto de vista funcional no entendimento da mente humana? (Kandel; Schwartz; Jessell, 2000). Podemos também nos perguntar como as lesões cerebrais interferem na conduta frente às diversas situações e no comportamento de vida diária. É importante pesquisar se essas lesões interferem na capacidade cognitiva, emocional e comportamental do indivíduo e fazer uma avaliação, desde a conduta frente às diferentes situações até a capacidade compreender, analisar e resolver os problemas, com o intuito de entender o comportamento e correlacionar suas 11 causas com as possíveis lesões do sistema nervoso. Além disso, é preciso analisar toda a estrutura do sistema nervoso, verificando as possíveis ligações entre as falhas morfológicas da estrutura e do funcionamento (Kandel; Schwartz; Jessell, 2000). Enfim, a neuropsicologia abre um vasto leque de pesquisas em que a ciência e a psicologia se colocam lado a lado, buscando a compreensão do comportamento humano e suas razões (Kandel; Schwartz; Jessell, 2000). 5.2 Neurociência cognitiva A neurociência cognitiva analisa as capacidades cognitivas, as habilidades para desenvolver o conhecimento, as formas de aprendizado, o raciocínio e a memória, a interação entre a biologia e nossos atos. Como os nossos neurônios são capazes de coordenar o pensamento? Como nosso cérebro aprende? Por que algumas pessoas têm mais facilidade de aprendizado do que outras? Qual é a razão de termos mais facilidades em aprendermos uma disciplina e mais dificuldades em outras? (Myers, 1998). Os estudos nos mostram que nosso cérebro processa e aprende melhor as coisas para as quais damos mais importância, ou seja, a atenção interfere no processo de aprendizagem. Os sentimentos que nutrimos por um determinado tópico ou mesmo pela pessoa que nos apresenta esse tópico faz com que tenhamos muito mais interesse por este ou aquele assunto. Como melhorar esse interesse de forma a incrementar nossa capacidade cognitiva em relação a determinados temas? (Myers, 1998). 5.3 Neurociência comportamental Nossas ações do dia a dia são comandadas pelo nosso sistema nervoso. Fatores como as emoções e pensamentos influenciam diretamente o comportamento visível, como a forma de falar, de agir e até mesmo os gestos usados pela pessoa. O sistema nervoso é responsável pelo comportamento, mas como é feita esta relação entre a biologia e nossos atos? Como o ser humano controla o comportamento, e como as lições aprendidas no decorrer da vida podem influenciar nossas atitudes mudando padrões de comportamento? (Myers, 1998). 12 5.4 Neurociência afetiva As emoções sempre foram, sem sombra de dúvidas, a parte mais difícil de compreender da mente humana. Cada um de nossos sentimentos tem uma relação com todo o corpo e provoca diversas alterações fisiológicas. Buscar respostas para o que sentimos é um grande desafio. Queremos sempre saber por que estamos sentindo aquilo ou de onde vem esse sentimento. Podemos controlar nossos sentimentos? Uma dúvida que nos assola, por exemplo, é saber onde fica no nosso corpo cada emoção que permeamos. Mas se compreender as emoções já é uma tarefa árdua, saber como nossa mente controla as emoções é outro desafio. O sistema nervoso interage com as emoções, e sua ligação e comando do corpo fazem com que as emoções influenciem em todo nosso organismo (Cruz; Landeira-Fernandes, 2007). 5.5 Neurociência cultural Essa parteda neurociência estuda como os valores culturais, morais e nossas crenças interferem em nossa forma de agir. Como o que aprendemos no dia a dia e as regras que nos foram incutidas desde a infância influenciam em nosso comportamento? O domínio dos conceitos de certo e errado fazem com que nosso cérebro seja estimulado a realizar atitudes consideradas corretas ou inibido em virtude de algo que consideramos errado (Kandel; Schwartz; Jessell, 2000). Dessa forma, podemos compreender que em apenas uma ciência seria impossível responder a tantos questionamentos que nos assolam acerca da mente humana. A neurociência tenta reunir diversas áreas de estudo, tendo um ponto em comum, que é a mente humana (Kandel; Schwartz; Jessell, 2000). 13 REFERÊNCIAS BEAR, M. F.; CONNORS, B. W.; PARADISO, M. A. Neurociências: desvendando o sistema nervoso. 3. ed. Porto Alegre: Artmed, 2010 CRUZ, P. M.; LANDEIRA-FERNANDES, J. Por uma psicologia baseada em um cérebro em transformação. In. LANDEIRA-FERNANDES, J; SILVA, M. T. A. (Org.). Intersecções entre psicologia e neurociências. Rio de Janeiro: MedBook, 2007. GOMES, F. C. A.; TORTELLI, V. P.; DINIZ, L. Glia: dos velhos conceitos às novas funções de hoje e as que ainda virão. Estudos Avançados, São Paulo, v. 27, n. 77, 2013. KANDEL, E. R.; SCHWARTZ, J. H.; JESSELL, T. M. Fundamentos da neurociência e do comportamento. Rio de Janeiro: Guanabara Koogan, 2000. MYERS, D. Introdução à psicologia geral. 5. ed. Rio de Janeiro: LTC, 1998. ROONEY, A. A história da neurociência. São Paulo: M. Books, 2018.