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A2 Disciplina: Literatura Brasileira e Modernidade RIO DE JANEIRO 2021 Romance de 30 foi a denominação usada como referência a um conjunto de obras publicadas a partir de 1928 – ano da primeira edição de A bagaceira, de José Américo de Almeida. Deste grupo fazem parte Graciliano Ramos, Érico Veríssimo, José Lins do Rego, Raquel de Queiroz, Jorge Amado e outros que produziram obras de ficção cujo tema era a vida agrária. Os autores do período foram classificados como romancistas de 30 ou neo-regionalistas. Uma das características do romance de 30 é a verossimilhança; ou seja, o fato narrado é semelhante à realidade. A história narrada poderia ter acontecido no mundo real. A estrutura narrativa é linear; os fatos narrados aparecem em uma sequência cronológica, embora em algumas obras como São Bernardo e Fogo Morto a linearidade seja rompida. Do ponto de vista linguístico, narrador e personagens representam falam o português dos centros urbanos, mesmo quando – no caso dos personagens – utilizam expressões que remetam aos grupos rurais. Há pouco estranhamento por parte do leitor, uma vez que o narrador utiliza a variante de prestígio e apenas personagens secundários utilizam a linguagem de menor prestígio social. É nesse período que os autores registram melhor a diversidade da língua portuguesa no Brasil. No romance de 30, as personagens são integrantes de estruturas sociais perfeitamente identificáveis; assim, tais estruturas serão aceitas ou os personagens lutarão para transformá-las. No romance do século 19, era preciso interpretar o texto para reconhecer os padrões culturais e sociais abordados; no romance de 30, eles estão abordados explicitamente. No meio de tantos autores, destaca-se Graciliano Ramos, um dos maiores escritores da literatura de língua portuguesa. É marcado por uma visão socialista, fruto de experiências concretas da realidade social nordestina e profunda reflexão intelectual. Seus livros denunciam as injustiças sociais sem deixar de explorar também o drama psicológico de seus personagens. Graciliano Ramos é dono de um estilo marcado pela concisão e secura da linguagem. Suas frases são curtas e objetivas, sem adjetivação desnecessária e supérflua. Essa denúncia de mazelas sociais, ao lado de reflexões sobre angústias psicológicas, tornam suas obras universais, extrapolando os limites regionais e/ou culturais que atingem muitos escritores brasileiros. Ele também, assim como outros autores regionalistas, se propôs a fazer modificações em sua criação artística ajudando a reinventar as formas narrativas. Especificamente em Vidas Secas, Graciliano Ramos explora a migração de uma família que tenta fugir da seca nordestina. Nesse romance, a seca não é apenas o pretexto para a abordagem social; ela é o tema da obra. A seca é vista como um elemento que desestabiliza a vida da família de Fabiano. O autor utiliza da verossimilidade para prender e entreter o receptor fazendo com que ele viaje com a personagem, se envolvendo por completo. Isso fica evidente quando analisamos a persona de Fernando, personagem principal da obra. Fabiano é o retrato de um nordestino que sofre com a seca e é obrigado a partir para encontrar refúgio e sobreviver com sua família. Nesse texto a probabilidade do leitor acreditar que a história de Fabiano foi realmente vivida é grande, por causa das circunstâncias ocorridas, se tratando de uma personagem típica de um vaqueiro no sertão e seguindo fielmente essa linha. Aqui vale ressaltar que a estrutura cíclica da narrativa tem um forte aspecto simbólico. Graciliano Ramos está chamando a atenção do leitor para o drama dos retirantes nordestinos, que se repete ciclicamente, não apenas na questão da seca, mas das misérias e injustiças sociais que vão passando de geração para geração. O drama vivido por Fabiano já foi vivido por seu pai, seu avô e será repetido pelos seus filhos. A técnica narrativa mais importante dessa obra é o uso intenso do discurso indireto livre. Trata-se de uma forma de mostrar a fala ou pensamento das personagens inseridos diretamente no discurso do narrador. Se o leitor não estiver atento, pode não perceber que aquela fala é, na verdade, da personagem. Trata-se de uma técnica rara e difícil de ser empregada pelo autor e percebida pelo leitor. Na medida que em que sua obra trata dos problemas da modernidade como um todo, e não apenas da modernização brasileira, ele desenvolve alguns elementos caracterizadores da composição literária moderna. Por exemplo, a maneira que Graciliano trabalha a relação entre realidade e representação é uma pista para a caracterização do moderno em sua obra. “O modo de articulação entre literatura e realidade, ou, por outra, a maneira pela qual é posta em xeque aquela articulação. Uma espécie de desarticulação percebida no nível de construção do texto, como resultado das relações entre indivíduo e história. Desta maneira, o autor ou o texto moderno, é aquele de independente de uma estreita camisa de força cronológica, leva para o princípio de composição, e não apenas de expressão, um descompasso entre a realidade e sua representação, exigindo, assim, reformulações e ruptura dos modelos realistas. “(BARBOSA, 1990. P 120). Nesse sentido, Vidas Secas é uma obra moderna, pois a realidade social é articulada na linguagem, pelo conflito modernizador presente na linguagem de seus personagens, através da posição ocupada pelo seu narrador, no espaço e tempo de seu texto e na articulação interna desses elementos A mensagem que pode ser apreendida de Vidas secas, é a de que o traço definidor do processo existencialista, e da identidade humana, é a linguagem: o ser humano só existe porque desenvolveu a linguagem, e ela, como princípio de conhecimento, significa poder. Em tempos em que a literatura contemporânea passa por uma fase em que o auge popular, principalmente entre os mais jovens, são temas superficialmente fantásticos, resgatar a proposta simbólica, mítica e motivacional de Vidas secas é fundamental. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS: BARBOSA, J Alexandre. A leitura do intervalo. São Paulo: Illuminuras, 1990. BRUNACCI, M. I. Graciliano Ramos: um escritor personagem. Belo Horizonte: Autêntica, 2008. Biblioteca Virtual. DACANAL, J.H. Romance de 30. 3.ed. Porto Alegre: Novo Século, 2001. DIAS,.M.V Silvana .Literatura brasileira e Modernidade:Livro eletrônico, Rio de Janeiro, Universidade Veiga de Almeida-UVA, 2019 RAMOS, G. Vidas Secas. 13. ed. Rio de Janeiro: Record, 2007. SOARES, D Vinícius. A literatura sob uma perspectiva mítica e simbólica: A análise de Vidas Secas.
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