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Exames de Imagem no Trauma Glauber Cristo Letícia Reis 1 Sumário TRAUMA DE FACE ....................................................................................... 4 TRAUMAS CRANIANOS .................................................................................. 9 TRAUMA VERTEBROMEDULAR ........................................................................ 18 TRAUMA TORÁCICO .................................................................................... 26 TRAUMA ABDOMINAL .................................................................................. 36 TRAUMA DE PELVE ..................................................................................... 46 REFERÊNCIAS ........................................................................................... 47 2 EXAMES DE IMAGEM NO TRAUMA Os métodos fundamentais utilizados pela são: Radiografia: Ela usa os raios-X (RX), energia radiante/luminosa que é capaz de penetrar substâncias opacas à luz, como forma de obter imagens do corpo humano. A Radiografia é um exame barato, altamente disponível e rápido, de modo que é o mais utilizado no mundo todo. E apesar de existirem métodos radiológicos mais sensíveis e específicos, na maioria dos casos é o principal exame de imagem que auxilia na maioria dos diagnósticos. Termos usados: Radiopaco: estruturas esbranquiçadas na imagem, como ossos, calcificações, metais, componentes com contraste. Radiotransparente/Hiperlucente: estruturas que se encontram em tons de cinza escuro ou preto, a exemplo de gases, água e gordura. Hipotransparente: estruturas com cinza claro, como tecidos moles. Ultrassonografia (USG): A Ultrassonografia é o método radiológico que permite a avaliação dos tecidos do paciente através da energia sonora. Não requer uso de contraste, não é invasivo, tem baixo custo, pode ser feito em leito, etc. Termos usados: Egogenicidade: capacidade de diferentes estruturas em refletir as ondas de ultrassom, gerando eco. Anecoico: é a ausência completa de ecos (ou transmissão de som), ou seja, a estrutura é totalmente atravessada pelas ondas, não gerando eco, portanto, a imagem aparece negra. Aspecto comum em estruturas líquidas. Hiperecoica: quando a reflexão é intensa, logo, a imagem aparece branca e brilhante. Aspecto comum em gases e ossos. Hipoecoica: quando a reflexão é parcial/intermediária das ondas de ultrassom, de modo que a imagem aparece em vários tons de cinza. Aspecto comum em tecidos moles. Isoecoico: termo utilizado para estruturas que apresentam mesma ecogenicidade entre si quando comparadas. 3 Tomografia computadorizada (TC): A tomografia computadorizada (TC) se trata de um exame de imagem de rápida aquisição e que fornece imagens com grau elevado de detalhes quando compara à USG e RX, sendo por isso o exame mais solicitado nas emergências. Termos usados: Hipodenso/Hipoatenuante: a imagem apresenta-se escurecida no filme radiológico. Ex: ar, pulmão, etc. Isodenso/Isoatenuante: apresenta mesma atenuação do tecido vizinho comparado. Ex: nódulos hepáticos. Hiperdenso/Hiperatenuante: apresenta-se na imagem de forma mais clara, esbranquiçada. Ex: ossos. Ressonância magnética (RM): A Ressonância Magnética é uma técnica que produz imagens tomográficas por meio de campos magnéticos e ondas de rádio. Assim, são as diferentes densidades protônicas disponíveis nos tecidos que contribuem para que o sinal de RM consiga fazer a distinção entre um tecido e outro. Termos usados: Sinal Ausente: a estrutura não emite sinal devido á ausência (ou carência) de íons H+ Ex: cortical óssea Hipointenso: a estrutura de referência é mais escura que os tecidos circunvizinhos. Ex: liquor em T1. Isointenso: a estrutura de referência apresenta a mesma intensidade dos tecidos circunvizinhos. Hiperintenso: a estrutura de referência apresenta-se mais clara que os tecidos circunvizinhos. Ex: liquor em T2. 4 TRAUMA DE FACE O traumatismo na região da face pode afetar desde a pele, planos gordurosos, musculares, neurovasculares, ósseos e até estruturas encefálicas, dependendo da energia cinética envolvida no trauma. O exame clínico associado a estudos radiológicos possui importância ímpar no manejo desses pacientes. A avaliação por radiografia simples é feita essencialmente pelas incidências mento-naso (Waters) e fronto-naso (Caldwell), que muitas vezes já identificam traços de fratura e desalinhamentos. No entanto, a radiografia simples é limitada devido a intensa interposição óssea e de partes moles, causada pelo edema e hemorragia secundários ao trauma. Neste contexto, a tomografia computadorizada (TC) vem se tornando o método de imagem preconizado na avaliação do paciente com fratura de face, sendo importante não apenas no diagnóstico, mas na avaliação da sua extensão tridimensional da fratura, otimizando a terapêutica. A pesquisa radiológica deve avaliar: os ossos envolvidos, número de fragmentos, se há afundamento ou desalinhamento dos fragmentos ósseos, o grau de envolvimento de partes moles adjacentes, se há corpos estranhos e avaliar se há lesões encefálicas associadas. Essa avaliação permitirá responder duas coisas: 1) As fraturas envolvem estruturas que afetam o funcionamento fisiológico dos seios paranasais, boca, órbita e nariz? 2) As fraturas resultam em deformidades visíveis? Fratura Nasal: É a fratura mais comum, o osso nasal não necessita de grande cinética para que haja lesão. O exame clínico é o padrão-ouro para seu diagnóstico, onde se observa crepitação e dor à palpação, no entanto, a avaliação por imagem é importante para determinar a complexidade da fratura e sua extensão, bem como o grau de comprometimento de partes moles adjacentes. Os principais achados que devem ser descritos no relatório são: a presença de fratura dos ossos nasais, do processo frontal da maxila e do septo nasal, bem como se as fraturas são simples ou cominutivas e se há desalinhamentos e suas direções. 5 TC imagem axial. Fratura dos ossos nasais (setas brancas) e do aspecto anterior do septo nasal (seta vermelha), com encurvamento e desvio para a esquerda dos fragmentos. (B) TC imagem axial. Fratura do processo frontal dos maxilares, com leve desvio a para a direita à esquerda e desviado para a esquerda à direita (setas brancas). (C) TC imagem axial. Obliteração da porção anterior das cavidades nasais (asteriscos pretos). (D) TC em reformatação coronal em volume rendering 3D. Fratura nasal com acentuado desvio para a esquerda Vista frontal evidenciando edema nasal / Incidência de Waters evidenciando traço de fratura Traumas Mandibulares: A fratura mandibular é a segunda mais frequente no trauma de face, acometendo em ordem decrescente as seguintes estruturas: côndilo, ângulo, corpo, sínfise/parassínfise, ramo e processo coronóide. As fraturas mandibulares podem ser divididas em: (1) simples, fraturas lineares, sem comunicação com a cavidade oral ou pele; (2) compostas, 6 as que apresentam extensão para cavidade oral ou pele; (3) cominutivas, aquelas com múltiplos fragmentos e (4) complicadas, aquelas que comprometem estruturas vasculares e/ou nervosas. Fratura mandibular. (A) TC reformatação coronal. Fratura do processo condilar esquerdo (seta branca), com herniação superior do côndilo mandibular para a fossa craniana média (seta amarela). (B) TC axial. Fratura do corpo da mandíbula com desalinhamento e afastamento dos fragmentos Fratura Transfacial (Le Fort): Estas fraturas envolvem a separação da maxila e da base do crânio, invariavelmente envolvendo as placas pterigóides. Existem três tipos predominantes: Fort I (fratura maxilar transversa ou horizontal): linha de fratura no plano transmaxilar, acima dos ápices dos dentes e abaixo da junção zigomaticomaxilar. Resulta num aspecto de “palato flutuante. Figura1 - Le Fort I. (A) TC reformatação coronal. Fratura do processo pterigóide bilateral (setas brancas). (B) TC reformatação em volume rendering 3D sagital oblíquo. Fratura transmaxilar (seta branca). 7 Fort II (fratura piramidal): linha de fratura no plano subzigomático, a partir da ponte nasal, através do processo frontal da maxila, osso lacrimal e assoalho da órbita, estendendo-se inferiormente através da parede anterior do seio maxilar sob o zigoma. Resulta num aspecto de “maxila flutuante”. Fort II. (A) TC reformatação coronal. Fratura bilateral do processo pterigóide (setas brancas). (B) TC reformatação oblíqua em volume rendering 3D. Fratura do assoalho da órbita (setas brancas) Fort III (fratura transversal ou disjunção craniofacial): a linha de fratura percorre o processo nasofrontal, maxilofrontal, paredes orbitárias e arco zigomático. Resulta num aspecto de “face flutuante”. Le Fort III. (A) TC reformatação sagital oblíqua em volume rendering 3D. Fratura do teto da órbita (seta branca). (B) Fratura do arco zigomático (seta branca) e da parede lateral da órbita (seta amarela) Fraturas Orbitárias: As fraturas orbitárias podem ser isoladas ou extensão de outras fraturas faciais. A órbita é composta por sete ossos, que possuem a função de proteger os olhos e as estruturas anexas. A fratura do tipo blow-out é a mais típica da órbita, sendo decorrente de trauma fechado direito sobre o globo ocular, resultando em aumento da pressão intraocular, que se transmite para a porção mais frágil da órbita, o assoalho. Em alguns casos a parede medial também pode ser comprometida. Na fratura orbitária é importante avaliarmos nos métodos de imagem sinais de herniação dos 8 componentes orbitários, posicionamento do cristalino, que pode estar luxado ou subluxado, pesquisar corpos estranhos, se há hemorragias intra e extraoculares, bem como avaliar as veias oftálmicas e o nervo óptico. Fratura orbitária blow-out. (A) TC reformatação coronal. Fratura do assoalho orbitário com herniação da gordura intra e extraconal e do músculo reto inferior (seta branca). (B) TC reformatação coronal. Fratura da parede medial e parte do assoalho da órbita com herniação da gordura extraconal e músculo reto lateral (seta vermelha) 9 TRAUMAS CRANIANOS As lesões craniocerebrais são causas comuns de internação hospitalar após trauma, e estão associadas a uma significante morbidade e mortalidade a longo prazo, particularmente na população adolescente e de adultos jovens. A neuroimagem tem um papel essencial na identificação e caracterização de lesões cerebrais traumáticas. Além disso, a avaliação por imagem do traumatismo cranioencefálico (TCE), define conduta terapêutica clínica ou cirúrgica emergencial, posteriormente auxiliando na monitorização terapêutica e permitindo acesso a estimativa mais precisa do prognóstico do paciente. Durante a avaliação das imagens deve-se focar em características e estruturas principais, como: Densidades da Imagem Avaliamos as diferenças de densidade entre estruturas e tecidos para poder classifica-las de acordo com um referencial comparativo em hiperdensas, isodensas ou hipodensas. Diferenças de densidade entre as substâncias branca e cinzenta podem indicar anormalidades. Linha Média Desvios podem indicar lesão com efeito de massa no lado a partir do qual a linha média se desviou. Simetria O padrão dos sulcos, cisternas e ventrículos deve ser simétrico, mesmo que haja alguma diferença sútil, e a fissura inter-hemisférica anterior deve ser visualizada. O padrão de densidade também deve ser simétrico. Cisternas Basais As estruturas que devem, necessariamente, ser analisadas são as cisternas da placa quadrigeminal e supra- selar, pois são atravessadas por importantes estruturas neurais. A quadrigeminal parece um sorriso. A supra- selar, assemelha-se a Estrela de Davi. Qualquer assimetria dessas estruturas deve ser suspeita, pois indica falha na circulação liquórica com risco de alteração na pressão intracraniana. Ventrículos Assimetria pode indicar efeito de massa, dilatação pode indicar hidrocefalia e apagamento pode indicar hemorragia. Em alguns casos de elevação da Pressão IC ou de hidrocefalia pode haver apagamento do 4° ventrículo também. Ossos A avaliação dos ossos do crânio e, consequentemente, afundamentos ou fraturas 10 Fraturas cranianas: Fraturas lineares sem deslocamento da calvária são o tipo mais comum de fratura craniana. Sua detecção pode ser difícil na TC, especialmente quando o plano da fratura for paralelo ao plano do corte. Felizmente, fraturas cranianas lineares isoladas dispensam tratamento. O tratamento cirúrgico, geralmente, é indicado para fraturas compostas e com afundamento, sendo que a visualização de ambas é melhor na TC do que na radiografia convencional. Fraturas com afundamento, muitas vezes, estão associadas a contusão subjacente. Pode ser observado ar intracraniano (pneumocéfalo) nos casos de fraturas compostas ou fraturas envolvendo os seios paranasais. TC com cortes finos empregando um algoritmo de osso é o melhor método para avaliação de fraturas em áreas críticas, como base do crânio, órbitas ou ossos da face. Os cortes finos também podem ajudar na avaliação do grau de cominutividade e afundamento dos fragmentos ósseos. Fratura de osso temporal: A primeira suspeita de uma fratura do osso temporal pode ocorrer em TC craniana padrão, realizada para excluir lesão intracraniana. Achados como opacificação das células aéreas do processo mastoide, líquido na cavidade da orelha média, pneumocéfalo e, ocasionalmente, pneumolabirinto devem levantar suspeita sobre fratura no osso temporal. A melhor maneira de se avaliar a suspeita de uma fratura de osso temporal é por intermédio de TC em imagens no plano axial e coronal direto, com cortes finos (1 a 1,5mm), e empregando um algoritmo de osso. Fratura longitudinal de osso temporal Lesão no escalpo: Para interpretar a TC no caso de traumatismo craniano, é recomendável iniciara verificação pelo exame de estruturas extracranianas, na busca por evidências de lesão no escalpo ou corpos estranhos radiopacos. O edema de tecido mole do escalpo, muitas vezes, é a única evidência confiável do local de impacto. O hematoma subgaleal é a manifestação mais comum de lesão no escalpo e pode ser reconhecido na TC ou RM como tumefação focalizada nas partes moles do escalpo localizadas 11 abaixo do tecido fibroadiposo subcutâneo e acima do músculo temporal e da calvária. Na avaliação inicial de um paciente vítima de traumatismo cranioencefálico (TCE) existem questões fundamentais que devem ser rapidamente respondidas: se há lesão traumática intracraniana, qual sua natureza e qual seu tratamento, se clínico ou cirúrgico emergencial. A radiografia simples de crânio, a tomografia computadorizada (TC), a ressonância magnética (RM) e a angiografia digital são os principais métodos por imagem utilizados nestes pacientes. A radiografia simples de crânio não é capaz de excluir lesão intracraniana, tendo elevados índices falso-negativos. Inversamente, a presença de fratura craniana à radiografia simples não necessariamente indica presença de lesão intracraniana. Portanto, não é um método que deve ser utilizado para o rastreamento de lesão traumática intracraniana. A TC é o método por imagem mais adequado no atendimento inicial ao paciente vítima de TCE, pois, quando comparada à RM, é mais disponível, tem menor custo, e tem ótima sensibilidade na detecção das principais lesões traumáticas intracranianas agudas, permitindo rapidamente a identificação de lesões potencialmente fatais que necessitem de tratamento cirúrgico imediato . Os tomógrafos de multidetectores (TC “multislice”) são extremamente rápidos,ideais para pacientes agitados, com confusão mental, em intoxicação exógena e em crianças, situações frequentes nos pacientes com TCE. Além disso, a TC “multislice” permite avaliação multiplanar e tridimensional das estruturas ósseas cranianas, da base do crânio e da coluna cervical, bem como estudo das estruturas vasculares por angiotomografia (angio-TC) trazendo grande avanço no diagnóstico das lesões dos vasos cervicais e intracranianos, seja nos traumas fechados ou nos perfurantes. A RM mostra excelente definição das estruturas encefálicas, muito superiores em relação à TC, gerando imagens multiplanares, sendo um método mais sensível que a TC para a detecção de lesões intracranianas, especialmente aquelas não hemorrágicas, hemorrágicas de pequeno volume, ou de localização profunda ou infratentorial. No entanto, a RM tem alto custo, menor disponibilidade nos serviços de saúde, maior tempo de execução, entre outros fatores, o que dificulta seu uso. A angiotomografia também é utilizada e permite diagnosticar lesões vasculares crânio-cervicais potencialmente graves. As lesões cranianas traumáticas podem ser divididas em duas formas: primária e secundária. Lesões primárias são as que ocorrem como resultado direto de um golpe na cabeça. As secundárias ocorrem em consequência de uma lesão primária, geralmente por efeito expansivo ou comprometimento vascular. Muitas vezes, as lesões secundárias podem ser prevenidas, enquanto as primárias, por definição, já ocorreram quando o paciente chega à unidade de emergência. As lesões primárias incluem hemorragia epidural, subdural, subaracnoide e intraventricular; lesão axônica difusa (LAD), contusão cortical, 12 hematoma intracerebral e lesão subcortical da substância cinzenta. Danos diretos à vasculatura cerebral constituem outro tipo de lesão primária. As lesões secundárias incluem edema cerebral, herniação cerebral, hidrocefalia, isquemia ou infarto, extravasamento do LCR, cisto leptomeníngeo e encefalomalacia. Hematoma epidural (extradural): Na TC, o hematoma epidural aparece como uma coleção extra-axial bem definida, de alta atenuação, de formato lenticular ou biconvexo. Frequentemente, observa-se a associação a efeito expansivo, apagamento dos sulcos e desvio da linha média. A janela de osso, geralmente, mostra uma fratura craniana linear sobreposta. Como os hematomas epidurais se localizam no espaço potencial entre a dura-máter e a tábua interna do crânio, normalmente não atravessam as suturas cranianas, onde a camada periosteal da dura-máter encontrasse firmemente fixada. Próximo ao vértice, no entanto, o periósteo forma a parede externa do seio sagital, onde a aderência à fissura sagital é menos firme. Sendo assim, hematomas epidurais no vértice, os quais, em geral, são de origem venosa por ruptura do seio sagital, podem cruzar a linha média. Ocasionalmente, um hematoma epidural agudo mostrará aspecto heterogêneo, com áreas irregulares de atenuação mais baixa. Esse achado pode indicar extravasamento ativo de sangue fresco não coagulado para dentro da coleção, o que requer atenção cirúrgica imediata. Hematoma extradural 13 Hematoma extradural agudo hiperdenso à esquerda, de morfologia biconvexa, determinando compressão ventricular e desvio da linha mediana para a direita Hematoma Subdural: Localiza-se no espaço subdural, mais frequentemente no compartimento supratentorial (95%), em geral ao longo das convexidades corticais, da foice cerebral ou da tenda cerebelar, frequentemente causando acentuados desvios das estruturas encefálicas da linha mediana e herniações cerebrais. Está presente em mais de 30% dos TCEs graves. O hematoma subdural ocorre na vigência de forças de aceleração/desaceleração que causam laceração de veias corticais enquanto cursam pelo espaço subdural, antes de drenarem ao seio venoso dural adjacente. Estas veias são particularmente suscetíveis a este mecanismo de trauma uma vez que de um lado elas estão aderidas ao seio venoso dural ancorado na calota craniana e do outro, ao encéfalo que se movimenta durante a ação destas forças traumáticas, ocasionando estiramento, laceração ou ruptura das mesmas. O hematoma subdural agudo classicamente apresenta-se à TC como uma coleção hiperatenuante de morfologia semelhante a uma lente côncavo- convexa, com sua face côncava moldando-se à convexidade cortical, foice cerebral ou tenda cerebelar, podendo atravessar as linhas de suturas, mas não as inserções durais ou a foice cerebral. 14 RM: Delgado hematoma subdural à direita, exibindo hipersinal na sequência FLAIR (setas) Hematoma Subdural à esquerda com desvio de estruturas e linha média. Hemorragia subaracnóidea traumática: Caracteriza-se pelo extravasamento de sangue no espaço subaracnóide devido a laceração de artérias ou veias corticais que cursam por este espaço, ou por extensão de hemorragia proveniente de contusões corticais. Está presente na maioria dos casos de TCEs moderados ou graves e classicamente se localiza na cisterna interpeduncular ou silviana, mas podendo ocorrer em qualquer região do espaço subaracnóide. 15 Na TC é identificada como conteúdo hiperatenuante preenchendo as cisternas e os sulcos corticais. A quantidade da hemorragia subaracnóidea deve ser correlacionada com a severidade do TCE, e, havendo alguma desproporção, deve-se suspeitar de lesão vascular maior associada, neste caso sendo válido o prosseguimento na investigação diagnóstica através de angio-TC ou arteriografia digital. RM, principalmente através das sequências T2* gradiente eco e FLAIR também é um método bastante sensível à detecção de hemorragia subaracnóidea traumática, porém a TC é mais sensível. TC: Hemorragia subaracnóidea traumática aguda caracterizada por conteúdo hiperatenuante ocupando os sulcos corticais e as cisternas da base, mais notada- mente nas cisternas interpeduncular e perimesencefálica. Hemoventrículo volumoso observado no ventrículo lateral direito Lesão Axonal Difusa: É um dos tipos mais comuns de lesão neuronal primária em pacientes que sofreram TCE grave. Se caracteriza por comprometimento disseminado dos axônios, que ocorre no momento de uma lesão por aceleração ou desaceleração. As áreas do cérebro afetadas podem estar distantes do local do impacto não sendo necessário um golpe direto para causar esse tipo de lesão. É um tipo de lesão de difícil visualização nos exames de imagem e também nos espécimes histológicos, tendo sido subestimada por muito tempo devido à baixa sensibilidade dos exames de imagem de algumas décadas atrás. A LAD pode ser muito mais bem visualizada por meio de RM do que de TC, sendo que esse exame tem sofrido crescente importância na avaliação de déficits neurológicos após traumatismo e para prever resultados a longo prazo. O tipo de acidente mais comumente relacionado à LAD são os acidentes automobilísticos em alta velocidade. Os achados para LAD na TC podem ser sutis ou ausentes. O mais comum são as pequenas hemorragias petequiais na 16 junção entre substância branca e cinzenta dos hemisférios cerebrais ou no corpo caloso. Áreas mal definidas de atenuação reduzida em TC podem, ocasionalmente, ser observadas em lesões não hemorrágicas. Aspecto em TC de lesão axonal difusa. Focos pontilhados de alta atenuação na substância branca subcortical frontal esquerda e no esplênio esquerdo do corpo caloso. Traumatismo por arma de fogo e outros ferimentos penetrantes: Ferimento por arma de fogo (FAF) de trajeto unilobar, em geral, tem melhor prognóstico que aqueles de trajeto bi-hemisférico, transventricular ou cursando pela fossa posterior. A TC tem importante papel na avaliação inicial destes pacientes, caracterizando a localização e o trajeto do projétil, demonstrando a localização e a extensão do ferimento encefálico, o grau de hemorragia intracraniana e de fragmentação do projétil, presençade fraturas associadas, e, principalmente, mostrando se há lesões cirurgicamente tratáveis tais como hematomas intracranianos ou herniação cerebral. A alta densidade metálica do projétil ou de seus fragmentos gera intensos artefatos que prejudicam a avaliação do parênquima encefálico adjacente, neste aspecto sendo uma limitação da TC. A TC também é bastante útil na avaliação de outros ferimentos penetrantes tais como por arma branca ou outros objetos perfurantes. Qualquer ferimento penetrante tem potencial para causar lesão vascular tais como laceração, dissecção, pseudoaneurisma, fístula arteriovenosa e trombose venosa, neste caso sendo válido considerar a necessidade de avaliação por angiografia digital que é método padrão-ouro, ou mais recentemente como alternativa não invasiva, por angio-TC que além do estudo vascular, permite avaliação multiplanar e 3D do crânio, contribuindo no planejamento cirúrgico 17 dos ferimentos penetrantes. A angio-RM em geral é contraindicada devido à presença de corpo estranho metálico. TC: (A) Reconstrução sagital de ferimento penetrante por chave de fenda de curso intraorbitário, paraclinóide e em fossa posterior, em estreita proximidade com o canal carotídeo. (B) arteriografia digital excluindo lesão vascular Ferimento por projétil de arma de fogo 18 TRAUMA VERTEBROMEDULAR O trauma na coluna vertebral e na medula espinhal vem aumentando nos últimos anos em decorrência do aumento nos acidentes de trânsito. Existem três localizações mais frequentes de trauma na coluna vertebral: C1-C2, C5-C7 e T12-L2. Em crianças menores que 12 anos, existe uma maior incidência de lesões em C1, C2 e na articulação atlanto-axial. O papel dos métodos por imagem no trauma raquimedular é diagnosticar a fratura e/ou deslocamento e definir se é instável ou não. Tabela de Classificação fisiopatológica do trauma de coluna cervical: Radiografia Simples: A radiografia simples ou Raio-X (RX) é considerada a técnica de escolha para a avaliação inicial do trauma raquimedular. Deve ser realizada levando-se em consideração os sinais clínicos do paciente. Se houver 19 lesão de múltiplos órgãos ou déficit neurológico associados, as incidências realizadas são ântero-posterior (AP) e perfil que devem ser complementadas por uma tomografia computadorizada ou ressonância magnética. Se não houver sinais localizatórios, podem ser necessárias ainda outras incidências, como as oblíquas, para melhor identificar uma possível fratura/deslocamento. A incidência em perfil deve, necessariamente, incluir todas as sete vértebras cervicais. As vértebras cervicais baixas podem não ser visibilizadas devido a sobreposição dos ombros. Isto pode ser atenuado puxando-se os braços para baixo. Se mesmo assim as vértebras não forem visibilizadas, pode se realizar a incidência do nadador, na qual um dos braços é estendido sobre a cabeça e o outro permanece ao lado do corpo. Nesta posição, o corpo fica em uma projeção oblíqua, permitindo a visibilização da transição cérvico-torácica. Na falha de visibilização com esta incidência, uma tomografia computadorizada é indicada. As incidências AP da coluna cervical e AP com a boca aberta da região atlanto-axial (ou transoral) também devem ser obtidas. Na ausência de alterações nestas incidências, deve-se decidir se são necessárias às incidências oblíquas ou incidências dinâmicas (em flexão e extensão). As incidências dinâmicas devem ser sempre realizadas sob a supervisão de um médico para evitar uma lesão ou aumento da extensão de uma lesão neurológica. Pontos importantes durante a avaliação radiológica da coluna cervical: 1- Avaliar a adequação e alinhamento a. Identificar a presença de todas as sete vértebras cervicais e a borda superior de T1. b. Identificar: i. Linha anterior dos corpos vertebrais ii. Linha anterior do canal medular iii. Linha posterior do canal medular iv. Processos espinhosos 2- Avaliar os ossos a. Examinar todas as vértebras para verificar a preservação da altura e a integridade do periósteo. b. Examinar as facetas. c. Examinar os processos espinhosos. 3- Avaliar as cartilagens, incluindo o exame dos espaços dos discos intervertebrais para a identificação de estreitamento ou de alargamento 4- Avaliar o processo odontoide a. Examinar o alinhamento do processo odontoide. b. Examinar o espaço anterior do processo odontoide (3 mm). c. Examinar o clivus; ele deve apontar para o processo odontoide. 5- Avaliar as partes moles extra-axiais. a. Examinar o espaço extra-axial e as partes moles: 20 • 7mm em C3 • 3mm em C7 b. Examinar a distância entre os processos espinhosos 21 Esquema da posição do nadador e Radiografia obtida nessa posição para melhor visualização da transição cérvico-torácica (C7-T1) 22 Os sinais radiográficos associados à lesão da coluna cervical são: • Aumento de partes moles retrofaríngea: maior que 10 mm, na altura de C3 e C4; • Desalinhamento: melhor incidência em perfil, onde 4 linhas convexas são formadas. A quebra da continuidade destas linhas, especialmente das 3 primeiras indica desalinhamento. É normal, no entanto, observar uma leve anterolistese de C3 sobre C4 em crianças (fisiológico). O alinhamento no plano frontal também deve ser observado, especialmente as paredes laterais e os processos espinhosos; • Diminuição da altura do espaço discal: devido a um trauma no disco intervertebral; • Aumento da distância entre os processos espinhosos; • Variações na altura dos corpos vertebrais: associados geralmente a fraturas em cunha. Aumento de partes moles retrofaríngea. Radiografia em perfil da coluna cervical mostra aumento de partes moles retrofaríngea, na altura de C3 e C4 (16 mm, para um normal de até 10 mm). Presença de fratura completa do corpo vertebral de C5 (cabeça de seta) 23 Ressonância Magnética: A ressonância magnética (RM) é indicada em pacientes com déficit neurológico parcial ou progressivo após o trauma, assim como em pacientes com instabilidade mecânica secundária a lesão ligamentar ou do disco intervertebral. Sua principal função é detectar compressão da medula espinhal por osso, disco ou hematoma para decidir se será necessária uma cirurgia descompressiva. Demonstra a herniação discal aguda pós- traumática, alterações na medula espinhal e lesões ligamentares. A ressonância magnética (RM) é indicada em pacientes com déficit neurológico parcial ou progressivo após o trauma, assim como em pacientes com instabilidade mecânica secundária a lesão ligamentar ou do disco intervertebral. Sua principal função é detectar compressão da medula espinhal por osso, disco ou hematoma para decidir se será necessária uma cirurgia descompressiva. Demonstra a herniação discal aguda pós-traumática, alterações na medula espinhal e lesões ligamentares O paciente politraumatizado grave pode ser impedido de realizar a RM, devido às suas condições clínicas e a impossibilidade de alocação dos sistemas de suporte a vida no ambiente de RM. A indicação ideal para RM é o paciente com déficit neurológico, sem alterações no RX ou TC e que não necessite de suporte à vida. Fraturas específicas: Fratura de Jefferson: Caracterizada pelas fraturas bilaterais dos arcos anterior e posterior do atlas (C1) e produzida por um mecanismo de trauma que envolva força de compressão axial do crânio em direção aos côndilos occipitais e coluna, ocorrendo principalmente em acidentes automobilísticos. É considerada estável quando o ligamento transverso não se rompe e existe afastamento lateral menor de 7 mm entre as massas laterais. A fratura instável ocorre quando existe lesão do ligamento transverso e afastamento maior que 7 mm. Clinicamente, o paciente apresenta dor no pescoço e cefaleia occipital unilateral. Imagens axiais de TC do atlasdemonstram as fraturas completas dos arcos anterior e posterior de C1 (setas) 24 Fratura do Processo Odontoide: Ocasionada principalmente por lesões em hiperflexão do pescoço. A classificação mais aceita leva em conta a estabilidade da fratura. Tipo I: fratura na extremidade cranial do odontóide – cerca de 4% das fraturas do odontóide estável Tipo II: fratura na base do odontóide – cerca de 66% das fraturas do odontóide - geralmente instável com alta de taxa de pseudoartrose (até 50%). Tipo III: fratura na base do odontóide, estendendo-se até o corpo de C2 – cerca de 30% das fraturas – geralmente instável. Na sequência, fraturas de odontoide dos tipos I, II e III Fratura em lágrima: Fratura extremamente grave e Instável causada por um mecanismo em hiperflexão do pescoço. Caracteriza-se pela fratura dos elementos posteriores com deslocamento posterior do corpo vertebral e consequente laceração da medula espinhal. Também ocorre lesão do ligamento longitudinal anterior com avulsão óssea do corpo vertebral, formando um fragmento triangular, em forma de lágrima, deslocado anteriormente e inferiormente. 25 Reformatação sagital de TC da coluna cervical – fratura da porção anterior C 5, com fragmento triangular (cabeça de seta) e deslocamento posterior deste corpo vertebral 26 TRAUMA TORÁCICO A avaliação inicial do trauma torácico é realizada pela radiografia de tórax em razão da sua rápida disponibilidade, inclusive na sala de emergência. Entretanto, a radiografia apresenta limitações no diagnóstico de diversas lesões traumáticas, especialmente as vasculares. Para esses casos, é mais utilizado a TC com contraste endovenoso. Como analisar uma radiografia no trauma? É importante obter a história AMPLA: A: Alergias M: Medicações em uso P: Passado médico L: Líquidos ou alimentos ingeridos antes do trauma A: Ambiente do trauma Avaliação inicial da radiografia de tórax (ABCDE na radiografia): Inicia- se o estudo pelas partes moles e adentra-se o tórax. Seguem-se o plano ósseo, as cúpulas diafragmáticas e os espaços pleurais, o parênquima pulmonar e sua vascularização, os hilos pulmonares, a traqueia e os brônquios-fonte, o coração, a aorta e o restante do mediastino. A - Avaliar a perviedade da via aérea - Avaliar traqueia: centralizada ou desviada? B - Avaliar campos pulmonares - Avaliar se os pulmões estão bem perfundidos - Avaliar se há boa penetração na radiografia - Avaliar o parênquima pulmonar 27 C - Analisar o coração (se há aumento da área cardíaca) - Investigar se há alargamento do mediastino D - Avaliar diafragma( se há alteração na curva do diafragma) - Avaliar seios costofrênicos - Avaliar seios cardiofrênicos E - Avaliar esqueleto - Avaliar arcos costais - Avaliar clavículas e escápulas F - Investigar se há a presença de enfisema subcutâneo G - Ganho de dreno, cateter e etc Trauma torácico fechado: Em casos de trauma torácico fechado, podem ocorrer lacerações na árvore traqueobrônquica, parênquima pulmonar e nos vasoso e o impacto direto, além de causar lesões na região do trauma, pode ocasionar lesões de contragolpe (contralaterais), sobretudo nos pulmões (contusões pulmonares). Trauma torácico penetrante: O trauma torácico penetrante acontece principalmente nos ferimentos por arma branca ou arma de fogo e nos acidentes de trabalho. Em relação às lesões causadas por arma de fogo, além do trauma causado diretamente pelo projétil, há uma onda de choque que o acompanha, 28 cuja intensidade varia de acordo com o calibre e a velocidade do projétil, e gera um dano maior aos tecidos. Nestes casos, é importante reconhecer o ferimento de entrada e de saída (quando houver) para estabelecer o trajeto do ferimento perfurante e avaliar suas possíveis lesões, sobretudo no mediastino. Achados possíveis: Fratura de Costelas, Tórax Instável (Retalho Costal Móvel) e Contusão Pulmonar: As fraturas de costelas são comuns e na grande maioria dos casos não apresentam complicações e não necessitam de tratamento específico. No entanto, podem ocorrer deslocamentos dos fragmentos ósseos para o interior da cavidade torácica, causando hemopneumotórax, contusão e laceração pulmonar. O tórax instável (retalho costal móvel) ocorre quando um segmento da parede torácica não tem mais continuidade óssea com a caixa torácica e geralmente é consequente a um trauma que provoca múltiplas fraturas de arcos costais, ou seja, duas ou mais fraturas em dois ou mais lugares. 29 Pneumotórax: O pneumotórax é um achado frequente no trauma torácico, e tem como causas: lesões penetrantes, fraturas de costelas, lesões pulmonares e traqueobrônquicas. De maneira geral, pode ser classificado em: ser classificado em aberto, fechado, traumático, espontâneo e iatrogênico. O diagnóstico do pneumotórax depende do reconhecimento de duas características: (1) uma linha separando com ar a borda do pulmão da parede torácica, mediastino ou diafragma; (2) ausência de sombras vasculares fora desta linha. Se for um pneumotórax sutil, observa-se apenas uma pequena linha que determina o limite da pleura visceral, sem a presença de vasos, demonstrando o colabamento pulmonar. Pode drenar sem exame de imagem. 30 Pneumotórax - Note o pulmão colabado, dando espaço a preenchimento por ar na cavidade externa Pneumotórax hipertensivo: Em geral, é uma evolução do pneumotórax simples. Observa-se o colabamento pulmonar. Trata-se de uma urgência médica, que descompensa rápido, comprime coração e as estruturas mediastinais. Não pedir raio X para pneumotórax hipertensivo, diagnóstico é clinico. Pneumotórax Hipertensivo - Note como há deslocamento das estruturas do mediastino devido o quadro hipertensivo à direita 31 Pneumomediastino e Pneumopericardio: Presença de ar na parte central do tórax. Acontece geralmente por condições traumáticas ou por barotrauma. O pneumopericárdio e o pneumomediastino possuem diferenças entre si. O pneumopericárdio é mais bem delimitado e contínuo, enquanto o pneumomediastino é mais descontínuo. Derrame Pleural: Definimos derrame pleural como o acúmulo anormal de líquido na cavidade pleural. A pleura que recobre os pulmões e as cissuras interlobares é chamada de visceral e nos demais trajetos é chamada de parietal. Comumente, independente do cenário do trauma, iniciamos o estudo do derrame pleural através da radiografia de tórax (sempre que possível em ortostase, em PA). Nem todos os derrames pleurais irão aparecer no estudo radiográfico em PA ou AP. Por quê? Um dos motivos é por causa do tamanho. Derrames livres menores que 170 ml de volume dificilmente vão obliterar o seio costofrênico lateral. Este pode se mostrar na TC. Por quê? O paciente está deitado, então no inicio não teremos obliteração do seio costofrênico lateral, pois o derrame poderá se espalhar posteriormente, ou seja, para o seio costofrênico posterior. Hemotórax: Tipo clássico de derrame pleural relacionado ao cenário de trauma. A causa mais comum de hemotórax (<1.500 mL de sangue) é a laceração pulmonar ou a ruptura de um vaso intercostal ou da artéria mamária interna devido tanto a trauma penetrante quanto a trauma fechado. As fraturas da coluna torácica também podem levar ao hemotórax. Geralmente esse sangramento é autolimitado e não necessita de tratamento cirúrgico. A visualização do sinal de parábola é clássico do derrame pleural. É comum haver perda da visualização das cúpulas diafragmáticas, seios costofrênicos ou bolha gástrica na área afetada. 32 Setas brancas: cúpulas diafragmáticas; Setas vermelhas: Seios costofrênicos; Círculo: Bolha Gástrica. Na imagem ao lado, com derrame, não há mais visualização deles devido preenchimento porlíquido Volumoso derrame pleural, que desloca as estruturas contralateralmente ao lado 33 TC de tórax com janela mediastinal -Note que, apesar da lesão ser homogênea na maior parte da sua extensão, há devidamente marcado, uma área de hiperatenuação. Isso corresponde a sangue. Tratava-se de um hemotórax. Contusão cardíaca: O trauma cardíaco contuso pode resultar em contusão do músculo cardíaco, ruptura das câmaras cardíacas, dissecção e/ou trombose das artérias coronárias ou laceração valvular. A ruptura da câmara cardíaca manifesta-se tipicamente por tamponamento cardíaco e deve ser reconhecida durante a avaliação primária. No caso de uma ruptura atrial, entretanto, os sinais e sintomas de tamponamento podem surgir lentamente. A utilização precoce do F AST pode facilitar o diagnóstico. Ruptura traumática de aorta: A ruptura traumática de aorta é causa comum de morte súbita após colisões de veículos automotores ou de quedas de grande altura. Se o doente sobrevive ao evento inicial, a recuperação costuma ser possível desde que a ruptura aórtica seja identificada e tratada precocemente. Alguns sinais radiológicos, que podem ou não estar presentes, indicam maior probabilidade de lesão nos grandes vasos do tórax. São eles: • Alargamento do mediastino • Obliteração do cajado aórtico • Desvio da traqueia para a direita • Rebaixamento do brônquio-fonte principal esquerdo • Elevação do brônquio-fonte direito 34 • Obliteração do espaço entre a artéria pulmonar e a aorta (apagamento da janela da artéria pulmonar) • Desvio do esôfago (sonda nasogástrica) para a direita • Alargamento da faixa paratraqueal • Alargamento das interfaces paraespinhais • Presença de derrame extrapleural apical • Hemotórax à esquerda • Fratura do primeiro e segundo arcos costais ou da escápula Cada um desses sinais radiológicos pode resultar em informações falso- positivas e falso-negativas. Raramente (1 a 13%) não se encontram achados anormais nas radiografias simples de tórax, mesmo na presença de lesões de grandes vasos. Caso haja a menor suspeita de trauma aórtico, o doente deve ser avaliado em um ambiente onde existam condições de confirmar o diagnóstico e tomar as medidas terapêuticas cabíveis. A tomografia computadorizada helicoidal do tórax tem se mostrado um método acurado para triagem de doentes com suspeita de lesão de aorta torácica. A tomografia computadorizada helicoidal do tórax deve ser utilizada corriqueiramente porque os achados da radiografia de tórax, especialmente em posição ortostática, não são confiáveis. Quando os resultados são equivocados, deve ser realizada a aortografia. 35 Ruptura traumática de diafragma: A ruptura traumática do diafragma é mais comumente diagnosticada do lado esquerdo, talvez porque o fígado oblitere o defeito ou proteja o lado direito do diafragma enquanto o intestino, o estômago e a sonda nasogástrica sejam mais facilmente detectados no lado esquerdo do tórax. A visualização de elevação do diafragma direito na radiografia de tórax pode ser o único achado da lesão diafragmática desse lado. Se houver suspeita de ruptura do hemidiafragma esquerdo, deve-se passar uma sonda gástrica. Quando a sonda gástrica aparecer na cavidade torácica na radiografia de tórax, torna-se supérfluo o estudo contrastado. Ocasionalmente, o diagnóstico não é feito mediante estudo radiográfico inicial ou TC. Se o diagnóstico não estiver claro, deve-se realizar um estudo contrastado do trato gastrointestinal. 36 TRAUMA ABDOMINAL O trauma abdominal é um dos tipos de traumas mais comuns, sendo dividido em trauma penetrante, que normalmente acomete cólon, fígado e intestino delgado. E o trauma fechado que acomete mais baço, fígado e intestino. Com isso, quando se vai atender um paciente vítima de trauma penetrante, é importante obter informações sobre o tempo da lesão, tipo de arma, distância entre o agressor e a vítima e o volume de sangue perdido pela vítima no local da cena da agressão. Radiografia: A radiografia simples de abdome, embora com menos sensibilidade e especificidade do que os métodos multiplanares, é capaz de fornecer bastantes dados úteis à avaliação médica complementar de um paciente. Trata-se de um estudo de baixo custo e elevada disponibilidade nos serviços de saúde, e que não apresenta contraindicações absolutas, apenas relativas e restritas às gestantes. É indicada em casos de: ▪ Distensão abdominal, obstrução intestinal e íleo para- lítico: para avaliação e acompanhamento. ▪ Perfuração intestinal. ▪ Pneumoperitônio. ▪ Posicionamento de dispositivos médicos (como sondas e cateteres). ▪ Pós-operatório: para acompanhamento da abordagem e avaliação de corpos estranhos cirúrgicos. ▪ Corpos estranhos: para diagnóstico e localização. ▪ Cálculo do trato urinário: para avaliação diagnóstica, localização e acompanhamento. Avaliação Ultrassonográfica Diferenciada para o Trauma: O FAST é um dos exames de diagnósticos mais rápidos e utilizados para identificação de hemorragias, tendo uma grande acurácia na detecção de líquido intra-abdominal, quando comparado a Lavagem Peritoneal Diagnóstica (LPD). Logo, ele é um meio rápido, não invasivo, e barato para diagnosticar hemoperitônio. As imagens podem ser obtidas do saco pericárdio (1) espaço 37 hepatorenal (2) espaço esplenorenal (3) e pelve ou fundo do saco do Douglas (4), podendo ser repetido 30 min após o primeiro exame. No intuito de avaliar e monitorar o paciente, foi desenvolvida uma extensão do protocolo FAST, denominada FAST-Estendido ou EFAST, a qual amplia a avaliação do paciente antes reservada à parede abdominal e cardíaca para a cavidade torácica, possibilitando a detecção de pneumotórax, hemotórax e ruptura diafragmática. Ele é indicado em caso de trauma cardíaco penetrante ou fechado e também em casos de trauma abdominal fechado, trauma torácico e hipotensão de causa não definida. Uma particularidade do FAST é sua aplicabilidade em locais com restrição de métodos complementares, como nas catástrofes naturais (terremotos), conflitos de guerra, estações espaciais, em que a obtenção de dados adicionais pode ser decisiva, e não se dispõe de outros métodos complementares. À esquerda: Pontos de Foco do FAST, à direita: Pontos de foco do EFAST 38 Método de uso do FAST segundo o ATLS: 1- Iniciar pela janela pericárdica para garantir que o ganho esteja definido corretamente -o fluido (líquido) dentro do coração deve estar preto. O coração pode ser visualizado utilizando-se a janela paraesternal ou a subxifoide. 2- A visualização do quadrante superior direito é feita com um corte sagital na linha axilar média, aproximadamente na altura do 10° ou 11° espaço intercostal. As estruturas a serem visualizadas são o diafragma, o fígado e o rim. O espaço hepatorrenal deve ser visualizado como um todo. 3- A visualização do quadrante superior esquerdo é feita com um corte sagital na linha axilar média, aproximadamente na altura do 8° ou go espaço intercostal. As estruturas a serem visualizadas incluem o diafragma, o baço e o rim. O espaço esplenorrenal deve ser visualizado como um todo. Os artefatos produzidos por ar do estômago e do cólon, 39 e uma janela acústica menor, fazem com que essa visualização seja a mais difícil de ser realizada; pode ser necessário mover o transdutor posteriormente. 4- A visualização suprapúbica é feita com um corte uma transversal, obtido melhor antes da colocação da sonda vesical de demora Artefatos podem surgir em consequência de realces posteriores; caso as imagens de líquido desapareçam com o movimento lateral do transdutor para ambos os lados, ela deve ser interpretada como artefato. É importante lembrar que um FAST negativo não exclui lesão intra- abdominal. Porém, torna menos provável que a fonte de hemorragiaque produz alterações hemodinâmicas seja o abdome. A visualização pélvica é realizada melhor antes da inserção da sonda vesical de demora, pois, a bexiga distendida ajuda a visualização de líquido livre na pelve. Assim como para a LPD, a indicação absoluta de laparotomia é uma contraindicação para o FAST. 40 Tomografia Computadorizada: A tomografia computadorizada possui a vantagem de poder avaliar as lesões de órgãos parenquimatosos, tanto intra quanto retroperitoniais, bem como a presença e quantificação de líquido livre na cavidade abdominal, de lesões ósseas e de partes moles, porém envolve a remoção do paciente até o departamento de radiologia, uso de contraste iodado, custo mais elevado, necessidade de estabilidade hemodinâmica e cooperação do paciente para o adequado posicionamento durante a realização do exame, apresentando dificuldade relativa em detectar lesões do trato gastrintestinal. A sensibilidade e especificidade descritas na literatura, para tomografia computadorizada, situam-se acima dos 97%. Contraste: O uso do contraste endovenoso é obrigatório nos casos de trauma, exceto se houver contraindicações, como alergia ou insuficiência renal e, para tanto, infundem-se, inicialmente, 50ml de contraste. iodado a 60% com velocidade de infusão de 2-3ml/s e o restante a 1ml/s. Em crianças, a dose utilizada de contraste é de 2ml/kg de peso. O contraste oral iodado 1 a 2%, num volume de 500 ml, deve ser iniciado 30 minutos antes do exame e 250ml imediatamente do início do exame, preferencialmente gelado. Quando em função da gravidade clínica do paciente não se puder administrar previamente o contraste, deve-se oferecer 120 a 180 ml imediatamente antes de se iniciar o exame para contrastação do estômago e duodeno. O contraste iodado, numa concentração de 2 a 3 %, por via retal, é infundido imediatamente antes do início do exame, num volume de 150 ml, no intuito de melhor delineamento do intestino grosso. Possíveis achados em imagens: Hemoperitônio: Em função dos recessos anatômicos e da ação da gravidade, o líquido livre intraperitoneal acumula-se, preferencialmente, na pelve, no espaço de Morison (espaço compreendido entre o fígado e o rim direito, que se comunica, cranialmente, com o espaço periepático e, caudalmente, com a goteira parietocólica direita), topografia periepática e periesplênica e ao longo das goteiras parietocólicas, mais à direita. Assim, é obrigatório que os cortes tomográficos alcancem a pelve nos casos de trauma, e que o espaço de Morison seja atentamente avaliado, pois, em 97% dos casos de laceração hepática ou esplênica, ocorrerá acúmulo de líquido nesta região. O tipo de líquido coletado poderá ser composto, isoladamente, por sangue, bile, urina, conteúdo da alça intestinal lesada, líquido de lavado peritonial ou, ainda, associação dos mesmos. O ultrassom claramente demonstra o acúmulo de líquido com uma coleção anecóica, localizada, preferencialmente, nos recessos peritoniais supracitados. Entre os sinais tomográficos estão: sinal do coágulo sentinela e o efeito hematócrito. O primeiro refere-se à presença de uma área mais densa em um local específico intra-abdominal, podendo corresponder ao sítio de hemorragia inicial. 41 A tomografia também pode ser útil no seguimento da resolução das lesões decorrentes do trauma hepático. Deve ser ressaltado que, durante a resolução do hematoma, a área lesada pode parecer mais hipodensa, com maiores dimensões em função de efeito osmótico e de limites mais regulares. Trauma Esplênico: No exame de ultrassom realizado na sala de urgência, o sangue apresenta-se hiper ou hipoecóico, identificando-se o parênquima esplênico com ecotextura heterogênea. É possível que o sangue se apresente isoecogênico em relação ao parênquima adjacente, dificultando o diagnóstico, dando a impressão de uma esplenomegalia. 42 Trauma Renal: A avaliação pelo ultrassom é menos vantajosa que pela tomografia devido à localização retroperitonial do órgão, limitando a visibilização dos achados. Os hematomas podem apresentar-se com textura hipo, hiperecóica ou heterogênea, sendo que as coleções perirrenais também devem ser pesquisadas. Na tomografia computadorizada, a contusão é visibilizada como uma área focal e irregular do parênquima, sem realce na fase contrastada, associada a aumento localizado ou difuso do rim, enquanto, nas fases tardias, podem existir imagens focais hiperdensas dentro do parênquima, representando urina extravasada com contraste concentrado. Já a laceração aparece como área linear, irregular, hipodensa dentro do parênquima renal, havendo extravasamento de urina na presença de comprometimento do sistema coletor. O hematoma subcapsular apresenta aspecto lentiforme, hipodenso, comprimindo o parênquima subjacente. As imagens de falha de enchimento dentro do sistema coletor podem representar coágulos. O comprometimento dos vasos renais, seja por ruptura ou por trombose. Algumas literaturas classificam o trauma renal em 4 tipos de acordo com os achados de imagem. São: Grau 1 Discreta contusão renal, laceração superficial, pequenos hematomas subcapsulares ou perinefrético Grau 2 Laceração mais profunda, estendendo- se para o sistema coletor com extravasamento limitado de urina extra-renal ou hematoma perinefrético, de moderada a grande dimensão 43 Grau 3 Fragmentação renal, comprometimento da vasculatura, grande extravasamento de urina e grande hematoma rapidamente progressivo. Grau 4 Avulsão ou ruptura da pelve renal ou ureter com o rim intacto. Captação assimétrica de contraste renal, mostrada pela tomografia computadorizada, com hipodensidade, estendendo-se até a pelve renal. Lesão renal grau II 44 Laceração renal extensa (setas), com hematoma perirrenal, visualizada através da tomografia computadorizada. Extensa coleção perirrenal, não sendo visualizado o rim esquerdo. Trauma Pancreático: É raro como lesão isolada, sendo, geralmente, diagnosticado na laparotomia ou em exames de controle. A taxa de falsos negativos é elevada. Os achados tomográficos compreendem laceração, edema focal ou difuso, hemorragia intra ou peripancreática, líquido retroperitonial, espessamento da fáscia renal, edema peripancreático e edema envolvendo o mesocólon transverso. O trauma é classificado por tomografia nos seguintes graus: Grau 1 Contusão, laceração com ducto intacto. Grau 2 Laceração severa ou transecção do corpo e cauda com provável lesão do ducto pancreático. Grau 3 transecção, hematoma, lesão da cabeça pancreática e do ducto. Grau 4 Grau 3 associado a ruptura duodenal. Trauma de Víscera Oca: Comparativamente às lesões de outros órgãos, nos traumas abdominais fechados, as lesões das vísceras ocas apresentam uma menor incidência relativa, sendo mais frequentes no intestino delgado, seguindo-se no intestino grosso e estômago. A radiologia convencional mostra 45 pneumo ou retropneumoperitônio, líquido abdominal, escoliose ou apagamento do contorno do músculo psoas, presentes em menos de 50% dos casos. Retropneumoperitônio pós trauma, visto em radiografia simples do abdome. Observe as linhas hipertransparentes, delineando as estruturas retroperitoniais (setas) Retropneumoperitônio evidenciado pela tomografia computadorizada (setas), delineando região pararrenal anterior. 46 TRAUMA DE PELVE Os quatro padrões de força que causam fraturas pélvicas incluem: (1) compressão anteroposterior, (2) compressão lateral, (3) cisalhamento vertical e (4) padrões complexos (combinação). Uma lesão traumática por compressão anteroposterior pode ser causada por colisões de motocicletas, atropelamentos, esmagamento direto da pelve ou queda de alturas superiores a 3,6 metros. Achados: 47REFERÊNCIAS AMERICAN COLLEGE OF SURGEONS. ATLS: Advanced trauma life support. 10. ed. Chicago, 2018. ROCHA, N.; ANDRADE, J; JAYANTHI, S. Imagem no trauma de face. Revista de Medicina, v. 90, n. 4, p. 169-173, 2011. GATTÁS, G. Imagem no traumatismo craniano. Revista de Medicina, v. 90, n. 4, p. 157-168, 2011. RODRIGUES, M. Diagnóstico por imagem no trauma raquimedular-princípios gerais. Revista de Medicina, v. 90, n. 4, p. 174-184, 2011. FLATO, U. et al. Utilização do FAST-Estendido (EFAST-Extended Focused Assessment with Sonography for Trauma) em terapia intensiva. Revista Brasileira de Terapia Intensiva, v. 22, n. 3, p. 291-299, 2010.
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