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Tétano Epidemiologia O tétano tem distribuição mundial, com predomínio em países onde a cobertura vacinal é deficitária – é uma doença imunoprevinível. Ademais, 1 milhão de casos-ano são detectados no mundo, havendo maior prevalência nos países com a característica citada inicialmente. Acrescenta-se, ainda, a maior frequência nas estações da primavera e do verão, devido à maior exposição das pessoas ao ambiente. Torna-se oportuno mencionar, que o grupo etário de mais de 60 anos são frequentemente acometidos. Tal fato possui relação com a negligência na atualização da carteira vacinal a cada 10 anos. No que se refere ao tétano neonatal, há uma concentração dos casos no Sudeste da Ásia – tanto pela ausência de imunizações, quanto pelas práticas inadequadas durante o corte e higiene do cordão umbilical. Etiologia O Clostridium tetani é um bacilo gram- positivo, extracelular, anaeróbio obrigatório, formador de esporos e toxinas. Durante o seu desenvolvimento, ele é móvel e possui flagelos. Em contrapartida, quando maduro, ele perde o flagelo e forma um esporo terminal esférico. Logo, os esporos de C. tetani germinam, e as bactérias se proliferam quando a tensão de oxigênio no tecido é baixa. A partir desse crescimento, são produzidas duas exotoxinas: tetanospasmina (toxina tetânica) e tetanolisina, sendo a primeira a principal responsável pelas manifestações clínicas da doença. A tetanospasmina é sintetizada sob forma de uma única cadeia. Em seguida, uma protease bacteriana, realiza a clivagem daquela cadeia formando uma cadeia pesada e uma leve, ambas conectadas por uma ponte dissulfeto. Não obstante, tal ponte é responsável pela atividade da toxina. Ademais, o DNA responsável pela formação da cadeia daquele polipeptídio, reside em um plasmídeo único. Caso alguma cepa de C. tetani não tenha tal plasmídeo, ela não apresentará propriedade toxogênica. Transmissão Os esporos são amplamente distribuídos no solo. A porta de entrada ocorre a partir de focos infecciosos, seja por feridas cirúrgicas ou não cirúrgicas. Além disso, cerca de 20% dos casos não é possível identificar a origem da infecção, ou seja, não há como determinar a porta de entrada. Cita-se alguns exemplos de feridas não cirúrgicas, como trauma, queimaduras, trauma com material enferrujado, pé diabético, úlceras, lesões na boca. No foco da lesão, a germinação dos esporos não é imediata. Ou seja, o agente necessita de condições favoráveis para se desenvolver. Logo, o bacilo permanece na ferida contaminada, até mesmo após ela ter se cicatrizado, para então se desenvolver. Diante disso, o paciente esquece da existência da antiga porta de entrada que já cicatrizou. Não obstante, o tecido necrosado – onde há pouco suprimento sanguíneo - ou contaminado por outros microrganismos, são fundamentais para a geração de um ambiente anaeróbio. O tétano neonatal, quando o organismo penetra por um ferimento infectado no umbigo ou associado à circuncisão, representa um importante problema em alguns países em desenvolvimento. Patogênese Quando o bacilo contamina o hospedeiro, ele não se espalha pelo corpo, e sim a sua toxina. Portanto, o bacilo permanece no local de lesão se proliferando e liberando mais toxinas. Ademais, as tetanospasminas, liberadas no ferimento, são transportadas intra- axonalmente (via retrógrada). Isto é, ela é capaz de atravessar várias ordens de neurônios sinapticamente conectados. Desse modo, ela se move da junção Tome nota! Os esporos de tetanospasmina resistem à umidade e temperatura extremas, são estáveis na pressão de oxigênio da atmosfera, podendo sobreviver indefinidamente, mesmo após exposição ao etanol, fenol ou formol. neuromuscular dos neurônios motores alfas para a medula espinal, podendo chegar ao cérebro. A partir disso, explica-se os efeitos clínicos produzidos nas junções neuromusculares, função autônoma e SNC. No sistema nervoso central, a tetanospasmina inibe a liberação de neurotransmissores no terminal pré-sináptico do nervo. Diante disso, ela se liga, inicialmente, à membrana pré-sináptica (receptores de gangliosídeos) e, em seguida, consegue penetrar para o interior do citoplasma do terminal pré-sináptico. A partir daqui a toxina inativa a sinaptobrevina – proteína neural que possibilita a fusão das vesículas para a liberação de neurotransmissores. Consequentemente, haverá bloqueio da liberação dos neurotransmissores inibitórios como a glicina ou o ácido y-aminobutírico (GABA). Ademais, a glicina controla a produção e liberação de acetilcolina pelas terminações nervosas motoras espinais que inervam a musculatura esquelética. Com a ausência dela, haverá grande concentração de acetilcolina nessas terminações, culminando na contração espástica dos músculos extensores e flexores simultaneamente. Quadro Clínico O período de incubação é curto: em média de 5 a 15 dias, mas pode variar de 3 a 21 dias. Caso o início dos sintomas ocorra no período inferior há 7 dias, pode-se inferir que o prognóstico tende a ser pior. Ademais, o tétano é classificado em quatro tipos clínicos os quais representam o local de ação da toxina, predominantemente na junção neuromuscular ou na inibição do SNC. O período de incubação depende da gravidade e da distância da lesão ou local de inoculação em relação ao SNC. Tétano generalizado O sinal clínico mais comum é o trismo que consiste na rigidez dos músculos masseteres, impedindo a abertura da boca. Quando mais grave a doença, menor será a abertura da boca. Ademais, o trismo resulta na expressão facial denominada de riso sardônico – extensão lateral dos cantos da boca, pálpebras elevadas e enrugamento da fronte. Há, também, contração dos músculos da mímica facial. Os músculos retos abdominais e a musculatura paravertebral podem ficar enrijecidos, culminando na presença do opistótono – arqueamento pronunciado das costas decorrente do espasmo dos fortes músculos extensores dorsais. Como o indivíduo permanece consciente, os espasmos são extremamente dolorosos. Ademais, os reflexos se apresentam exacerbados. Não obstante, o comprometimento respiratório, devido ao espasmo da glote, do diafragma ou dos músculos abdominais, constitui o problema inicial mais grave no tétano generalizado. Com a progressão da doença, pode haver a disfunção autonômica havendo hiperatividade simpática. A partir daí, poderá surgir hipertensão lábil (e, algumas vezes, hipotensão) e taquicardia, arritmias, constrição vascular periférica, diaforese, pirexia, aumento do débito de dióxido de carbono e aumento na excreção urinária de catecolaminas. O tétano generalizado pode levar de 10 a 14 dias para progredir, e a recuperação pode levar de 4 semanas ou mais. Sem a administração de antitoxina, a doença persiste enquanto houver produção de toxina, e, como a toxina é produzida em quantidades insuficientes para estimular uma resposta imune, há tétano recorrente. Curiosidade: no tétano ocorre a paralisia espástica (intensas contrações musculares). Tétano neonatal Trata-se de uma forma generalizada da doença, sendo mais prevalente em países subdesenvolvidos. Nesses países, o tétano neonatal é a segunda causa de mortalidade neonatal para doenças para quais existem vacinas – perde apenas para o sarampo. Ademais, a infecção ocorre, habitualmente, frente a um cuidado inadequado do coto umbilical. Além disso, a ausência de imunidade materna – adquirida na vacinação durante o pré-natal – contribui para o desenvolvimento da doença no recém-nascido. No que se refere ao período de incubação há um período médio de 1 a 10 dias após o parto. As manifestações clínicas consistem em fraqueza, irritabilidade e incapacidade de sucção. Os espasmos tetânicos são mais tardios, e a postura de epistótono pode ser confundidacom outras afecções. Acrescenta- se que é estabelecido o estado hipersimpático – constituindo a maior causa de morte – alcançando taxas de até 90%. Tétano localizado e cefálico Ocorre uma rigidez fixa dos músculos no local de lesão ou próximo a ele. Tal rigidez pode persistir por meses, podendo haver resolução espontânea. Fala-se da imunidade parcial contra a toxina um mecanismo responsável por prevenir a disseminação adicional e tétano generalizado. Entretanto, se não houver tratamento, o tétano localizado pode se tornar o generalizado. O tétano cefálico é o menos comum, mas decorre de lesões na cabeça ou em associações de infecções no ouvido médio por C. tetani. Não obstante, o quadro clínico consiste em paralisia facial epsilateral à lesão, trismo, disfagia e comprometimento dos pares cranianos: nervo oculomotor, troclear, glossofaríngeo, vago e hipoglosso. Os sintomas do tétano localizado em outros membros, que não a cabeça, pode surgir como uma mialgia frente às contrações involuntárias dos grupos musculares próximos ao ferimento. Diagnóstico Não há diagnóstico microbiológico nem sorológico. Os organismos raramente são isolados a partir do sítio do ferimento. Portanto, a cultura do tecido contaminado, não prova e também não descarta a presença do bacilo. Além disso, exames de sangue e de soro são habitualmente normais ou inespecíficos, e o LCS habitualmente está normal. Ademais, o diagnóstico é essencialmente clínico. Logo, para o tétano generalizado, espera-se um quadro clínico de trismo, rigidez muscular, tetania induzida por estímulos e história de ferida ou lesão nas últimas três semanas. Já para o tétano neonatal espera-se quadro clínico de sucção deficiente, aumento da rigidez muscular e espasmos, no contexto de higiene precária do umbigo e ausência de imunização da mãe, é sugestivo de tétano neonatal. Tratamento Tanto o tétano generalizado quanto o neonatal, necessitam de recursos e da unidade de terapia intensiva para sobrevier, uma vez que tal medida previne a morte por insuficiência respiratória. No que se refere ao tratamento medicamentoso, têm- se: - Administração de imunoglobulina antitetânica humana (HTIG): para neutralizar a tetanospasmina que ainda não entrou nos neurônios. Ademais, recomenda- se a dose única de 500 UI, que é tão efetiva quanto as doses mais altas, que variam de 3.000 a 5.000 UI. - Administração de antibióticos: deve ser instituído desde o início. [...] em um estudo aberto que comparou o metronidazol com a penicilina, o metronidazol, na dose de 500 mg IV, a cada 6 horas durante 7 a 10 dias, foi superior, com progressão significativamente menor da doença, duração mais curta da hospitalização e melhora da sobrevida. - Para o relaxamento muscular: altas doses de benzodiazepínicos ou baclofeno são necessários para controlar os espasmos. Ademais, a infusão contínua de magnésio pode ajudar a reduzir a excitabilidade neuronal e espasmos. Caso aqueles medicamentos não sejam efetivos, pode-se realizar bloqueio neuromuscular com vecurônio ou rocurônio. O labetalol IV, um alfa e betabloqueador combinado, constitui o tratamento de escolha de primeira linha. A clonidina e a dexmedetomidina são agonistas dos Soro antitetânico equino: pode ser o mais encontrado em regiões com assistência à saúde ainda precárias. Essa imunoglobulina causa mais reações adversas – anafilaxia e doença do soro. Administra-se por via intramuscular uma dose de 10.000 a 1.000.000 de unidades. receptores α2 que reduzem o tônus simpático basal e que podem ser úteis na supressão dos surtos simpáticos. Profilaxia O tétano é prevenido pela imunização com o toxoide tetânico (toxina tratada com formaldeído) na infância e, em seguida, a cada 10 anos. O toxoide tetânico é usualmente administrado em crianças em combinação com o toxoide diftérico e a vacina pertussis acelular (DTaP). Quando ocorre um trauma, o ferimento deve ser limpo e debridado, e um reforço do toxoide tetânico deve ser administrado. Quando o ferimento se encontra altamente contaminado, a imunoglobulina tetânica, bem como o reforço de toxoide devem ser administrados, assim como penicilina. A imunoglobulina tetânica (antitoxina tetânica) é produzida em humanos a fim de evitar as reações de doença do soro que ocorrem quando se utiliza a antitoxina produzida em cavalos. A administração de imunoglobulinas e do toxoide tetânico (em sítios corporais distintos) é um exemplo de imunidade passiva-ativa. A vacina pentavalente contém difteria, tétano e meningite, coqueluche e hepatite B. Tal vacina obedece ao esquema vacinal de três doses, começando aos 2 meses, 4 e 6 meses. Depois o reforço é feito a cada 10 anos com a dupla ou tripla bacteriana. Resposta imune contra o Clostridium Os mecanismos envolvidos são as barreiras naturais, a imunidade inata e a ação de anticorpos. Ademais, a barreira natural que ajuda a impedir a ação do C. tetani, são as próprias camadas da pele e substâncias antimicrobicidas secretadas sobre a pele. A participação inata tem grande importância no combate a bactérias extracelulares. Desse modo, a resposta ocorre com ajuda de células fogociticas, da ativação do complemento, produção de quimiocinas e citocinas. - Sistema complemento: ativa o complexo de ataque à membrana e ajuda a opsonizar os patógenos, facilitando a ação das células fagocitárias. - Células: os basófilos e monócitos ativados pelo complemento liberam mediadores que atraem leucócitos para o sítio; os eosinófilos fagocitam e liberam substâncias microbicidas; os neutrófilos e macrófagos além de fagocitarem a bactéria, liberam substâncias como NO e do peróxido de hidrogênio, que ajudam a degradar as estruturas da bactéria. - Citocinas: as citocinas de destaque são a TNF-alfa, IL- 1 e IL-6. Essas são produzidas nos processos infecciosos iniciais, e são responsáveis por induzir a febre, importante mecanismo que diminui a proliferação bacteriana. Além disso, estimulam neutrófilos e macrófagos a produzirem NO. A imunidade adaptativa, principalmente mediante os anticorpos, desempenha importante papel na defesa contra as bactérias extracelulares. Os anticorpos podem exercer suas ações de três maneiras: 1) opsonização, 2) ativando o sistema complemento, 3) promovendo a neutralização de bactérias ou de seus produtos. No que se refere ao C. tetani, os anticorpos se ligam tanto às bactérias, como também, podem se ligar à toxina tetânica, neutralizando-a e reduzindo a sua ação maléfica. Referências Bibliográficas Microbiologia médica e imunologia /Warren Levinson ; tradução: Martha Maria Macedo Kyaw. – 10. ed. – Dados eletrônicos. – Porto Alegre : AMGH, 2011. Merritt tratado de neurologia / Elan D. Louis, Stephan A. Mayer, Lewis P. Rowland ; tradução Carlos Henrique de A. Cosendey ... [et al.]. 13. ed. Rio de Janeiro : Guanabara Koogan, 2018. : il. Observação: Após a lesão, recomenda-se lavar o ferimento com água e sabão e procurar, imediatamente, os serviços de saúde.
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