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Justiça Penal Consensual, Mediação Penal e Justiça Restaurativa

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1 
 
Disciplina: Justiça Penal Consensual, Mediação Penal e Justiça Restaurativa 
Autor: Esp. Pablo Felipe Galante 
Revisão de Conteúdos: Esp. Alexandre Kramer Morgenterm 
Designer Instrucional: Esp. Alexandre Kramer Morgenterm 
Revisão Ortográfica: Esp. Lucimara Ota Eshima 
Ano: 2020 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
Copyright © - É expressamente proibida a reprodução do conteúdo deste material integral ou de suas 
páginas em qualquer meio de comunicação sem autorização escrita da equipe da Assessoria de 
Marketing da Faculdade UNINA. O não cumprimento destas solicitações poderá acarretar em cobrança 
de direitos autorais. 
 
 
 
2 
 
Pablo Felipe Galante 
 
 
 
 
Justiça penal consensual, mediação 
penal e justiça restaurativa 
1ª Edição 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
2020 
Curitiba, PR 
Faculdade UNINA 
 
 
3 
 
Faculdade UNINA 
Rua Cláudio Chatagnier, 112 
Curitiba – Paraná – 82520-590 
Fone: (41) 3123-9000 
 
 
Coordenador Técnico Editorial 
Marcelo Alvino da Silva 
 
Conselho Editorial 
D.r Alex de Britto Rodrigues / D.r Eduardo Soncini Miranda / 
D.r João Paulo de Souza da Silva / D.ra Marli Pereira de Barros Dias / 
D.ra Rosi Terezinha Ferrarini Gevaerd / D.ra Wilma de Lara Bueno / 
D.ra Yara Rodrigues de La Iglesia 
 
Revisão de Conteúdos 
Alexandre Kramer Morgenterm 
 
Designer Instrucional 
Alexandre Kramer Morgenterm 
 
Revisão Ortográfica 
Lucimara Ota Eshima 
 
Desenvolvimento Iconográfico 
Juliana Emy Akiyoshi Eleutério 
 
 
 
 
FICHA CATALOGRÁFICA 
 
GALANTE, Pablo Felipe. 
Justiça Penal Consensual, Mediação Penal e Justiça Restaurativa / Pablo Felipe 
Galante. – Curitiba: Faculdade UNINA, 2020. 
76 p. 
ISBN: 978-65-87972-27-5 
1. Direito. 2. Justiça. 3. Lei. 
Material didático da disciplina de Justiça Penal Consensual, Mediação Penal e 
Justiça Restaurativa – Faculdade UNINA, 2020. 
Natália Figueiredo Martins – CRB 9/1870 
 
 
 
4 
 
PALAVRA DA INSTITUIÇÃO 
 
Caro(a) aluno(a), 
Seja bem-vindo(a) à Faculdade UNINA! 
 
 Nossa faculdade está localizada em Curitiba, na Rua Cláudio Chatagnier, 
nº 112, no Bairro Bacacheri, criada e credenciada pela Portaria nº 299 de 27 de 
dezembro 2012, oferece cursos de Graduação, Pós-Graduação e Extensão 
Universitária. 
 A Faculdade assume o compromisso com seus alunos, professores e 
comunidade de estar sempre sintonizada no objetivo de participar do 
desenvolvimento do País e de formar não somente bons profissionais, mas 
também brasileiros conscientes de sua cidadania. 
 Nossos cursos são desenvolvidos por uma equipe multidisciplinar 
comprometida com a qualidade do conteúdo oferecido, assim como com as 
ferramentas de aprendizagem: interatividades pedagógicas, avaliações, plantão 
de dúvidas via telefone, atendimento via internet, emprego de redes sociais e 
grupos de estudos, o que proporciona excelente integração entre professores e 
estudantes. 
 
 
 Bons estudos e conte sempre conosco! 
 Faculdade UNINA 
 
 
 
 
 
 
 
 
5 
 
Sumário 
Prefácio ..................................................................................................... 07 
Aula 1 – As transformações da Justiça Criminal Brasileira. Justiça Penal 
Consensual, Mediação Penal e Justiça Restaurativa ................................ 
 
08 
Apresentação da aula 1 ............................................................................. 08 
 1.1 As transformações da Justiça Criminal Brasileira .......................... 08 
 1.1.1 Funções da pena no Código Penal Brasileiro ............................ 11 
 1.1.2 Crise do Sistema Penal Brasileiro ............................................. 13 
 1.1.3 Hipertrofia do Direito Penal X Direito Penal Mínimo ................... 14 
 1.2 Justiça Penal Consensual, Mediação Penal e Justiça 
Restaurativa .............................................................................................. 
 
16 
Conclusão da aula 1 .................................................................................. 23 
Aula 2 – A Lei n. 9.099/1995 ...................................................................... 23 
Apresentação da aula 2 ............................................................................. 23 
 2.1 Antecedentes da Lei nº 9.099/1995 ............................................... 24 
 2.2 Princípios orientadores da Lei nº 9.099/1995 ................................ 26 
 2.3 Competência dos Juizados Especiais Criminais ........................... 30 
 2.4 Medidas despenalizadoras ........................................................... 31 
 2.5 Lei nº 9.099/95 e Justiça Restaurativa .......................................... 35 
Conclusão da aula 2 .................................................................................. 36 
Aula 3 – Violência doméstica contra a mulher e violência contra o idoso . 37 
Apresentação da aula 3 ............................................................................. 37 
 3.1 Violência doméstica contra a mulher ............................................. 37 
 3.1.1 Violência doméstica contra mulher no Brasil .............................. 38 
 3.1.2 Lei Maria da Penha – Lei nº 11.340/2006 .................................. 39 
 3.1.3 Tipos de violência doméstica ..................................................... 41 
 3.1.4 Violência sexual ......................................................................... 42 
 3.1.5 Feminicídio ................................................................................ 43 
 3.1.6 Justiça restaurativa e violência doméstica contra a mulher ....... 45 
 3.2 Violência contra idoso ................................................................... 48 
 3.2.1 Violência contra idoso no Brasil ................................................. 49 
 3.2.2 Estatuto do Idoso – Lei 10.741, de 1º de outubro de 2003 ........ 50 
 3.2.3 Justiça restaurativa e violência contra idosos ............................ 51 
Conclusão da aula 3 .................................................................................. 52 
 
 
6 
 
Aula 4 – Violência contra criança e adolescente e o sistema de garantia 
de Direitos à criança e ao adolescente ....................................................... 
 
 53 
Apresentação da aula 4 ............................................................................. 53 
 4.1 Violência contra criança e adolescente ......................................... 53 
 4.1.1 Breve contexto histórico sobre crianças e adolescentes ............ 56 
 4.1.2 Tipos de violência contra criança e adolescentes ..................... 58 
 4.2 Sistema de Garantia de Direitos à Criança e ao Adolescente ........ 62 
 4.3 Justiça juvenil e Justiça restaurativa ............................................. 65 
Conclusão da aula 4 .................................................................................. 68 
Conclusão da disciplina ............................................................................. 69 
Índice Remissivo ........................................................................................ 70 
Referências ............................................................................................... 72 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
7 
 
Prefácio 
 
 Na disciplina Justiça Penal Consensual, Mediação Penal e Justiça 
Restaurativa, abordaremos as transformações da Justiça Criminal Brasileira e a 
crise do sistema penal, discutindo as finalidades da pena e demonstrando que 
não se atingiram com ela os objetivos visados. Posteriormente, serão tratadas 
as concepções sobre Justiça Penal Consensual, Mediação Penal e Justiça 
Restaurativa que visam ao enfrentamento dessa crise dosistema penal, 
mediante o reconhecimento da subsidiariedade do direito penal com a 
implementação de alternativas às penas privativas de liberdade. 
Com o intuito de aprofundamento das noções sobre Justiça Restaurativa, 
serão apresentadas noções sobre a Lei nº 9.099/95, e a Lei dos Juizados 
Especiais Cíveis e Criminais, explicando antecedentes e objetivos desta norma, 
seus princípios norteadores, as medidas despenalizadoras instituídas por ela e, 
por fim, o estabelecimento das conexões entre este dispositivo e a Justiça 
Restaurativa. Serão ainda abordados temas como: a violência doméstica contra 
a mulher, expondo noções sobre a Lei Maria da Penha e sobre feminicídio; 
violência contra idosos e o Estatuto do Idoso; Violência contra Criança e 
Adolescente, apresentando noções sobre o Sistema de Garantia de Direitos à 
Criança e ao Adolescente; assim como serão discutidas essas temáticas com o 
enfoque da Justiça Restaurativa. 
 
A disciplina foi dividida em quatro aulas, que são: 
 
➢ As transformações da Justiça Criminal Brasileira. Justiça Penal 
Consensual, Mediação Penal e Justiça Restaurativa. 
➢ A Lei n. 9099/1995. 
➢ Violência doméstica contra a mulher e violência contra o idoso. 
➢ Violência contra criança e adolescente e o sistema de garantia de 
Direitos à criança e ao adolescente. 
 
 
 
 
 
 
8 
 
Aula 1 – As transformações da Justiça Criminal Brasileira. Justiça Penal 
Consensual, Mediação Penal e Justiça Restaurativa 
 
Apresentação da aula 1 
 
Nesta aula serão abordadas as transformações da Justiça Criminal 
Brasileira, sendo discutidas as funções da pena no Código Penal Brasileiro, a 
crise do sistema penal brasileiro e as diferentes tendências da produção 
legislativa no país, que se contrapõem (hipertrofia do direito penal e direito penal 
mínimo). Ainda serão exploradas concepções de Justiça Penal Consensual, 
Mediação Penal e Justiça Restaurativa, que visam enfrentar a crise do sistema 
penal. 
 
1.1 As transformações da Justiça Criminal Brasileira 
 
Mirabete (2003) explica que no Brasil, quando se iniciou o processo de 
colonização, existiam tribos em diferentes estágios de evolução que possuíam 
práticas punitivas ligadas ao direito costumeiro, sendo realizadas a vingança 
privada, a vingança coletiva e o talião. Contudo, os ideais penais destas tribos 
selvagens que habitaram o país não influenciaram em nossa legislação. 
No período colonial, estiveram em vigor as Ordenações Afonsinas (até 
1512), as Manuelinas (até 1569), o Código de Dom Sebastião (até 1603) e a 
partir de então, as Ordenações Filipinas, que refletiam o direito penal dos tempos 
medievais. De acordo com Mirabete (2003), o crime era confundido com o 
pecado e com a ofensa moral, punindo severamente os hereges, apóstafas, 
feiticeiros e benzedores, existiam crimes como a blasfêmia, a benção de cães, a 
relação sexual de cristão com infiel, entre outros. As penas eram severas e cruéis 
(açoites, degredo, mutilação, queimaduras etc.), pois tinham o intuito de infundir 
o temor pelo castigo. Além da cominação de pena de morte (executada pela 
forca, pela tortura, pelo fogo etc.), eram comuns as penas infamantes, o confisco 
e as galés. 
Com a Proclamação da Independência, a Constituição de 1824 determinou 
que se elaborasse nova legislação penal, assim, em 1830 foi sancionado o 
Código Criminal do Império. Para Mirabete (2003), este diploma penal fixava um 
 
 
9 
 
esboço de individualização da pena, previa a existência de atenuantes e 
agravantes e estabelecia um julgamento especial para menores de 14 anos. A 
pena de morte era prevista somente para coibir a prática de crimes pelos 
escravos. 
Com a Proclamação da República, foi editado um novo estatuto, desta vez, 
denominado de Código Penal, contudo, ele foi alvo de duras críticas pelas falhas 
que apresentava, que decorriam evidentemente da pressa com que fora 
elaborado. Neste Código, aboliu-se a pena de morte e instalou-se o regime 
penitenciário de caráter correcional, o que constituía um avanço na legislação 
penal. Contudo, era mal sistematizado e foi modificado por inúmeras leis, até 
que foram reunidos esses diversos diplomas legais na Consolidação das Leis 
Penais pelo Decreto nº 22.213, de 14 de dezembro de 1932 (MIRABETE, 2003). 
Em 1º de janeiro de 1942 entrou em vigor o Código Penal (Decreto-lei nº 
2.848, de 7 de dezembro de 1940), que ainda é nossa legislação penal 
fundamental. Este código teve origem em projeto de Alcântara Machado, 
submetido ao trabalho de uma comissão revisora composta por Nelson Hungria, 
Vieira Braga, Narcélio de Queiroz e Roberto Lira. 
 
 
 
Segundo Mirabete (2003), é uma legislação eclética, em que se 
aceitam postulados das Escolas Clássica e Positiva. Sendo 
assim, da Escola Clássica adotou a pena retributiva, com 
“finalidade repressiva e intimidante” e, dentre pressupostos da 
Escola Positiva, acolheu as medidas de segurança, como 
medidas de prevenção e assistência social relativamente ao 
estado perigoso daqueles que, sendo ou não penalmente 
responsáveis, praticam ações previstas na lei como crime 
(TOLEDO, 1994). 
 
 
 
O Código Penal de 1940 foi reconhecido por ter boa técnica e simplicidade 
em sua redação, incorporando o que havia de melhor em outras codificações, 
como o Código Italiano de 1930 e do Código Suíço de 1937, motivo pelo qual 
recebeu moção de aplauso no 2º Congresso Latino-Americano de Criminologia, 
realizado em Santiago em 1941 (TOLEDO, 1994). 
Contudo, cumpre mencionar que o Código Penal de 1940 apresentava a 
mácula indelével do período histórico entreguerras em que foi gerado, ou seja, 
 
 
10 
 
era um estatuto de caráter nitidamente repressivo, construído sob a crença da 
necessidade e suficiência da pena privativa de liberdade (pena de prisão) para 
o controle do fenômeno do crime. 
Essas circunstâncias e outras aliadas às profundas mutações ocorridas no 
quadro social, político e econômico brasileiro, após a década de 50, levaram 
Nélson Hungria a aceitar a incumbência de elaborar anteprojeto de novo Código 
Penal, apresentando-o ao Governo no ano de 1963. Esse anteprojeto, submetido 
à revisão final por Comissão, veio a transformar-se no Código Penal de 1969, 
editado pela Junta Militar, então no Poder. Mal recebido pela crítica, teve seu 
início de vigência adiado por mais de uma vez até que, no Governo do Presidente 
Geisel, optou-se pela reforma parcial do Código de 1940 e pela revogação 
definitiva do Código de 1969, o que de fato se deu, respectivamente, pelas Leis 
n. 6.416, de 24 de maio de 1977, e 6.578, de 11 de outubro de 1978 (TOLEDO, 
1994). 
A reforma penal brasileira de 1984 decorreu de uma exigência histórica, em 
razão de que as transformações da sociedade já não comportavam mais as 
regras de comportamento da década de 1940, época em que o Código Penal foi 
editado. Sendo assim, em abril de 1980, o então Ministro da Justiça, Ibrahim Abi-
Ackel, deu início aos estudos para a reforma penal, mediante Portaria n° 359, e, 
já em dezembro de 1980, após debates realizados no mês de julho do mesmo 
ano, no Instituto dos Advogados Brasileiros e no Conselho Federal dos 
Advogados do Brasil, definiu-se o quadro de uma ampla reforma do sistema 
criminal brasileiro a ser empreendida em duas etapas: na primeira seriam 
concluídos e encaminhados os Anteprojetos de Código Penal – Parte Geral, de 
Código de Processo Penal e de Lei de Execução Penal; na segunda, cuidar-se-
ia do Código Penal – Parte Especial e da Lei das Contravenções Penais 
(TOLEDO, 1994). 
No processo de elaboração desses projetos, houve a participação de 
juristas que defendiam a subsidiariedade do Direito Penal, ou seja, o 
interpretavam como ultima ratio. Diante dessa percepção, a pena privativa de 
liberdade é reconhecida como o recurso mais grave, que não deve ser aplicado 
quando for possível o mesmo resultado com algum recurso mais brando. Enfim, 
todoeste processo culminou com a Reforma Penal de 1984, havendo uma 
grande reforma da parte geral do Código Penal com a Lei nº 7.209/84, 
 
 
11 
 
propiciando uma aplicação mais restritiva do Direito Penal, alinhada a uma visão 
política criminal tendente à prevenção do crime e à recuperação e 
ressocialização do preso, dentre inúmeros avanços. 
Para Mirabete (2003), a reforma penal de 1984 foi resultado de um influxo 
liberal e de uma mentalidade humanista em que se procurou criar medidas 
penais para os crimes de pequena relevância, evitando o encarceramento de 
seus autores por curto lapso de tempo. Objetivava o respeito à dignidade do 
homem que delinquiu, tratando-o como ser livre e responsável, enfatizando-se a 
culpabilidade como indispensável à responsabilidade penal. 
 
1.1.1 Funções da pena no Código Penal Brasileiro 
 
O Sistema Penal Brasileiro, conforme evidenciado no Código Penal 
Brasileiro em seu artigo 59, adotou a Teoria Mista ou Unificadora da pena, que 
engloba a teoria absoluta (de retribuição ou retribucionista) e a teoria relativa 
(utilitária ou utilitarista) justificadoras para a pena (DIANIN, 2007). No final do 
referido artigo, conjuga-se a necessidade de reprovação e prevenção do crime, 
deste modo, são unificadas as teorias absoluta e relativa, pois elas se pautam, 
respectivamente, pelos critérios da retribuição e da prevenção do mal cometido. 
Conforme leciona Capez (2012), na teoria mista “a pena tem a dupla função de 
punir o criminoso e prevenir a prática do crime pela reeducação e intimidação 
coletiva (punitur quia peccatum est et ne peccetur)”. 
 
 DECRETO-LEI Nº 2.848, DE 7 DE DEZEMBRO DE 1940. 
CÓDIGO PENAL 
 
Art. 59 - O juiz, atendendo à culpabilidade, aos antecedentes, à conduta 
social, à personalidade do agente, aos motivos, às circunstâncias e 
conseqüências do crime, bem como ao comportamento da vítima, 
estabelecerá, conforme seja necessário e suficiente para reprovação e 
prevenção do crime: (Redação dada pela Lei nº 7.209, de 11.7.1984) 
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-
lei/del2848compilado.htm 
 
 
Dianin (2007) explica que para a Teoria Absoluta da Pena, a finalidade da 
pena é retribuir o mal injusto causado pelo criminoso, pelo mal justo 
 
 
12 
 
consubstanciado no ornamento jurídico (punitur quia peccatum est), seja 
privando-o de sua liberdade, seja privando-o de certos direitos ou bens. Segundo 
o autor, para Claus Roxin a teoria da retribuição não encontra o sentido da pena 
na perspectiva de algum fim socialmente útil, senão a de retribuir com um mal 
merecidamente imposto e assim equilibrar e espiar a culpabilidade do autor do 
fato delituoso. 
Denomina-se de teoria “absoluta” porque, de acordo com esta concepção, 
a finalidade da pena é desvinculada de seu efeito social. A concepção da pena 
como retribuição compensatória já é conhecida desde a antiguidade e, sob este 
prisma, para que a pena seja justa, pressupõe-se que corresponda em sua 
duração e intensidade com a gravidade do delito. Para Luiji Ferrajoli, são teorias 
absolutas todas as doutrinas que concebem a pena como um fim em si mesma, 
ou seja, como um “castigo”, “reação”, “reparação” ou “retribuição” do crime 
(DIANIN, 2007). 
A Teoria Relativa (utilitária ou utilitarista) da pena tem por finalidade 
prevenir a ocorrência de futuros crimes (punitir ne peccetur). Opera-se de duas 
formas, na prevenção geral, que se destina à coletividade, e, na prevenção 
especial, dirigida diretamente ao criminoso. 
Importante 
A prevenção geral pode ser vista sob dois ângulos (DIANIN, 
2007): 
➢ Prevenção geral negativa, também conhecida como 
prevenção por intimidação, consiste na prevenção dos crimes 
sob a concepção de que os indivíduos de uma sociedade, ao 
presenciarem outras pessoas sendo condenadas pela prática 
de crimes, desistirão de fazer o mesmo; 
➢ Prevenção geral positiva, ou prevenção integradora, 
sob este enfoque, objetiva-se a prevenção dos crimes pela 
conscientização das pessoas para o respeito de valores éticos, 
morais e de convivência em sociedade. O intuito é incutir na 
consciência geral a necessidade de respeito a determinados 
valores, exercitando a fidelidade ao direito e promovendo a 
integração social. 
A prevenção especial, por sua vez, também se apresenta em 
duas vertentes (DIANIN, 2007): 
➢ Prevenção especial negativa: visa retirar do convívio 
social aquele que praticou o crime, colocando-o em cárcere 
privado, e, deste modo, impedir que o mesmo indivíduo venha 
a cometer novos delitos por um determinado período. 
 
 
13 
 
➢ Prevenção especial positiva: busca-se a intimidação 
e a ressocialização do indivíduo que cometeu o crime. O intuito 
é fazer com que o indivíduo desista de praticar novos crimes. 
Assim, a finalidade da pena é evitar a reincidência. A prevenção 
de novos delitos se dirige ao infrator da norma em particular. O 
direito penal pretende, assim, a ressocialização do criminoso, 
com a conversão do criminoso em homem de bem. 
 
1.1.2 Crise do Sistema Penal Brasileiro 
 
No Brasil, o modelo retributivo da pena e o encarceramento do preso não 
surtiram os efeitos desejados, considerando-se que o Sistema Penal Brasileiro 
está longe de cumprir com as finalidades adotadas no texto legal. Os 
estabelecimentos penais brasileiros não estão aptos a oferecer aos presos a 
assistência de que eles necessitam conforme a Lei de Execuções Penais, Lei n. 
7.210, de 11 de julho de 1984, que estabelece em seu art. 10 que “a assistência 
ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e 
orientar o retorno à convivência em sociedade”. O Conselho Nacional de Justiça 
divulgou em 2014 o Novo diagnóstico de pessoas presas no Brasil, do qual se 
extraem os seguintes dados: 
 
CAPACIDADE DO SISTEMA CARCERÁRIO DO BRASIL – 357.219 
VAGAS (2014) 
 Quantidade Quantidade de vagas 
necessárias 
Déficit de 
vagas 
População 
carcerária 
567.655 567.655 210.436 
Pessoas em 
prisão domiciliar 
147.937 715.592 358.373 
Mandados de 
prisão a cumprir 
373.991 1.089.583 732.364 
Fonte: elaborado pelo autor (2020), com base em dados do CNJ (2014). 
 
Infere-se, com base nesses dados do Conselho Nacional de Justiça, que 
se todas as pessoas em prisão domiciliar e com mandados de prisão a serem 
cumpridos fossem incluídas no sistema carcerário brasileiro, seriam cerca de 
1.089.583 de presos, situação hipotética na qual haveria um déficit de 732.364 
vagas. De acordo com o CNJ, no Brasil há 358 presos por grupo de 100.000 
habitantes, um índice muito elevado quando comparado com outros países como 
 
 
14 
 
Argentina (149), México (212), África do Sul (294) ou Alemanha (78). Evidencia-
se também que o país apresenta uma taxa de ocupação de 200%, ou seja, para 
que o sistema se torne “lotado” é preciso primeiro dobrar a capacidade atual 
(SILVA, 2015). 
Conforme o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2019, em 2018 foram 
57.341 mortes violentas intencionais no país, e, do ano 2000 ao ano 2017 houve 
uma variação no número de pessoas encarceradas de 212,1% (aumentando de 
232.755 em 2000, para 726.354 pessoas presas em 2017), e, mesmo com um 
crescimento de 211,9% no número de vagas no sistema prisional, o déficit no 
número de vagas aumentou em 212,3% no mesmo período (de 97.045 em 2000 
para 303.112 em 2017). 
No relatório de auditoria realizada no Funpen pelo Tribunal de Contas da 
União (TCU), conforme o Acórdão 1542/2019 votado em plenário no mês de 
julho do corrente ano, inferiu-se que o sistema penitenciário nacional demandaria 
um valor estimado de R$ 97,84 bilhões para, no prazo de dezoito anos (R$ 5,44 
bilhões anuais), extinguir o déficit de vagas prisionais, reformar unidades 
prisionais precárias e viabilizar seu pleno funcionamento. 
Ví deo 
Para melhor compreensão sobre a crise do sistema penal do 
Brasil, sugerimos que você assista à reportagem sobre 
superlotação em presídios,produzida pelo Jornal “O Globo”. 
Disponível no link abaixo: 
https://www.youtube.com/watch?v=W0YjKTKQMgQ 
 
Diante do exposto, evidencia-se a crise do Sistema Penal brasileiro, que 
não cumpre adequadamente com suas finalidades e não atende os objetivos de 
prevenção geral ou especial, contribuindo para a manutenção dos atuais índices 
de criminalidade e violência alarmantes. 
 
1.1.3 Hipertrofia do Direito Penal X Direito Penal Mínimo 
 
Neste contexto de crise, há espaço para a difusão de ideias críticas ao atual 
modelo de direito penal, todavia, não há consenso sobre as mudanças a serem 
 
 
15 
 
implementadas e coexistem correntes que defendem um maior rigor penal, 
exigindo uma hipertrofia penal, e outras que em oposição defendem um Direito 
Penal Mínimo, que defendem a redução do direito penal e a humanização do 
Sistema Penal. Neste sentido, Madeira (2009) afirma que a partir da década de 
1990, podemos observar a produção legislativa dividindo-se em construções de 
proteção aos direitos humanos e outras com viés criminalizante. 
Para exemplificar, nas tendências de enrijecimento penal é possível citar a 
política de Tolerância Zero, implementada por Rudolph Giuliani, em Nova York 
e posteriormente difundida internacionalmente, tem por fundamento principal a 
“Teoria das Janelas Quebradas”, que estabelece que quando uma janela de um 
edifício é quebrada e não é consertada, logo outras janelas também serão 
quebradas, pois o descaso inicial criará um “quadro de permissividade” para 
ações semelhantes ou piores. Para os defensores desta política, a impunidade 
para pequenos delitos serviria de incentivo para a ocorrência de delitos mais 
graves, assim todo desvio de conduta deveria ser rigorosamente apurado e 
punido para a manutenção e preservação da ordem pública. 
Os discursos de “Tolerância Zero” são em defesa de uma “Hipertrofia 
Penal”, possuem muitos adeptos em nossa sociedade, considerando que em um 
contexto de violência crescente, a população clama por segurança e justiça. 
No sentido, de hipertrofia penal, visando ao aumento de tipificações penais 
ou enrijecimento de regramento processual penal, é possível citar: 
 
➢ Legislações voltadas a tratar de crimes contra a ordem tributária (Lei 
8137/90) e de lavagem de dinheiro (Lei 9613/98); 
➢ Crimes de improbidade administrativa (Lei 8429/92); 
➢ Crimes praticados por organizações criminosas (Lei 9034/95); 
➢ Crimes contra o meioambiente; 
➢ Lei de Crimes Hediondos (Lei 8072/90); 
➢ Pacote Anticrime (Lei 13.964/2019, que alterou a legislação penal e 
processual penal). 
 
Em contrapartida, adeptos de Direito Penal Mínimo defendem o princípio 
da Intervenção Mínima do Direito Penal que preceitua a limitação e regulação da 
aplicação do Direito Penal, reservando-se seu emprego tão somente na 
 
 
16 
 
ocorrência de “condutas extremamente graves, dirigidas a bens jurídicos 
essenciais à convivência social, sempre no sentido de preservar ao máximo a 
liberdade do cidadão” (FABRETTI, SMANIO, 2012). Os referidos autores 
defendem que a pena não ressocializa, pois não resolve o problema da 
“desviação do delinquente” e ainda pode potencializá-lo. Como manifestações 
legislativas dessa tendência humanizadora do direito penal, é possível citar: 
 
➢ Lei 8069/90, que institui o Estatuto da Criança e do Adolescente, a partir 
da regulamentação de garantias; 
➢ Decreto 678/92, que incorporou os preceitos de proteção aos direitos 
humanos do Pacto de San Jose da Costa Rica; 
➢ Legislações descriminalizantes e de instituição da informalização, como 
é o caso da Lei 9099/95, que institui os Juizados Especiais Criminais; 
➢ Leis que instituem regras de proteção à sociedade em geral, como é o 
caso do Código de Defesa do Consumidor/CDC, criado pela Lei 8078/90, 
a Lei de Tortura, (Lei 9455/97), Lei 9807/99, lei que cria medidas e 
sistemas de proteção a vítimas e testemunhas, entre outras. 
 
Para Refletir 
Considerando a superlotação das prisões e o fato de que a 
maioria dos presos responde por tráfico de drogas, qual sua 
opinião sobre a descriminalização das drogas? 
 
A crise do sistema criminal brasileiro impõe a busca de novas respostas ao 
problema do encarceramento, neste sentido, a justiça penal consensual, a justiça 
restaurativa e a mediação penal são opções viáveis de enfrentamento dessas 
questões. 
 
1.2 Justiça Penal Consensual, Mediação Penal e Justiça Restaurativa 
 
Moreira (2014) explica que o direito penal, material e processual, é 
eminentemente público: há participação do Estado, na figura do Ministério 
Público, há interesse do Estado e da sociedade, materializado no direito de punir, 
 
 
17 
 
e, está presente também na proteção do indivíduo contra abusos do Poder 
público, assim, de acordo com uma concepção tradicional, inexiste a 
possibilidade de que a lide penal seja tratada extrajudicialmente. Em princípio, 
estas características se opõem à solução consensual dos casos criminais, 
contudo, na atualidade, este rigorismo é mitigado. 
A crise que se abate sobre o tratamento tradicional conferido aos litígios 
penais, fenômeno que não se restringe ao Brasil, as críticas ao processo penal 
clássico, referentes por exemplo à morosidade e ineficiência, conduziram à 
aplicação de outros meios de solução aos casos criminais. Deste modo, a 
doutrina classificou os modelos de resolução de conflitos penais da seguinte 
forma (MOREIRA, 2014): 
 
➢ Modelo Dissuasório Clássico: fundado na resposta punitiva estatal, 
que seria suficiente para a reprovação e prevenção de delitos futuros. A 
pena contaria com a finalidade puramente retributiva, não havendo 
espaço para outra finalidade (como ressocialização, reparação dos 
danos etc.), e o delito não poderia escapar da inderrogabilidade da 
sanção; 
➢ Modelo Ressocializador: atribui à pena a finalidade de ressocialização 
do infrator (prevenção especial positiva), deste modo, o direito penal 
objetiva intervir no pessoal do delinquente, sobretudo enquanto ele 
estivesse preso, para melhorá-lo e reintegrá-lo à sociedade; 
➢ Modelo consensual: fundado no acordo, no consenso, na transação, 
na conciliação, na mediação ou na negociação (plea bargaining). 
Subdivide-se em modelo pacificador ou restaurativo e modelo da justiça 
criminal negociada. 
 
Gomes (2007) afirma que é possível distinguir no âmbito da justiça criminal 
o “espaço de consenso” do “espaço de conflito”: 
 
➢ Espaço de consenso: modelo consensual, resolve o conflito penal 
mediante conciliação, transação, acordo, mediação ou negociação; 
➢ Espaço de conflito: os modelos punitivistas (dissuasório e 
ressocializador), que não admitem qualquer forma de acordo, ou seja, 
 
 
18 
 
exigem o “devido processo legal" (denúncia, processo, provas, ampla 
defesa, contraditório, sentença, duplo grau de jurisdição etc.). 
 
Os modelos consensuais de resolução de litígio penais podem ser 
classificados em (MOREIRA, 2014): 
 
➢ Pacificador ou restaurativo: visa à conciliação à reparação dos danos 
da vítima e, enfim, à cooperação das partes interessadas para encontrar 
uma solução conjunta ao conflito; 
➢ Modelo de justiça criminal negociada, que tem por base a confissão 
do delito, a assunção de culpabilidade e o acordo sobre a quantidade da 
pena, incluindo a prisional, a perda de bens, a reparação dos danos, a 
forma de execução da pena etc. 
 
De acordo com Gomes (2007), dentro do espaço de consenso, neste 
modelo de justiça penal consensual impõe-se bem definir e distinguir as múltiplas 
formas de resolução dos conflitos penais: 
 
➢ Conciliação: procedimento rápido que inclui um terceiro que orienta e 
até pressiona pela obtenção de um acordo que, ainda que não satisfaça 
totalmente, consegue encerrar o assunto. Em nosso país a conciliação 
é típica dos juizados criminais, é dirigida pelo juiz (ou conciliador) e visa, 
sobretudo, à reparação dos danos em favor da vítima.Busca-se pela 
conciliação (que é um gênero) tanto a reparação ou composição civil 
como a transação penal (que são suas espécies). Essa forma de 
resolução de conflitos só é apropriada para as infrações penais menos 
graves, que se denominam no nosso país "infrações penais de menor 
potencial ofensivo" (legalmente são as infrações punidas com pena 
máxima não superior a dois anos, nos termos das Leis 9.099/1995 e 
11.313/2006). 
➢ Mediação: é um procedimento privado e voluntário coordenado por um 
terceiro capacitado, que orienta seu trabalho para que se estabeleça 
uma comunicação cooperativa e respeitosa entre os participantes, com 
o objetivo de alcançar uma administração satisfatória dos problemas em 
 
 
19 
 
que estão envolvidos. Atualmente é a forma predileta de resolução de 
conflitos da chamada Justiça Restaurativa. Deve ser dirigida por 
terceiros imparciais (mediadores profissionais), objetivando-se a 
integração social de todos os envolvidos no problema, a preservação da 
liberdade, a ampliação dos espaços democráticos dentro da Justiça 
Penal, redução do sentido aflitivo e retributivo da pena. A mediação 
parece válida apenas para alguns delitos (normalmente de média 
gravidade), excluindo-se os fatos de alta ou altíssima potencialidade 
lesiva. 
➢ Negociação: a negociação é a marca registrada do modelo norte-
americano de Justiça Criminal, que é conhecido como plea bargaining. 
Mais de 90% dos delitos nos EUA são resolvidos por esse sistema, que 
permite acordo sobre todos os aspectos penais (pena, definição do 
delito, perda de bens, execução da pena etc.). Nos Eua, o plea 
bargaining é válido para todos os delitos, inclusive fatos extremamente 
graves. O acusado assume responsabilidade pelo injusto cometido 
(aceita sua culpabilidade) e a negociação se faz entre ele, seu defensor 
e o representante do Ministério Público. 
 
Para Moreira (2014), a justiça restaurativa é a principal via consensual de 
solução de lides penais, tendo em conta a possibilidade de sua ampla aplicação 
no ordenamento jurídico brasileiro, bem como maior eficiência quando 
comparado à negociação criminal. Segundo o referido autor, Paul McCold e Ted 
Wachtel, do Instituto Internacional por Práticas Restaurativas (International 
Institute for Restorative Practices), em trabalho apresentado no XIII Congresso 
Mundial de Criminologia, realizado de 10 a 15 agosto de 2003, no Rio de Janeiro, 
afirmam que a justiça restaurativa constitui uma nova maneira de abordar a 
justiça penal, que enfoca a reparação dos danos causados às pessoas e aos 
relacionamentos, ao invés de punir os transgressores. 
 
 
Segundo Damásio E. de Jesus (2005): “Justiça Restaurativa é 
um processo colaborativo em que as partes mais afetadas 
diretamente por um crime determinam a melhor forma de reparar 
o dano causado pela transgressão”. 
 
 
 
 
20 
 
Renato Sócrates Gomes Pinto (2005) explica que o modelo restaurativo se 
baseia em valores, procedimentos e resultados definidos, mas pressupõe a 
concordância de ambas as partes (réu e vítima), sendo que tal concordância 
pode ser revogada unilateralmente por qualquer uma das partes. Os acordos 
devem ser razoáveis e as obrigações propostas devem atender ao princípio da 
proporcionalidade. A aceitação do programa não deve, em nenhuma hipótese, 
ser utilizado como indício ou prova no processo penal. 
Deste modo, verificam-se como princípios da Justiça restaurativa: 
 
➢ Voluntariedade: a Justiça Restaurativa apenas pode ser aplicada com 
a concordância dos interessados, a qual, inclusive, pode ser retirada a 
qualquer tempo durante o procedimento; 
➢ Confidencialidade: as situações e histórias contadas são confidenciais. 
Caso não haja acordo, o conteúdo dos encontros não poderá ser usado 
como prova em eventual processo. 
➢ Consenso: para que a Justiça Restaurativa realmente funcione, as 
partes envolvidas devem estar cientes e de acordo com seus direitos e 
obrigações. 
 
Paul McCold e Ted Wachtel criaram a teoria de que a justiça restaurativa é 
composta por três estruturas conceituais distintas, porém relacionadas 
(MOREIRA, 2014): 
 
➢ Janela de disciplina social: busca evitar práticas puramente 
punitivas (ou retributivas), as quais tendem a estigmatizar as 
pessoas rotulando-as indelevelmente de forma negativa, ou 
meramente permissivas, buscando proteger as pessoas das 
consequências de suas ações erradas; trata-se de suprir as 
necessidades emocionais e materiais das vítimas e, ao mesmo 
tempo, fazer com que o infrator assuma responsabilidade por seus 
atos, mediante compromissos concretos; 
➢ O papel das partes interessadas: objetiva-se relacionar o dano 
causado pela infração penal às necessidades específicas de cada 
 
 
21 
 
interessado e às respostas restaurativas necessárias ao 
atendimento dessas necessidades; 
➢ Tipologia das práticas restaurativas: todas as partes 
interessadas, diretas e indiretas, desde que haja consenso, são 
chamadas a buscar, em conjunto, uma solução efetiva para o 
conflito, de modo a preencher suas necessidades emocionais; os 
três grupos devem ter participação ativa e se engajar no processo 
de conciliação. 
 
Moreira (2014) afirma que para uma plena realização de justiça, é 
necessário que as partes retornem ao estado anterior e o dano seja reparado, o 
que é viabilizado por meio da participação de todas as partes interessadas, em 
um processo cooperativo e abrangente na busca da solução do litígio. Deste 
modo, a Justiça Restaurativa tem por objetivo não apenas reduzir a 
criminalidade, mas também reduzir o impacto dos crimes sobre os cidadãos. 
Para o autor, a mera punição dos infratores, com desconsideração das 
necessidades daqueles mais afetados pelo crime, resulta em uma sentença, 
condenatória ou absolutória, que não atinge verdadeiramente objetivos de 
pacificação social. 
Moreira (2014) explica que a justiça restaurativa não pode ser confundida 
com um modo de burlar a imposição da pena ou de consagração da impunidade, 
objetiva-se “desenhar outras formas de resolver a lide penal que não seja 
exclusivamente mediante a pena de prisão”. Portanto, é um procedimento 
indicado, sobretudo, para infrações de menor gravidade, em que será possível 
que o espaço de conflito possa ser adequadamente substituído pelo espaço de 
consenso. 
Sendo assim, as práticas restaurativas não excluem o processo penal 
tradicional, tampouco são recomendáveis em crimes mais graves, contra direitos 
coletivos ou difusos, ou quando em razão da própria personalidade do infrator, 
da habitualidade criminosa ou outros fatores, a solução consensual seja 
inviabilizada (MOREIRA, 2014). 
A justiça restaurativa pode ser concretizada de diversas formas durante o 
processo penal e em fases diferentes. No ordenamento jurídico brasileiro, ainda 
não há previsão na legislação de práticas totalmente restaurativas, contudo, 
 
 
22 
 
existem diversos dispositivos e diversas aberturas em nosso ordenamento que 
permitem sua aplicabilidade. 
Mediante o Art. 126 do Estatuto da Criança e do Adolescente, que trata do 
instituto da remissão, mecanismo de exclusão, suspensão ou extinção do 
processo referente à aplicação de medidas socioeducativas a adolescentes, e, 
este instituto pode ser utilizado como meio de adoção de práticas restaurativas, 
desde que as autoridades dela encarregadas (MP e Poder Judiciário) promovam 
a participação do adolescente, de seus familiares, da vítima, na busca de uma 
efetiva reparação dos danos e de uma responsabilização consciente do menor 
infrator. 
A Lei nº 9.099/1995, ao prever a composição civil (art. 74 e parágrafo 
único), a transação penal (art. 76) e a suspensão condicional do processo (art. 
89), viabilizou a realização de práticas restaurativas por meio dessas vias. A 
suspensão condicional do processo e composição civil podem gerar extinção de 
punibilidade, e o acordo homologado pelas partessignifica a renúncia ao direito 
de queixa ou representação. No caso da suspensão condicional, há uma 
previsão no parágrafo segundo do Art. 89 que permite que sejam estipuladas 
outras condições judiciais a serem cumpridas, que não as taxadas em lei, o que 
permite a adoção de medidas restaurativas. 
Há no Código Penal a definição de penas restritivas de direitos, que são 
institutos jurídicos que permitem a construção de práticas “parcialmente 
restaurativas”, como a prestação pecuniária (art. 45, § 1º, CP) e a prestação 
inominada (Art. 45, § 2º). 
Diante da Resolução nº 225/2016 do Conselho Nacional de Justiça, a 
Justiça Restaurativa vem sendo aplicada inclusive diante de violência doméstica 
contra a mulher e idosos, ainda que com restrições considerando impossibilidade 
de aplicação de medidas despenalizadoras aos autores de crimes 
regulamentados pelo Estatuto do Idoso ou pela Lei Maria da Penha. 
Curiosidade 
O Projeto de Lei nº 7.006, de 2006, propõe facultar o uso de 
procedimentos de Justiça Restaurativa no sistema de justiça 
 
 
23 
 
criminal brasileiro em casos de crimes e contravenções 
penais. 
 
Evidenciamos que as finalidades da pena de prevenção geral, visando 
desencorajar a criminalidade pelo rigor das punições, ou prevenção especial, 
visando evitar a reincidência criminosa pela ressocialização do preso, estão 
longe de serem concretizadas diante de um sistema penitenciário em colapso. 
Neste contexto, a pena privativa de liberdade não cumpre com seu papel social, 
não ressocializa e não previne a ocorrência de novos delitos, pouco 
influenciando na redução dos índices de criminalidade atuais. Urge, então, a 
necessidade de um novo olhar sobre o direito penal, e a justiça restaurativa pode 
oportunizar um novo caminho, sobretudo, para os crimes de menor potencial 
ofensivo ou nas situações que descreveremos nas próximas aulas. 
 
Conclusão da aula 1 
 
Nesta aula tratamos das transformações da Justiça Criminal Brasileira, 
discutindo funções da pena no Código Penal Brasileiro, a crise do sistema penal 
e as diferentes tendências da produção legislativa no país. Também foram 
exploradas concepções de Justiça Penal Consensual, Mediação Penal e Justiça 
Restaurativa, que visam enfrentar a crise do sistema penal. 
Atividade de Aprendizagem 
Redija uma dissertação sobre a crise do sistema penal e como 
a Justiça Restaurativa pode ser empregada para amenizar 
problemas como a superlotação carcerária. 
 
 
 
Aula 2 - A Lei n. 9.099/1995 
 
Apresentação da aula 2 
 
Nesta aula será abordada a Lei º 9.099/1995, Lei dos Juizados Especiais 
Cíveis e Criminais, apresentando o contexto histórico para sua formação, seus 
 
 
24 
 
princípios norteadores (oralidade, informalidade, simplicidade, economia 
processual, celeridade e obrigatoriedade mitigada), a competência dos Juizados 
Especiais Criminais, medidas despenalizadoras (composição civil, transação 
penal, suspensão condicional do processo e exigência de representação da 
vítima em casos de lesões corporais leves). Por fim, será discutida a relação 
entre a Lei nº 9.099/95 e a Justiça Restaurativa. 
 
2.1 Antecedentes da Lei nº 9.099/1995 
 
Para melhor compreensão do intuito da Lei nº 9.099/95 - Lei dos 
Juizados Especiais Cíveis e Criminais - e das inovações por ela estabelecidas, 
é importante debater a influência exercida pela Constituição Federal no âmbito 
do direito penal e processual brasileiro. Neste sentido, Brito, Fabretti e Lima 
(2015) afirmam que a Carta Constitucional de 1988 é responsável pela 
incorporação em nosso ordenamento jurídico de modernas correntes de 
despenalização e descriminalização, que buscam resgatar a subsidiariedade do 
Direito Penal, incentivando a concentração de recursos no combate de condutas 
efetivamente graves. 
A Constituição Federal em seu Art. 5º, inciso XLIII, menciona os crimes 
hediondos, e, no Art. 98, trata das “infrações de menor potencial ofensivo”, de 
modo que é possível concluir que reconheceu assim três categorias de injusto: 
os hediondos e equiparados, as infrações comuns e as de menor potencial 
ofensivo (BRITO, FABRETTI, LIMA, 2015). 
A Lei nº 9.099/95 deve ser interpretada no contexto de um movimento 
“despenalizador” ou “desencarcerizador”, com o intuito de afastar ao máximo a 
imposição da pena privativa de liberdade, que influenciou na formação também 
de outras normas. Nesta perspectiva, Pinheiro (2007) explica esse movimento 
reformista de cunho minimalista (Direito Penal Mínimo), que se desenvolveu a 
partir da reforma penal e penitenciária de 1984, com a introdução de penas 
alternativas (Leis 7.209 e 7.210/84) e culminou na atual Lei da Penas Alternativas 
(Lei 9.714/98), passando pela implantação dos Juizados Especiais Criminais ( 
Lei 9.099/95) para tratar de crimes de menor potencial ofensivo. 
A aceitação de concepções de Direito Penal Mínimo foi impulsionada 
pela descrença no sistema penal, que não atingiu os objetivos sociais de 
 
 
25 
 
prevenção geral ou especial, para os quais se destina, ao contrário, a pena não 
ressocializa, mas estigmatiza, já que potencializa a desviação do delinquente 
(BRITO, FABRETTI, LIMA, 2015). A bifurcação do sistema penal, com a retirada 
das questões menores do campo da intervenção estatal tradicional ocorreu como 
resposta à crise de eficiência vislumbrada no sistema penal (PINHEIRO, 2007). 
A Constituição Federal de 1988, com consonância com o contexto 
mencionado, determinava a criação, em seu Art. 98, dos juizados especiais: 
 
Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. 
 
Art. 98. A União, no Distrito Federal e nos Territórios, e os Estados criarão: 
I - juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, 
competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de 
menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante 
os procedimentos oral e sumariíssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em 
lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau; 
 
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/constituicao.htm 
 
 
Considerando que compete privativamente à União legislar sobre 
matéria penal e processual, por meio da Lei Federal nº 9.099, de 26 de setembro 
de 1995, foram instituídos os Juizados Especiais Criminais, em conformidade 
com comando constitucional, conforme previsto no Art. 60 da Lei 9.099/95: 
 
LEI Nº 9.099, DE 26 DE SETEMBRO DE 1995. 
 
 Art. 60. O Juizado Especial Criminal, provido por juízes togados ou togados e 
leigos, tem competência para a conciliação, o julgamento e a execução das 
infrações penais de menor potencial ofensivo, respeitadas as regras de conexão 
e continência. (Redação dada pela Lei nº 11.313, de 2006). 
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9099.htm 
 
 
Os Juizados Especiais foram instituídos com a finalidade de viabilizar um 
processo mais democrático, mais ágil, com maior preocupação com a reparação 
dos danos e com a aplicação de alternativas à pena privativa de liberdade. A Lei 
9.099/95 introduziu quatro medidas despenalizadoras (composição civil, 
transação penal, suspensão condicional do processo e exigência de 
representação da vítima nos casos de lesões corporais leves ou culposas), 
http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11313.htm#art1
 
 
26 
 
implantando um procedimento sumaríssimo orientado pelos princípios da 
oralidade, simplicidade, economia processual, informalidade e celeridade. 
Diante das diversas inovações trazidas, a Lei 9.099/95 representou uma 
nova mentalidade e uma verdadeira revolução em nosso ordenamento 
processual penal, e, com vontade política e treinamento de pessoal 
especializado, os Juizados Especiais Criminais poderão servir como “porta de 
entrada” para a justiça restaurativa no Brasil (MOREIRA, 2014). 
 
2.2Princípios orientadores da Lei nº 9.099/1995 
 
O princípio é, por definição, o mandamento nuclear de um sistema, 
verdadeiro alicerce dele, disposição fundamental que se irradia sobre diferentes 
normas, compondo o espírito e servindo de critério para sua exata compreensão 
e inteligência (BALTHAZAR ET AL, 2016). 
O legislador da Lei nº 9.099/95 preferiu referir-se expressamente à 
oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade como 
sendo “critérios”, mas dispensando-se rigorismo técnico é possível identificá-los 
como os princípios norteadores desta lei. Tais critérios ou princípios estão 
inscritos nos artigos 2º e 62 da referida lei. 
 
LEI Nº 9.099, DE 26 DE SETEMBRO DE 1995. 
Art. 2º O processo orientar-se-á pelos critérios da oralidade, simplicidade, 
informalidade, economia processual e celeridade, buscando, sempre que 
possível, a conciliação ou a transação. 
[...] 
Art. 62. O processo perante o Juizado Especial orientar-se-á pelos critérios da 
oralidade, simplicidade, informalidade, economia processual e celeridade, 
objetivando, sempre que possível, a reparação dos danos sofridos pela vítima e 
a aplicação de pena não privativa de liberdade. 
 
Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l9099.htm 
 
a. Princípio da Oralidade 
 
O princípio da oralidade revela a predominância da palavra falada sobre a 
escrita. A oralidade se manifesta em diversos momentos do procedimento 
criminal da Lei nº 9.099/95, da elaboração do Termo Circunstanciado, na 
audiência preliminar, na oportunidade de representação verbal, na defesa, na 
 
 
27 
 
acusação, nos debates e na sentença. Está relacionada a um conjunto de 
princípios intimamente ligados entre si, dentre os quais os mais importantes são 
(BARACHO, 2004): 
 
➢ Imediação: pela aplicação do princípio da imediação exige-se o contato 
direto do Juiz com as partes e as provas, a fim de que ele receba, sem 
intermediários, o material que fundamentará seu julgamento; 
➢ Identidade física do juiz: o princípio da identidade física do juiz 
determina que o magistrado deve ser o mesmo, do começo ao fim do 
processo, salvo casos excepcionais, para que o julgamento não seja 
feito por um juiz que não teve contato direto com os atos processuais; 
➢ Concentração: a concentração dos atos processuais pode ser 
verificada na audiência unitária de instrução e julgamento, e na audiência 
da fase preliminar. Esta concentração dos atos geralmente permitirá que 
o juiz participe da fase preliminar e do processo, tendo contato direto 
com as provas e partes. 
 
Ao impor a oralidade, o legislador não exclui o procedimento escrito, mas 
vislumbra a superioridade da forma oral à escrita na condução do processo. 
Segundo Mirabete (2002), a experiência permite constatar que “o processo oral 
é melhor e mais de acordo com a vida moderna, como garantia de melhor 
decisão, fornecida com mais economia, presteza e simplicidade”. 
De acordo com o Art. 65 da Lei nº 9.099/95 serão objeto de registro escrito 
exclusivamente os atos havidos por essenciais e os atos realizados em audiência 
de instrução e julgamento, poderão ser gravados em fita magnética ou 
equivalente. 
 
b. Princípios da Informalidade e da Simplicidade 
 
A informalidade e a simplicidade são a “marca principal” dos Juizados 
Especiais, pois na audiência preliminar devem estar reunidos os interessados, o 
Ministério Público e o juiz, expondo as suas posições, a fim de que, se for o caso, 
seja evitada a instauração do processo e a vítima possa ser reparada 
 
 
28 
 
(FERNANDES ET AL, 2005). Os Juizados Especiais buscam diminuir as 
formalidades privilegiando-se a simplicidade e informalidade. 
Fernandes et al (2005) explica que a grande simplificação realizada pelos 
Juizados Especiais Criminais consiste na supressão do inquérito policial, que é 
substituído por um termo circunstanciado, conforme previsto no art. 69, caput Lei 
9.099/95. 
Curiosidade 
O Art. 69 da Lei 9.099/95 estipula que a “autoridade policial” 
que tomar conhecimento da ocorrência lavrará o termo 
circunstanciado. Diante desta redação, sob o argumento de 
que a única autoridade policial é o delegado de polícia, a 
lavratura de Termos Circunstanciados (T.C.O) pela Polícia 
Militar é um tema polêmico. Na prática, a realização de T.C.O 
pela Polícia Militar viabiliza os princípios norteadores da Lei, 
considerando que agiliza o atendimento de ocorrências 
policiais envolvendo crimes de menor potencial ofensivo. O 
Supremo Tribunal Federal por unanimidade, em 27 de março 
de 2020, na ação direta de inconstitucionalidade – ADI 3954, 
interposta pela Associação dos Delegados de Polícia do 
Brasil – ADEPOL, negou provimento ao agravo regimental, 
decidindo pela constitucionalidade da lavratura de T.C.O pela 
Polícia Militar. 
 
O professor Damásio Evangelista de Jesus (1995) afirma que a 
informalidade visa assegurar a necessária agilidade do processo, já que o 
procedimento escrito se revelou, ao menos no que toca às infrações de pequena 
monta, fonte inesgotável da prescrição da pretensão punitiva, com altos custos 
sociais. Na Lei 9.099/95, a informalidade é constatada, por exemplo, pelo Art. 67 
que autoriza que a intimação seja realizada por qualquer meio idôneo de 
comunicação. 
Estes princípios imprimem ao processo um ritmo sem formalidades inúteis, 
desburocratizando o rito jurisdicional. Todavia, os atos processuais devem ser 
realizados em conformidade com a lei, não estando o Juiz isento de observar um 
mínimo de formalidade, essencial para a prática de determinados atos 
processuais. 
 
 
 
 
29 
 
 
c. Princípio da Economia Processual 
 
O princípio da economia processual preconiza que na escolha entre duas 
alternativas, deve ser selecionada aquela menos onerosa às partes, o que não 
significa que devam ser suprimidos os atos previstos no rito processual 
estabelecido na lei. Trata-se da possibilidade de escolher a forma que causa 
menos encargo. 
Para Platner (2004), a abolição do inquérito policial e a disposição que 
prevê a realização de toda a instrução e o julgamento em uma única audiência, 
evitando sempre que possível sua multiplicidade, são exemplos da adoção de 
alternativas menos onerosas às partes e ao próprio Estado, presentes na Lei nº 
9.099, ou seja, representam a aplicação do princípio da economia processual 
nesta norma. 
Platner (2004) afirma ainda que modernamente a economia processual 
está relacionada à reengenharia do serviço público, que exige maior produção, 
com melhor qualidade e a custos menores. Segundo Baracho (2004), evidencia-
se que a economia processual está presente nos Juizados Especiais Criminais 
da sua fase preliminar até o encerramento da causa. 
 
d. Princípio da Celeridade 
 
A essência dos Juizados Especiais está na dinamização da prestação 
jurisdicional, motivo pelo qual todos os outros princípios informativos guardam 
estreita relação com a celeridade processual, tida como uma “meta principal do 
processo especial, por representar o elemento que mais o diferencia do processo 
tradicional, aos olhos do jurisdicionado” (BARBIERI JUNIOR, 2004). 
No âmbito dos Juizados Especiais Criminais, ao reduzir-se o tempo entre a 
prática da infração penal e a solução jurisdicional, evita-se a impunidade pela 
porta da prescrição e dá-se uma resposta rápida à sociedade na realização da 
Justiça Penal (PLATNER, 2004). 
 
 
 
 
 
30 
 
e. Princípio da Obrigatoriedade Mitigada ou Regrada 
 
Baracho (2004) afirma que, pelo princípio clássico da obrigatoriedade, o 
Ministério Público é obrigado a propor a ação penal tão logo tenha em mãos a 
notícia do crime e os elementos mínimos que possibilitem o oferecimento de 
denúncia, entretanto, excepcionalmente, em alguns casos previstos em lei e sob 
o controle judicial, o Ministério Público pode dispor da persecutio criminis, para 
propor a aplicação de uma pena não privativade liberdade, que é o princípio da 
oportunidade regrada ou obrigatoriedade mitigada. 
Não se trata da adoção do princípio da oportunidade pura, pois não se 
permite que o promotor simplesmente deixe de agir. O Ministério Público não 
pode abrir mão da via alternativa eleita pelo legislador, quando presentes os 
requisitos legais. O Ministério Público, quando faz a proposta alternativa, está 
dispondo da resposta estatal cominada abstratamente (pena de prisão ou multa 
integral), mas seu poder não chega ao extremo de lhe permitir abdicar 
integralmente de qualquer resposta estatal (BARACHO, 2004). 
Diante do princípio da obrigatoriedade mitigada, são admissíveis as 
medidas “despenalizadoras”, que são “medidas penais ou processuais 
alternativas que procuram evitar a pena de prisão” (FERNANDES ET AL, 2005) 
e a adoção de práticas de justiça restaurativa. 
 
2.3 Competência dos Juizados Especiais Criminais 
 
O Art. 60 da Lei nº 9.099/95 instituiu os Juizados Especiais Criminais e 
atribuiu-lhes competência para a conciliação, o julgamento e a execução de 
infrações penais de menor potencial ofensivo. 
Diante do exposto, cumpre definir o que são infrações de menor potencial 
ofensivo: de acordo com o Art. 61 da Lei nº 9.099/95, com redação dada pela Lei 
nº 11.313, de junho de 2006, são consideradas infrações de menor potencial as 
contravenções penais e os crimes que a lei comine pena máxima não superior a 
2 (dois) anos, cumulada ou não com multa. 
Assim, a competência dos Juizados Especiais Criminais é fixada pelo grau 
da pena cominada no tipo, ressalvada unicamente as previsões legais em 
sentido contrário de modo expresso, caso da Lei nº 11.340/06, que cuida da 
 
 
31 
 
Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher, cujo Art. 41 estipula que não se 
aplica a Lei nº 9.099/95 aos delitos por ela tipificados, independentemente da 
pena prevista, outra ressalva está prevista no art. 90-A da Lei 9.099/95, que 
prevê que “as disposições desta Lei não se aplicam no âmbito da Justiça Militar”. 
Cumpre ainda mencionar que a Lei 10.741/03, conhecida como Estatuto do 
Idoso, estipula em seu Art. 94 que aos crimes previstos nesta Lei, cuja pena 
máxima privativa de liberdade não ultrapassem 4 (quatro) anos, aplica-se o rito 
sumaríssimo previsto na Lei nº 9.099/95, contudo, não permite a aplicação das 
medidas despenalizadoras previstas nessa lei, como os institutos da composição 
civil de danos e da transação penal. 
 
2.4 Medidas despenalizadoras 
 
A Lei nº 9.099/95 não cuidou de nenhum processo de descriminalização, 
isto é, não retirou o caráter ilícito de nenhuma infração penal, mas disciplinou 
medidas despenalizadoras. Tais medidas se restringem às infrações penais de 
menor potencial ofensivo, isto é, contravenções penais e os crimes a que a lei 
comine pena máxima não superior a dois anos, cumulada ou não com multa, 
conforme estabelece o artigo 61, da Lei nº 9.099/95. 
Importante 
São distintos os conceitos de descriminalização e 
despenalização: 
Descriminalização é a extinção de modelo de conduta pela 
superação, por qualquer meio de sua estrutura, típica, ilícita ou 
da culpabilidade; 
Despenalização é o repúdio à pena, sobretudo, à de prisão, 
implica em aplicar outros mecanismos de controle sociaI. 
 
Com a Lei 9.099/95, foram colocadas em prática quatro medidas 
“despenalizadoras”, que são “medidas penais ou processuais alternativas que 
procuram evitar a pena de prisão” (FERNANDES ET AL, 2005), são elas: a 
composição civil, a transação penal e a suspensão condicional do processo; e a 
exigência de representação da vítima nos casos de lesões corporais leves ou 
culposas. 
 
 
32 
 
 
a. A Composição Civil 
Prevista no Art. 74 da Lei 9.099/95, a composição civil dos danos é um 
acordo civil firmado entre a vítima e o autor do fato. A conciliação representa, em 
tese, vantagens para ambas as partes: 
 
➢ A vítima: terá o título executivo ou a própria satisfação de seu 
interesse; a homologação da composição civil pelo juiz mediante 
sentença irrecorrível terá eficácia de título executivo a ser executado 
no juízo cível competente, qualquer que seja o tipo de obrigação 
(obrigação de pagar, de entregar coisa, de fazer, de não fazer etc.); 
➢ O autor do fato: poderá obter a obrigação que lhe seja mais 
favorável; tratando-se de ação penal de iniciativa privada ou de ação 
penal pública condicionada à representação, o acordo homologado 
acarreta a renúncia ao direito de queixa ou representação, ou seja, 
alcançada a composição civil nas infrações de iniciativa privada ou 
pública condicionada, resulta extinta a punibilidade. 
 
A Lei 9.099/95 não veda a composição dos danos na ação penal pública 
incondicionada, entretanto, sendo obtida a conciliação, ela não servirá de 
obstáculo para o exercício do jus persequendi in judício pelo Ministério Público 
(BARACHO, 2004). 
Cumpre mencionar, que há autores que sustentam que o modo como é 
operacionalizada a composição civil, impõe ao suposto autor a antecipação do 
pronunciamento sobre a obrigação de indenizar, reparar ou compor o dano e, 
com isso, dispensam o conhecimento e a avaliação de provas da existência da 
própria obrigação. Diante deste fato, é possível que ocorra uma enganosa 
negociação entre as partes, que pode se revelar como uma verdadeira 
chantagem, considerando que a vítima tendo a assistência do Ministério Público 
pode induzir o ofensor a sentir-se temeroso, pela possibilidade de uma pena 
mais severa ou mesmo pelo simples fato de ter que se submeter ao 
prosseguimento do processo penal, caso não aceite a composição civil (BREUS, 
2014). 
 
 
33 
 
 
b. A Transação Penal 
 
A transação penal é disciplinada no art. 76 da Lei nº 9.099/95, que 
estabelece que havendo representação ou em se tratando de crime de ação 
penal pública incondicionada, não sendo o caso de arquivamento, o Ministério 
Público poderá propor a aplicação imediata de pena restritiva de direitos ou 
multas, a ser especificada na proposta. 
Não será admitida a proposta se ficar comprovado: 
 
➢ Ter sido o autor da infração, condenado pela prática de crime à pena 
privativa de liberdade, por sentença definitiva; 
➢ Ter sido o agente beneficiado anteriormente, no prazo de cinco anos, 
pela aplicação de pena restritiva ou multa, nos termos deste artigo; 
➢ Não indicarem os antecedentes, a conduta social e a personalidade do 
agente, bem como os motivos e as circunstâncias, ser necessária e 
suficiente a adoção da medida. 
 
Sendo aceita a proposta pelo autor da infração e seu defensor, será 
submetida à apreciação pelo Juiz. Acolhendo a proposta do Ministério Público, 
aceita pelo autor da infração, o Juiz aplicará a pena restritiva de direitos ou multa, 
que não importará em reincidência, sendo registrada apenas para impedir 
novamente o mesmo benefício no prazo de cinco anos. 
A sanção imposta pela transação penal não constará de certidão de 
antecedentes criminais, conforme § 6º do Art. 76, e, assim, não terá efeitos civis. 
A pena imposta na transação não implica em reconhecimento de culpa e nem 
gera quaisquer outros efeitos penais, somente será registrada com único intuito, 
impedir que o agente seja novamente beneficiado no prazo de cinco anos. 
Assim como discutido quanto à composição dos danos civis, há autores 
que criticam a transação penal, considerando que também neste dispositivo, o 
acusado poderá ver-se obrigado a aceitar a proposta, considerando que parece 
ser mais benéfico do que a submissão a um processo penal propriamente dito 
(BREUS, 2014). 
 
 
 
34 
 
c. Suspensão Condicional do Processo 
 
A Suspensão Condicional do processo, prevista nos crimes em que a pena 
for igual ou inferior a um ano, abrangidas ou não pela Lei 9.099/95, está 
disciplinada no Art. 89 desta lei, que estabelece que nestes casos o Ministério 
Público, ao oferecer a denúncia, poderá propor a suspensão do processo,por 
dois a quatro anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não 
tenha sido condenado por outro crime, presente os demais requisitos que 
autorizariam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Código Penal). 
 Aceita a proposta pelo acusado e seu defensor, na presença do Juiz, ele 
recebendo a denúncia poderá suspender o processo, submetendo o acusado a 
período de prova, sob as seguintes condições: 
 
➢ Reparação do dano, salvo impossibilidade de fazê-lo; 
➢ Proibição de frequentar determinados lugares; 
➢ Proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização do 
Juiz; 
➢ Comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para 
informar e justificar suas atividades. 
 
O §2º do Art. 89 estabelece que o Juiz poderá especificar outras condições 
a que fica subordinada a suspensão condicional do processo, desde que 
adequadas ao fato e à situação pessoal do acusado. Este dispositivo oportuniza 
a incorporação de práticas de Justiça Restaurativa na construção de “outras 
condições”, as quais a suspensão será subordinada. 
A suspensão será revogada se o acusado vier a ser processado, no curso 
do prazo, seja por contravenção ou por descumprir qualquer condição imposta. 
Caso o prazo expire sem que tenha havido a revogação da suspensão, o 
Juiz declarará extinta a punibilidade. E, na hipótese de que o acusado não aceite 
a proposta prevista no Art. 89, ou seja, não aceite a suspensão condicional do 
processo, ele prosseguirá em seus ulteriores termos. 
Fernandes et al (2005) explica que a suspensão regulada na mencionada 
lei não se confunde com o sursis, no qual se realiza o processo e ao final, 
 
 
35 
 
havendo condenação, o juiz pode suspender a execução da pena, presentes os 
requisitos legais do art. 77, CP. 
A suspensão condicional do processo, prevista no Art. 89 da Lei nº 
9.099/95, suspende o próprio processo ab initio. É a paralisação do processo, 
com potencialidade extintiva, caso todas as condições acordadas sejam 
cumpridas, durante determinado período de prova (FERNANDES ET AL, 2005). 
 
c. Representação da vítima nos casos de lesões corporais leves ou 
culposas 
 
De acordo com Baracho (2004, p. 15), as lesões corporais culposas ou 
leves, por imposição da Lei 9.099/95, conforme previsto em seu Art. 88, 
passaram a exigir representação da vítima. 
A representação é condição de procedibilidade da ação penal pública 
condicionada, ou seja, a ação penal não pode ser instaurada se essa exigência 
não for atendida. 
A renúncia ou a decadência leva à extinção da punibilidade. 
 
 
 
Fernandes et al (2005, p. 226) afirmam que “há anos a doutrina 
brasileira vinha insistindo na ideia de que lesões corporais leves 
deveriam ser transformadas em delitos de ação penal pública 
condicionada à representação do ofendido”, então, sob a 
inspiração da mínima intervenção penal, a transformação de 
ação penal pública incondicionada em ação penal pública 
condicionada propiciada pelo Art. 88 da Lei nº 9.099/95 
representou uma via despenalizadora. 
 
 
 
 
2.5 Lei nº 9.099/95 e Justiça Restaurativa 
 
Os princípios da indisponibilidade e obrigatoriedade da ação penal pública 
são os maiores obstáculos jurídicos para a implementação do modelo 
restaurativo no Brasil. Existem aberturas para a aplicação de métodos 
alternativos, como a mitigação do princípio da obrigatoriedade, como ocorre nos 
 
 
36 
 
crimes de ação penal privada, nos quais é possível que as partes optem por um 
procedimento restaurativo, todavia, tais casos são exceção à regra. 
A Lei nº 9.099/1995, ao prever a composição civil (art. 74 e parágrafo 
único), a transação penal (art. 76) e a suspensão condicional do processo (art. 
89), em tese, permite a realização de experiências restaurativas. Na composição 
civil, o acordo homologado pelas partes significa a renúncia ao direito de queixa 
ou representação. No caso da suspensão condicional, há uma previsão no 
parágrafo segundo que permite que sejam estipuladas outras condições judiciais 
a serem cumpridas, que não as taxadas em lei, o que permite a adoção das 
cláusulas do encontro restaurativo. Nos demais institutos, como a transação 
penal, o diálogo restaurativo pode caminhar ao encontro de penas alternativas à 
prisão, podendo a aceitação do procedimento ser revogada a qualquer momento 
(CUNHA, 2017). 
Apesar das limitações, as experiências restaurativas no país viabilizadas 
com a Lei nº 9.099/95, têm obtido resultados positivos. No Centro Judiciário de 
Solução de Conflitos e Cidadania da cidade de Ponta Grossa/PR, por exemplo, 
de acordo com o relatório produzido sobre o ano de 2019, os círculos 
restaurativos conquistaram até 94% de consenso. 
De acordo com o Mapeamento dos Programas de Justiça Restaurativa de 
2019, do Conselho Nacional de Justiça, cerca de 60% dos Tribunais de Justiça 
existentes no país possuem programas de Justiça Restaurativa, sendo que 
alguns ainda em processo de implantação de projetos e aqueles com projetos já 
estabelecidos, que estão em diferentes graus de evolução e estruturação. 
Diante desses dados, infere-se que a Justiça Restaurativa apresenta 
resultados positivos, mas ainda incipientes, portanto, o desenvolvimento e a 
difusão destas práticas são necessários para um melhor enfrentamento da atual 
crise no sistema penal. 
 
Conclusão da aula 2 
 
Nessa aula foi estudada a Lei º 9.099/1995, Lei dos Juizados Especiais 
Cíveis e Criminais, apresentando antecedentes que contribuíram para sua 
formação, seus princípios norteadores (oralidade, informalidade, simplicidade, 
economia processual, celeridade e obrigatoriedade mitigada), a competência 
 
 
37 
 
dos Juizados Especiais Criminais, medidas despenalizadoras (composição civil, 
transação penal, suspensão condicional do processo e exigência de 
representação da vítima em casos de lesões corporais leves). Por fim, discutimos 
a relação entre a Lei nº 9.099/95 e a Justiça Restaurativa. 
Atividade de Aprendizagem 
Elabore um texto dissertativo sobre as medidas 
despenalizadoras, expondo sua visão sobre estes dispositivos 
que induzem os supostos autores a decidir pela aceitação de 
acordos ou o prosseguimento normal do processo. Nesse 
sentido, tais instrumentos não estariam cerceando a ampla 
defesa e o contraditório dessas pessoas? 
 
 
 
Aula 3 - Violência doméstica contra a mulher e violência contra o Idoso 
 
Apresentação da aula 3 
 
Nesta aula, estudaremos a violência doméstica praticada contra as 
mulheres, relacionando a temática à Lei Maria da Penha (Lei n.º 11.340/2006), 
explicando os tipos de violência praticados contra as mulheres, apresentando 
dados relativos à violência sexual e comentários sobre feminicídio. Será ainda 
discutida a violência praticada contra idosos, abordando previsões do Estatuto 
do Idoso (Lei nº 10.741, de 1º de outubro de 2003). Por fim, serão apresentadas 
ações de Justiça Restaurativa, envolvendo estes temas. 
 
3.1 Violência doméstica contra a mulher 
 
De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), violência é o uso 
intencional da força física ou do poder, real ou ameaça, contra si próprio, contra 
outra pessoa, ou contra um grupo ou uma comunidade, que resulte ou tenha 
grande possibilidade de resultar em lesão, morte, dano psicológico, deficiência 
de desenvolvimento ou privação. A partir desta definição, a violência pode ser 
dividida em: violência autoinfligida, violência interpessoal e violência coletiva. A 
 
 
38 
 
violência que ocorre nas relações familiares é um subtipo de violência 
interpessoal (FONSECA, LEAL, RIBEIRO, 2012). 
A Declaração das Nações Unidas sobre a Eliminação da Violência contra a 
Mulher, na Resolução 48/104, de 20 de dezembro de 1993, define a violência 
contra as mulheres como qualquer ato de violência de gênero que resulte ou 
possa resultar em danos ou sofrimentos físicos, sexuais ou mentais, para as 
mulheres, inclusiveameaças de tais atos, coação ou privação arbitrária de 
liberdade, seja em vida pública ou privada. 
Na maioria dos casos a violência contra mulheres ocorre pelo próprio 
parceiro e no interior de suas residências, contudo, a maioria das vítimas 
permanece nestes relacionamentos violentos, por dependência financeira ou 
emocional, levando a eventos cíclicos de violência (FONSECA, LEAL, RIBEIRO, 
2012). 
 
3.1.1 Violência doméstica contra mulher no Brasil 
 
Em uma breve contextualização histórica, importa mencionar que antes da 
República, sob a vigência das Ordenações Filipinas, o marido traído poderia 
inclusive matar a mulher e o amante, em “legítima defesa de sua honra”, ao 
mesmo tempo em que se o próprio marido mantivesse relações com outra 
mulher, seria reconhecido como “concubinato” e não como adultério. Com o 
Código Civil de 1916, o adultério passou a ser reconhecido igualmente para 
ambos os sexos, como motivo para o divórcio (PILAR, 2017). 
A violência doméstica somente tornou-se uma preocupação a partir da 
Constituição de 1988, que impôs ao Estado “o dever de assegurar assistência à 
família, na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para 
coibir a violência, no âmbito de suas relações”, conforme disposto no artigo 226, 
§ 8º. 
Foi neste panorama que em 1996, o Brasil se tornou signatário da 
“Convenção Interamericana para Prevenir, Punir e Erradicar a Violência contra 
a Mulher” (Convenção de Belém do Pará), assumindo obrigações de agir com 
zelo para prevenir, investigar e punir a violência contra a mulheres, dentre outras 
medidas. Contudo, somente em 22 de setembro de 2006, entrou em vigor a Lei 
Maria da Penha (Lei nº 11.340/2006), considerada uma das três melhores leis 
 
 
39 
 
de proteção às mulheres no mundo, conforme o Fundo de Desenvolvimento das 
Nações Unidas para a mulher (PILAR, 2017). 
 
3.1.2 Lei Maria da Penha – Lei nº 11.340/2006 
 
A Lei Maria da Penha, em seus 46 (quarenta e seis) artigos, dispôs sobre 
a criação dos Juizados de Violência Doméstica e Familiar, atribuindo-lhe 
competência civil e criminal. Assim, definiu-se as formas de violência, a 
assistência à vítima e as medidas protetivas, organizaram-se as funções da 
autoridade policial, da Defensoria e do Ministério Público, estabelecendo noções 
sobre atendimento multidisciplinar. 
O único crime previsto na Lei Maria da Penha está previsto em seu Art. 24-
A, incluído pela Lei nº 13.641/2018, que dispõe sobre “descumprir decisão 
judicial que defere medidas protetivas de urgência previstas nesta Lei”, 
estipulando pena de detenção de 3 (três) meses a 2 (dois) anos. Deste modo, a 
Lei Maria da Penha aumentou o rigor na punição de agressões cometidas contra 
mulheres desencadeadas em ambiente doméstico ou familiar, contudo, 
excetuando o tipo penal exposto, não concebeu novos tipos penais. Portanto, a 
Lei 11.340/2006 majoritariamente possui natureza jurídica de lei processual. 
Curiosidade 
Maria da Penha Maia Fernandes sofreu violência doméstica 
por 23 anos. Seu marido tentou mata-la por duas vezes. Na 
primeira vez, com arma de fogo, deixando-a paraplégica, e, 
na segunda, por eletrocussão e afogamento. Após a última 
tentativa de homicídio, ela o denunciou e iniciou uma batalha 
judicial para que ele fosse condenado. Entretanto, após dois 
julgamentos e alegações de irregularidades pela defesa, o 
processo permaneceu em aberto por alguns anos. Em razão 
desse fato, o Centro pela Justiça pelo Direito Internacional 
(CEJIL) e o Comitê Latino - Americano de Defesa dos Direitos 
da Mulher (CLADEM), juntamente com a vítima, formalizaram 
uma denúncia à Comissão Interamericana de Direitos 
Humanos da OEA, acusando o Brasil de não dispor de 
mecanismos suficientes e eficientes para proibir a prática de 
violência doméstica contra a mulher. Ao final, a Comissão 
Interamericana de Direitos Humanos recomendou ao país a 
adoção de políticas públicas voltadas à prevenção, punição 
e erradicação da violência contra a mulher. O acatamento 
 
 
40 
 
desta recomendação resultou na Lei nº 11.340, de 7 de 
agosto de 2006 (Lei Maria da Penha). 
 
Dentre os dispositivos de maior destaque da Lei Maria da Penha, citamos: 
 
➢ O Art.17 vedou a aplicação, nos casos de violência doméstica e familiar 
contra a mulher, de penas de cesta básica ou outras de prestação 
pecuniária, bem como a substituição de pena que implique o pagamento 
isolado de multa; 
➢ O artigo 41 vedou a aplicação dos benefícios despenalizadores da Lei 
nº 9.099/95 aos crimes praticados com violência doméstica e familiar 
contra a mulher, independentemente da pena prevista; 
➢ Em seu Art. 44, alterou o artigo 129 do Código Penal, com inclusão dos 
parágrafos 9º e 11º que qualificam a lesão praticada contra ascendente, 
descendente, irmão, cônjuge ou companheiro, ou com quem conviva ou 
tenha convivido, ou, ainda, prevalecendo-se o agente das relações 
domésticas, de coabitação ou de hospitalidade; 
➢ O artigo 20 estabeleceu a possibilidade de prisão preventiva em 
qualquer fase do inquérito policial ou da instrução criminal, que pode ser 
decretada inclusive de ofício pelo juiz, a requerimento do Ministério 
Público ou mediante representação da autoridade policial; 
➢ O artigo 42 alterou o artigo 313 do Código de Processo Penal, 
acrescentando o inciso IV, para consignar que se o crime envolver 
violência doméstica contra a mulher, a prisão preventiva é possível, 
também para garantir a execução das medidas protetivas de urgência, 
contudo, o mesmo artigo foi alterado pela Lei nº 12.403, de 4 de maio de 
2011, que modificou a redação do Art. 313, prevendo em seu inciso III a 
possibilidade de prisão preventiva para garantir a execução de medidas 
protetivas, se o crime envolver violência doméstica e familiar contra a 
mulher, criança, adolescente, idoso, enfermo ou pessoa com deficiência; 
➢ A Lei Maria da Penha criou dois tipos: Medidas Protetivas de Urgência, 
aquelas dirigidas à ofendida e às que obrigam o agressor, conforme 
exposto no Capítulo II da referida lei; tais medidas protetivas visam 
oferecer um atendimento integral e qualificado às mulheres que sofrem 
 
 
41 
 
com a prática de violência doméstica, como encaminhar a ofendida e 
seus dependentes a programa oficial ou comunitário de proteção ou de 
atendimento, ou determinar o afastamento do agressor do lar, domicílio 
ou local de convivência com a ofendida. 
 
Os crimes praticados com violência doméstica ou familiar são processados 
por ação penal pública condicionada à representação da ofendida, sendo 
admitida a renúncia à representação perante o juiz em audiência, especialmente 
designada para este fim, desde que manifestada antes do recebimento da 
denúncia. 
 
 
 
O STF julgou procedente a ADIn 4.424, impondo natureza de 
pública incondicionada à ação penal nos crimes de lesões 
corporais praticados com violência doméstica ou intrafamiliar, 
ainda que culposas ou leves. Contudo, permanecerá a ação 
penal condicionada à representação da ofendida, nos crimes 
cometidos com ameaça e contra a dignidade sexual. 
 
 
 
 
3.1.3 Tipos de violência doméstica 
 
A Lei nº 11.340/2006, Lei Maria da Penha, que rege os mecanismos para 
coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher, define os tipos de 
violência doméstica: 
 
➢ Violência física: é entendida como qualquer conduta que ofenda sua 
integridade ou saúde corporal; 
➢ Violência psicológica: é entendida como qualquer conduta que lhe 
cause danos emocional e diminuição da autoestima ou que lhe 
prejudique e perturbe o pleno desenvolvimento, que vise degradar ou 
controlar suas ações, comportamentos, crenças e decisões, mediante 
ameaça, constrangimento, humilhação, manipulação, isolamento, 
vigilância constante, perseguição contumaz, insulto, chantagem, 
violação de sua intimidade, ridicularização, exploração e limitação do 
 
 
42 
 
direito de ir e vir ou qualquer outro

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