Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Aula 16 - Doenças desmielinizantes (Dr. Renato Endler) - Então, essa aula será sobre doenças desmielinizantes, que possuem uma prevalência considerável entre as mulheres, principalmente. No Brasil, há uma maior prevalência dessas doenças nas regiões Sul e Sudeste. - As principais doenças desmielinizantes que iremos ver são a esclerose múltipla, a mielite transversa e a neuromielite óptica. - A mielite transversa e a neuromielite óptica não são sinônimos, porém elas se “juntam” e possuem características compartilhadas. Depois vamos ver cada uma delas para diferenciar uma da outra. - A esclerose múltipla, essa sim, é muito comum, e talvez vocês até conhecem alguém que tem essa doença. O diagnóstico é difícil, geralmente em mulheres jovens, então é muito importante fazer um diagnóstico precoce. Esclerose múltipla (EM) Epidemiologia - É uma doença inflamatória desmielinizante do SNC. Então, na aula de doenças neuromusculares eu falei sobre doenças desmielinizantes do SNP (polineuropatias, mononeuropatias, Guillain-Barré). Então, quando fazia a eletroneuromiografia nas doenças desmielinizantes do SNP o achado era de uma lesão do nervo. Aqui é diferente. É uma desmielinização do SNC. - São alterações que ocorrem na medula e no parênquima cerebral (locais onde se consegue fazer o diagnóstico). - Tem uma causa desconhecida. Na maioria das vezes tem causa imunomediada. Mas não se sabe ao certo o porquê algumas pessoas têm essa doença. - Tem uma prevalência de 400 mil pessoas nos EUA. O brasil possui uma prevalência semelhante. - A doença afeta pessoas mais jovens (20 a 40 anos). - Ocorre principalmente em mulheres (2:1). - Quando acomete homens geralmente pode ser mais grave, principalmente se forem homens negros. Mas a maioria dos casos são mulheres. - Tenho uma paciente com diagnóstico de EM com 14 anos e outra com 62 anos, com a maior idade. - Então existe essa variação de idade entre os 20 e 40 anos, e por isso o diagnóstico é mais difícil, pois muitos desses pacientes são tratados por transtorno ansioso. Muitos pacientes procuram atendimento médico com queixa de parestesia, formigamento, e são diagnosticados com “piti”. Etiologia - Causa não conhecida. - Existem interações entre fatores ambientais e genes de suscetibilidade que fazem uma resposta imune aberrante. - Os fatores ambientais são extremamente importantes na EM. Sabe-se que pacientes que moram próximos à linha do Equador e que depois se mudaram para uma região longe da linha do Equador têm mais chances de ter EM. Um dos motivos que explica isso é a vitamina D. Em regiões ao Sul e Sudeste há menor incidência solar, as pessoas se expõe menos ao sol, e vão ter menor ação da vitamina D. - Vão ocorrer danos à bainha de mielina, aos oligodendrócitos, axônios e neurônios. Lembrar que aqui estamos falando sobre o SNC e não sobre o SNP, como visto nas doenças neuromusculares. - Então, o mais forte fator genético conhecido a influenciar a suscetibilidade à EM é o haplótipo HLA- DRB1’1501. Esse é um fator conhecido para o desenvolvimento de EM. - No entanto, a presença desse haplótipo não é essencial para a ocorrência de EM, mas aumenta o risco em 2 a 4 vezes e está presente em 20 a 30% das pessoas normais. - Existe risco aumentado em alguns étnicos (caucasianos) e risco diminuído em outros grupos étnicos (índios norte americanos). Portanto, a etnicidade também é um fator importante para o diagnóstico de EM. - Quando tem história de EM na família aumenta o risco de 20 a 40% em familiares de primeiro grau. - Em relação aos fatores ambientais, o gradiente de latitude também influencia. Ou seja, em regiões longe da linha do Equador há uma prevalência aumentada de casos de EM. Geralmente são locais mais frios, com menor incidência solar, que, por consequência, acredita-se que por menor ação da vitamina D existe uma maior propensão ao desenvolvimento da doença. - Outros fatores influenciam: Vitamina D (a forma ativa 1,25-di-hidroxivitamina D3 tem propriedades imunomoduladoras. Então, se o paciente se expõe menos ao sol, ele vai apresentar uma menor atividade imunomoduladora. Dentre as causas infecciosas, destaca-se principalmente o Epstein Barr Vírus (EBV), que também está relacionado à EM. Patologia - É uma doença imunologicamente mediada. Então, há uma reação cruzada que desencadeia a EM. - Alguns vírus, bactérias ou toxina ambiental podem induzir resposta imune em pessoas geneticamente susceptíveis. - Então, se for uma pessoa que possui aquele haplótipo, que possui o vírus o EBV, pode ocorrer uma reação cruzada, podendo desenvolver a EM. - Então, as células apresentadoras de antígenos vão ativar as células T auxiliares CD4+ na periferia, que, por sua vez, ativam células T auxiliares (th) próinflamatórias autorreativas 1 e 17, ativando, por fim, as células B e monócitos. - Essas células B e os monócitos ativados vão desencadear uma cascata inflamatória. Então, interagem com moléculas de aderência na superfície de vênulas do SNC (é possível ver isso na RNM), juntamente com anticorpos que atravessam a barreira hematoencefálica (mostrando que tem mesmo uma atividade no SNC). - No SNC, os antígenos alvo são reconhecidos e têm resultado final na proliferação de citocinas anti- inflamatórias que suprem a resposta imune. - Mas tudo isso depende da exposição a esse vírus, à bactéria ou ao fator ambiental. Esse paciente tem que ser geneticamente susceptível. Essa reação cruzada tem que desencadear toda essa cascata inflamatória, com resultado final no SNC, pois atravessa a barreira hematoencefálica. - Dependendo da localização e da extensão dos danos, a desmielinização pode alterar ou bloquear a condução nervosa e ocasionar sintomas neurológicos. Não há um sintoma específico para a EM. Tem que ter comprometimento ocular? Não, é só mais um sintoma. Tem que ter perda de força? Não, é só mais um sintoma. O sintoma vai depender de onde acontece essa desmielinização. - Com a perda do suporte trófico dos oligodendrócitos, os axônios podem degenerar, causando déficits neurológicos irreversíveis. Então, se você não tratar esse paciente, se ele tiver uma lesão axonal, vai causar um dano irreversível. Portanto, quanto mais precoce o diagnóstico melhor o prognóstico. - A melhora dos sintomas é atribuída à resolução da inflamação, a mecanismos adaptativos ou à remielinização. É comum pacientes terem surtos da doença e depois melhorarem espontaneamente. Isso ocorre pela resolução da inflamação, por mecanismos de defesa. No entanto, alguns pacientes não apresentam melhora, daí precisamos tratar para fazer essa remielinização. Por exemplo, aquele paciente que passa de médico em médico durante anos, ele provavelmente ficará com sequelas, pois não foi tratado precocemente. - As placas de desmielinização crônica são encontradas mais frequentemente na substância branca periventricular (principalmente no corno posterior do ventrículo lateral), nervos ópticos, tronco encefálico, cerebelo e medula espinhal (cervical ou torácica). Mais para frente vamos ver que esses locais fazem parte dos critérios diagnósticos da EM. - Resumidamente, a patologia ocorre por uma interação entre um fator ambiental e uma resposta imunológica, cursando com alteração na bainha de mielina, nos oligodendrócitos. Se for lesão axonal, vai ter uma lesão irreversível. Lembrar da cascata inflamatória no SNC, atravessando a BHE. Manifestações clínicas - Não existe um sintoma específico. É como eu falei anteriormente, é comum em mulheres jovens que passam de médico em médico que não fazem o diagnóstico. Nunca pensar em ansiedade, transtorno depressivo como primeira hipótese diagnóstica. Mesmo se você estiver em um local que não possui ressonância você precisa pensar na hipótese de EM. Tem que excluir tudo o que é orgânico primeiro para pensar em problema psiquiátrico. - O sintoma depende do local em que ocorre adesmielinização do SNC. - Mas existem apresentações clínicas mais comuns (não são exclusivas, porém mais comuns). - Neurite óptica (tríade clínica) é muito comum, mas não é um requisito para a EM. Qual é tríade? 1) Turvação visual. Como pergunta isso ao paciente? Pergunta se o paciente enxerga como se fosse uma nuvem. Geralmente a turvação visual é monocular. 2) Discromatopsia, que é a mudança das cores ao enxergar. O paciente invés de enxergar verde ele enxerga cinza; invés de ser laranja é vermelho. 3) Dor ocular à movimentação dos olhos. O paciente movimentos os olhos e tem dor. - Lembrar, então, que a neurite óptica possui uma tríade (turvação visual, discromatopsia e dor ocular à movimentação dos olhos). Geralmente é monocular, apenas em 1 olho. Nem todos os pacientes apresentam essas queixas, mas quando as possuem favorece muito mais o diagnóstico. - Qual exame teria que fazer se o paciente chegasse com queixas de neurite óptica? Um exame de fundo de olho, pois esses pacientes podem ter edema de papila. Outra causa de neurite óptica que falei para vocês na prática é a NOIA (neurite óptica isquêmica anterior). - A neurite óptica, em geral, pode ter 2 causas principais: Ou ela pode ser isquêmica ou inflamatória. - Na EM a causa da neurite óptica é inflamatória e no AVCi do nervo óptico é isquêmica. Na NOIA o paciente ainda vai apresentar amaurose (perda visual). - Na EM também vamos ter como apresentação a Síndrome Clínica Isolada (SCI). O que é essa SCI? É quando o paciente tem uma clínica bem sugestiva de EM. Vou dar um exemplo: Atendi há 2 meses uma paciente de 21 anos que veio de Guaíra. Ela tinha uma hemiparesia em dimidio direito, tinha força grau 4 menos em membros superiores e inferiores direitos. Em Guaíra falaram que ela não tinha nada, daí ela veio para Cascavel, fez os exames, ressonância, e não deu nada também. Então, isso é uma Síndrome Clínica Isolada, temos que acompanhar essa paciente, pois tem grande propensão a desenvolver a EM. A conduta seria tratar ela e repetir a ressonância em 3 a 4 meses. - A SCI anuncia a doença em aproximadamente 85-90% dos casos. Essa é a chance de a paciente ter EM. - Existem outras manifestações clínicas também. - Fenômeno de Uhthoff: É quando o paciente tem uma piora dos sintomas quando exposto ao calor. Não somente o calor do ambiente, mas também, por exemplo, quando o paciente vai tomar um banho bem quente e tem uma parestesia. Isso é característico da EM. - Fraqueza de membros é comum na EM, mais frequentemente nas pernas. - Parestesias, disestesias e hipoestesias (alterações da sensibilidade). - Sinal de Lhermitte: É quando o paciente sente um “choque” quando faz a flexão do pescoço. Esse “choque” corre por toda a região cervical e torácica. - Neuralgia do trigêmeo: Corresponde 2% dos pacientes com EM. Se for neuralgia do trigêmeo em pacientes jovens aumenta muito mais a chance de ser por EM do que por causas tumorais, vasculares. - Fadiga é um dos sintomas mais comuns, e fadiga é diferente da fraqueza. Fadiga é o cansaço. - Os sinais e sintomas principais são: 1) Turvação visual, 2) Diplopia (horizontal ou vertical, e podem não apresentar alteração da motilidade ocular com a diplopia), 3) Alteração sensitiva e vibratória, 4) Espasmos tônicos (não confundir com crises convulsivas), 5) Efeitos pseudobulbares (náuseas e soluços recorrentes), 6) Fenômeno de Uhthoff. Os sinais e sintomas clássicos estão listado na tabela abaixo: Evolução da doença - Não existe marcador biológico, nem características da RM que diferenciem as formas de EM. - A EM possui algumas formas principais de apresentação. Quais são as formas de evolução da EM? - A forma mais comum é a surto-remissão. O paciente tem uma crise da doença que chamamos de surto e depois ela remite. Corresponde a 85-90% dos casos. - Existe também a forma primariamente progressiva, em que a doença começa e vai piorando. Corresponde a 10% dos casos. Precisa ter 1 ano de acompanhamento, de piora progressiva. Geralmente são homens que chegam, por exemplo, com paresia do membro inferior direito, faz o tratamento agudo e não obteve melhora significativa, depois de 3 meses piorou e depois de 6 meses piorou ainda mais. - Tem também a forma secundariamente progressiva, em que o paciente tem surto, depois remissão, depois surto de novo, e remissão, e assim por diante. Depois de alguns anos que o paciente teve alguns surtos e pode vir a apresentar novamente. - Para o tratamento da forma primariamente progressiva só existe 1 droga atualmente aprovada, e para as outras formas existem diversas drogas que podem ser administradas. - O que é uma síndrome radiológica-isolada? Paciente fez uma RN, e o radiologista percebeu uma lesão hiperintensa em Flair que sugere um foco de lesão desmielinizante, porém o paciente não apresenta clínica, somente alteração radiológica. Nesse caso, não precisaria tratar o paciente, somente acompanhar o paciente. - Lembrando que a forma mais prevalente, a que vamos encontrar, é a forma surto-remissão. Diagnóstico - Primeiramente, tem que ter uma clínica sugestiva (mesmo que os sintomas sejam inespecíficos). - O exame de imagem tem que ser a ressonância. A tomografia não mostra as alterações da EM. - Líquor, por ser uma doença inflamatória. Vamos encontrar aumento de proteínas. - Também podemos fazer o potencial evocado visual. Mas de rotina precisamos ter ressonância, líquor e clínica sugestiva. - Critérios de McDonald (2001): É necessário ter critérios clínicos e de imagem. Não adianta ter imagem sem clínica sugestiva. - A forma recorrente-remitente requer pelo menos 1 episódio de disfunção neurológica compatível, ocorrendo na ausência de febre ou infecção e com duração maior que 24 horas, juntamente com lesões disseminadas no espaço e no tempo. Tem que excluir causas infecciosas. Exemplo: Um paciente está tratando EM, tomando medicação e está bem controlado, e de repente ele tem uma parestesia do membro superior direito que dura cerca de 3 horas. Isso é um surto? Não é, pois o surto temos que pensar quando tem uma duração maior que 24 horas. Se for uma duração menor que 24 horas não se considera como surto. - A forma progressiva primária requer 1 ano de evolução neurológica insidiosa, combinada com alterações em RM e LCR. - Diagnóstico de EM não pode ser estabelecido na ausência de evidências clínicas de desmielinização. O que isso quer dizer? Se o paciente não tem uma imagem compatível não dá para dizer que é EM. Tem que ter uma clínica compatível e exame de imagem compatível. - No exame de imagem existem 2 formas que podem ser percebidas: Uma disseminação no tempo e uma disseminação no espaço. A disseminação no tempo é quando aparece uma lesão ativa. E a disseminação no espaço é quando aparece uma lesão diferente da que já existia, tem uma lesão a mais. - Para o diagnóstico, os critérios tem que ser satisfeitos, além da necessidade de afastar doenças alternativas. As mais comuns são Neuroborreliose de Lyme (NBL), neurossífilis, leucoencefalopatia multifocal progressiva (LEMP), HTLV-1 (paraparesia espástica tropical), HIV, sarcoidose, doença de Behçet, doença de Sjögren, lúpus eritematoso sistêmico (LES), vasculites, síndromes antifosfolípides, deficiência de B12 e tumores. - Tem que primeiramente afastar tudo que pode “imitar” a EM. - Não precisa decorar essa tabela para a prova, mas precisamos saber algumas coisas. - O importante é saber que na ressonância temos que avaliar a disseminação no espaço (novas lesões) ou a disseminação no tempo (lesão ativa). - A disseminação no tempo é quando a lesão impregna o contraste. Na ressonância, quando a lesão está captando contraste, isso é uma lesão ativa. É talvez uma resposta de que o tratamento não esteja fazendo efeito. Muitas vezes uma disseminação no tempo pode ser um dos fatores para troca de medicação. - Se o pacientetem 2 surtos da doença com uma ressonância compatível = Fecha diagnóstico de EM sem outros critérios. - Se o paciente tiver apenas 1 surto com ressonância compatível = Vai precisar de outros critérios para fechar o diagnóstico, podendo ser o LCR, ou acompanhamento por meio da RM. - Se 2 ataques (com imagem compatível) definem a EM melhor que 1 ataque somente, isso quer dizer que a clínica é mais importante. - Existem alguns locais mais comuns onde se encontram essas placas desmielinizantes: Na região periventricular, na região justacortical ou cortical, infratentorial, medula cervical ou torácica. Esses são locais importantes. Se o paciente tiver 2 lesões em regiões diferentes isso favorece o diagnóstico de EM. - A imagem da página anterior é extremamente importante. Tem alterações que parecem uma luva, como se fossem dedos ali no corpo caloso, como se fosse a crista de uma galinha. É praticamente patognomônico da EM. Essas alterações são conhecidas como dedos de Dawson, como exemplificado na imagem abaixo mais uma vez. - A imagem abaixo mostra uma sequência T1 com contraste no seio sagital superior, com impregnação de contraste. Se essa ressonância fosse a primeira desse paciente, poderíamos dizer que isso é uma disseminação no tempo. Com uma clínica compatível, pode-se dizer que o paciente tem EM. Dedos de Dawson - Essa outra imagem abaixo até daria para confundir com um tumor. É de um paciente com RM recidivante-remitente. Na dúvida, geralmente se faz o exame de LCR, para ver se tem proteína aumentada, presença de bandas oligoclonais. - Abaixo, outras imagens mostrando as alterações também alterações do tronco cerebral. Dá para ver melhor em T2. Quando afeta o tronco cerebral geralmente o prognóstico é pior (NC, diplopia, soluço). - Aqui abaixo novamente mostrando os dedos de Dawson. São várias lesões na substância branca periventricular. Tratamento - Primeiro pode-se fazer o tratamento agudo, para os ataques, surtos. - Tratamento agudo: Metilprednisolona 1 g IV por 3 a 5 dias (Isso é a pulsoterapia. O paciente é internado e são administradas altas doses de corticoide). - Esses pacientes devem ser avaliados para ver se não possuem algum quadro infeccioso associado. Pois o corticoide favorece a imunossupressão, piorando o quadro infeccioso. - Devem ser tratados para evitar estrogiloidíase: Albendazol 400 mg (1x/dia) durante 3 a 5 dias. Se o paciente tiver somente uma parestesia, por exemplo, dá para tratar por 3 dias. Se o paciente tiver uma neurite óptica, diplopia, paresia, plegia, dá para tratar por 5 dias. - E existe o tratamento crônico, que são as drogas modificadoras da doença. São aquelas drogas que serão usadas para evitar o diminuir a recorrência de crises. São mais efetivas para as formas surto-remissão (é como eu disse para vocês antes, só existe um medicamento para a forma primariamente progressiva). Quanto mais precoce o tratamento, melhor. São menos eficazes na forma progressiva. Somente o Ocrelizumabe é indicado para tratamento da forma primária progressiva. Também pode ser usado para a forma surto- remissão, porém o único para a primária progressiva. - O que vai nos dizer quais desses medicamentos devo utilizar? Muitos deles são antigos, mas ainda apresentam uma resposta boa. Esses medicamentos têm efeitos colaterais que muitas vezes são ruins para o paciente, mas quando é uma gravidade maior, a gente prefere partir para algo mais forte. Quando é uma forma mais agressiva preferimos começar pelo Fingolimod. - O Natalizumabe é um medicamento excelente, um anticorpo monoclonal, em que faz infusão 1 vez ao mês. Mas tem que cuidar porque ele pode causar leucoencefalopatia multifocal progressiva. Esses pacientes precisam ser monitorados (Vírus JC ou vírus John Cunningham). Mielite transversa (MT) - É uma doença desmielinizante muito semelhante à EM, no entanto o que modifica bastante é o exame de imagem. Não vai ter alterações no parênquima cerebral, mas somente na medula. - É uma síndrome clínica de mielopatia aguda ou subaguda. - Ocorre uma inflamação da medula. - Muitas doenças não inflamatórias podem “imitar” a MT, como, por exemplo, causas vasculares, tóxicas, metabólicas e mielopatia neoplásicas. - O tempo do desenvolvimento dos sintomas é importante no diagnóstico. - Pode afetar homens e mulheres em proporções semelhantes. - A ressonância magnética vai mostrar lesões em medula cervical, torácica. - Diagnóstico com biomarcadores: Anti-aquaporina 4 (AQP4-IgG) com 99% de especificidade para NMOSD. - O tratamento é semelhante ao da EM. Metilprednisolona da mesma forma. E plasmaférese. Às vezes, dependendo da causa, tem que entrar com imunossupressores também (Azatioprina, ciclofosfamida). - O problema da plasmaférese é a logística, são em poucas cidades que pode ser realizada. - Tem que excluir outras hipóteses, como mielopatia espondilótica e tumores, que podem causar alterações semelhantes. Spectrum de neuromielite óptica - É como se fosse um primo da mielite transversa. Neuromielite óptica (DEVIC) - É uma inflamação severa do SNC (é grave). - Menos prevalente que a EM (bem menos). - Geralmente na quarta década, e mais comum em mulheres (10 vezes mais comum). - Patologia: AQP4-IgG é o anticorpo sensível e pode estar presenta em 70% dos pacientes, podendo ser detectado tanto no sangue quanto no LCR. - Quando tem esse anticorpo tem 99% de especificidade pra neuromielite óptica. - Esses pacientes vão apresentar neurite óptica (geralmente bilateral), aguda, com comprometimento da área postrema (náuseas, vômitos e soluços incoercíveis). - Tem que ser feita ressonância de crânio e cervical. - São episódios severos de mielite e neurite óptica. - A mielite transversa ocupa mais de 4 vértebras, seja cervical ou torácica (lesão extensa). - Outros sintomas associados: Vômitos, tontura, disartria, neuralgia do trigêmeo, perda auditiva, hemiparesia, tremor, ataxia e encefalopatia. - A imagem acima mostra uma lesão que se estende de C1 até T1, evidenciando a grande extensão da lesão. Para o tratamento se faz a mesma coisa (pulsoterapia, plasmaférese). - O diagnóstico de mielite transversa e neuromielite óptica são muito parecidos. Mas, na verdade, a neuromielite óptica entra no universo da mielite transversa, é um diagnóstico diferencial. - Você só vai pensar em neuromielite óptica quando há um comprometimento de mais de 3 segmentos vertebrais. Conclusão da aula - É importante vocês saberem as características epidemiológicas da EM, a fisiopatologia, com a cascata inflamatória, a apresentação clínica. Lembrar da disseminação no tempo e espaço, do tratamento com as drogas modificadoras da doença. - Na mielite transversa, tem que afastar outras causas (mielopatia espondilótica, tumor, vasculite). - No spectrum da neuromielite óptica, lembrar do AQP4-IgG que é importante para o diagnóstico. Casos clínicos 1) Paciente de 22 anos é admitida com queixa de paraparesia com início súbito há aproximadamente 3 dias. No período houve escape urinário, que a paciente refere como “não sentir quando urina”. Não apresentava comorbidades. Ao exame físico: em cadeira de rodas, nervos cranianos sem alterações, força grau V em MMSS e grau II em MMII, incluindo proximal e distal. Reflexos 2+/2+ em MMSS e 3+/2+ em MMII, Eumetria, eudiadococinesia. Hipossensibilidade vibratória em MMII. Com base no caso clínico, qual o diagnóstico? - Mielite transversa. Pedir a ressonância de acordo com o nível sensitivo alterado. Pode fazer exame do LCR (aumento da proteína), VHS, investigar neuroborreliose, vasculites. A conduta seria pulsoterapia. 2) Paciente de 38 anos há 2 dias está com parestesia em MSE. O sintoma ocorre em todo o MSE, não apresentando o sintoma em face ou em MMII. O inicio foi súbito e não teve melhora desde então. Não apresenta outrossintomas. Ao exame: marcha atípica, nervos cranianos sem alterações, Eumetria, eudiadococinesia, reflexos 2+/2+ global, Hipossensibilidade tátil em MSE, Romberg negativo. Com base no caso clínico, qual ou quais hipóteses diagnósticas podem ser levantadas? - AVC isquêmico é uma hipótese, esclerose múltipla também (pela faixa etária). Pede uma ressonância. Pode fazer exame de LCR. A conduta é pulsoterapia. 3) Paciente de 44 anos é admitido no pronto socorro do Hospital São Lucas devido à paresia em MIE. O início do sintoma foi súbito e não houve melhora dos sintomas até o momento do atendimento. Paciente tabagista. Ao exame: Caminhando com apoio, nervos cranianos sem alterações, eumetria, eudiadococinesia, sem alteração da sensibilidade tátil. Com base no caso clínico, qual o diagnóstico? - Podemos pensar em AVC ou em quadro de esclerose múltipla. Precisaria do tempo do início dos sintomas. Pensando em AVC, deve-se investigar fibrilação atrial. É um caso mais aberto. 4) Homem de 42 anos procura consulta devido à perda de força em MMII. Sintoma progressivo com início há mais ou menos 10 dias. Relata que tem dificuldade para caminhar devido à falta de força. Ao exame: Marcha escarvante, nervos cranianos sem alterações, eumetria, eudiadococinesia, hipossensibilidade tátil em MMII, reflexos 0+/2+ global. Com base no caso clínico, qual ou quais hipóteses diagnósticas? Está certo destas opções por quê? Quais exames complementares solicitaria na sequência? - O que chama atenção é a arreflexia global (pega o corpo todo). Paciente jovem com essa piora progressiva, com essa marcha escarvante. A hipótese poderia ser Guillain-Barré, por ser um quadro agudo. Os exames pedidos seriam a eletroneuromiografia, poderia fazer um LCR talvez. Poderia fazer uma ressonância torácica, afastando uma mielite transversa. O tratamento desse paciente com Guillain-Barré seria com imunoglobulinas 0,4 g/kg/dia. 5) Mulher de 27 anos com queixa de alteração visual. Sintoma iniciado há 3 dias. No período, queixa que houve discreta perda de força do lado direito do corpo. Paciente tabagista. Ao exame: papiledema bilateral, sem outras alterações em nervos cranianos, eumetria, eudiadococinesia, força IV+ em dimidio direito, reflexos 2+/2+ global, sem alteração da sensibilidade tátil. Com base no caso clínico, qual seria o diagnóstico? - Neuromielite óptica. Exame solicitado: RN de crânio, cervical e torácica. Dosagem do AQP4- IgG e exame do LCR. Trata com metilprednisolona 1g por 5 dias.
Compartilhar