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Aula 02 - Hipertensão Intracraniana (Dr. João Bandeira) - Artigo de referência para a aula: https://www.revistas.usp.br/rmrp/article/view/7723/9261 - Conceito: Pressão intracraniana (PIC) é a relação entre o conteúdo da caixa craniana (inelástica) e o seu volume, tendo como referência a pressão atmosférica. É uma das maiores emergências médicas que podemos atender, o raciocínio deve ser extremamente rápido. - PIC fisiológica: Varia entre 5 a 15 mmHg (12 a 20 cm de água). Histórico - 1760, Lorry: Ao apertar o crânio em pacientes traumatizados, ocorria disfunções neurológicas. - 1766, Von Haller: Descobriu que o aumento da PIC tinha relação direta com a consciência. - 1842, Magendie: Apertando a meningomielocele, a fontanela anterior se mexia fazendo protusão. - 1866, Leyden: Quando a PIC > Pressão Arterial Média (PAM) o paciente ia a óbito. - 1891, Spencer e Horsley: Análise de cadáveres mostravam pedaços de cerebelo no forame magno. - 1920, Meyer: Descreveu as hérnias cerebrais internas. - 1938, Jefferson: Descreveu as hemorragias de tronco cerebral (hemorragias pontinas). Quando ocorrem herniações ascendentes e descendentes, ocorrem pequenos sangramentos principalmente no interior da ponte por tração dessas artérias. - 1959, Thompson: Fez um ensaio colocando um balão inflável no interior do cérebro e ia percebendo as alterações de consciência, pupilares, parada respiratória e óbito. - 1960, Lundberg: Descreveu as ondas de pressão. - 1969, Langfitt: Descreveu a curva de pressão X volume. - 1974, Symon: Fez um trabalho correlacionando balão inflável X hérnias cerebrais internas X pupila e respiração. - Vamos rever um pouco da anatomia agora. - O crânio de um adulto pode ser considerado uma esfera oca de paredes rígidas e inelásticas. - Forame magno: Cavidade que se comunica com o exterior por uma abertura ampla, onde passa a medula. - Tenda do cerebelo: Faz a divisão transversal em 2 compartimentos, infratentorial (cerebelo e tronco) e supratentorial (cérebro). - Foice cerebral: É um septo vertical mediano em forma de foice que ocupa a fissura longitudinal do cérebro, dividindo o compartimento supratentorial em 2 hemisférios: direito e esquerdo. - Seios ímpares: São 3 relacionados com a abóbada/calvária craniana (sagital superior, sagital inferior e seio reto) e 3 relacionados com a base do crânio (intercavernoso anterior, intercavernoso posterior, plexo basilar). - Seios pares: Estão situados na base do crânio (esfenoparietal, cavernoso, petroso superior, petroso inferior, transverso, sigmoide, occipital). - Seio sagital superior: Situa-se na borda superior e acompanha a foice do cérebro em toda sua extensão. - Seio sagital inferior: Ocupa 2/3 posteriores da borda inferior da parte livre da foice do cérebro. - Seio reto: Situado na junção da foice do cérebro com a tenda do cerebelo. Anteriormente recebe o seio sagital inferior e a veia magna do cérebro (de Galeno, que é formada pelas veias cerebrais internas do cérebro) e posteriormente desemboca na confluência dos seios. Fisiologia - A pressão intracraniana (PIC) é igual ao volume das estruturas que tem dentro (encéfalo + sangue + LCR). Então, PIC é igual ao volume (encéfalo + sangue + LCR). O fluxo sanguíneo cerebral (FSC) é diretamente proporcional à pressão de perfusão cerebral (PPC) e inversamente proporcional à resistência vascular cerebral (RVC). PPC é igual à pressão arterial média (PAM) menos a pressão venosa (PV), ou seja, PPC = PAM - PV. Como no homem a pressão nos seios venosos é difícil de ser medida e ela é similar à PIC, substitui-se a PV pela PIC, ficando, então, PPC = PAM - PIC. - PPC normal = Entre 50 e 60 mmHg. - Quanto maior a PIC, menor é a PPC (isso pode levar a uma isquemia focal ou global). Quando a PIC é superior ou se iguala à PAM, não há mais perfusão cerebral, sendo que o tecido cerebral vai à óbito após 5 minutos de sofrimento. - A autorregulação do FSC pode ser: 1) Metabólica, 2) Pressórica. - Autorregulação metabólica: Capacidade de aumento do FSC quando há aumento da necessidade metabólica e capacidade de diminuição do fluxo com redução da demanda. O acúmulo de CO2 no espaço intersticial leva à acidose tecidual, que ocasiona o relaxamento da musculatura lisa da microcirculação (vasodilatação) e reduz à RVC, aumentando o FSC. - Autorregulação pressórica: Capacidade de manutenção do fluxo apesar do aumento ou da redução da pressão arterial sistêmica. Essa autorregulação funciona adequadamente na faixa de variação da PAM de 50 a 160 mmHg, o que significa que, conforme a PAM diminui (↓PPC também), os vasos de resistência dilatam (↓RVP) até que atinjam um ponto máximo em resposta à redução da pressão. A partir de 50 mmHg, o FSC reduz abruptamente com quedas adicionais da PAM. O resultado dessa intensa vasodilatação é um quadro de vasoplegia capilar, que provoca ingurgitamento da microcirculação. Essa vasoplegia pode ser irreversível e, com o aumento progressivo, a PIC pode igualar-se à PAM, interrompendo o FSC. - Os vasos intracranianos podem ser divididos em: Sistemas de condução, de resistência, de trocas e de depósito ou reservatório. - Sistema de condução: Formado pelas grandes artérias e pelas artérias superficiais do cérebro, esse sistema é o responsável por uma boa parte da resistência vascular cerebral. - Sistema de resistência: É formado pelas arteríolas, metarteríolas e canais pré-capilares. A microcirculação cerebral tem a capacidade de vasomotricidade, pois as arteríolas podem dilatar ou constringir rapidamente. As metarteríolas e os canais pré-capilares contém os esfíncteres pré-capilares, responsáveis pela regulação do fluxo de sangue para o leito capilar. O fluxo de sangue através do leito capilar é intermitente, com áreas do leito capilar com fluxo e áreas sem fluxo em um mesmo instante. - Sistema de trocas: Constituído pelos capilares, onde ocorre a maioria das trocas. - Sistema de depósito ou reservatório: Constituído pelas vênulas e veias e compreendem um sistema de baixa pressão e grande volume. - Doutrina de Monro-Kellie: Relata que a caixa craniana é composta de sangue, LCR e parênquima cerebral. Ou seja, a caixa craniana tem o volume determinado por 3 fatores: 1) Sangue (10%): Artérias, veias e capilares. Aproximadamente, 4 a 4,5 ml/100 g de tecido cerebral, que, normalmente, está distribuído em 60% no lado venoso e 40% no lado arterial. 2) Cérebro (80-85%): Parênquima cerebral, constituindo 80-85% do volume intracraniano (corresponde a 1200 a 1500 g em um indivíduo adulto normal). 3) Líquor (10%): Temos cerca de 120-150 ml de líquor em um indivíduo adulto, dos quais 20 a 30 ml estão no interior dos ventrículos e o restante nos espaços subaracnóides intracranianos e raquidiano. - A produção de líquor gira em torno de 0,37 ml/min (0,3 a 0,4 ml/min), principalmente nos plexos coroides dos ventrículos laterais. A produção demanda alta energia e alto fluxo sanguíneo, na falta destes, a produção de LCR diminui. - Circulação do líquor: O líquor circula nos ventrículos laterais > Forame de Monro (interventricular) > III ventrículo > Aqueduto cerebral > IV ventrículo > Forame de Luschka (2 aberturas laterais) e Magendie (1 abertura medial) > Cisternas basais. - A propagação do líquor nos diversos espaços do SNC é atribuída ao efeito de “martelo d’água”, exercido pelas pulsações cardíacas nas artérias do plexo coroide, o qual provoca uma onda de pressão. - Reabsorção do líquor: Ocorre nas vilosidades aracnoideas, ao longo do seio sagital, através de um mecanismo passivo do tipo valvular unidirecional. Quando a pressão liquórica atinge 5mm/H2O, mecanismos valvulares permitem o escoamento do LCR, para dentro do sistema venoso. As alterações da circulação liquórica que podem levar à hidrocefalia e HIC são aquelas que causam obstrução ou da circulação liquórica ou dificuldade na reabsorção do LCR. - A doutrina de Monro-Kelliefala que essas estruturas estão em constante equilíbrio (homeostasia). Basicamente, as doenças que provocam HIC o fazem por um ou mais dos seguintes mecanismos: - Crescimento de lesões que ocupam espaço na caixa craniana. - Obstrução da circulação liquórica (hidrocefalia). - Aumento de líquido nos espaços intersticial e/ou intracelular encefálico (edema cerebral). - Ingurgitamento da microcirculação (aumento do volume sanguíneo intracraniano). - O edema cerebral decorre do funcionamento inadequado dos mecanismos de transporte da água e de eletrólitos entre os capilares e espaços extra e intracelular. Pode ser dividido em: 1) Edema vasogênico, 2) Edema citotóxico. - Edema Vasogênico: Resulta da quebra da barreira hematoencefálica, aumentando a permeabilidade do endotélio capilar de modo que há o extravasamento dos componentes do plasma para o espaço intersticial (água e proteínas). - Edema Citotóxico: É caracterizado por aumento do volume intracelular e redução do volume extracelular. O mecanismo é a alteração da membrana celular com desregulação da bomba de sódio. Durante a evolução do edema celular por isquemia, ocorre sua transformação em vasogênico. - Ciclo vicioso do edema cerebral: Lesão de hemisfério cerebral > Edema cerebral > Aumenta a pressão intracraniana (PIC) > Queda da pressão de perfusão cerebral (PPC) > Isquemia > Acúmulo de CO2, gerando quadro de acidose > Cérebro entende que está faltando circulação > Vasodilatação (↓RVP) > Aumenta a pressão intracraniana (PIC). Curva de Pressão X Volume (Langfitt) - O aumento de volume gera aumento de PIC. Numa fase inicial, os mecanismos de compensação são ativados e o aumento pequeno de volume não gera um aumento tão grande da PIC. - Existem mecanismos compensatórios, como: 1) As veias colabam e ocorre deslocamento de sangue venoso para as veias jugulares, 2) Evasão do líquor intracraniano para o saco dural, 3) Deslocamento do tecido cerebral, iniciando as hérnias cerebrais internas. - Nas fases tardias, os mecanismos de compensação não fazem mais efeito (exaustão) e um mínimo aumento de volume gera um aumento muito grande de pressão. Na fase de descompensação, as artérias contraem, gerando menor volume de deslocamento de sangue arterial para o sistema nervoso, isso faz uma parada do fluxo sanguíneo cerebral, levando ao óbito. Um tumor pode demorar 10 anos para atingir o ponto de descompensação e uma hemorragia pode demorar 5 minutos, indicando que os mecanismos compensatórios podem não ser suficientes sempre. Às vezes, as hérnias já vão ocorrendo simultaneamente, de maneira menor. Vai colabando o vaso, sai o líquor, hérnia e tudo. - Complacência: Capacidade do crânio tolerar aumentos no volume sem um aumento correspondente na pressão. Volume necessário para elevar a PIC em uma unidade. - Elastância: Nada mais é do que o aumento de pressão intracraniana por unidade de volume acrescentado ao compartimento. Causas de hipertensão intracraniana - Traumatismo cranioencefálico: Causa mais importante, tendo como consequências os hematomas subdurais, subcariais, epidurais/extradurais, contusões cerebrais, edema (Brain Swelling). - Tumores: Tumores supra ou infratentoriais, tumores ósseos (osteomas), tumores do revestimento do crânio (meningiomas). - Hemorragia cerebral: Corresponde aos aneurismas, HAS, trombose do seio sagital superior, malformações arteriovenosas. - Hidrocefalia: Congênita ou adquirida (pós-trauma, pós-meningite, pós-hemorragia), edema. - Abcessos/infecções: Acúmulo de secreção purulenta que forma uma cavidade. Pode ser complicação de sinusite, otite ou até mesmo endocardites. - Granulomas: Por toxoplasmose, por tuberculose, pacientes com HIV, neurocisticercose. - Encefalopatia metabólica: Insuficiência hepática aguda e hiponatremia aguda. - Pseudotumor cerebral ou hipertensão intracraniana benigna: Fazer diagnóstico diferencial com hipertensão intracraniana maligna. Quadro clínico - Tríade da hipertensão intracraniana: Cefaleia + Vômitos + Papiledema. - Cefaleia: Piora durante a noite (noturna). Paciente deita e dificulta o retorno venoso, aumentando a pressão intracraniana. Paciente acorda com dor holocraniana, de forte intensidade, compressiva, contínua, persistente, acompanhada de vômitos matinais. Costuma melhorar quando o paciente levanta após os episódios de vômitos. - Vômitos: São vômitos em jato (não precedidos de náuseas, enjoo e alimentação). Os vômitos são desencadeados por alterações centro específicas, por estiramento ou distorção do assoalho do IV ventrículo. O vômito decorrente do acúmulo de CO2 durante o sono alivia a cefaleia pela diminuição do edema cerebral que se segue à hiperventilação provocada pelo ato de vomitar. - Papiledema: O aumento da pressão intracraniana promove a dificuldade do retorno venoso, causando ingurgitamento venoso na retina (papiledema inicial). Depois ocorrem hemorragias de fundo de olho > Espasmo arterial > Pode fazer isquemia do nervo óptico > Borramento do nervo óptico. O papiledema não é visível no TCE agudo, é visível em pacientes que vêm desenvolvendo papiledema há algum tempo. - Então, essa é a tríade da HIC: Cefaleia, vômitos e papiledema. - É possível haver déficits motores, como a hemiplegia ou hemiparesia, alterações de personalidade e do nível de consciência. Fatigabilidade, apatia, irritabilidade, desatenção, indiferença, diminuição da espontaneidade, instabilidade emocional são mais frequentes nas neoplasias cerebrais. Com a evolução da HIC, surgem períodos de sonolência, rebaixamento do nível de consciência e coma. - Crises convulsivas: Mais precoces nos processos expansivos de rápida evolução e nos situados próximos ao córtex motor. - Pode ocorrer alterações de pares cranianos, como paresia do nervo abducente (o paciente tem diplopia, enxergando duplo), Síndrome de Parinaud (paresia do oculomotor, não move o reto superior), alterações pupilares também. - Pode ocorrer alterações posturais como a decorticação e a descerebração. - Decorticação: Ocorre a flexão dos membros superiores e extensão dos membros inferiores. - Descerebração: Ocorre a extensão dos 4 membros. - Macrocefalia: Em crianças com suturas ainda não soldadas, o aumento da PIC pode ser compensado de forma temporária pela disjunção progressiva das suturas. Lactentes com sinais de HIC costumam cursar com macrocefalia + desproporção craniofacial. - Tríade de Cushing (pacientes graves): Bradicardia + Alteração respiratória + Hipertensão arterial. - Na HIC grave pode haver o rebaixamento do nível de consciência e chegar até o estado de coma. Fenômenos responsáveis: Compressão unilateral ou bilateral do tálamo e do mesencéfalo (sistema reticular ascendente) e hipofluxo cerebral (pela redução da perfusão cerebral). Alterações respiratórias (Cheynes-Stokes, hiperpneia central) + Reflexo de Cushing: Hipertensão arterial e bradicardia = indicativos de HIC grave. O reflexo de Cushing tenta proteger o fluxo cerebral já que tenta elevar a PAM. Por isso que devemos ter muito cuidado ao tentar abaixar a PA, pois é um mecanismo reflexo, ela está elevada para preservar a função cerebral. - Hérnias cerebrais internas: São um desvio de alguma estrutura. É um efeito secundário da HIC. - Hérnia de úncus: É uma hérnia transtentorial descendente. Porque ela passa pelo tentório do cerebelo e vai para baixo. É o tipo de hérnia mais comum. Ocorre quando um aumento de volume do andar supratentorial, unilateral ou bilateral, força o cérebro para baixo através da incisura da tenda/tentório do cerebelo. Essa herniação pode causar um sulco deixado pela borda livre da tenda e pode comprimir o mesencéfalo e o nervo oculomotor. - Ainda sobre a hérnia de úncus, temos que saber que o úncus é a porção mais medial do lobo temporal, então, quando ocorre um aumento de volume na região temporal, ocorre a herniação da porção medialdo lobo temporal sobre o bordo livre da tenda. - Temos alguns sinais causados por essa herniação. Pode ocorrer dilatação da pupila (midríase) ipsilateral à hérnia, por compressão e paralisia do nervo oculomotor, deixando o paciente anisocórico. Esse é o primeiro sinal. O paciente pode ter dor de cabeça, obviamente; alteração do nível de consciência. Às vezes, essa compressão é tão grande que pode comprimir os dois nervos oculomotores, fazendo uma midríase bilateral. Pode fazer uma descerebração postural do lado oposto ao da midríase (extensão dos membros inferiores e superiores + adução, extensão e rotação interna dos ombros, cotovelos e punhos). Isso ocorre por lesão do trato piramidal. Outros sinais podem estar presentes, como hemiparesia, alteração da respiração, bradicardia e hipertensão. - Hérnia do giro do cíngulo (giro cingulado): Aumento de volume de um dos hemisférios cerebrais, ou compressão do mesmo por uma lesão expansiva. O hemisfério é empurrado para o lado oposto sendo parcialmente contido pela foice do cérebro. A porção mais próxima do corpo caloso, que inclui o giro do cíngulo, sofre herniação e pode comprimir a artéria cerebral anterior, gerando isquemia e agravando ainda mais a HIC. O infarto dos territórios das artérias cerebrais anteriores resulta em paresia de um ou de ambos os membros inferiores. - Hérnia de amígdala (tonsila cerebelar): Também conhecidas como foraminais ou tonsilares. Resulta do aumento do volume do conteúdo intracraniano, o que força o cerebelo e o tronco para baixo, na direção do forame magno. As amígdalas, a porção do cerebelo mais próxima do bulbo, insinuam-se pelo forame magno causando compressão bulbar e eventualmente parada respiratória, obstrução do trânsito do LCR ao nível do IV ventrículo, perda de força (tetraparesia) por compressão também da medula. Paciente pode ter queixa na região cervical. Comum em tumores em crianças (M. de Chiari). - Muito importante: É contraindicado fazer punção lombar em paciente que tiver HIC sem causa conhecida. A pessoa pode ter uma hérnia de amígdala e, ao realizar a punção lombar, o paciente pode descompensar e ter uma parada respiratória e vir a óbito. Figura 1 Hérnia de úncus - Deslocamento caudal do tronco cerebral: Quando se tem uma estenose do aqueduto cerebral (de Sylvius), o paciente pode fazer uma migração caudal. Geralmente causado por hidrocefalia e lesões expansivas supratentoriais. Às vezes, podem acontecer hemorragias pontinas. Inicialmente, por alteração da capacidade de concentração e da memória recente e, posteriormente, por alterações do nível de consciência, por aparecimento de pupilas pequenas (1-3 mm de diâmetro), e com reação à luz fraca e rápida, além de manifestações de lesão do trato piramidal (decorticação, geralmente). Outras manifestações são desvio conjugado rápido do olhar aos movimentos passivos de rotação da cabeça e alterações respiratórias (inspirações profundas com pausas ocasionais; muitos pacientes apresentam respiração do tipo Cheynes-Stokes). - Hérnia transtentorial ascendente: Menos frequente. Principal causa é iatrogenia. Lesão expansiva na fossa posterior, pelo gradiente de pressão entre esse compartimento anatômico, a fossa supratentorial e o espaço raquidiano, pode provocar deslocamento cerebelar em direção a tenda cerebelar. - Outras informações: Quando comprime o mesencéfalo, ocorre hiperventilação intracraniana. Lesões na ponte fazem respiração atáxica e pupilas puntiformes. Lesões no bulbo fazem respiração totalmente irregular (gasping) e pupilas fixas. Primeiro a pessoa tem dor de cabeça e depois vem a alteração do nível de consciência. Exames Complementares - Radiografia do crânio: Podemos ter sinais indiretos de hipertensão intracraniana. É importante conhecermos esses sinais, pois, às vezes, sem querer podemos chegar ao diagnóstico de HIC por meio de um raio-x. Sinal da prata batida: São impressões digitiformes no crânio causadas pela pressão das circunvoluções do cérebro no osso. Esse sinal pode indicar uma hipertensão intracraniana crônica. Absorção da porção clinóide posterior: Reabsorção óssea/erosão por conta do aumento da pressão. Diástase de suturas: Afastamento das suturas, indicando hipertensão intracraniana crônica. Ocorre em crianças e adultos jovens. Calcificações intracranianas: Sugestivas de alguns tumores. Também temos calcificações fisiológicas, da glândula pineal e plexos coroides. Por meio do raio-x também é possível verificar um desvio da glândula pineal e um aumento da sela túrcica do esfenoide. - Tomografia axial computadorizada: É um exame bastante rápido e com bastantes informações. Você pode visualizar a parte óssea, o tecido cerebral, a densidade e o LCR. Temos alguns achados como o desvio da linha média a nível do III ventrículo, dilatação ventricular e presença ou ausência dos espaços liquóricos (cisternas e ventrículos). É o exame de escolha, porém, para a fossa posterior (cerebelo) a tomografia não é muito boa. Então, em um paciente com náuseas e ataxia, é melhor uma ressonância. - Ressonância magnética nuclear: Como dito anteriormente, é melhor para analisar a fossa posterior. - Angiografia cerebral: Usados na suspeita de alterações arteriais. Por meio da injeção de contraste através das artérias teremos imagens que podem nos mostrar uma malformação arteriosa, ou um meningioma, que tem uma irrigação muito significativa. - Doppler transcraniano: Exame evolutivo para ver a perfusão/fluxo sanguíneo cerebral. Tratamento - Pode ser dividido em medidas gerais e medidas específicas. - Medidas gerais: Temos a proteção das vias aéreas, pois se o paciente está com Glasgow < 8 começa a obstruir as vias aéreas e ventilar mal, retendo CO2, gerando hipóxia e vasodilatação cerebral (piora ainda mais o quadro). Fazer sedação, relaxamento da musculatura para impedir vômitos e aspiração, e, em seguida, fazer rapidamente a intubação orotraqueal com a cânula de Guedel. Ventilação adequada é fundamental e a pessoa mais experiente do local deve iniciar o procedimento. Elevação da cabeceira (30 a 45º): Para favorecer o retorno venoso e diminuir a PIC. Posição neutra da cabeça: Para não comprimir as jugulares e aumentar o retorno venoso. Correção dos distúrbios hidroeletrolíticos: Eles podem agravar a HIC, principalmente a hiponatremia, portanto a hidratação sempre deve ser feita, procurando a manutenção da homeostase. - Agora vamos ver as medidas específicas do tratamento da HIC. - Redução da produção liquórica: Usar Acetazolamida. Se o paciente está com hidrocefalia. Usar um diurético ou inibidor da anidrase carbônica. É uma forma de “ganhar tempo” até que outros tratamentos específicos sejam providenciados. - Drenagem de LCR por via craniana: Casos de hidrocefalia extrema com hérnias. Fazer drenagem ventricular com cateter e deixar a pressão em torno de 20 mmHg que seria a pressão normal. Não fazer por via lombar! - Hiperventilação: Sedação > Analgesia potente > Relaxamento da musculatura > Ventilação mecânica em frequência respiratória elevada para eliminar o excesso de CO2 (deixar em torno de 30- 35 mmHg) e promover vasoconstrição > Diminuição da pressão intracraniana. Eficiente até o 3º ou 4º dia. Cuidar para não gerar uma hiperventilação tão intensa a ponto de a vasoconstrição gerar isquemia. - Diuréticos osmóticos: O Manitol é um fármaco hiperosmótico que aumenta a eliminação de água pela urina. Muito utilizado em casos de trauma com inchaço cerebral difuso. Não é muito útil para casos de hidrocefalia. - Barbitúricos (Tiopental): Diminui a atividade elétrica do cérebro (põe o cérebro para dormir) > Diminui metabolismo cerebral > Diminui edema. - Solução salina hipertônica: Funciona bem em um primeiro momento, porém gera muitos distúrbios hidroeletrolíticos, não sendo muito utilizado na prática. Não tem importância. - Hipotermia: Funcionaem alguns casos graves e refratários, como última opção. Coloca-se gelo perto da cabeça para diminuir o fluxo sanguíneo e o metabolismo cerebral. - Corticoide: Para casos específicos, como uma lesão tumoral com edema perilesional. - Neurocirurgia: Pode ser feita uma ventriculostomia com monitorização (tratamento precoce, deve- se retirar um pouco de líquor até que a pressão se regularize). Craniotomia descompressiva: Retira um pedaço do osso do crânio e deixa sem até que se reduza a PIC. Lobotomia: Conhecida também como descompressão interna, técnica agressiva, que nada mais é que a retirada dos locais que estão sendo afetados, “arranjando” espaço dentro do crânio. Retirada do tumor pode ser feita também. - Conclusão: A HIC é uma emergência médica, tendo a tríade de cefaleia + vômitos + papiledema. Nunca deve se realizar a punção lombar, e lembrar que a descompensação pode ser muito rápida. Casos clínicos - Caso clínico 1: Paciente do sexo feminino, branca, 33 anos. QP: Cefaleia. Exame físico: Escala de coma de Glasgow: 15, acordada, lúcida, papiledema bilateral, paresia facial à direita, com discreto apagamento do sulco nasolabial. À ressonância, tem uma enorme lesão, ao lado direito, com desvio da linha média. Nesse caso, provavelmente seria uma hérnia do giro do cíngulo. - Caso clínico 2: Paciente do sexo masculino, branco, 55 anos. QP: Sofreu TCE. Exame físico: Escala de coma de Glasgow 13, sem sinal focal motor. À ressonância, vemos que não tem desvio de linha média, mas temos uma lesão posterior. O paciente caiu, bateu a cabeça na região posterior, fez uma rotura de um ramo do seio sagital superior e fez esse hematoma. - Caso clínico 3: Paciente do sexo feminino, branca, 46 anos. QP: Cefaleia e anosmia. Exame físico: Papiledema, anosmia, hemiparesia à direita (área mais escura, edema perilesional, é o que dá a perda de força). À ressonância, isso é um glioma do nervo olfatório, tumor do nervo olfatório. - Caso clínico 4 (Sem imagem): Imagem de um cérebro em cirurgia, visualização de um projétil de arma de fogo, o cérebro está hiperemiado, presença de sangue no espaço subdural, subaracnóideo também. Paciente com TCE, tinha muito edema, foi feita uma craniotomia descompressiva, que é uma das maneiras de se tratar HIC, tira o crânio, ganha espaço. Com medidas terapêuticas, você diminui o inchado e depois recoloca o osso. - Caso clínico 5: Tumor de região mesencefálica, não tem hidrocefalia, mas é um grande potencial para desenvolver. - Caso clínico 6: Ao lado direito da imagem abaixo vemos uma tomografia normal. A linha média bem centrada, o plexo coroide, um de cada lado, na altura do terceiro ventrículo. Não se esqueçam de traçar a linha média. Às vezes tem desvio, hematomas, coleções podem desviar. Do lado esquerdo temos uma hidrocefalia, um aumento do tamanho dos ventrículos. Paciente com HIC. Essa paciente estava com queixa de dor de cabeça, com alteração leve da parte comportamental. Estava mais quieta. Ela emagreceu 15 kg, pois quando ia comer, tinha náuseas. Fizemos uma tomografia, tinha uma hidrocefalia enorme. Quando foi colocado um cateter, espirrou líquor, ou seja, a PIC estava enorme. Às vezes, tem variações do que o livro traz. Nem sempre é bem aquilo. - Caso clínico 7: Nesta imagem da direita, temos um hematoma subdural (circulado), causando uma HIC. Esse é um hematoma subdural crônico, pois vemos uma parte hipodensa (O) e uma hiperdensa (F). Porque não tem desvio de linha média? Porque estamos vendo o ventrículo bem na porção superior, aqui temos a foice, ela segura. Se formos ver em baixo da foice, vai ter um desvio de linha média grande. Aqui não corresponde bem à realidade. Para avaliar o desvio de linha média, devemos avaliar na altura do terceiro ventrículo. Na imagem da esquerda, temos uma coleção subdural. - Caso clínico 8: Aqui temos um hematoma intracerebral. Era um paciente hipertenso, faz um edema perilesional, área de hemorragia, desvio de linha média, já fazendo uma isquemia da parte posterior contralateral (imagem 1). Aqui já tem um edema perilesional depois de alguns dias (2). Reabsorvendo (3), reabsorveu (4) espontaneamente (ou não, após a cirurgia). - Caso clínico 9: É um meningioma. Qual a conduta? Glasgow 15, sem déficit motor. Geralmente esses tumores são de crescimento lento, o cérebro vai sendo complacente, deixa o tumor crescer. Normalmente tem crise convulsiva. Corticoide, anticonvulsivante, diurético, cabeceira elevada, até que seja encaminhado para cirurgia. - Caso clínico 10: Hematoma subdural crônico. Paciente com Glasgow 15, somente hemiparesia. Enorme desvio da linha média. Faz cirurgia de hematoma subdural agudo. “Quando estivermos em frente a um paciente com HIC, temos que ter um comprometimento muito grande, devemos ser proativos, fazer um encaminhamento adequado. Não somos nós que vamos resolver, mas devemos fazer o mais adequado para alguém resolver. Para isso descompensar, é muito rápido. A partir do momento que vocês fazem o diagnóstico de maneira adequada, isso é o fundamental. Devemos ser bons médicos, comprometidos com o paciente.”
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