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Vasculites sistêmicas (Capítulo de Livro)

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5.1 INTRODUÇÃO
As vasculites sistêmicas formam um grupo de doenças heterogêneas que
apresentam, em comum, um processo inflamatório na parede vascular, podendo
levar à diminuição de sua luz e trombose secundária ou à ruptura de sua parede e
consequente sangramento.
A maioria das vasculites sistêmicas inicia-se com sintomas constitucionais
inespecíficos, que podem ser confundidos com uma série de outras doenças,
dificultando muito o diagnóstico.
Sem tratamento, muitos dos pacientes com vasculites sistêmicas evolui para óbito.
O tratamento controla os sintomas e pode levar a remissões prolongadas.
As vasculites primárias possuem baixa incidência na população. No que diz respeito
à faixa etária de acometimento, esta varia conforme o tipo de vasculite. Por exemplo,
a púrpura de Henoch-Schönlein predomina em crianças, a arterite de Takayasu em
adultos com idade inferior a 40 anos, e a arterite de células gigantes é predominante
em adultos acima de 60 anos. Ainda não foi identificado fator etiológico comum,
porém, se sabe que os vírus das hepatites B e C possuem correlação com vasculites,
em especial, a poliarterite nodosa e a vasculite por crioglobulinas, respectivamente.
Além disso, especula-se que diversos agentes microbianos ou ambientais, como o
citomegalovírus ou o estreptococo, podem ocasionalmente desencadear vasculite.
De maneira ampla, todos os sintomas que são causados pelas vasculites decorrem
de oclusão de vasos com sofrimento a jusante. Com a destruição dos vasos, pode
ocorrer também extravasamento de elementos do sangue para os tecidos
adjacentes. Quando os vasos estão expostos ao ambiente, como nos vasos dos
capilares pulmonares, ocorrem síndromes hemorrágicas. A caracterização das
síndromes vasculíticas depende da compreensão desse mecanismo fisiopatológico
elementar.
Uma vez compreendido o mecanismo básico, toma-se como regra geral que as
vasculites nada mais são do que síndromes isquêmicas. A manifestação clínica
dependerá, então, do tamanho do vaso que está comprometido. É justamente por
essa razão que as classificações de vasculites, sendo a última a do Consenso de
Chapel Hill de 2012 (2012 Revised International Chapel Hill Consensus Conference
Nomenclature of Vasculitides, 2013), tomam como base o tamanho do vaso
acometido (Figura 5.1).
 
Quais são os principais grupos de síndromes
clínicas que sugerem vasculite sistêmica?
Figura 5.1 - Classificação atual das vasculites primárias
 
Fonte: adaptado de Pathogenesis of antineutrophil cytoplasmic autoantibody-mediated
disease, 2014.
Por um segundo prisma, pode-se observar as vasculites pelo mecanismo
fisiopatológico de doença. Para tanto, lança-se mão da compreensão das vias da
autoimunidade que possam estar doentes. Como toda autoimunidade, as vasculites
sistêmicas possuem desregulação relevante nas vias de sinalização linfocitária,
especialmente nas vias Th1 e Th17. Como discutido no capítulo Noções gerais de
imunologia, uma disfunção destas vias pode gerar, no polo mais Th1, ativação e
recrutamento de fagócitos aos tecidos, com inflamação e destruição tecidual, e
formação de granulomas. Por outro lado, disfunções mais Th17 podem gerar
sensibilização dos fagócitos às opsoninas, inflamação tecidual direta e produção de
anticorpos com deposição de imunocomplexos em circulação terminal.
#importante
Quando usadas nessa terminologia de maneira
isolada — “vasculites sistêmicas” —, entende-se que
tratam-se de disfunções primordialmente imunes,
sem outra causa atribuível envolvida. Diz-se,
igualmente, tratarem-se de vasculites primárias.
Quando se associa ao tamanho do vaso a fisiopatologia envolvida no processo,
emergem padrões fenotípicos de doença. Se imaginarmos os vasos de grande
calibre, por exemplo, concluiremos que o ataque imune raramente será capaz de
ocluí-los de uma só vez, de tal forma que as síndromes relacionadas aos vasos
grandes serão compostas por isquemia progressiva de segmentos corporais inteiros
ou de órgãos completos — pois um grande vaso origina dezenas de vasos menores
que nutrem todo um segmento ou órgão. De fato, as vasculites de grandes vasos
acometem preferencialmente aorta e seus ramos, com sintomas de cefaleia,
claudicação de mandíbula e membro superior e insuficiência renal renovascular. Daí
emerge o nosso primeiro padrão fenotípico: síndromes oclusivas de vasos grandes e
nomináveis — ou seja, que são grandes o bastante para receberem um nome
individual.
Prosseguindo para vasos menores, entraremos em um universo misto de vasos
ainda nomináveis, mas, preferencialmente, de vasos macroscópicos, porém, não
nominados. Estes vasos têm importância em conjunto, pois nutrem um segmento de
um órgão, mas perdem importância individualmente – como ocorrem ramificações
progressivas dos vasos para os segmentos orgânicos, raramente se nomina
gerações acima da terceira ou quarta ramificações vasculares. Os principais
exemplos de vasos de médio calibre, ou seja, vasos que nutrem um segmento de um
órgão, são as coronárias, os vasos das extremidades digitais, os vasa nervorum —
vasos que nutrem os nervos — e os vasos esplâncnicos. Assim sendo, revela-se um
segundo padrão fenotípico: síndromes oclusivas segmentares de órgãos e tecidos,
incluindo as neurites isquêmicas. As vasculites de médios vasos geralmente
acometem porções dos rins, porções do coração e porções das extremidades, com
grande tendência à neuropatia.
Por fim, resta o grande universo das vasculites de pequenos vasos. Esses vasos são
microscópicos e nutrem a microestrutura dos órgãos. Como são vasos muito
pequenos, a reação imune rapidamente os destrói e causa extravasamento de
sangue. Na pele, o extravasamento se manifesta como púrpura palpável; no pulmão,
como hemorragia alveolar; e, nos glomérulos, como glomerulonefrite. Fecham-se,
assim, as principais manifestações clínicas dos pacientes com vasculites.
#importante
De maneira bastante universalista, vasculites
sistêmicas cursarão com um ou mais das seguintes
manifestações: oclusão de vasos grandes, oclusão de
vasos macroscópicos não nomináveis — causando,
entre outros, neurite —, púrpura palpável,
glomerulonefrite e capilarite pulmonar — com
provável hemorragia alveolar.
Tendo em vista a fisiopatologia envolvida, deve-se sempre considerar, também, que
as vasculites não são processos necessariamente primários, no sentido de que
outras doenças podem causar autoimunidade dirigida contra o vaso. Os principais
exemplos são as infecções, as neoplasias, as reações às drogas e as doenças
autoimunes — especialmente as conectivopatias. Em todas estas situações, uma
grande carga de anticorpos associada à condição primária pode eventualmente
depositar nos vasos e causar destruição vascular. Diz-se, nestes casos, que se trata
de vasculite secundária.
#importante
Não é uma definição universal, mas, de uma maneira
geral, quadros com alterações hematológicas muito
relevantes, especialmente citopenias, sugerem mais
causa secundária de vasculite.
Tomando como base, especialmente a classificação internacional de Chapel Hill
(2012 Revised International Chapel Hill Consensus Conference Nomenclature of
Vasculitides, 2013), esta obra agora se deterá em explorar cada um dos grandes
grupos de vasculites sistêmicas e as suas principais formas secundárias associadas.
5.2 VASCULITES DE GRANDES VASOS
As vasculites de grandes vasos possuem forte componente Th1 e Th17 e, como dito
anteriormente, tendem a ocluir lentamente os grandes vasos do corpo —
especialmente aorta e seus ramos. Como o bloqueio de citocinas relacionadas à
resposta Th17, como a IL-6, parece controlar a doença (2018 Update of the EULAR
recommendations for the management of large vessel vasculitis, 2019), é possível
que seja o mecanismo predominante. A presença Th1 na fisiopatologia das
vasculites de grandes vasos, porém, as torna doenças com presença de granulomas
vasculares. Na análise patológica dos pacientes, o achadomais típico, será, portanto,
o de invasão das camadas vasculares por infiltrados organizados de linfócitos e
macrófagos. São duas as vasculites de grande calibre de interesse: a artrite de
células gigantes e a arterite de Takayasu.
5.2.1 Arterite de células gigantes
A arterite de células gigantes (ACG), outrora conhecida como arterite temporal,
ocorre exclusivamente em indivíduos acima dos 50 anos, com aumento da
incidência conforme a idade. É duas vezes mais frequente em mulheres do que em
homens. De causa desconhecida, afeta, primariamente, ramos extracranianos das
carótidas. O arco aórtico também pode ser acometido, em especial, os ramos
proximais dos membros superiores.
Trata-se de uma panarterite, já que todas as camadas da parede arterial são
acometidas por um infiltrado inflamatório constituído por células T e macrófagos. O
infiltrado pode ser granulomatoso, com acúmulo de histiócitos e células gigantes
multinucleadas.
#importante
Diferentemente da arterite de Takayasu — abaixo de
40 anos —, a arterite temporal tem início após 50
anos.
As manifestações mais comuns são sintomas constitucionais , como fadiga, perda
de peso, febre e mialgia. Após os sintomas constitucionais, a cefaleia é o sintoma
mais comum da ACG, classicamente descrita como dor moderada a intensa no
território da artéria temporal, que pode estar espessada (Figura 5.2) ou dolorida.
Os sintomas visuais são comuns — 20% dos casos (Giant cell arteritis: disease
patterns of clinical presentation in a series of 240 patients, 2005) —, com eventual
evolução para perda visual ou diplopia. A perda visual é a complicação mais temida,
geralmente precedida por episódios de borramento visual ou amaurose fugaz,
estabelecendo-se alguns meses após o início dos sintomas sistêmicos. Reflete
neuropatia óptica anterior isquêmica (NOIA) e pode ser prevenida pelo tratamento
com doses altas de corticoide. A diplopia acontece por oftalmoplegia — paralisia dos
nervos motores devido à isquemia.
Pode ocorrer claudicação intermitente da mandíbula e da língua pela isquemia dos
músculos da mastigação, sintoma mais específico de ACG. Também é possível
claudicação dos membros superiores por arterite em artérias braquiais.
#importante
Neurite óptica isquêmica anterior (NOIA) é a
principal causa de perda visual na arterite de células
gigantes. Como a avaliação do fundo de olho, em
geral, é alterada nos casos de NOIA, um bom exame
físico oftalmológico é um divisor de águas.
Figura 5.2 - Espessamento da artéria temporal em paciente com arterite de células gigantes
 
Frequentemente, a ACG se manifesta de maneira muito semelhante à polimialgia
reumática (PMR) — ver capítulo Doenças sistêmicas do tecido conectivo — com dor
e rigidez nos músculos do pescoço, nas cinturas escapular e pélvica, associada a
sinais de inflamação sistêmica, como fadiga, perda de peso, sudorese e febre baixa,
além de anormalidades laboratoriais, como aumento da velocidade de
hemossedimentação (VHS), da Proteína C Reativa (PCR) e anemia. Cerca de 30 a
50% dos pacientes com ACG possuem uma síndrome clínica inicial que lembra
muito a PMR, sendo o diagnóstico verdadeiro só obtido com a evolução desfavorável
— incomum na PMR —, com a documentação de acometimento vascular ou com o
aparecimento de outras formas clínicas de ACG (Giant cell arteritis and polymyalgia
rheumatica: current challenges and opportunities, 2017).
A elevação das proteínas de fase aguda é um achado típico e auxilia no diagnóstico e
no seguimento dos pacientes após o tratamento: a VHS encontra-se elevada, acima
de 50 mm na primeira hora. Outras provas de fase aguda podem estar alteradas.
Fator antinúcleo (FAN) e Fator Reumatoide (FR), em geral, são negativos.
O diagnóstico de ACG deve ser considerado a pacientes acima de 50 anos com
história inexplicada de cefaleia, sinais de isquemia em território vascular
extracraniano, perda da visão ou síndrome clínica semelhante à PMR associada à
evidência laboratorial de inflamação — aumento de proteínas de fase aguda. Como
exame complementar disponível, há a ultrassonografia com Doppler de artéria
temporal, que classicamente demonstrará o sinal “do halo” — edema no interior do
vaso sanguíneo. Em pacientes com quadro clínico clássico e ultrassonografia
positiva, o histopatológico não se faz necessário. A biópsia da artéria temporal, o
padrão-ouro para o diagnóstico, pode ser realizada para confirmação diagnóstica em
casos duvidosos. Recomenda-se biópsia unilateral de segmento com 2 cm de artéria
temporal em até duas semanas após o início do tratamento. Caso seja negativa,
pode-se realizar a biópsia da artéria contralateral, porém, os exames não devem
retardar o tratamento. Os exames de imagem, muitas vezes, são necessários e
constituem importante método diagnóstico. Entre os principais exames de imagem
disponíveis para o diagnóstico do comprometimento extracraniano na ACG,
podemos citar angiotomografia de aorta e/ou angiorressonância de aorta.
É fundamental que o tratamento seja iniciado precocemente na suspeita do
diagnóstico. Para tanto, recomenda-se prednisona em doses de até 1 mg/kg, com
redução lenta e progressiva. Na vigência de quadro ocular, deve-se proceder
rapidamente com pulsoterapia com metilprednisolona, 1 g/d, por 3 dias, para evitar
amaurose definitiva; após a pulsoterapia, o tratamento com corticoide é semelhante.
A maioria dos pacientes responde bem ao corticoide, mas pode haver recidiva ou
corticodependência. Nesses casos, podem ser utilizadas drogas imunossupressoras,
como metotrexato ou inibidor de IL-6 (2018 Update of the EULAR recommendations
for the management of large vessel vasculitis, 2019). Sintomas de inflamação
sistêmica e provas de atividade inflamatória, como VHS ou PCR, são úteis na
detecção de recidivas e má resposta.
Baixas doses de ácido acetilsalicílico (AAS) eram indicadas para reduzir o risco
vascular, mas as recomendações mais recentes do European League Against
Rheumatism (EULAR) excluíram essa medida (2018 Update of the EULAR
recommendations for the management of large vessel vasculitis, 2019), sendo usada
apenas para pacientes que já tinham outras indicações de ácido acetilsalicílico.
5.2.2 Arterite de Takayasu
A arterite de Takayasu, também conhecida como doença sem pulsos — pulseless
disease —, tem predomínio entre mulheres — relação 10:1 —, e seu início ocorre entre
15 e 40 anos — doença de adolescentes e adultos jovens.
É uma poliarterite granulomatosa, com formação de granulomas e células gigantes,
que podem destruir a camada média e substituí-la por tecido fibrótico. O processo
pode enfraquecer a parede do vaso, favorecendo a formação de aneurisma, ou
proliferá-la, provocando o estreitamento da luz arterial.
Pode acometer a aorta e quaisquer de seus ramos, bem como as artérias
pulmonares. Até 10% dos pacientes são assintomáticos ao diagnóstico.
Aproximadamente 40% dos pacientes apresentam sinais e sintomas inflamatórios,
como febre, sudorese noturna, fadiga, mialgia, anorexia e perda de peso. Os
sintomas mais sugestivos, entretanto, são dor à palpação de trajetos vasculares —
por exemplo, a carotidínea —, claudicação de extremidades, diminuição de pulsos,
diferença de pressão entre os membros e presença de sopros vasculares.
Comprometimento de territórios nobres podem culminar com angina cardíaca ou
mesentérica, acidente vascular encefálico ou acidente isquêmico transitório e
hipertensão renovascular.
Os exames de imagem, como arteriografia (Figura 5.3), angiotomografia e
angiorressonância fornecem informações sobre o lúmen dos vasos, a distribuição e
a gravidade da doença.
Figura 5.3 - Arteriografia que mostra dilatação do arco aórtico e múltiplas estenoses em
carótidas e, especialmente, em artérias subclávias
 
Fonte: Justin Ly.
As imagens vasculares são fundamentais para o diagnóstico, sendo a arteriografia
reservada para procedimentos cirúrgicos.
O diagnóstico diferencial é amplo e difícil,necessitando de minuciosa investigação
laboratorial e de imagem. Devemos excluir arterite de células gigantes —
compromete indivíduos com mais de 50 anos —, doença de Kawasaki, doenças
vasculares congênitas, aterosclerose, entre outras.
Corticosteroide é a terapia de escolha no tratamento da arterite de Takayasu, na
dose de 1 mg/kg de prednisona ou equivalente para controle inflamatório da doença,
com posterior desmame da medicação. A última diretriz do EULAR recomenda
associação de imediato com imunossupressores, como o metotrexato (2018 Update
of the EULAR recommendations for the management of large vessel vasculitis,
2019).
Em casos de estenose ou formações aneurismáticas, cirurgia e angioplastia são
importantes no tratamento da arterite de Takayasu.
5.3 VASCULITES DE MÉDIOS VASOS
As vasculites de médios vasos acometem artérias de calibre intermediário e cursam
com sofrimento orgânico segmentar. Possuem como principal fisiopatologia o
ataque direto aos vasos sanguíneos por células inflamatórias, especialmente por
neutrófilos e macrófagos. O ataque à parede do vaso é intenso, com perda da
estrutura muscular e substituição por tecido cicatricial fibrinoide. Nas regiões de
cicatrização, ocorre abaulamento da parede vascular e formação de aneurismas e
microaneurismas.
A presença de microaneurismas renais e aneurismas coronarianos sugere vasculite
de médios vasos.
Os órgãos mais acometidos pelas vasculites de médio calibre são o coração, as
extremidades, o rim e os nervos. As suas duas principais representantes são a
poliarterite nodosa e a doença de Kawasaki.
5.3.1 Poliarterite nodosa
A poliarterite nodosa (PAN) é uma forma de vasculite que afeta artérias de médio e
pequeno calibres. Pode surgir em qualquer idade, mas o pico ocorre entre 40 e 50
anos, sendo três vezes mais comum em homens do que em mulheres. Vacinas ou
infecções podem estar relacionadas ao desencadeamento da doença. Em 30% dos
casos, associa-se à infecção por hepatite B e C, apresentando melhora após o
tratamento do quadro, quando possível. Acomete mais comumente rins, trato
gastrintestinal e sistema nervoso central.
Como dito anteriormente, o comprometimento inflamatório da parede arterial leva à
formação de aneurismas. A imagem à arteriografia de segmentos de várias artérias
com abaulamentos em suas paredes originou o nome da doença (Figura 5.4).
Caracteristicamente, as lesões histológicas estão em diferentes estágios de
evolução, acompanhadas de necrose fibrinoide, ausência de granulomas e presença
de aneurismas da parede arterial.
Figura 5.4 - Arteriografia renal em paciente com poliarterite nodosa
 
Nota: observar aneurismas saculares intraparenquimatosos em artérias de médio calibre.
A doença costuma começar com queixas vagas, febre baixa e emagrecimento. As
lesões cutâneas incluem nódulos subcutâneos (Figura 5.5), livedo reticularis (Figura
5.6), úlceras vasculíticas (Figura 5.7) e gangrena digital. A PAN cutânea é uma
variante da PAN clássica, em que só a pele é acometida, sem envolvimento visceral.
Mais de 80% dos pacientes têm neuropatia periférica por vasculite, tipicamente uma
mononeurite múltipla, que afeta nervos específicos, com frequência, os nervos
fibular, tibial, ulnar, mediano e radial, levando a sintomas e sinais nas extremidades
distais, como pé e mão caídos (Figura 5.8). O acometimento de vasos mesentéricos
leva à manifestação clássica de angina intestinal: dor periumbilical pós-prandial.
Pode haver perfuração ou isquemia do intestino, com sangramento intestinal
maciço. Envolvimento renal, presente universalmente nas autópsias, pode provocar
insuficiência renal e hipertensão. Orquiepididimite também é possível. Lesões
cardíacas podem levar a infarto do miocárdico e falência cardíaca congestiva, mas,
em geral, são subclínicas.
A PAN costuma poupar o leito arterial pulmonar.
Figura 5.5 - Nódulos subcutâneos em paciente com poliarterite nodosa
 
Fonte: site Logical Images.
Figura 5.6 - Livedo reticularis em paciente com poliarterite nodosa
 
Fonte: ABC of Rheumatology, 2009.
Figura 5.7 - Úlcera cutânea em paciente com poliarterite nodosa
 
Fonte: Livedo reticularis ulcerado em paciente com anticorpo anticardiolipina tipo IgA, 2005.
Figura 5.8 - Mão caída por acometimento do nervo radial em paciente com poliarterite nodosa
 
Quanto às alterações laboratoriais, as mais encontradas são leucocitose, elevação
da VHS e anemia discreta. FR e FAN podem estar presentes em títulos baixos, mas é
uma doença tipicamente soronegativa.
Para o diagnóstico, entretanto, é necessário excluir outras doenças sistêmicas
infecciosas, neoplásicas ou inflamatórias. Para a confirmação por achados mais
específicos de PAN, biópsias mostrando a vasculite necrosante em parede arterial
podem ser realizadas em lesões cutâneas, músculos ou nervos. Os microaneurismas
podem ser demonstrados em angiografias renais ou mesentéricas.
#importante
São associações fortemente sugestivas de PAN:
livedo, mononeurite múltipla, dor muscular e perda
da função renal com hipertensão em paciente com
provas de atividade inflamatória elevadas.
No diagnóstico diferencial dessa patologia, entram as demais vasculites sistêmicas
— granulomatose com poliangiite, Wegener; granulomatose com poliangiite e
eosinofilia, Churg-Strauss —, além das pseudovasculites, como ateroembolismo,
linfoma, neurofibromatose, displasia fibromuscular, pseudoxantoma elástico,
amiloidose, mixoma atrial, coarctação de aorta, síndrome de Sweet, sepse,
endocardite, calcifilaxia, púrpura trombocitopênica trombótica, síndrome de Ehlers-
Danlos, síndrome do desfiladeiro torácico etc.
O tratamento da PAN idiopática — primária, não associada ao vírus da hepatite B —
inclui corticoide em altas doses e terapia com imunossupressor – por exemplo,
azatioprina ou ciclofosfamida (Rheumatology Secrets, 2015). No caso de PAN
associada ao vírus B, é requerido o tratamento antiviral. A plasmaférese também é
uma opção nessas situações.
5.3.2 Doença de Kawasaki
A doença de Kawasaki, também conhecida como síndrome linfonodo-mucocutânea,
é uma doença aguda, febril, exantemática e de etiologia desconhecida. Trata-se de
vasculite aguda e multissistêmica, que compromete vasos predominantemente de
médio calibre. Predomina no sexo masculino, em crianças menores de 5 anos, sendo,
na maioria das vezes, autolimitada.
A doença de Kawasaki pode causar vasculite em vários órgãos e aparelhos, como
pulmão, intestino, vesícula biliar, sistema nervoso central, entre outros, porém, o
comprometimento cardíaco é o mais significativo, com formação de aneurismas
coronarianos.
É de ocorrência universal e atinge todas as faixas etárias pediátricas, ainda que 85%
dos casos acometam crianças com menos de 5 anos, sendo infrequente em
pacientes com menos de 6 meses ou mais de 8 anos, nos quais, entretanto, há maior
risco de formação de aneurismas coronarianos.
Sua causa permanece desconhecida, apesar das características clínicas — doença
febril autolimitada — e epidemiológicas — sazonalidade e caráter epidêmico —
favorecerem a hipótese de um agente infeccioso ser o determinante causal,
hipótese que, entretanto, ainda não está comprovada.
As alterações histológicas precoces mostram infiltrado inflamatório macrofágico,
síncrono e circunferencial nas paredes dos vasos. Após alguns dias, a inflamação
reduz e o processo cicatricial gera a formação de aneurismas (Kawasaki disease:
basic and pathological findings, 2013).
A doença de Kawasaki é dividida em três fases clínicas distintas: aguda, subaguda e
de convalescença. A fase aguda dura de uma a duas semanas e caracteriza-se por
febre, conjuntivite, hiperemia de mucosas, linfadenopatia e rash cutâneo. Outros
achados clínicos podem estar associados, como miocardite, derrame pericárdico,
meningite asséptica (10 a 25%), diarreia (15%), disfunção hepática (5%), uveíte (17%)
e artrite e/ou artralgia (30%).
A fase subaguda inicia-se quando a febre, o rash e alinfadenopatia cessam, em
média, de uma a duas semanas depois do início da doença. A duração dessa fase é
de cerca de quatro semanas, na qual ocorrem descamação periungueal (Figura 5.9),
trombocitose, formação de aneurismas coronarianos e risco maior de morte súbita.
Complicações neurológicas também podem surgir em 1% dos casos e incluem
paralisia do nervo facial, ataxia, encefalopatia, hemiplegia e infarto cerebral.
Figura 5.9 - Descamação palmoplantar em paciente com doença de Kawasaki
 
Fonte: Doença de Kawasaki, 2009.
A fase de convalescença inicia-se quando os sinais clínicos desaparecem e dura até
a normalização da VHS, em média de seis a oito semanas após início do quadro febril.
Na doença de Kawasaki, a febre, sinal característico da fase aguda da doença, é, em
geral, acima de 39 a 40 °C e remitente. O primeiro dia de febre é considerado o
primeiro dia de doença, no entanto, alguns pacientes ocasionalmente apresentam
outras manifestações clínicas antecedendo o quadro febril. A febre dura, em média,
de uma a duas semanas, podendo, na ausência de tratamento, estender-se até três a
quatro semanas, e tem resposta apenas parcial ao uso de antipiréticos. Porém, ao se
iniciar a terapêutica apropriada — imunoglobulina intravenosa e ácido acetilsalicílico
—, a febre cessa em dois dias.
A conjuntivite (Figura 5.10) bilateral não exsudativa envolve, principalmente, a
conjuntiva bulbar em relação às conjuntivas palpebral e tarsal; é indolor e ocorre na
fase aguda da doença. A iridociclite pode acompanhar o quadro clínico, com rápida
resolução, e é raramente associada à fotofobia.
Figura 5.10 - Conjuntivite em paciente com doença de Kawasaki
 
As alterações vistas na mucosa labial são caracterizadas por eritema, edema com
fissuras, descamação e exsudação; a mucosa orofaríngea apresenta-se com
enantema, e a língua, com eritema intenso e papilas gustativas proeminentes, o
chamado aspecto framboesiforme (Figura 5.11).
Figura 5.11 - Língua com aspecto framboesiforme em menor com doença de Kawasaki
 
Fonte: Natr, 2011.
O rash cutâneo que surge no paciente é polimórfico, não pruriginoso e geralmente
aparece até o quinto dia de febre. O exantema cutâneo pode compreender lesões
maculopapulares eritematosas e difusas (Figura 5.12), a forma mais comum, além de 
rash tipo urticariforme, escarlatiniforme, eritrodérmico, purpúrico, eritema
multiforme-like e, mais raramente, com micropústulas em superfície extensora dos
membros.
Figura 5.12 - Intenso eritema labial e rash maculopapular na face de criança com doença de
Kawasaki
 
Fonte: Cardiovascular Lesions of Kawasaki Disease: From Genetic Study to Clinical
Management, 2012.
As manifestações cardíacas podem ser exacerbadas na fase aguda da doença,
conferindo aumento na mortalidade e na morbidade. Pode haver miocardite,
pericardite, endocardite, além de comprometimentos valvular e coronariano com
repercussão hemodinâmica. Ao exame, pode haver precórdio hiperdinâmico,
taquicardia, sopro pansistólico em caso de regurgitação mitral significativa e ritmo
“de galope”, devido à instalação de insuficiência cardíaca. O dano coronariano pode
variar de dilatação a estenose, até a formação de aneurisma. A frequência do
envolvimento coronariano é maior nos lactentes com menos de 6 meses em relação
àqueles de 6 a 12 meses. Os aneurismas fusiformes e saculares aparecem de 18 a 25
dias depois de instalada a doença (Figura 5.13).
Figura 5.13 - Arteriografia evidenciando aneurisma da artéria coronária esquerda
 
Outras possíveis manifestações incluem poliartrites e rabdomiólise. Pelo
comprometimento cardiovascular, é possível o achado de aneurismas coronarianos,
miocardite, pericardite e regurgitação valvar. Pacientes com comprometimento
gastrintestinal evoluem com dor abdominal e diarreia, colangite, pancreatite e ascite.
O comprometimento pulmonar apresenta-se como quadros influenza-like ou
derrames pleurais. O paciente pode evoluir ainda com cistite e prostatite. Na
presença de sintomas neurológicos, podemos encontrar quadros de meningites
assépticas e surdez neurossensorial.
#importante
Na doença de Kawasaki, há conjuntivite bilateral não
exsudativa, edema labial com fissuras, língua “em
framboesa”, rash cutâneo polimórfico,
maculopapular eritematoso e difuso e envolvimento
cardíaco, com formação de aneurismas
coronarianos.
São fatores de risco para surgimento de aneurismas: sexo masculino, idade abaixo
de 1 ano, febre recorrente apesar do tratamento, aumento de VHS, anemia e
hipoalbuminemia, trombocitopenia e hiponatremia.
Recentemente, a American Heart Association apresentou critérios para
complementar os critérios originais propostos por Tomisaku Kawasaki (Diagnosis,
Treatment, and Long-Term Management of Kawasaki Disease: A Scientific
Statement for Health Professionals From the American Heart Association, 2017),
tornando possível, teoricamente, o diagnóstico de formas incompletas da doença.
Assim, pacientes com febre alta de início abrupto presente por cinco ou mais dias
preenchem critério se apresentarem quatro ou mais dos seguintes achados:
• Conjuntivas oculares hiperemiadas;
• Alterações da cavidade oral, incluindo eritema, secura, mucosa e orofaringe
hiperemiada;
• Alterações nas extremidades distais dos membros, incluindo rubor e edema
endurado das mãos e dos pés e descamação periungueal;
• Exantema eritematoso polimorfo — morbiliforme, escarlatiniforme, maculopapular,
eritema marginado —, propagando-se das extremidades para o tronco e durando
cerca de uma semana;
• Aumento não supurado dos linfonodos cervicais.
Pacientes que não preenchem critério e possuem alta suspeita, podem, então, ser
avaliados para os critérios de Kawasaki incompletos:
Quadro 5.1 - Critérios diagnósticos propostos pela American Heart Association para doença de
Kawasaki incompleta
 
Fonte: adaptado de Diagnosis, Treatment, and Long-Term Management of Kawasaki Disease: A
Scientific Statement for Health Professionals From the American Heart Association, 2017.
Laboratorialmente, observam-se aumento da VHS ou PCR, leucocitose e
trombocitose caracteristicamente a partir da segunda semana de doença. Podemos
ainda evidenciar hipoalbuminemia, aumento moderado de transaminases, piúria
estéril, hiponatremia e líquido sinovial com leucocitose. O liquor demonstra
pleocitose com predomínio de mononucleares.
O diagnóstico diferencial inclui síndrome de Stevens-Johnson, farmacodermias,
exantemas virais, artrite reumatoide juvenil, síndrome da pele escaldada, síndrome
do choque tóxico e linfadenites cervicais bacterianas.
A imunoglobulina intravenosa é o principal medicamento na doença de Kawasaki,
sendo utilizada na fase aguda, preferencialmente nos primeiros 10 dias da doença.
Deve-se utilizar a dose de 2 g/kg, em infusão única, durante período de 10 a 12 horas,
associada ao ácido acetilsalicílico na dose de 30 a 100 mg/kg/d. Na fase aguda, o
ácido acetilsalicílico é utilizado dividido em 4 tomadas diárias para potencializar o
efeito anti-inflamatório da imunoglobulina intravenosa, porém, não diminui a
frequência de anormalidades coronarianas. O tempo de uso do ácido acetilsalicílico
em altas doses varia, sendo, em geral, reduzido à dose de 3 a 5 mg/kg/d, após um
período de 48 a 72 horas afebril. Essa nova dose é mantida por 4 a 6 semanas
(Diagnosis, Treatment, and Long-Term Management of Kawasaki Disease: A
Scientific Statement for Health Professionals From the American Heart Association,
2017). Para crianças com anormalidades cardíacas, o ácido acetilsalicílico é mantido
até a melhora.
5.4 VASCULITE DE PEQUENOS VASOS
As vasculites de pequenos vasos acometem vasos microscópicos e aparelhos
relacionados à microestrutura dos órgãos, como o aparelho glomerular e a interface
alveolocapilar. O mecanismo envolvido nas vasculites de pequenos vasos é amplo,
mas, de maneira geral, é mais relacionado às vias Th17, com produção de anticorpos
ou inflamação tecidual direta.
Quandohá grande produção de anticorpos voltados contra antígenos que são
disponíveis em circulação, ocorre formação de imunocomplexos circulantes e
deposição vascular com vasculite como consequência; neste caso, teremos
vasculite por imunocomplexos, um dos subgrupos de vasculite de vasos de pequeno
calibre.
Quando não há grande produção de anticorpos, ou quando os anticorpos produzidos
não encontram os seus antígenos prontamente disponíveis na circulação – como é o
caso do citoplasma neutrofílico (Overview of the Pathogenesis of ANCA-Associated
Vasculitis, 2015) –, ocorre ataque direto ao vaso sanguíneo, com infiltração
fagocitária e destruição vascular. Neste subgrupo, encontram-se as vasculites ditas
pauci-imune, ou seja, com lesão não relacionada à deposição de imunocomplexos.
Nas vasculites relacionadas ao anticorpo anticitoplasma de neutrófilo (ANCA), ainda
há mais mecanismos, como hiperativação Th1 com formação de granulomas e
hiperativação Th2 com recrutamento de eosinófilos.
Assim sendo, as vasculites relacionadas ao ANCA possuem uma das fisiopatologias
mais ricas e intrigantes da Reumatologia, com inúmeras perguntas ainda não
respondidas.
5.4.1 Vasculites relacionadas aos ANCA
Como dito, as vasculites pauci-imunes são assim chamadas porque o mecanismo de
dano à parede vascular não se faz por meio de depósitos de imunocomplexos à
histologia. Isso as difere das vasculites por imunocomplexos.
São ditas relacionadas ao ANCA porque a maioria dos pacientes com vasculite de
pequenos vasos pauci-imune apresenta anticorpos contra determinadas proteínas
específicas encontradas dentro dos grânulos citoplasmáticos dos neutrófilos. Há
dois padrões clássicos de ANCA pela imunofluorescência: o citoplasmático (c-ANCA)
e o perinuclear (p-ANCA). Um padrão atípico, quando não há c-ANCA nem p-ANCA,
também foi descrito.
Por método ELISA (enzyme-linked immunosorbent assay), podemos encontrar
anticorpos antiproteinase-3 (anti-PR3) e antimieloperoxidase de neutrófilos (anti-
MPO).
O c-ANCA é relativamente específico para granulomatose com poliangiite — outrora
chamada de granulomatose de Wegener — e pode correlacionar-se com a atividade
da doença. O p-ANCA, por sua vez, é mais relacionado à poliangiite microscópica e à
granulomatose eosinofílica com poliangiite — outrora chamada de síndrome de
Churg-Strauss.
5.4.1.1 Poliangiite microscópica
A poliangiite microscópica (PAM) é uma desordem que acomete vasos de pequeno
calibre, incluindo capilares, vênulas e arteríolas. É uma vasculite necrosante pauci-
imune com tropismo pelos rins — glomerulonefrite rapidamente progressiva — e
pulmões — capilarite pulmonar.
As manifestações mais comuns são glomerulonefrite com hematúria, perda de
função renal, hipertensão, perda de peso, lesões cutâneas purpúricas (Figura 5.14) e
febre. Capilarite pulmonar pode acarretar hemorragia alveolar (Figura 5.15) e
hemoptise. A hemorragia pulmonar ocorre em até 30% dos casos e pode causar
dispneia e hemoptise, com radiografia mostrando infiltrado alveolar focal (Figura
5.16).
Figura 5.14 - Púrpura palpável nos membros inferiores
 
Figura 5.15 - Radiografia de tórax de paciente com poliangiite microscópica e hemorragia
pulmonar
 
Figura 5.16 - Tomografia computadorizada evidenciando hemorragia alveolar no pulmão
direito
 
Embora a PAM possa cursar com manifestações neurológicas — eminentemente
mononeurite múltipla — e inflamação de vias aéreas altas (Rheumatology, 2019), não
é infrequente que se apresente apenas com síndrome pulmão-rim pura, sem muitos
outros achados (Long-term followup of polyarteritis nodosa, microscopic
polyangiitis, and Churg-Strauss syndrome: analysis of four prospective trials
including 278 patients, 2001). Quando ocorre acometimento do parênquima
pulmonar, geralmente se dá mais na forma de intersticiopatia (Rheumatology
Secrets, 2015).
Sessenta a oitenta por cento dos pacientes com PAM são positivos para o ANCA
(Rheumatology, 2019), sendo o padrão perinuclear (p-ANCA) o mais encontrado na
imunofluorescência. Em geral, esse padrão simboliza o anticorpo anti-MPO. A
titulação do p-ANCA pode, eventualmente, se associar à atividade de doença (Serial
ANCA titers: useful tool for prevention of relapses in ANCA-associated vasculitis,
2003), mas jamais deve ser avaliada de maneira isolada (Rheumatology, 2019).
Apresentam-se ainda achados incaracterísticos, como anemia normo/normo,
trombocitose, hipoalbuminemia e elevação de provas inflamatórias — VHS e PCR.
#importante
O p-ANCA é geralmente positivo, em 70% dos casos,
em pacientes com PAM, e seus títulos podem
eventualmente se relacionar à atividade dentro de
um contexto clínico pertinente.
Para pacientes com PAM que apresentam glomerulonefrite, hemorragia alveolar,
mononeurite múltipla ou outras manifestações graves, está indicado o tratamento
com a combinação de corticoide em forma de pulsoterapia – acompanhada de
corticoide oral dose alta – e ciclofosfamida. Rituximabe é uma outra opção possível
(EULAR/ERA-EDTA recommendations for the management of ANCA-associated
vasculitis, 2016).
5.4.1.2 Granulomatose com poliangiite
A granulomatose com poliangiite (GPA), chamada anteriormente de granulomatose
de Wegener, é uma doença sistêmica caracterizada pela vasculite necrosante
granulomatosa do trato respiratório superior e inferior, com ou sem
glomerulonefrite. É uma doença incomum, que afeta ambos os sexos igualmente e
surge em todas as faixas etárias, sendo mais encontrada em caucasianos, em 97%.
Sua causa é desconhecida.
Como sintomas gerais iniciais, o paciente costuma apresentar febre, anorexia,
emagrecimento, fadiga e fraqueza. As vias aéreas superiores — seios da face,
ouvidos, nasofaringe, orofaringe e traqueia —, o trato respiratório inferior —
brônquios e pulmões — e os rins são caracteristicamente envolvidos.
Nas vias aéreas superiores, podem ocorrer obstrução nasal crônica com rinorreia
persistente — sanguinolenta e/ou purulenta —, ulceração e edema da mucosa nasal.
Perfuração do septo nasal e ulceração e erosão do vômer, levando à deformidade de
nariz “em sela” (Figura 5.17), são achados clássicos. É comum o envolvimento
granulomatoso dos seios da face, podendo haver invasão das estruturas contíguas,
como a órbita (Figura 5.18). Tais lesões são com frequência infectadas,
secundariamente, por Staphylococcus aureus. Podem ocorrer otite média secretora,
otite média crônica, com perfuração da membrana timpânica, otalgia e otorreia,
assim como disfonia, estridor laríngeo, sibilos, ulceração oral, edema oral e gengivite
(Figura 5.19).
As manifestações oculares incluem pseudotumor orbital (Figura 5.18), massa
inflamatória retrobulbar — que pode levar à proptose —; dor; diplopia e perda visual
devido à isquemia do nervo óptico; esclerite, com dor e vermelhidão ocular, podendo
complicar com escleromalácia perfurante e cegueira; ceratite ulcerativa periférica,
que pode evoluir com perfuração da córnea e cegueira; além de outras
manifestações inflamatórias e vasculíticas, como uveíte, conjuntivite, episclerite e
obstrução do ducto lacrimal.
#importante
A granulomatose com poliangiite acomete
principalmente as vias aéreas superiores — incluindo
as órbitas e os olhos — e inferiores e os rins.
Figura 5.17 - Nariz “em sela” e ulceração cutânea em paciente com granulomatose com
poliangiite
 
Figura 5.18 - Pseudotumor orbital na granulomatose com poliangiite
 
Figura 5.19 - Paciente com granulomatose com poliangiite
 
Legenda: (A) ulceração na língua; (B) “gengivas de morango”.
O envolvimento pulmonar também é extremamente comum. Tosse produtiva,
dispneia, hemoptise, dor e desconforto torácico são os principais sintomas.
Anormalidades nas radiografias de tórax são vistas em mais de 90% dos casos e
incluem lesões nodulares escavadas não calcificadas, largas, múltiplas e bilaterais
(Figura 5.20).
Figura 5.20 - Nódulo pulmonar em paciente com granulomatose com poliangiite
 
As característicasnefrológicas da GPA são, predominantemente, representadas por
glomerulonefrite focal necrosante, que leva a hematúria, leucocitúria e
anormalidades nos níveis de ureia e creatinina, podendo provocar falência renal e
morte. Esse acometimento está presente em 80% dos pacientes em algum
momento da evolução, porém, apenas 20% dos casos como manifestação inicial. A
síndrome pulmão-rim pode aparecer na GPA, assim como na PAM.
Manifestações no sistema nervoso, como mononeurite múltipla, neuropatia
sensorial, anormalidades de nervos cranianos e perda auditiva neurossensorial,
podem ocorrer, mas em frequência menor do que nas demais vasculites
relacionadas ao ANCA (Rheumatology, 2019).
Os achados laboratoriais encontrados são anemia de doença crônica e aumento das
provas de atividade de fase aguda, como a VHS e a PCR. O FAN costuma ser
negativo, e o complemento, normal. A associação entre GPA e ANCA é bem
estabelecida. O ANCA, mais frequentemente de padrão citoplasmático e
representando geralmente o anticorpo anti-PR3, ocorre em mais de 90% dos
pacientes com GPA (Rheumatology, 2019) e é relativamente específico, podendo
correlacionar-se com a atividade da doença (Serial ANCA titers: useful tool for
prevention of relapses in ANCA-associated vasculitis, 2003).
O diagnóstico diferencial inclui outras vasculites, síndrome pulmão-rim, infecções
fúngicas ou micobacterioses, neoplasias, sarcoidose e doenças autoimunes
sistêmicas — lúpus eritematoso sistêmico e artrite reumatoide.
#importante
A positividade do ANCA é encontrada em mais de
90% dos pacientes com granulomatose com
poliangiite. O padrão mais comum é o
citoplasmático — aproximadamente 70%.
O tratamento atual é semelhante ao preconizado para a PAM e geralmente
consistirá em pulsoterapia com metilprednisolona — 1 g/d, por 3 dias —,
acompanhada de ciclofosfamida — oral ou em pulsos mensais. Nessa fase de
indução, o rituximabe também pode ser utilizado (EULAR/ERA-EDTA
recommendations for the management of ANCA-associated vasculitis, 2016). A
plasmaférese pode ser usada nos casos de síndrome urêmica associada à
glomerulonefrite rapidamente progressiva, com indicação de terapia dialítica, ou na
hemorragia alveolar grave, mas o ensaio PEXIVAS, que não demonstrou diferenças
na sobrevida renal e na mortalidade dos pacientes tratados com plasmaférese,
rebaixou a evidência do uso desta modalidade (Plasma Exchange and
Glucocorticoids in Severe ANCA-Associated Vasculitis, 2020).
5.4.1.3 Granulomatose eosinofílica com poliangiite
A granulomatose eosinofílica com poliangiite, anteriormente chamada de síndrome
de Churg-Strauss, é uma vasculite rara, que afeta vasos de médio e pequeno
calibres, com predileção por pequenas artérias, arteríolas, capilares e vênulas.
Caracteriza-se pela síndrome que apresenta asma, rinite alérgica, eosinofilia — em
mais de 10% — e febre, acompanhada por vasculite de vários sistemas orgânicos.
Também se trata de vasculite associada ao ANCA. É descrita, na literatura, a
ocorrência de três fases da doença: fase prodrômica, com sintomas atópicos; fase
eosinofílica, com infiltração dos tecidos por eosinófilos, como na gastrenterite
eosinofílica; e fase vasculítica, com acometimento sistêmico e fulminante. O
espectro total da doença pode levar anos para se desenvolver, mas não é obrigatório
que todas as fases estejam nessa ordem, nem que todas ocorram.
Como manifestações pulmonares, há asma de início tardio, de maior frequência e
intensidade até a terceira fase, quando tende a entrar em remissão. Alterações
cutâneas podem estar presentes em 66% dos casos, e, entre as manifestações mais
comuns, estão a púrpura (Figura 5.21), urticária, eritema e nódulos. Nesse subtipo
das vasculites associadas ao ANCA, sintomas neurológicos são bem mais comuns,
na forma de mononeurite múltipla e, muito raramente, alterações do sistema
nervoso central. Manifestações renais são ainda possíveis — glomerulonefrite focal e
segmentar necrosante, com presença de crescentes —, mas menos frequentes do
que nas demais vasculites associadas ao ANCA (Rheumatology, 2019).
Figura 5.21 - Lesões purpúricas em paciente com granulomatose com poliangiite e eosinofilia
 
Os achados laboratoriais incluem: anemia e provas de atividade inflamatória
elevadas em 80% dos casos; eosinofilia constante, geralmente acima de 1.000/
mm3 e logo reduzida após uso de corticosteroide, sendo o aumento na contagem
precedente ao período de atividade da doença. Pode ocorrer elevação dos níveis
séricos de IgE — 75% dos casos. O p-ANCA — anti-MPO —, por sua vez, está positivo
em cerca de 40% dos casos.
#importante
Uma causa importante de morbidade na
granulomatose eosinofílica com poliangiite é a
infiltração cardíaca por eosinófilos, gerando
insuficiência cardíaca e distúrbios de ritmo.
O diagnóstico diferencial se faz com pneumonia eosinofílica crônica —
comprometimento exclusivamente pulmonar — e síndromes hipereosinofílicas.
Para o tratamento, são utilizadas altas doses de prednisona — 1 mg/kg/d. Agentes
citotóxicos, como a ciclofosfamida, devem ser reservados a casos individuais graves
e progressivos, com envolvimentos renal, intestinal, cardíaco ou pulmonar.
5.4.2 Púrpura de Henoch-Schönlein
A púrpura de Henoch-Schönlein (PHS) pode desenvolver-se em qualquer idade, mas,
em 90% dos casos, acontece em crianças. Nesse grupo, dois terços dos pacientes
relatam antecedente de infecção do trato respiratório superior, sugerindo que o
processo infeccioso possa ser o desencadeador da doença.
O paciente apresenta, tipicamente, quadro agudo de febre, púrpura palpável nos
membros inferiores e nas nádegas (Figura 5.22), dor abdominal — tipo cólica pós-
prandial —, artrite — grandes articulações — e glomerulonefrite com hematúria. A
púrpura pode ser extensa e confluente e envolver braços e tronco. Dor abdominal
pode ser causada por edema intestinal e isquemia mesentérica. Doença articular
pode manifestar-se como artralgia e artrite, em especial, de grandes articulações,
como joelhos e tornozelos e, menos comumente, punhos e cotovelos. A principal
manifestação da glomerulonefrite é hematúria microscópica acompanhada por
proteinúria. Em geral, é benigna, mas pode evoluir com insuficiência renal em 10%
dos casos.
Figura 5.22 - Púrpura nos membros inferiores em paciente com púrpura de Henoch-Schönlein
 
Fonte: Púrpura de Henoch-Schönlein com anticorpo c-ANCA em um adulto, 2016.
A púrpura palpável em menores de 20 anos, com angina abdominal, é altamente
indicativa do diagnóstico. À histologia, tem-se o achado de granulócitos nas paredes
dos vasos com depósito de IgA. Apesar de ser mediada por imunocomplexos, a PHS
não necessariamente provoca hipocomplementenemia, pois a IgA é uma fraca
indutora das vias do complemento.
O tratamento inclui anti-inflamatórios não hormonais para artralgias e corticoides
para os sintomas gastrintestinais, se necessário. A maioria dos pacientes evolui bem,
sem maiores necessidades de imunossupressão. Casos de glomerulonefrite grave,
com crescentes, podem ser tratados com pulsoterapia de corticoide e altas doses
de corticoterapia oral, além de imunossupressores, como azatioprina e
ciclofosfamida.
5.4.3 Vasculite por crioglobulinas
As crioglobulinas são anticorpos que se precipitam em condições de baixa
temperatura, dissolvem no calor e ocorrem em associação a inúmeras condições
sistêmicas, podendo levar a complicações que incluem vasculites e
hiperviscosidade. As crioglobulinemias são classificadas em tipos I, II ou III:
• Crioglobulinemia tipo I: contém anticorpos monoclonais — IgG ou IgM —, sem
atividade de FR; estes estão associados a certas doenças hematológicas malignas,
como mieloma múltiplo e macroglobulinemia de Waldenström;
• Crioglobulinemia tipos II e III: são chamadas “mistas”, pois contêm anticorpos IgM
e IgG. O componente IgG é sempre policlonal. Já o componente IgM, diferencia a do
tipo II, quando é monoclonal, da do tipo III, queé policlonal. Em ambos os casos, o FR
é positivo. Crioglobulinemias II e III ocorrem em associação a algumas doenças, como
hepatite C, síndrome de Sjögren e lúpus. Podem provocar vasculite
predominantemente de pequenos vasos do tipo hipocomplementêmica. A
glomerulonefrite membranoproliferativa é a forma mais comum de
comprometimento renal.
A manifestação mais comum na crioglobulinemia é a púrpura palpável nos membros
inferiores (Figura 5.23). Outras manifestações são neuropatia, glomerulonefrite,
artralgia, mialgia e fadiga.
O diagnóstico é tipicamente feito com base na história, nas manifestações típicas da
doença, como púrpura e hipocomplementenemia, e na presença de crioglobulinas.
Os testes sorológicos positivos para o vírus da hepatite C reforçam o diagnóstico da
crioglobulinemia relacionada a este vírus.
Figura 5.23 - Púrpura palpável em paciente com crioglobulinemia
 
Fonte: Crioglobulinemia: relação entre hepatite C e glomerulonefrite, 2018.
O tratamento depende se há doença de base associada, mas quase sempre passará
por imunossupressão. Caso seja crioglobulinemia por vírus C, o tratamento antiviral
está sempre indicado, mas, se houver doença ameaçadora, a imunossupressão deve
vir primeiro (Recommendations for the management of mixed cryoglobulinemia
syndrome in hepatitis C virus-infected patients, 2011). Para pacientes com
mononeurite múltipla ou outras manifestações graves, podem ser usados
corticosteroides, ciclofosfamida e o rituximabe. A plasmaférese pode ser indicada
em casos de glomerulonefrite grave.
5.5 VASCULITE DE VASOS VARIÁVEIS
As vasculites de vasos variáveis incluem doenças de difícil classificação inicial, por
acometerem vasos de vários tipos — artérias e veias — e calibres — todas as
espessuras. Por essa característica, a fisiopatologia dessas entidades clínicas é
pouco conhecida e o seu comportamento é mais incerto do que nas demais
vasculites. A maioria dessas síndromes são extremamente infrequentes e fogem ao
escopo desta obra, contudo, a doença de Behçet é aqui classificada e merece
especial atenção pela sua singularidade.
5.5.1 Doença de Behçet
A doença de Behçet é uma doença vascular inflamatória crônica de etiologia
desconhecida que ocorre em todo o mundo, com prevalência mais elevada em
países do Mediterrâneo, do Oriente Médio e da Ásia. Acomete, principalmente,
adultos jovens, com idade entre 15 e 40 anos — pico aos 20 anos.
As aftas orais são, usualmente, os primeiros sintomas. Em geral, são múltiplas e
dolorosas e podem estar presentes na língua, na gengiva e no palato (Figura 5.24).
Úlceras genitais podem aparecer na vulva, na vagina, no escroto e, muito raramente,
no pênis (Figura 5.25).
#importante
Sempre se deve pensar em doença de Behçet
quando há úlceras orais, úlceras genitais e uveíte.
Figura 5.24 - Aftas orais em paciente com doença de Behçet
 
Figura 5.25 - Ulceração na bolsa escrotal de paciente com doença de Behçet
 
Fonte: Doença de Behçet: revisão com ênfase em aspectos dermatológicos, 2017.
Lesões cutâneas são comuns e incluem paniculite — que lembra muito um eritema
nodoso na apresentação, mas a patologia revela ser, na verdade, paniculite com
vasculite —, pseudofoliculites, lesões papulopustulosas ou nódulos acneiformes.
O teste da patergia positivo — uma resposta exacerbada da pele ao trauma,
resultante da hiperatividade dos neutrófilos — pode auxiliar no diagnóstico, mas não
é específico de doença de Behçet. Para reproduzir o teste, uma agulha estéril é
inserida perpendicularmente na pele e no subcutâneo, na região anterior do
antebraço. Após 48 horas, aparece eritema ou pústula — com mais de 2 mm de
diâmetro — nos locais onde ocorreu o trauma, considerando o teste positivo.
O achado ocular clássico na doença de Behçet é a uveíte aguda bilateral,
eventualmente com formação de hipópio (Figura 5.26). Além de uveíte anterior, a
doença de Behçet pode fazer uma verdadeira panuveíte, acometendo todas as
câmaras oculares. Ademais, vasculite de retina é outro achado possível. As
manifestações oculares frequentemente cursam com perda de acuidade visual.
Figura 5.26 - Hipópio
 
Nota: observar a formação do nível líquido.
O envolvimento de grandes vasos, tanto no território venoso quanto no arterial, é
comum, sendo a maior causa de morbimortalidade. Trombose venosa profunda é a
complicação vascular mais comum. Podem, ainda, ocorrer trombose de veia cava,
síndrome de Budd-Chiari, trombose venosa cerebral e varizes de esôfago. Lesões
arteriais podem ocorrer na circulação sistêmica e no leito arterial pulmonar,
causando estenoses, oclusões e aneurismas.
Do ponto de vista neurológico, além das síndromes trombóticas, pode cursar com
vasculite de sistema nervoso central, com consequências graves ao paciente por
acometer preferencialmente o rombencéfalo.
O diagnóstico de doença de Behçet é difícil, sendo apenas facilitado pela presença
de úlceras bipolares. Quando não estão presentes — ou estão presentes na forma
unipolar —, faz-se necessário grande esforço para confirmá-lo, baseando-se, quase
que exclusivamente, em achados clínicos. Deste modo, é uma doença que desperta
interesse entre os reumatologistas.
Não existem testes específicos ou biomarcadores confirmatórios. Os reagentes de
fase aguda geralmente estão aumentados, mas são inespecíficos, e as dosagens do
complemento, fator reumatoide, crioglobulinas e fator antinúcleo são
caracteristicamente normais ou negativas. A biópsia de eventuais lesões acessíveis
pode contribuir se mostrar vasculite neutrofílica, dentro de um contexto adequado,
mas é comum que retornem com achados inespecíficos. Assim, existe, acima de
tudo, uma importância em excluir outros diagnósticos mais comuns antes de
concluir se tratar de doença de Behçet, como infecções por herpes-simples, HIV ou
citomegalovírus e doença inflamatória intestinal.
#importante
As espondiloartrites e a doença inflamatória
intestinal são dois grandes mimetizadores de
doença de Behçet.
As lesões aftosas são tratadas agudamente com corticoide tópico. Colchicina,
talidomida e metotrexato são utilizados como drogas profiláticas no tratamento de
manifestações mucocutâneas. A azatioprina e a ciclosporina têm sido utilizadas no
envolvimento ocular. A ciclofosfamida é usada em casos oculares incontroláveis,
doença do sistema nervoso central e vasculites. Inibidores do TNF-alfa também
podem ser utilizados no tratamento das formas refratárias.
 
Quais são os principais grupos de síndromes
clínicas que sugerem vasculite sistêmica?
As vasculites sistêmicas cursam com um ou mais dos seguintes grupos
de síndromes clínicas: oclusão vascular de grandes vasos, oclusão
vascular de vasos macroscópicos não nomináveis — incluindo neurites
—, púrpura palpável, glomerulonefrite e capilarite pulmonar —
hemorragia alveolar.
	Quais são os principais grupos de síndromes clínicas que sugerem vasculite sistêmica?
	5.1 INTRODUÇÃO
	Figura 5.1 - Classificação atual das vasculites primárias
	Fonte: adaptado de Pathogenesis of antineutrophil cytoplasmic autoantibody-mediated disease, 2014.
	#importante
	#importante
	#importante
	5.2 VASCULITES DE GRANDES VASOS
	5.2.1 Arterite de células gigantes
	#importante
	#importante
	Figura 5.2 - Espessamento da artéria temporal em paciente com arterite de células gigantes
	5.2.2 Arterite de Takayasu
	Figura 5.3 - Arteriografia que mostra dilatação do arco aórtico e múltiplas estenoses em carótidas e, especialmente, em artérias subclávias
	Fonte: Justin Ly.
	5.3 VASCULITES DE MÉDIOS VASOS
	5.3.1 Poliarterite nodosa
	Figura 5.4 - Arteriografia renal em paciente com poliarterite nodosa
	Nota: observar aneurismas saculares intraparenquimatosos em artérias de médio calibre.
	Figura 5.5 - Nódulos subcutâneos em paciente com poliarterite nodosa
	Fonte: site Logical Images.
	Figura 5.6 - Livedo reticularis em paciente com poliarterite nodosa
	Fonte: ABC of Rheumatology, 2009.
	Figura 5.7 - Úlcera cutânea em paciente com poliarteritenodosa
	Fonte: Livedo reticularis ulcerado em paciente com anticorpo anticardiolipina tipo IgA, 2005.
	Figura 5.8 - Mão caída por acometimento do nervo radial em paciente com poliarterite nodosa
	#importante
	5.3.2 Doença de Kawasaki
	Figura 5.9 - Descamação palmoplantar em paciente com doença de Kawasaki
	Fonte: Doença de Kawasaki, 2009.
	Figura 5.10 - Conjuntivite em paciente com doença de Kawasaki
	Figura 5.11 - Língua com aspecto framboesiforme em menor com doença de Kawasaki
	Fonte: Natr, 2011.
	Figura 5.12 - Intenso eritema labial e rash maculopapular na face de criança com doença de Kawasaki
	Fonte: Cardiovascular Lesions of Kawasaki Disease: From Genetic Study to Clinical Management, 2012.
	Figura 5.13 - Arteriografia evidenciando aneurisma da artéria coronária esquerda
	#importante
	Quadro 5.1 - Critérios diagnósticos propostos pela American Heart Association para doença de Kawasaki incompleta
	Fonte: adaptado de Diagnosis, Treatment, and Long-Term Management of Kawasaki Disease: A Scientific Statement for Health Professionals From the American Heart Association, 2017.
	5.4 VASCULITE DE PEQUENOS VASOS
	5.4.1 Vasculites relacionadas aos ANCA
	5.4.1.1 Poliangiite microscópica
	Figura 5.14 - Púrpura palpável nos membros inferiores
	Figura 5.15 - Radiografia de tórax de paciente com poliangiite microscópica e hemorragia pulmonar
	Figura 5.16 - Tomografia computadorizada evidenciando hemorragia alveolar no pulmão direito
	#importante
	5.4.1.2 Granulomatose com poliangiite
	#importante
	Figura 5.17 - Nariz “em sela” e ulceração cutânea em paciente com granulomatose com poliangiite
	Figura 5.18 - Pseudotumor orbital na granulomatose com poliangiite
	Figura 5.19 - Paciente com granulomatose com poliangiite
	Legenda: (A) ulceração na língua; (B) “gengivas de morango”.
	Figura 5.20 - Nódulo pulmonar em paciente com granulomatose com poliangiite
	#importante
	5.4.1.3 Granulomatose eosinofílica com poliangiite
	Figura 5.21 - Lesões purpúricas em paciente com granulomatose com poliangiite e eosinofilia
	#importante
	5.4.2 Púrpura de Henoch-Schönlein
	Figura 5.22 - Púrpura nos membros inferiores em paciente com púrpura de Henoch-Schönlein
	Fonte: Púrpura de Henoch-Schönlein com anticorpo c-ANCA em um adulto, 2016.
	5.4.3 Vasculite por crioglobulinas
	Figura 5.23 - Púrpura palpável em paciente com crioglobulinemia
	Fonte: Crioglobulinemia: relação entre hepatite C e glomerulonefrite, 2018.
	5.5 VASCULITE DE VASOS VARIÁVEIS
	5.5.1 Doença de Behçet
	#importante
	Figura 5.24 - Aftas orais em paciente com doença de Behçet
	Figura 5.25 - Ulceração na bolsa escrotal de paciente com doença de Behçet
	Fonte: Doença de Behçet: revisão com ênfase em aspectos dermatológicos, 2017.
	Figura 5.26 - Hipópio
	Nota: observar a formação do nível líquido.
	#importante
	Quais são os principais grupos de síndromes clínicas que sugerem vasculite sistêmica?

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