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O CASAL, A QUARENTENA E A COABITAÇÃO: NAMORO SIMPLES, QUALIFICADO OU UNIÃO ESTÁVEL? Luiza Montezuma Magalhães Ferreira1 RESUMO Considerando a atual crise humanitária e sanitária que assola todo o mundo em decorrência da COVID-19, se faz necessário analisar, no âmbito do Direito de Família, o fenômeno da coabitação na mudança das relações amorosas. A relevância da presente pesquisa fica demonstrada através da crescente busca dos companheiros, após o término do vínculo conjugal, de tipificar a relação aflorada durante a pandemia, fornecendo subsídios para estudos e decisões judiciais sobre a temática. Utilizando-se da metodologia exploratória, a pesquisa possui natureza bibliográfica baseada em doutrinas, legislações e dissertações. Especificamente, aborda-se os princípios constitucionais e do Direito de Família que regulam os conceitos de namoro simples, qualificado e de união estável. Dessa forma, conclui-se que a coabitação não configura como elemento essencial para caracterizar a união estável, sendo necessária a análise do caso concreto para averiguar o animus de constituir família e comunhão de vida. PALAVRAS-CHAVE: Pandemia; União Estável; Coabitação. 1. INTRODUÇÃO A pandemia da COVID-19 trouxe uma nova realidade para a sociedade brasileira, desde aproximadamente março do ano de 2020. A disseminação de um vírus com impactos à saúde em nível mundial colocou o país em situação de quarentena por um período muito maior do que o esperado, e modificou a forma de convivência entre as pessoas. As recomendações de distanciamento social se tornaram essenciais para a proteção individual e coletiva, fazendo com que as pessoas tivessem que diminuir ou até cortar encontros pessoais com amigos, familiares e colegas de trabalho. 1 Advogada. Graduada em Direito pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas). Pós- graduanda em Direito e Processo do Trabalho pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e Direito de Família Aplicado pela Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais (PUC Minas) Um ponto importante é a definição do relacionamento entre duas pessoas. Isto porque a pandemia fez com que vários remanejamentos fossem necessários, e consequentemente pessoas que estariam em uma simples relação de namoro passassem a morar juntas, seja para se distanciar de familiares ou para ficarem fisicamente mais próximos, não colocando a própria saúde ou de terceiros em risco. A situação descrita traz o seguinte questionamento: Como classificar essa relação? A coabitação é suficiente para que o namoro seja considerado uma união estável? A fim de decifrar a problemática ora posta, a metodologia adotada para o desenvolvimento deste artigo, capaz de proporcionar uma compreensão e análise das relações afetivas, é a exploratória, utilizando-se da técnica de pesquisa bibliográfica, jurisprudencial e documental. Em suma, discutir-se-á as espécies de namoro e a união estável, embasadas em princípios constitucionais e do Direito de Família, bem como o posicionamento jurisprudencial acerca de casos concretos sobre a temática. Não obstante, à luz do marco teórico adotado, o trabalho pretende fornecer subsídios para estudos futuros da temática, impondo um olhar crítico-reflexivo da mudança de paradigma decorrente da pandemia. 2. A CONFUSÃO CAUSADA PELA PANDEMIA NA TIPIFICAÇÃO DAS RELAÇÕES AMOROSAS Registra-se, portanto, que a convivência comum entre dois sujeitos, alçados a um vínculo amoroso, em decorrência do isolamento social, acarretará em diversos litígios no tempo da dissolução da relação afetiva. Por oportuno, a alternância dos fatos sociais ensejaram inovações nas reflexões jurídicas, mormente na esfera do Direito de Família e Sucessório. Neste contexto, a tendência da coabitação pode ser utilizada como argumento para verificar o pressuposto de ordem subjetiva da comunhão de vida, situação similar ao casamento. Todavia, na prática, podem existir companheiros que convivam sob o mesmo teto mas não possuem o ânimo de constituir família, tendendo a descaracterizar a união estável. É necessário analisar diversos outros aspectos subjetivos e objetivos para classificar o relacionamento como união estável. O art. 1.723 do Código Civil Brasileiro disciplina que: “É reconhecida como entidade familiar a convivência duradoura, pública e contínua, de um homem e uma mulher, estabelecida com objetivo de constituição de família”. (BRASIL, 2002) Necessário se faz analisar estes aspectos para determinar se a relação se trata de um namoro simples, namoro qualificado ou união estável. Muitos casais, para prevenir futuras demandas judiciais, se tornaram adeptos ao chamado “contrato de namoro”, em que é expressa a intenção dos envolvidos, qual seja, a de naquele momento não haver intenção de constituir família. De acordo com Pereira (2018): Embora o contrato de namoro possa parecer o antinamoro, muitos casais em busca de uma segurança jurídica e para evitar que a relação equivocadamente seja tida como união estável, desviando assim o animus de namorados, têm optado por imprimir esta formalidade à relação. (PEREIRA, 2018, p. 529) Por outro lado, a imensa maioria não possui conhecimento acerca de tal formalidade, o que leva a possíveis questões na justiça. De qualquer forma, são diversas as situações que demandam a procura do Judiciário para a sua resolução, sendo necessária a análise do caso concreto, com seus diversos aspectos subjetivos, para a determinação da tipificação de cada relação amorosa em tempos de pandemia da COVID-19. 3. PRINCÍPIOS NORTEADORES DO DIREITO DE FAMÍLIA E PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS: APLICAÇÃO NA DISCUSSÃO ACERCA DA TIPIFICAÇÃO DO RELACIONAMENTO AMOROSO Dentro do ordenamento jurídico brasileiro, os princípios se mostram essenciais e acabam por reger o conteúdo das normas. São uma forma de adequação da lei para com a justiça, de maneira que cada norma deverá estar de acordo com os princípios que a regem, trazendo uma forma de “sentido” para aquele ato normativo. Têm papel imprescindível ao preencher lacunas que possam ter sido deixadas na Lei. De acordo com o art. 4º da LINDB (1942): “Quando a lei for omissa, o juiz decidirá o caso de acordo com a analogia, os costumes e os princípios gerais de direito.” A discussão acerca da classificação dos relacionamentos amorosos em tempos de pandemia, em que um namoro pode ser confundido com uma união estável em razão, principalmente, da coabitação que passou a existir, demonstra a necessidade de analisar este conflito em acordo com os princípios. Isso significa dizer que qualquer decisão no âmbito do direito de família deve levar em consideração os princípios norteadores do direito de família, que decorrem de outros princípios gerais, tais como os princípios constitucionais. Vale a pena destacar alguns deles, como: princípio da liberdade, da autonomia da vontade, da dignidade humana, da afetividade, do livre planejamento familiar, etc. Ao assinar um contrato de namoro, por exemplo, o casal está exercendo a sua liberdade ao não querer constituir uma família, naquele momento. Tal princípio está presente em qualquer das classificações apresentadas, já que decorre da vontade das partes, do livre arbítrio em decidir constituir ou não uma família, e de como desejam se relacionar. A autonomia da vontade e a liberdade são os principais elementos ao se determinar o tipo de relacionamento existente, namoro, namoro qualificado e união estável. De acordo com o art. 226, § 7º da Constituição Federal (BRASIL, 1988) o planejamento familiar é de livre decisão do casal, com fundamento no princípio da dignidade da pessoa humana e compreende o direito de constituir ou não uma família, de apenas namorar, de constituir família, de compôr uma união estável, de casar,etc. Tal artigo engloba os princípios da dignidade da pessoa humana, da afetividade e da liberdade. O princípio da afetividade está implícito em diversas normas constitucionais e em outras regras do ordenamento jurídico e também se relaciona com a dignidade humana. Ele está presente na forma de conexão e ligação entre as pessoas, no amor e no cuidado para com o outro. Nas palavras de Ricardo Lucas Calderon (2012): Parece possível sustentar que o Direito deve laborar com a afetividade e que sua atual consistência indica que se constitui em princípio no sistema jurídico brasileiro. A solidificação da afetividade nas relações sociais é forte indicativo de que a análise jurídica não pode restar alheia a este relevante aspecto dos relacionamentos. A afetividade é um dos princípios do direito de família brasileiro, implícito na Constituição, explícito e implícito no Código Civil e nas diversas outras regras do ordenamento. (CALDERON, 2012) Como demonstrado acima, de forma breve, os princípios se mostram imprescindíveis e devem ser levados em conta na determinação e julgamentos de casos concretos em que se questione a tipificação de um relacionamento amoroso. 4. AS RELAÇÕES AFETIVAS NA PANDEMIA E AS CONSEQUÊNCIAS JURÍDICAS Sob a égide dos tópicos supramencionados e os impactos da pandemia da COVID-19 na realidade fática das pessoas, estão sendo enfrentados, pelos Tribunais de Justiça pátrios, litígios para o reconhecimento da união estável ou do namoro qualificado, baseando-se os litigantes, principalmente, na convivência e coabitação decorrentes dos protocolos de http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/155571402/constitui%C3%A7%C3%A3o-federal-constitui%C3%A7%C3%A3o-da-republica-federativa-do-brasil-1988 http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/111983995/c%C3%B3digo-civil-lei-10406-02 segurança para evitar a transmissão do vírus. A distinção do namoro qualificado e da união estável se torna significativa ao averiguar as consequências jurídicas que decorrem destes relacionamentos afetivos. Ao contrário das espécies de namoro, a união estável desfruta de efeitos patrimoniais idênticos ao casamento e, no silêncio dos conviventes de gozarem da liberdade de escolha do regime de bens, a lei firma o regime da comunhão parcial como regra. Destarte, de forma breve, Dias (2015) assegura que "no regime da comunhão parcial, todos os bens amealhados durante o relacionamento são considerados fruto do trabalho comum. Presume-se que foram adquiridos por colaboração mútua, passando a pertencer a ambos em parte iguais" (DIAS, 2015, p. 252). Portanto, na dissolução da união estável, presume-se que os bens adquiridos naquela constância devam ser objeto na eventual partilha, tendo os companheiros direito à meação e eventual pensão alimentícia, pelo seu caráter assistencial. Além disso, os bens adquiridos à época integram no acervo sucessório, podendo um dos companheiros buscar estes direitos na vara de família, por se tratar de uma entidade familiar. Diverge-se do namoro qualificado, em que sua certificação não interferirá no regime sucessório e no direito à partilha. Nesta modalidade de relacionamento afetivo, um dos pares está limitado a buscar, na vara comum, eventual ação de indenização caso entenda ter tido seu direito violado. À vista disso, percebe-se a importância do esclarecimento dos conceitos de união estável e das modalidades de namoro, tratado a seguir. 4.1. Modalidades de namoro: simples e qualificado Fundadas no desenvolvimento e cultura social, como já citado anteriormente, as relações afetivas passaram por mutações ao longo do tempo, criando-se novas formas de conexões amorosas e modalidades familiares, as quais o ordenamento jurídico deve-se adaptar. Com isto, houve alterações fáticas no namoro, que passou a ser dividido pela doutrina em namoro simples ou qualificado – distintos da união estável. Com a ausência de propósito de constituir família, Bertoldo e Barbará (2006) apontam que o relacionamento puro é aquele centrado no compromisso, intimidade e confiança, “de modo que os parceiros tenham garantias da estabilidade do relacionamento ao mesmo tempo que este deve durar enquanto for satisfatório para ambas as partes.” (BERTOLDO E BARBARÁ, 2006, p. 230). Díspar ao namoro simples, mais usual pela sociedade – especialmente pelos jovens adultos –, o namoro qualificado é a modalidade correspondente ao compromisso imbricado na assistência moral e material, com características idênticas à união estável, quais sejam: a convivência pública, contínua e duradoura. Todavia, diferente da união estável e igual ao namoro simples, o namoro qualificado não é estabelecido com o objetivo de constituir família. Aliás, esclarece Júnior (2016) que, bem como a união estável, no namoro qualificado não poderá existir impedimentos matrimoniais. Em suas palavras: Já o namoro qualificado, por seu turno, é uma relação contínua e sólida, aproximada à união estável por apresentar os mesmos pressupostos objetivos para sua caracterização: a ausência de impedimentos matrimoniais e a convivência duradoura, pública e contínua. (JÚNIOR, 2016, p. 49) Portanto, os parceiros, no namoro qualificado, não assumem a condição de companheiros, mesmo que haja coabitação. Sem a intenção de viver como se casados fossem, nesta modalidade de relacionamento, é retirada a responsabilidade jurídica, especialmente o reflexo patrimonial. Ensina Carlos e Adriana Maluf (2013): No namoro qualificado, por outro lado, embora possa existir um objetivo futuro de constituir família, não há ainda essa comunhão de vida. Apesar de se estabelecer uma convivência amorosa pública, contínua e duradoura, um dos namorados, ou os dois, ainda preserva sua vida pessoal e sua liberdade. Os seus interesses particulares não se confundem no presente, e a assistência moral e material recíproca não é totalmente irrestrita (MALUF, A.; MALUF, C., 2013, p. 371). Conforme exposto, apesar do namoro qualificado situar-se próximo da união estável, estes relacionamentos românticos-afetivos não podem se confundir, já que geram efeitos jurídicos diversos. Diferenciá-los, depois de tantas mudanças sociais, se tornou complexo, principalmente pela ausência de definições apriorísticas e por possuírem alicerce em um requisito subjetivo, qual seja, objetivo de constituir família – presente apenas na união estável –, sendo comum a delegação do reconhecimento do elo afetivo pelo poder judiciário. 4.2. União estável e a coabitação como elemento acidental Noutro tempo, apenas o casamento civil era considerado uma modalidade familiar, mas com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, diversos arranjos intrapessoais foram protegidos pelo Estado, não havendo um rol taxativo de entidades familiares, mas exemplificativo. Em seu art. 226, a Constituição Federal de 1988 reconhece a união estável como uma entidade familiar, sendo uma das bases da sociedade. Tratando-se de uma instituição jurídica e social, portanto, a união estável é resguardada por leis constitucionais e infraconstitucionais. A conceituação da união estável consta do art. 1.723 do Código Civil de 2002, in verbis: “É reconhecida como entidade familiar a união estável entre o homem e a mulher, configurada na convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família” (BRASIL, 2002). Nessa consonância, pode-se perceber que a configuração da união estável está atrelada a requisitos objetivos e subjetivos. Os pressupostos de ordem objetiva, são enumerados por Gonçalves (2012) como aqueles fundados independentemente das preferências individuais dos personagens, quais sejam: notoriedade, estabilidade ou duração prolongada, continuidade e inexistência de impedimentos matrimoniais. Ainda que não exigido o lapso temporal mínimo da relação afetiva paracaracterização da união estável, o pressuposto objetivo da estabilidade ou duração prolongada é enfatizado pelo Código Civil. No caso concreto, o juiz deve analisar se a união dos companheiros foi duradoura e se perdurou por tempo suficiente para o reconhecimento da estabilidade familiar (GONÇALVES, 2012). Complementando a exposição, Dias (2015) lembra que "a relação não deve ser efêmera, circunstancial, mas sim prolongada no tempo e sem solução de continuidade, residindo, nesse aspecto, a durabilidade e a continuidade do vínculo" (DIAS, 2015, p. 245). Por fim, o art. 1.723 do Código Civil veda a constituição da união estável “se ocorrerem os impedimentos do art. 1.521” (BRASIL, 2002). Portanto, o vínculo conjugal carece de inexistência de impedimentos matrimoniais, assim dispõe Gonçalves (2012): Assim, não podem constituir união estável os ascendentes com os descendentes, seja o parentesco natural ou civil; os afins em linha reta, ou seja, sogro e nora, sogra e genro, padrasto e enteada, madrasta e enteado, observando-se que o vínculo de afinidade resulta tanto do casamento como da união estável, como dispõe o art. 1.595, caput; os irmãos, unilaterais ou bilaterais, os colaterais até o terceiro grau inclusive, e o cônjuge sobrevivente com o condenado por homicídio ou tentativa de homicídio contra seu consorte. (GONÇALVES, 2012, p. 534) Ademais, como pressupostos de ordem subjetiva, o mesmo autor elenca a convivência "more uxorio" –comunhão de vidas– e "affectio maritalis" –ânimo ou objetivo de constituir família. A comunhão plena de vida, em resumo, se reveste como um dever mútuo de cooperação e a intenção de projetar uma vida a dois. Compartilhando os pares interesses comuns, resultados construídos e disponibilidade permanente um para com o outro, há a partilha de atributos determinantes para o núcleo familiar (ALVES, 2014). Já o elemento subjetivo affectio maritalis é aquele essencial para a configuração da união estável. É notável que, este requisito em apreço que faz perceptível a distinção das realidades fáticas: namoro qualificado e união estável. Esta condição é determinada pela intenção e forte propósito de constituir família, não se limitando apenas no afeto entre os conviventes, devendo tal condição estar presente no momento do pedido do reconhecimento da modalidade familiar e não no futuro, como ocorre mormente nos namoros qualificados. Com efeito, assevera Gonçalves (2012) sobre: Além de outros requisitos, é absolutamente necessário que haja entre os conviventes, além do afeto, o elemento espiritual caracterizado pelo ânimo, a intenção, o firme propósito de constituir uma família, enfim, a affectio maritalis. O requisito em apreço exige a efetiva constituição de família, não bastando para a configuração da união estável o simples animus, o objetivo de constituí-la. (GONÇALVES, 2012, p. 530) Para Alves (2014), o dever de comunhão de leito e de habitação não constitui, necessariamente, a comunhão de vida, anteriormente elucidada, podendo existir a coabitação sem que os conviventes comunguem em prol de uma existência una. Dessa forma, a ausência de moradia comum entre o casal não gera a descaracterização da união estável, como também, apenas a relação fática da coabitação não é suficiente para caracterizá-la. A construção feita destes pressupostos leva à conclusão que a coabitação não se configura como um elemento essencial, mas acidental, portanto, dispensável (CARVALHO e MAFRA, 2020). A limitação da liberdade de locomoção e o isolamento social como medidas utilizadas ao combate da pandemia estimulou casais que não tinham pretensão de morar sob o mesmo teto, passassem a fazê-lo. Registra-se que, apesar do vínculo amoroso existente entre os sujeitos, no caso concreto, deve ser analisada a presença dos requisitos imprescindíveis do enquadramento da união estável, sobretudo o requisito subjetivo da pretensão de constituir família, vez que, como já esclarecido, apenas a coabitação não enseja na sua caracterização automática. CONCLUSÃO Diante de todo o exposto, é possível perceber que a resolução do problema existente sobre a tipificação de um relacionamento amoroso, principalmente acerca da caracterização de uma união estável e suas consequências jurídicas, não é de forma alguma simples e objetiva. A crescente coabitação entre casais, muitas vezes por mera conveniência e de forma temporária, fez com que a demanda por reconhecimento de uniões estáveis crescesse dentro do poder judiciário. A decisão acerca do assunto precisa levar em conta diversos fatores subjetivos. A coabitação pode sim ser fator determinante para o reconhecimento da união estável, mas não deve ser analisada individualmente, e nem se tornar elemento essencial, sem considerar fatores como convivência pública, estável e duradoura, com objetivo de constituir família. O casal pode ter decidido coabitar apenas considerando os protocolos de segurança pública e distanciamento social, não havendo neste caso a configuração da união estável. O mencionado contrato de namoro está de acordo com os princípios fundamentais norteadores do direito de família e já é visto pela doutrina como uma excelente forma de se evitar conflitos judiciais. Isso porque nele a vontade das partes é expressa, assim como a liberdade na forma de se relacionar, não sendo fator impeditivo para uma futura configuração de união estável, se assim for a vontade de ambos. Posto isto, conclui-se pela necessidade de um estudo aprofundado de todos os elementos e particularidades de um relacionamento afetivo, observando a concordância com os princípios fundamentais e os requisitos presentes em lei, a fim de se reconhecer ou não a existência de uma união estável, não sendo a temporária coabitação entre as partes elemento essencial ou decisivo para tanto. A existência da modalidade do namoro qualificado aparece para preencher a lacuna, sanar a dúvida existente quando o namoro não é meramente simples, possui certas características de união estável, mas não se caracteriza como tal, por não haver intenção em se constituir família. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ALVES, Jones Figueirêdo. Comunhão de vida. Diário de Pernambuco. Pernambuco, 2014. Disponível em: http://www.impresso.diariodepernambuco.com.br/noticia/cadernos/mundo/2014/11/c omunhao-de-vida.html. BERTOLDO, Raquel Bohn; BARBARÁ, Andréa. Representação social do namoro: a intimidade na visão dos jovens. Psico-USF, São Paulo, v. 11, n.2, p. 229-237. Jul./Dez. 2006. BRASIL. Constituição (1988). Constituição da República Federativa do Brasil. Brasília, DF: Senado Federal: Centro Gráfico, 1988. BRASIL. Lei nº 10.406, de 10 de janeiro de 2002. Institui o Código Civil. Diário Oficial da União: seção 1, Brasília, DF, ano 139, n. 8, p. 1-74, 11 jan. 2002. BRASIL, Decreto – Lei nº. 4.657, de 4 de setembro de 1942 – Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/decreto-lei/del4657compilado.htm. CALDERON, Ricardo Lucas. O percurso construtivo do princípio da afetividade no Direito de Família Brasileiro contemporâneo: contexto e efeitos. Disponível em: https://acervodigital.ufpr.br/handle/1884/26808. DIAS, Maria Berenice. Manual de Direito das Famílias. 10 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2015. DINIZ, Maria Helena. As lacunas do direito. São Paulo: Saraiva, 1989. GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro: Direito de Família. vol. 6. São Paulo: Editora Saraiva, 2012. JÚNIOR, Gilmar Loretto Marino. União estável ou namoro qualificado? A (im)possibilidade de gradação da convivência conjugal. TCC (Graduação em Direito) - Universidade Federal de Santa Catarina. Florianópolis, 2016. MALUF, Adriana Caldas do Rego Freitas Dabus; MALUF, Carlos Alberto Dabus. 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