Buscar

Anafilaxia

Prévia do material em texto

JOSÉ SANTANA FARIAS NETO - UESB 
 
1 Emergências Clínicas 
 Anafilaxia 
Definição 
É uma reação em cascata potencialmente FATAL de 
hipersensibilidade sistêmica grave, com rápida 
instalação e que pode cursar com hipotensão grave 
ou comprometimento das vias aéreas; causada pela 
liberação de mediadores de mastócitos e basófilos de 
uma forma dependente de IgE, após exposição a um 
antígeno em indivíduos previamente sensibilizados. 
Hoje o termo inclui também as reações causadas por 
outros mecanismos ou com associação a outros 
mecanismos. 
 
CHOQUE ANAFILÁTICO → reação anafilática em que 
ocorre uma insuficiente entrega de oxigênio para os 
tecidos, resultando em colapso cardiovascular e fluxo 
sanguíneo insuficiente. 
 
REAÇÃO ANAFILACTOIDE → respostas clinicamente 
indistinguíveis da anafilaxia, que não são IgE mediadas 
e que não necessitam de uma exposição 
sensibilizadora. 
• O contraste radiológico é um agente que 
provoca a reação anafilactoide. 
 
Obs.: o termo ANAFILAXIA é agora utilizado para se 
referir tanto a reação anafilática quanto anafilactoide, 
envolvendo ou não reação com IgE. 
 
Epidemiologia 
A verdadeira incidência de anafilaxia é desconhecida. 
Apesar disso, publicações recentes relatam o 
aumento da incidência em diferentes países como a 
Austrália, Reino Unido e EUA, principalmente nas 
faixas etárias mais JOVENS sendo os medicamentos e 
alimentos os principais desencadeantes apontados. 
 
Em CRIANÇAS, os alimentos são as maiores causas de 
procura de serviços de emergência por reações 
alérgicas ou anafiláticas; o risco de alergia ao látex é 
maior naquelas submetidas a múltiplas cirurgias ou 
com espinha bífida; sabe-se ainda que pode ocorrer 
alergia cruzada entre látex e outros alérgenos, como 
abacate, banana, kiwi, mamão, aipim, inhame e figo. 
 
As MULHERES JOVENS também são especialmente 
afetadas por anafilaxia a alimentos. 
HOMENS IDOSOS apresentam pior evolução após 
alergias ocorridas por picadas de inseto. 
 
Idade, ocupação, raça, sexo e fatores geográficos NÃO 
parecem ↑ risco de anafilaxia; os ÚNICOS fatores 
conhecidos que ↑ risco de desenvolver anafilaxia são 
ATOPIA e EPISÓDIO PRÉVIO DE ANAFILAXIA. 
• Obs.: A maioria dos estudos indica que 
indivíduos atópicos não apresentam maior 
risco de desenvolvê-la com picadas de insetos 
ou reações a drogas em relação aos indivíduos 
não atópicos. 
A taxa de RECORRÊNCIA de anafilaxia é de 40 a 60% 
para picadas de insetos, de 20 a 40% para os agentes de 
radiocontraste e de 10 a 20% para o uso de penicilina. 
 
Causas mais comuns de anafilaxias graves → uso de 
antibióticos, picadas de insetos e alimentos. 
• A picada pela Hymenoptera constitui a 2ª 
causa mais comum de anafilaxia 
atualmente. 
Anafilaxia perioperatória → o látex é a 2ª maior causa, 
sendo superado apenas pelos relaxantes musculares. 
Além destes agentes causais, antibióticos, AINH e 
outras drogas e/ou substâncias como coloides e 
opiáceos podem estar envolvidos. 
Exercício físico → isoladamente ou associado a 
alimentos (camarão, maçã, aipo e trigo) tem sido 
relatado como causa de anafilaxia. 
Anafilaxia idiopática → representa 19 a 37% dos casos, 
é um diagnóstico de exclusão, definido quando 
nenhum agente causador pode ser identificado. 
 
Fisiopatologia 
Mecanismo básico → degranulação de mastócitos e 
liberação de mediadores por basófilos; a reação pode 
ocorrer com 2 mecanismos predominantes: 
1. Mecanismo mediado por IgE → mecanismo de 
hipersensibilidade tipo I; nesse caso, o 
alérgeno se liga ao segmento Fab da IgE e este 
ativa e libera proteinoquinases presentes em 
basófilos e mastócitos e, por consequência, 
leva à liberação de mediadores pré-formados 
estocados nos grânulos citoplasmáticos 
daquelas células, que incluem histamina e 
triptase, entre outros mediadores. 
 
 
JOSÉ SANTANA FARIAS NETO - UESB 
 
2 
Emergências Clínicas 
o Histamina → liga-se aos receptores H1 
(efeitos vasoconstritores e 
broncoconstritores) e H2 (efeitos 
vasodilatadores e de aumento da 
permeabilidade capilar). 
o Triptase → tem muitos efeitos, como 
ativação da via do complemento e da 
cascata de coagulação, quimiotaxia e 
produção de mediadores pró-
inflamatórios, resultando em 
manifestações clínicas como edema e 
distúrbios hemorrágicos. 
o Leucotrienos, prostaglandinas e PAF → 
induzem broncoconstrição, 
vasodilatação, permeabilidade capilar 
e regulação da resposta inflamatória. 
o Outros elementos envolvidos incluem 
o óxido nítrico e a cascata de 
coagulação. 
2. Mecanismo independente da IgE → ativado por 
IgG ou por complemento. O mecanismo é 
pouco entendido e pode ser causado por 
atividade física, álcool e anafilaxia associada ao 
uso de opioides, entre outras causas. 
 
 
 
Diagnóstico 
A anafilaxia é altamente provável quando qualquer 
um dos dois critérios a seguir são atendidos: 
1. Início AGUDO de uma doença (minutos a 
algumas horas) com envolvimento 
simultâneo da pele, do tecido mucoso ou de 
ambos (ex.: urticária generalizada, prurido ou 
rubor, inchaço dos lábios-língua-úvula) + pelo 
menos um dos seguintes: 
a. Comprometimento respiratório (ex.: 
dispneia, broncoespasmo, estridor, 
pico de fluxo respiratório reduzido, 
hipoxemia); 
b. PA reduzida ou sintomas associados de 
disfunção de órgão-alvo (ex.: 
hipotonia [colapso], síncope, 
incontinência); 
c. Sintomas gastrintestinais graves (ex.: 
cólicas abdominais intensas, vômitos 
repetitivos), especialmente após a 
exposição a alérgenos não 
alimentares. 
2. Início AGUDO de hipotensão ou 
broncoespasmo ou envolvimento laríngeo 
após exposição a um alérgeno conhecido ou 
altamente provável para aquele paciente 
(minutos a algumas horas), mesmo na 
ausência de envolvimento cutâneo típico. 
 
O espectro das manifestações clínicas compreende 
desde reações leves até graves e fatais. O início 
geralmente é SÚBITO, podendo atingir vários órgãos. 
Os sintomas iniciais ocorrem em segundos/minutos 
até horas após a exposição ao agente causal. É 
importante ressaltar que REAÇÕES BIFÁSICAS podem 
ocorrer de 8 a 12 horas em até 10% dos casos. Os 
principais sintomas e sua ordem de frequência são 
descritos no quadro a seguir. 
 
 
Para confirmação da etiologia são necessários exames 
complementares, porém numa situação emergencial, 
a dosagem de imunoglobulina E (IgE) sérica específica 
no momento da reação pode ser negativa, por esta 
razão deve ser realizada posteriormente e é útil para 
a educação do paciente e a instituição de medidas 
terapêuticas. 
 
DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL → deve ser feito com a 
reação vasovagal que é a causa mais frequente de 
confusão e caracteriza-se por sudorese, náusea, 
hipotensão, bradicardia (na anafilaxia temos 
TAQUICARDIA, ocorrendo bradicardia apenas em 
situações pré falência cardiorrespiratória) e ausência de 
sintomas cutâneos como urticária/angioedema. Outras 
 
 
JOSÉ SANTANA FARIAS NETO - UESB 
 
3 
Emergências Clínicas 
doenças menos frequentes que merecem atenção 
quanto ao diagnóstico diferencial são: mastocitose 
sistêmica, angioedema hereditário; feocromocitoma, 
síndrome carcinoide, disfunção de cordas vocais e 
escromboidismo. 
 
Tratamento 
Por ser uma emergência médica, a anafilaxia requer o 
pronto reconhecimento do quadro clínico a fim de se 
preservar a permeabilidade das vias respiratórias, 
manter a pressão sanguínea e a oxigenação. 
 
Quatro aspectos são fundamentais no tratamento: 
1. Administração rápida de ADRENALINA. 
2. Decúbito dorsal com MMII elevados. 
3. Suplementação de O2 se SatO2 ≤95%. 
4. Manutenção adequada da volemia. 
 
ADRENALINA 
Em função de sua ampla atuação sobre os 
mecanismos fisiopatológicos da anafilaxia, é 
considerada a droga de 1ª LINHA para seu tratamento, 
e sua prescrição precoce é essencial para reversão do 
quadro e salvar a vida do paciente. 
• Efeito α-adrenérgico → reverte a 
vasodilataçãoperiférica, diminui o edema da 
mucosa, a obstrução das vias aéreas 
superiores, bem como a hipotensão, além de 
reduzir os sintomas de urticária/angioedema. 
• Efeitos β-adrenérgicos → aumentam a 
contratilidade do miocárdio, o débito cardíaco 
e o fluxo coronariano; causa broncodilatação 
e suprime a liberação de mediadores de 
mastócitos e basófilos. 
 
No quadro seguinte são descritos os principais 
agentes utilizados no tratamento agudo da anafilaxia. 
 
 
 
 
 
Orientações pós-alta hospitalar 
É fundamental a orientação sobre a possibilidade de 
recorrência de sintomas até 12 horas após o episódio, 
em especial nos casos idiopáticos, na possibilidade de 
absorção contínua do alérgeno e na presença de 
asma mal controlada ou história anterior de reação 
bifásica. Por esta razão, corticosteroides por via oral 
(prednisona ou prednisolona 1-2 mg/Kg/dia em dose 
única) devem ser prescritos pelo período de 5-7 dias. 
Além disso, antihistamínicos H1 de 2ª geração 
(fexofenadina, cetirizina, deslotaradina) nas doses 
habituais devem ser utilizados para todas as faixas 
etárias por pelo menos 7 dias. 
 
Prevenção 
Todos os pacientes com reações anafiláticas devem 
ser encaminhados ao especialista em alergia, para 
investigação etiológica, avaliação de riscos, 
prevenção de novos episódios e tratamento de 
comorbidades. As principais medidas 
preventivas/educativas compreendem: 
• Pacientes e familiares devem ser orientados 
para o reconhecimento dos sinais precoces de 
novo episódio de anafilaxia. 
• Fornecer plano de ação para exacerbações, 
contendo informações escritas em linguagem 
clara, orientações de conduta, nome e dose 
dos medicamentos. 
• O paciente deverá portar identificação com as 
seguintes informações: diagnóstico, telefone 
de contato e plano de ação. 
• A escola deve ser notificada sobre o risco de 
anafilaxia e dos possíveis fatores a serem 
evitados e sobre medidas a tomar em caso de 
emergência.

Continue navegando