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LITERATURA PRÉ-VESTIBULAR 1PROENEM.COM.BR A SEMANA DE ARTE MODERNA24 MOMENTO HISTÓRICO Após a República da Espada, o país conheceu uma série de presidentes civis ligados ao setor agrário, fortalecidos pela economia do café, beneficiando os grandes proprietários rurais de São Paulo e de Minas Gerais. Por outro lado, as grandes cidades brasileiras conheceram um período de transformação em que se tornavam cada vez mais urbanas, especialmente a cidade de São Paulo, em virtude do avanço notável da indústria. A Primeira Grande Guerra foi fator preponderante para a industrialização paulistana e sua consequente industrialização. Surgia, assim, uma burguesia industrial cada vez mais fortalecida economicamente, mas ainda marginalizada pela política governamental, voltada tão somente à exportação do café. Socialmente, São Paulo era palco de uma diversidade de tipos: imigrantes europeus, migrantes nordestinos, ex-escravos, burgueses, operários, senhores de café, enfim, toda a espécie de gente existia na nova metrópole. Econômica e politicamente, a cidade era agitada pelos movimentos operários, pelo surgimento de grupos anarquistas e comunistas e pelo intenso conflito entre o urbano e o rural. Greves e revoltas eclodiam e a cidade vivia a tensão da modernidade. VANGUARDA NACIONAL Nas primeiras décadas do século XX, a arte brasileira começou a demonstrar as influências que vinham da Europa, principalmente na pintura e na escultura. Segall, pintor lituano naturalizado brasileiro, expõe telas de caráter marcadamente expressionistas, Anita Malfatti faz uma exposição pela qual recebe duras críticas de Monteiro Lobato e vários outros artistas plásticos, como Victor Brecheret e Di Cavalcanti já buscavam alguma sintonia com os movimentos europeus. BRECHERET, Victor. Monumento às Bandeiras, 1953 Na literatura, Oswald de Andrade é o precursor de alguns passos rumo a novas experiências estéticas: sua viagem para a Europa apresentou-lhe o Futurismo de Marinetti. Segue-se a Oswald um conjunto de jovens escritores ansiosos por rupturas: Mario de Andrade, Menotti del Picchia, Manuel Bandeira e Graça Aranha. Engana-se aquele que tem em mente que a Semana de 22 representou uma revolução, um movimento popular rumo a uma nova perspectiva estética ou talvez a rejeição da população da arte já estabelecida. Os vanguardistas brasileiros, em sua maioria, tinham origem rica, muitos deles ligados aos barões do café, trazendo inúmeras contradições ao movimento: por um lado, a exaltação da modernidade, da urbanidade e, por consequência, da própria cidade de São Paulo; por outro a crítica feroz à burguesia, principalmente aquela industrial, motivada indubitavelmente pela condição social e histórica dos modernistas. Charge de um jornal carioca a respeito do movimento vanguardista paulistano Em um contexto político de afirmação do estado de São Paulo e a rivalidade com a capital federal, houve diversos apoios expressivos às ações desses novos artistas. Chefes políticos apadrinharam artistas em dificuldades financeiras, inclusive bancando bolsas de estudo no exterior. A Semana de Arte Moderna contou com patrocinadores importantes financeira e economicamente além de ter a simpatia dos dirigentes políticos da região. PRÉ-VESTIBULARPROENEM.COM.BR2 LITERATURA 24 A SEMANA DE ARTE MODERNA Aristocracia rural paulista. Ao centro, Monteiro Lobato senta-se no colo do jovem Oswald de Andrade. No plano estético, é certo também que o movimento ainda era bastante desorganizado, sem uma linha própria, uma personalidade. Não foram raras as vezes que a crítica limitou a produção dos modernos a mera cópia do futurismo italiano, causando grande revolta nos líderes da vanguarda brasileira, especialmente em Oswald de Andrade e Plínio Salgado. A ideia da Semana tenta dar uma resposta a essa desorganização, à falta de unidade de um movimento que nem era ainda um movimento. Estava claro, como afirmou Oswald que eles não sabiam o que queriam, mas sabiam o que não queriam. POLÊMICAS E UNIÃO Anita Malfatti, A boba Ironicamente pode-se afirmar que Monteiro Lobato, um dos maiores críticos do Modernismo, tem grande importância na construção da Semana e do novo movimento literário. Em 1917, Anita Malfatti faz sua segunda exposição de pinturas em São Paulo, nas quais apresenta obras expressionistas, que retratavam figuras humanas distorcidas, caricaturais. O que parecia ser apenas mais uma exposição de “arte nova” transformou-se em enorme polêmica quando o Estado de S. Paulo publica o artigo assinado por Monteiro Lobato, intitulado Paranoia ou mistificação, no qual critica duramente o trabalho da artista, sem ao menos ter ido à sua mostra: “Há duas espécies de artistas. Uma composta dos que vêm as coisas e em consequência fazem arte pura, guardados os eternos ritmos da vida, e adotados, para a concretização das emoções estéticas, os processos clássicos dos grandes mestres. (...) A outra espécie é formada dos que vêm anormalmente a natureza e a interpretam à luz das teorias efêmeras, sob a sugestão estrábica de escolas rebeldes, surgidas cá e lá como furúnculos da cultura excessiva. São produtos do cansaço e do sadismo de todos os períodos de decadência; são frutos de fim de estação, bichados ao nascedouro. Estrelas cadentes, brilham um instante, as mais das vezes com a luz do escândalo, e somem-se logo nas trevas do esquecimento. Embora se deem como novos, como precursores de uma arte a vir, nada é mais velho do que a arte anormal ou teratológica: nasceu como a paranoia e a mistificação. De há muito que a estudam os psiquiatras em seus tratados, documentando-se nos inúmeros desenhos que ornam as paredes internas dos manicômios. A única diferença reside em que nos manicômios essa arte é sincera, produto lógico dos cérebros transtornados pelas mais estranhas psicoses; e fora deles, nas exposições públicas zabumbadas pela imprensa partidária mas não absorvidas pelo público que compra, não há sinceridade nenhuma, nem nenhuma lógica, sendo tudo mistificação pura. (...) Estas considerações são provocadas pela exposição da sra. Malfatti, onde se notam acentuadíssimas tendências para uma atitude estética forçada no sentido das extravagâncias de Picasso & Cia. (...) Sejamos sinceros: futurismo, cubismo, impressionismo e tutti quanti não passam de outros ramos da arte caricatural. É a extensão da caricatura a regiões onde não havia até agora penetrado. Caricatura da cor, caricatura da forma – mas caricatura que não visa, como a verdadeira, ressaltar uma ideia, mas sim desnortear, aparvalhar, atordoar a ingenuidade do espectador.” Para defender a jovem pintora, reuniu-se um grupo de artistas como Oswald e Mario de Andrade, Di Cavalcanti, Guilherme de Almeida, Menotti del Picchia e muitos outros. Em verdade, mais que respaldar Anita, faziam a defesa da arte moderna, da sua própria expressão. Estava lançada a semente da Semana. Anita, de personalidade tímida, largou o modernismo. Caiu em forte depressão e chegou a abandonar a pintura por quase um ano. Apesar de ter participado da Semana de 22, jamais voltou a pintar como antes, adotando um estilo mais conservador, sem conseguir alcançar grande reconhecimento de público ou crítica. Acentuando as polêmicas, Mário de Andrade publica, anos mais tarde, uma série de ensaios em que critica, abusando da ironia e do sarcasmo, os poetas parnasianos, tratados de Mestres do passado. Todas as polêmicas levavam a um amadurecimento estético em torno de ideais modernos. A adesão de Graça Aranha, diplomata e membro da Academia Brasileira de Letras, confere inesperado respaldo e seriedade intelectual ao movimento, criando condições objetivas de uma semana que apresentasse a arte moderna. PRÉ-VESTIBULAR PROENEM.COM.BR 24 A SEMANA DE ARTE MODERNA 3 LITERATURA PARA “CHOCAR A BURGUESIA” Capa do catálogo da Semana, por Di Cavalcanti No final de janeiro de 1922 uma nota publicada no Estado de S. Paulo avisavaque haveria uma “Semana de Arte Moderna”, dando início aos preparativos do evento que ocorreria no Teatro Municipal de São Paulo entre 11 e 18 de fevereiro do mesmo ano. Desde o primeiro até o último dia foram expostas pinturas e esculturas de Anita Malfatti, Vicente do Rego Monteiro, Zina Aita, Di Cavalcanti, Victor Brecherete entre outros. Com ingressos caros e vendidos em locais de frequência da elite econômica paulistana, a Semana não foi, ao contrário do que muitos pensam, um evento popular. Pensada e realizada pela nata da classe média alta de São Paulo, não apresentava propostas de natureza política, limitando- se à renovação estética das artes, com duras críticas ao conservadorismo, representado pelas escolas artísticas anteriores. Essa crítica pouco teria de um real fundo nacionalista, visto que a Semana de Arte Moderna realizou-se a fim de divulgar o ideal artístico europeu, exatamente o que sempre acontecera na literatura brasileira. O evento guardou os dias 13, 15 e 17 de fevereiro para apresentações de palestras, leituras e apresentações de música e dança. Ingresso com o programa da primeira noite de conferências Coube a Graça Aranha abrir o primeiro dia de conferências com a palestra “A emoção estética na arte moderna”, dando suporte acadêmico ao movimento. A conferência não chegou a causar comoção, ficando a polêmica da noite pela música de Ernani Braga, que fazia uma sátira a Chopin, causando reclamações e protestos, inclusive de artistas que iriam apresentar-se no evento, como a pianista Guiomar Novaes. O segundo dia foi o mais conturbado, devido ao comportamento da plateia que vaiou, latiu, relinchou, gritou e aplaudiu a leitura de poemas e fragmentos de prosa apresentados por Oswald e Mário de Andrade. A reação foi tão inesperada que Mário de Andrade, no intervalo entre as partes do programa, foi praticamente impedido de fazer uma pequena palestra sobre as obras ali expostas, sendo caçoado e ofendido duramente. Sobre o fato, chegou a dizer, anos mais tarde: “Como pude fazer uma conferência sobre artes plásticas, na escadaria do teatro, cercado de anônimos que me caçoavam e ofendiam a valer?” O ponto alto da segunda noite, entretanto, foi a leitura do poema “Os sapos”, de Manoel Bandeira, lido por Ronald de Carvalho, em uma crítica aberta à estética parnasiana, tida como o modelo de literatura nacional. O público urrava e vaiava, fazendo coro de modo a ironizar o refrão “Foi... – Não foi!...”. Anúncio da terceira noite do festival O último dia, já com o teatro esvaziado, teve um público mais respeitoso para acompanhar o último dia do festival. As únicas vaias aconteceram na entrada do maestro Heitor Villa-Lobos, que trajava a tradicional casaca, mas com chinelos de dedo! A atitude foi interpretada como uma ação futurista manifestando-se na hora. Depois, Villa-Lobos explicaria que não se tratava de vanguardismo, mas de um calo que não o permitiria calçar seus sapatos... Os jornais acompanharam o que ocorria no Teatro Municipal e apesar de alguns deles tecerem críticas e fadarem o movimento ao fracasso, os artistas tiveram garantido um bom espaço de defesa nos periódicos, até porque muitos deles tinham colunas nos jornais e fizeram eles mesmos sua própria crítica – bem mais favorável, é claro. Não se pode esquecer que os modernistas contavam com o apoio de parte da imprensa além de importantes setores econômicos e políticos. PRÉ-VESTIBULARPROENEM.COM.BR4 LITERATURA 24 A SEMANA DE ARTE MODERNA Quando analisada isoladamente, a Semana de Arte Moderna não parece merecer tanta atenção. Além das vaias pouca coisa aproveitável ocorreu no evento. Os jornais que cobriram o evento não foram tantos e nem dedicaram tanto espaço assim ao festival, somado à própria defesa dos artistas nas colunas em que produziam; a opinião pública manteve-se distante do evento e, fora a alta sociedade paulistana, muitos nem souberam de sua realização. Contudo, pode-se dizer que seu saldo histórico é positivo – mesmo que alguns vejam como produto de publicidade – em razão de apresentar uma proposta de ruptura e de renovação, ainda que não sistematizadas e carentes de um projeto estético comum. Outro ponto positivo foi conseguir reunir uma gama de artistas de diferentes áreas, aproximando literatura, artes plásticas, músicas e danças. O mais notável da semana foi criar a polêmica, lançar novas ideias e criticar os modelos técnicos e estéticos vigentes. Foi o pontapé inicial para que se pudesse produzir uma nova arte no país e seus reflexos ainda se fazem perceber na arte que se produz atualmente. PROTREINO EXERCÍCIOS 01. Defina o contexto histórico em que ocorre a Semana de Arte Moderna. 02. A semana de arte Moderna teve qual objetivo? 03. O modernismo brasileiro teve forte influência de quais movimentos mundiais? 04. Cite dois manifestos importantes da Semana de 1922. 05. Cite três grandes pintores da Semana de Arte Moderna. PROPOSTOS EXERCÍCIOS 01. (ENEM) O trovador Sentimentos em mim do asperamente dos homens das primeiras eras... As primaveras do sarcasmo intermitentemente no meu coração arlequinal... Intermitentemente... Outras vezes é um doente, um frio na minha alma doente como um longo som redondo... Cantabona! Cantabona! Dlorom... Sou um tupi tangendo um alaúde! ANDRADE, M. In: MANFIO, D. Z. (Org.) Poesias completas de Mário de Andrade. Belo Horizonte: Itatiaia, 2005. Cara ao Modernismo, a questão da identidade nacional é recorrente na prosa e na poesia de Mário de Andrade. Em O trovador, esse aspecto é a) abordado subliminarmente, por meio de expressões como “coração arlequinal” que, evocando o carnaval, remete à brasilidade. b) verificado já no título, que remete aos repentistas nordestinos, estudados por Mário de Andrade em suas viagens e pesquisas folclóricas. c) lamentado pelo eu lírico, tanto no uso de expressões como “Sentimentos em mim do asperamente”, “frio”, “alma doente”, como pelo som triste do alaúde “Dlorom”. d) problematizado na oposição tupi (selvagem) x alaúde (civilizado), apontando a síntese nacional que seria proposta no Manifesto Antropófago, de Oswald de Andrade. e) exaltado pelo eu lírico, que evoca os “sentimentos dos homens das primeiras eras” para mostrar o orgulho brasileiro por suas raízes indígenas. 02. (ENEM) MUSEU DA LÍNGUA PORTUGUESA. Oswald de Andrade: o culpado de tudo. 27 set.2011 a 29 jan. 2012. São Paulo: Prof. Gráfica. 2012. O poema de Oswald de Andrade remonta à ideia de que a brasilidade está relacionada ao futebol. Quanto à questão da identidade nacional, as anotações em torno dos versos constituem a) A direcionamentos possíveis para uma leitura crítica de dados histórico-culturais. b) B forma clássica da construção poética brasileira. c) C rejeição à ideia do Brasil como o país do futebol. d) D intervenções de um leitor estrangeiro no exercício de leitura poética e) E lembretes de palavras tipicamente brasileiras substitutivas das originais. 03. (ENEM) Após estudar na Europa, Anita Malfatti retornou ao Brasil com uma mostra que abalou a cultura nacional do início do século XX. Elogiada por seus mestres na Europa, Anita se considerava pronta para mostrar seu trabalho no Brasil, mas enfrentou as duras críticas de Monteiro Lobato. Com a intenção de criar uma arte que valorizasse a cultura brasileira, Anita Malfatti e outros modernistas a) buscaram libertar a arte brasileira das normas acadêmicas europeias, valorizando as cores, a originalidade e os temas nacionais. b) defenderam a liberdade limitada de uso da cor, até então utilizada de forma irrestrita, afetando a criação artística nacional. c) representavam a ideia de que a arte deveria copiar fielmente a natureza, tendo como finalidade a prática educativa. d) mantiveram de forma fiel a realidade nas figuras retratadas, defendendo uma liberdade artística ligada à tradição acadêmica. e) buscaram a liberdade na composição de suas figuras, respeitando limites de temas abordados.PRÉ-VESTIBULAR PROENEM.COM.BR 24 A SEMANA DE ARTE MODERNA 5 LITERATURA 04. (ENEM) (Tarsila do Amaral. “O mamoeiro”, 1925. Óleo s/ tela; 65 x 70 cm. IEB-USP.) O modernismo brasileiro teve forte influência das vanguardas europeias. A partir da Semana de Arte Moderna, esses conceitos passaram a fazer parte da arte brasileira defi nitivamente. Tomando como referência o quadro “O mamoeiro”, identifi ca-se que, nas artes plásticas, a a) imagem passa a valer mais que as formas vanguardistas. b) forma estética ganha linhas retas e valoriza o cotidiano. c) natureza passa a ser admirada como um espaço utópico. d) imagem privilegia uma ação moderna e industrializada. e) forma apresenta contornos e detalhes humanos. 05. (ENEM) TEXTO I Embora eles, artistas modernos, se deem como novos precursores duma arte a ir, nada é mais velho que a arte anormal. De há muitos já que a estudam os psiquiatras em seus tratados, documentando-se nos inúmeros desenhos que ornam as paredes internas dos manicômios. Essas considerações são provocadas pela exposição da Sra. Malfatti. Sejam sinceros: futurismo, cubismo, impressionismo e tutti quanti não passam de outros tantos ramos da arte caricatural. LOBATO, M. Paranoia ou mistifi cação: a propósito da exposição de Anita Malfatti. O Estado de São Paulo, 20 dez.1917 (adaptado). TEXTO II Anita Malfatti, possuidora de uma alta consciência do que faz, a vibrante artista não temeu levantar com os seus cinquenta trabalhos as mais irritadas opiniões e as mais contrariantes hostilidades. As suas telas chocam o preconceito fotográfi co que geralmente se leva no espírito para as nossas exposições de pintura. Na arte, a realidade na ilusão é o que todos procuram. E os naturalistas mais perfeitos são os que melhor conseguem iludir. ANDRADE, O. A exposição Anita Malfatti. Jornal do Commercio, 11 jan. 1918 (adaptado). TEXTO III MALFATTI, A. O homem amarelo, 1915-1916. Óleo sobre tela, 61 x 51 cm. Disponível em: www.estadao.com.br. Acesso em: 28 fev. 2013 A análise dos documentos apresentados demonstra que o cenário artístico brasileiro no primeiro quartel do século XX era caracterizado pelo(a) a) domínio do academicismo, que difi cultava a recepção da vertente realista na obra de Anita Malfatti. b) dissonância entre as vertentes artísticas, que divergiam sobre a validade do modelo estético europeu. c) exaltação da beleza e da rigidez da forma, que justifi cavam a adaptação da estética europeia à realidade brasileira. d) impacto de novas linguagens estéticas, que alteravam o conceito de arte e abasteciam a busca por uma produção artística nacional. e) influência dos movimentos artísticos europeus de vanguarda, que levava os modernistas a copiarem suas técnicas e temáticas. 06.(UFF) PERO VAZ DE CAMINHA a descoberta Seguimos nosso caminho por este mar de longo Até a oitava da Páscoa Topamos aves E houvemos vista de terra os selvagens Mostraram-lhes uma galinha Quase haviam medo dela E não queriam pôr a mão E depois a tomaram como espantados primeiro chá Depois de dançarem Diogo Dias Fez o salto real as meninas da gare Eram três ou quatro moças bem moças e bem gentis Com cabelos mui pretos pelas espáduas E suas vergonhas tão altas e tão saradinhas Que de nós as muito olharmos Não tínhamos nenhuma vergonha (ANDRADE, Oswald. "Poesias reunidas". Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978, p.80.) PRÉ-VESTIBULARPROENEM.COM.BR6 LITERATURA 24 A SEMANA DE ARTE MODERNA O procedimento poético empregado por Oswald de Andrade no texto é: a) reconhecer e adotar a métrica parnasiana, criando estrofes simétricas e com títulos; b) recortar e recriar em versos trechos da carta de Caminha, dando-lhes novos títulos; c) irritar e refazer em prosa a carta de Caminha, criando títulos para as várias seções; d) reconhecer e retomar a prática romântica, dando títulos nacionalistas às estrofes; e) identificar e recusar os processos de colagem modernistas, dando-lhes títulos novos. 07. (UERJ) MANIFESTO DA POESIA PAU-BRASIL (fragmento) Lançado por Oswald de Andrade, no CORREIO DA MANHÃ, em 18 de março de 1924. 1 Houve um fenômeno de democratização estética nas cinco partes sábias do mundo. Instituíra-se o naturalismo. Copiar. Quadro de carneiros que não fosse lã mesmo não prestava. A interpretação do dicionário oral das Escolas de Belas-Artes queria dizer reproduzir igualzinho... Veio a pirogravura. As meninas de todos os lares ficaram artistas. Apareceu a máquina fotográfica. E com todas as prerrogativas do cabelo grande, da caspa e da misteriosa genialidade de olho virado - o artista fotógrafo. 2 Na música, o piano invadiu as saletas nuas, de folhinha na parede. Todas as meninas ficaram pianistas. Surgiu piano de manivela, o piano de patas. A Playela. E a ironia eslava compôs para a Playela. Stravinski. 3 A estatuária andou atrás. As procissões saíram novinhas das fábricas. 4 Só não se inventou uma máquina de fazer versos - já havia o poeta parnasiano. (...) 5 Nossa época anuncia a volta ao sentido puro. 6 Um quadro são linhas e cores. A estatuária são volumes sob a luz. 7 A poesia Pau-Brasil é uma sala de jantar domingueira, com passarinhos cantando na mata resumida das gaiolas, um sujeito magro compondo uma valsa para flauta e a Maricota lendo o jornal. No jornal anda todo o presente. (apud TELES, Gilberto M. "Vanguarda Europeia e Modernismo brasileiro". Petrópolis: Vozes, 1977.) O texto de Oswald de Andrade critica a estética naturalista porque: a) as pessoas que desejassem sair nas procissões poderiam fazer poesia e ingressar nas escolas de Belas-Artes b) os novos meios técnicos tornaram acessível a todos a possibilidade de representação da realidade c) o fenômeno de democratização estética acarretou prerrogativas como a da misteriosa genialidade de olho virado d) as meninas de todos os lares tiveram acesso às ideias naturalistas de representação da realidade e viraram escritoras 08. (ENEM) "Poética", de Manuel Bandeira, é quase um manifesto do movimento modernista brasileiro de 1922. No poema, o autor elabora críticas e propostas que representam o pensamento estético predominante na época. Poética Estou farto do lirismo comedido Do lirismo bem comportado Do lirismo funcionário público com livro de ponto expediente protocolo e [manifestações de apreço ao Sr. diretor. Estou farto do lirismo que pára e vai averiguar no dicionário [o cunho vernáculo de um vocábulo Abaixo os puristas ........................................................................................... Quero antes o lirismo dos loucos O lirismo dos bêbados O lirismo difícil e pungente dos bêbedos O lirismo dos clows de Shakespeare - Não quero mais saber do lirismo que não é libertação. (BANDEIRA, Manuel. "Poesia Completa e Prosa". Rio de Janeiro. Aguilar, 1974) Com base na leitura do poema, podemos afirmar corretamente que o poeta: a) critica o lirismo louco do movimento modernista. b) critica todo e qualquer lirismo na literatura. c) propõe o retorno ao lirismo do movimento clássico. d) propõe o retomo ao lirismo do movimento romântico. e) Propõe a criação de um novo lirismo. 09. (FEI) Assinalar a alternativa incorreta, quanto aos princípios básicos divulgados pelos participantes da Semana da Arte Moderna: a) Desejo de expressão livre e a tendência para transmitir, sem os embelezamentos tradicionais do academismo, a emoção e a realidade do país; b) Rejeição dos padrões portugueses, buscando uma expressão mais coloquial, próxima do falar brasileiro; c) Combate a tudo que indicasse o "statu quo", o conhecido; d) Manutenção da temática simbolista e parnasiana; e) Valorização do prosaico e do humor, que, em todas as suas gamas, lavou e purificou a atmosfera sobrecarregada pelos acadêmicos. 10. (PUCCAMP) Atente para estes versos de Manuel Bandeira, extraídos do poema “Minha terra”: Revi afinal o meu Recife. Está de fato completamente mudado. Tem avenidas, arranha-céus. É hoje uma bonitacidade. Diabo leve quem pôs bonita a minha terra. Nesses versos o poeta pernambucano a) renuncia ao estilo modernista, voltando ao verso clássico para poder saudar sua antiga cidade. b) admite que ele e sua cidade tiveram muito a ganhar com o irrecorrível processo de modernização. c) reconhece que a modernização altera as convicções que ele alimentava no passado. d) opõe a constatação do progresso de sua cidade à sua imagem afetiva guardada na memória. e) ironiza a beleza da cidade moderna enquanto idealiza a melancolia das cidadezinhas. PRÉ-VESTIBULAR PROENEM.COM.BR 24 A SEMANA DE ARTE MODERNA 7 LITERATURA 11. (UERJ) É certo que a capa de um livro é a marca de um produto que quer atrair o leitor. A associação seria mais certeira se esse leitor a relacionasse ao contexto histórico dos anos 1920, em que se traçava o projeto modernista empenhado na construção de uma consciência do país, num processo de conhecimento da realidade brasileira. Os modernistas queriam mesmo “descobrir o Brasil”. RENATO CORDEIRO GOMES Adaptado de www.revistadehistoria.com.br. Por meio de manifestos, livros e exposições, os modernistas refletiram sobre a sociedade brasileira, avaliando suas principais características e propondo a revisão da identidade nacional. a) crítica da valorização romântica da natureza tropical b) desqualificação das heranças coloniais luso-africanas c) negação da cooperação cultural de artistas estrangeiros d) reformulação da composição multiétnica da população nativa 12. (UFRGS) Observe a figura a seguir: A Semana de Arte Moderna, realizada em São Paulo em 1922, representou um marco na cultura brasileira. Tarsila do Amaral trouxe a público, em 1928, a obra o Abaporu, que passou a ser representativa do Manifesto Antropofágico. Esse manifesto a) defendia a migração de europeus para diminuir a importância dos brasileiros. b) propunha a “deglutição” da cultura europeia remodelada e devidamente enraizada à terra brasileira, sintetizada na conhecida frase “Tupi or nor tupi, that’s the question”. c) exaltava a cultura europeia e o transplante cultural e artístico do Velho para o Novo Mundo. d) valorizava a presença da cultura estrangeira no Brasil e também a manutenção de padrões arcaicos. e) justificava a mentalidade subserviente e o sentimento de inferioridade do brasileiro em relação aos europeus. 13 (UPE) Considere a imagem seguinte: O quadro Os operários (1933), de Tarsila do Amaral, é um dos exemplos da arte moderna brasileira. Com base na análise desse quadro e no contexto histórico de sua produção, analise as seguintes afirmações: I. Esse quadro foi o marco inicial da pintura modernista no Brasil. II. A Semana de Arte Moderna, realizada no Rio de Janeiro, em 1922, foi um dos eventos iniciais de divulgação da estética modernista no país. III. O quadro Os operários representa, entre outras questões, a diversidade étnica do povo brasileiro. IV. Além de Tarsila do Amaral, destacaram-se, na pintura modernista brasileira, as figuras de Anita Malfatti e Cândido Portinari. V. A presença africana no Brasil também está representada na referida obra da artista. Estão CORRETAS a) I, II e IV. b) II, IV e V. c) III, IV e V. d) I, III e V. e) II, III e V. 14. (ENEM PPL) TEXTO I PRÉ-VESTIBULARPROENEM.COM.BR8 LITERATURA 24 A SEMANA DE ARTE MODERNA TEXTO II Em janeiro de 1928, Tarsila queria dar um presente de aniversário especial ao seu marido, Oswald de Andrade. Pintou o Abaporu. Eles acharam que parecia uma figura indígena, antropófaga, e Tarsila lembrou-se do dicionário tupi-guarani de seu pai. Batizou-se quadro de Abaporu, que significa homem que come carne humana, o antropófago. E Oswald escreveu o Manifesto Antropófago e fundaram o Movimento Antropofágico. Disponível em: www.tarsiladoamaral.com.br. Acesso em: 4 ago. 2012 (adaptado). O movimento originado da obra Abaporu pretendia se apropriar a) da cultura europeia, para originar algo brasileiro. b) da arte clássica, para copiar o seu ideal de beleza. c) do ideário republicano, para celebrar a modernidade. d) das técnicas artísticas nativas, para consagrar sua tradição. e) da herança colonial brasileira, para preservar sua identidade. 15. (ESPM) Observe a imagem e o texto: “A Cuca” (1924) Figura canônica da arte moderna brasi leira, do início do século XX, a pintora paulis ta ganha a primeira mostra nos Estados Uni dos exclusivamente devotada à sua obra no Museum of Modern Art (MoMA-NY). A ex posição é portentosa, com 120 trabalhos (in cluindo telas, desenhos, livros de esquetes, fotografias e outros documentos históricos). Paulista de Capivari, a artista estudou desenho, piano, escultura e se mudou para Paris nos anos 1920, para estudar na Aca démie Julian. Ali, foi aluna de mestres como Fernand Léger, ingressou naquilo que cha mou de seu ‘serviço militar’ no Cubismo. Fonte: Revista Carta Capital, 14/02/2018. O quadro em questão e o texto devem ser relacionados com: a) Zina Aita; b) Lygia Clark; c) Anita Malfatti; d) Tarsila do Amaral; e) Maria Pardos. 16. (UERJ SIMULADO) As telas retratadas acima foram reunidas pela primeira vez no país em 2016 para a exposição “A Cor do Brasil”, realizada no Museu de Arte do Rio (MAR). Ambas fazem parte de um inovador movimento cultural que, dentre outros aspectos, rediscutiu a identidade nacional. A partir da análise das telas, uma proposta desse movimento foi: a) glorificar a pobreza. b) naturalizar o exotismo. c) exaltar a deformidade. d) valorizar a miscigenação. 17. (PUCRS) Enumerar a segunda coluna de acordo com a primeira, relacionando as ideias, expressões, autores e obras ao que convencionou denominar de Pré-Modernismo e Geração de 22. 1. Pré-Modernismo 2. Geração de 22 ( ) Oswald de Andrade ( ) Lima Barreto ( ) Mario de Andrade ( ) "Os Sertões" ( ) fragmentação da narrativa ( ) ruptura com a tradição ( ) ecletismo ( ) irreverência A sequência correta, de cima para baixo, é a da alternativa a) 2 - 2 - 2 - 1 - 1 - 1 - 1 - 2 b) 2 - 1 - 2 - 1 - 2 - 2 - 1 - 2 c) 2 - 1 - 2 - 2 - 1 - 2 - 2 - 2 d) 1 - 1 - 1 - 1 - 2 - 2 - 1 - 2 e) 1 - 1 - 2 - 1 - 2 - 2 - 1 - 1 18. (UPE) A tela de Tarsila do Amaral apresenta uma marcante característica do Modernismo. Assinale a alternativa que contém essa característica. a) Idealização da natureza, pois no quadro aparecem frutos tropicais. b) Equilíbrio e racionalismo, pois há na tela a predominância de cores neutras. c) Resgate da cultura popular brasileira, por se tratar de uma tela em que há elementos da fauna, da flora e do cotidiano do país. PRÉ-VESTIBULAR PROENEM.COM.BR 24 A SEMANA DE ARTE MODERNA 9 LITERATURA d) Objetividade e racionalismo, por trazer à tona o mar com todo o seu colorido. e) Religiosidade e cromatismo, principais características da primeira geração do Modernismo. 19. (UFV) Leia com atenção o poema intitulado "pronominais", de Oswald de Andrade: Dê-me um cigarro Diz a gramática Do professor e do aluno E do mulato sabido Mas o bom negro e o bom branco Da Nação Brasileira Dizem todos os dias Deixa disso camarada Me dá um cigarro (ANDRADE, Oswald de. "Obras completas: poesias reunidas". 5a ed. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1978. p. 125.) Das colocações abaixo, aquela que NÃO pode ser atribuída a esse poema modernista é: a) Os versos do poema expressam a defesa de um idioma brasileiro livre e descontraído, aquele praticado pela gramática do genuíno povo brasileiro, o "bom negro e o bom branco". b) O poema vem reafirmar a posição do poeta em favor da incorporação do discurso coloquial brasileiro à linguagem poética, como o expressa no "Manifesto da Poesia Pau Brasil": "Apenas brasileiros de nossa época. [...] Tudo digerido. Sem meeting cultural. Práticos. Experimentais. Poetas." (ANDRADE, O. 1995, p. 139.) c) O poeta, nestes versos, defende: "A língua sem arcaísmos, sem erudição. Natural e neológica. A contribuição milionária de todos os erros. Como falamos. Como somos". (ANDRADE, O. 1995, p.136.) d) o próprio título: "Pronominais" já sugere a preferência do poeta pela colocação enclítica do pronome na fala do brasileiro - tendência já expressa no "Manifesto Antropófago", contra a influência da gramática do colonizador europeu: "Antes dos portugueses descobrirem o Brasil, o Brasil já tinha descoberto a felicidade". (ANDRADE, O., 1995, p. 145.) e) o poema traduz a aversão do poeta ao academicismo, em defesa dos princípios da "poesia pau brasil": "O estado de inocência substituindo o estado de graça que pode ser uma atitude do espírito. O contrapeso da originalidade nativa para inutilizar a adesão acadêmica." (ANDRADE, O., 1995, p. 238.) 20. (MACKENZIE) I. Minha terra tem palmares Onde gorjeia o mar Os passarinhos daqui Não cantam como os de lá II. Quando o português chegou Debaixo duma bruta chuva Vestiu o índio Que pena! Fosse uma manhã de sol O índio tinha despido O português III. Não bebo pinga Não bebo nada Bebo sereno da noite Orvaio da madrugada! Sobre os três trechos, afirma-se que pertencem a um mesmo poeta brasileiro: a) da primeira geração modernista, que denuncia satiricamente mazelas brasileiras. b) que brinca com experimentos linguísticos e é receptivo às vanguardas europeias. c) que utiliza uma língua coloquial solta, com objetivos satíricos. d) que subverte a ideologia da seriedade, como está demonstrado desde a paródia do texto I. e) autor do MANIFESTO ANTROPÓFAGO, cuja frase - Contra as elites vegetais. Em comunicação com o solo - contradiz os valores veiculados por esses mesmos textos. APROFUNDAMENTO EXERCÍCIOS DE Leia este trecho do romance Macunaíma para responder às questões de 1 a 3. Macunaíma A inteligência do herói [Macunaíma] estava muito perturbada. As cunhãs rindo tinham ensinado pra ele que o sagui-açu não era saguim não, chamava elevador e era uma máquina. De- manhãzinha ensinaram que todos aqueles piados berros cuquiadas sopros roncos esturros não eram nada disso não, eram mas cláxons campainhas apitos buzinas e tudo era máquina. As onças pardas não eram onças pardas, se chamavam fordes hupmobiles chevrolés dodges mármons e eram máquinas. Os tamanduás os boitatás as inajás de curuatás de fumo, em vez eram caminhões bondes autobondes anúncios-luminosos relógios faróis rádios motocicletas telefones gorjetas postes chaminés... Eram máquinas e tudo na cidade era só máquina! ANDRADE, Mário de. Macunaíma. 30. ed. Belo Horizonte/ Rio de Janeiro: Villa Rica, 1997. sagui-açu: (açú = de grande porte) saguiguaçu = macaco da Mata Atlântica. Mauari: Maguari = ave comum no rio Grande do sul, existente também na Amazônia e nordeste do Brasil. Cunhãs: mulheres jovens, companheiras dos índios; no contexto são prostitutas. Cuquiada: cucar, canto do cuco. Esturro: estrondo; vozes de certas feras, rugido, urro. Cláxon: Kláxon = buzina de carro ou alarme elétrico. Inajá: grande palmeira nativa do Brasil. Curuatá: gravatá = planta ornamental. 01. Há no trecho uma clara oposição entre dois ambientes distintos. Que ambientes são estes? 02. O trecho transcrito mostra o momento em que o personagem principal acabara de chegar a São Paulo. descreva brevemente as principais características desta cidade que Macunaíma encontra. 03. Quanto à forma, o texto de Mário de Andrade apresenta uma particularidade. Aponte-a e explique porque ela se encaixa no ideário modernista. 04. Os romances de Oswald de Andrade adotaram uma estrutura inovadora, que tem semelhanças com a linguagem cinematográfica. essas semelhanças podem ser observadas no texto acima? Explique essa afirmação. PRÉ-VESTIBULARPROENEM.COM.BR10 LITERATURA 24 A SEMANA DE ARTE MODERNA 05. (PUC) TEXTO I 1 Uns certos profundíssimos filólogos negam-nos, a nós brasileiros, o direito de legislar sobre a língua que falamos. Parece que os cânones desse idioma ficaram de uma vez decretados em algum concílio celebrado aí pelo século XV. 4 Esses cânones só têm o direito de infringi-los quem nasce da outra banda, e goza a fortuna de escrever nas ribas históricas do Tejo e Douro ou nos amenos prados do Lima e do Mondego. 6 Nós, os brasileiros, apesar de orçarmos já por mais de dez milhões de habitantes, havemos de receber a senha de nossos irmãos, que não passam de um terço daquele algarismo. 8 Nossa imaginação americana, por força terá de acomodar-se aos moldes europeus, sem que lhe seja permitido revestir suas formas originais. 10 Sem nos emaranharmos agora em abstrusas investigações filológicas, podemos afirmar que é este o caso em que a realidade insurge-se contra a teoria. O fato existe, como há poucos dias escreveu o meu distinto colega em uma apreciação por demais benévola. 13 É vã, senão ridícula, a pretensão de o aniquilar. Não se junge a possante individualidade de um povo jovem a expandir-se ao influxo da civilização, com as teias de umas regrinhas mofentas. 15 Desde a primeira ocupação que os povoadores do Brasil, e após eles seus descendentes, estão criando por todo este vasto império um vocabulário novo, à proporção das necessidades de sua vida americana, tão outra da vida européia. 18 Nós, os escritores nacionais, se quisermos ser entendidos de nosso povo, havemos de falar-lhe em sua língua, com os termos ou locuções que ele entende, e que lhe traduzem os usos e sentimentos. 20 Não é somente no vocabulário, mas também na sintaxe da língua, que o nosso povo exerce o seu inauferível direito de imprimir o cunho de sua individualidade, abrasileirando o instrumento das idéias. 22 Entre vários exemplos recordo-me agora principalmente de um muito para notar. Falei-lhe há pouco da excentricidade de certos aumentativos. Usa-se no Ceará um gracioso e especial diminutivo, que talvez seja empregado em outras províncias; mas com certeza se há de generalizar, apenas se vulgarize. 26 Não permite certamente a rotina etimológica aplicar o diminutivo ao verbo. Pois em minha província o povo teve a lembrança de sujeitar o particípio presente a esta fórmula gramatical, e criou de tal sorte uma expressão cheia de encanto. 29 A mãe diz do filho que acalentou ao colo: "Está dormindinho". Que riqueza de expressão nesta frase tão simples e concisa! O mimo e ternura do afeto materno, a delicadeza da criança e sutileza do seu sono de passarinho, até o receio de acordá-la com uma palavra menos doce; tudo aí está nesse diminutivo verbal. 33 Entretanto, meu ilustre colega, suponha que em algum romance eu empregasse aquele idiotismo a meu ver mais elegante do que muita roupa velha com que os puristas repimpam suas idéias. 35 Não faltariam, como de outras vezes tem acontecido, críticos de orelha, que, depois de medido o livro pela sua bitola, escrevessem com importância magistral: "Este sujeito não sabe gramática". E têm razão; gramática para eles é a artinha que aprenderam na escola, ou por outra, uma meia dúzia de regras que se afogam nas exceções. José de Alencar. "O Nosso Cancioneiro" In: Obra Completa. v. 4. Rio de Janeiro: J. Aguilar, 1960, pp. 965-966. Compare as idéias defendidas pelo escritor romântico José de Alencar em seu texto com as afirmações contidas no fragmento do Manifesto da poesia pau-brasil, de Oswald de Andrade, abaixo indicado. "Contra o gabinetismo, a prática culta da vida. Engenheiros em vez de jurisconsultos, perdidos como chineses na genealogia das idéias. A língua sem arcaísmos, sem erudição. Natural e neológica. A contribuição milionária de todos os erros. Como falamos. Como somos." (In TELES, Gilberto M. Vanguarda européia e modernismo brasileiro. Petrópolis: Vozes, 1992, p. 267) GABARITO EXERCÍCIOS PROPOSTOS 01. D 02. A 03. A 04. B 05. D 06. B 07. B 08. E 09. D 10. D 11. A 12. B 13. C 14. A 15. D 16. D 17. B 18. C 19. D 20. E EXERCÍCIOS DE APROFUNDAMENTO 01. 1. O da floresta ou o fundo do mato virgem e o ambiente urbano, mais especificamente a cidade de São Paulo. 02. Na descrição das características do novo ambiente, são recorrentes as mençõesàs máquinas (sobretudo o automóvel, apresentado na enumeração de várias marcas e modelos famosos na época) e aos incessantes ruídos da modernidade, como buzinas, campainhas, alarmes. As máquinas são comparadas a grandes animais e os ruídos às "vozes" destes animais. 03. Há no texto uma liberdade formal que permite ao autor menor rigor na apresentação de sua escrita, sobretudo na pontuação. Em trechos como "ensinaram que todos aqueles piados berros cuquiadas sopros roncos esturros", Mário não faz uso de vírgulas, procedimento inadequado de acordo com a norma culta da língua, mas lícito de acordo com a proposição principal do Modernismo de liberdade e rompimento do formalismo na escrita. 04. Sim. O texto constitui um capítulo curto do romance em que o narrador-protagonista narra suas memórias. A situação apresentada dessa forma sintética e metafórica dá à narrativa características da linguagem cinematográfica, como se representasse uma sequência de cenas encadeadas que compõem um mosaico em que a realidade é flagrada em rápidos flashes. Percebe-se, no texto, a característica mais marcante da escrita oswaldiana: a capacidade de construção de um máximo de imagens num mínimo espaço verbal. 05. Escritor modernista Oswald de Andrade reafirma, em seu texto, princípios semelhantes aos defendidos pelo romântico José de Alencar: o diálogo com os segmentos populares, a autonomia da cultura nacional, a recusa de posturas elitistas e puristas e a defesa de uma variante brasileira da língua portuguesa. ANOTAÇÕES
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