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@danielleferreira._ Leucograma Introdução Definição: o leucograma é um exame de laboratório que avalia a séria branca do hemograma, ou seja, avalia a quantidade e a qualidade de leucócitos, as células responsáveis pela defesa do organismo. A coleta, armazenamento e envio para laboratório devem seguir as mesmas regras do eritrograma. Indicações para realização do leucograma ● exame de rotina ● suspeita clínica ● pré-operatório (é muito indicado) ● acompanhamento do animal ● determinar prognóstico Muitas vezes, até mesmo o hemograma sozinho pode ser um diagnóstico. No caso da imagem ao lado, temos o caso de um potro com suspeita de hemoparasita. Quando o hemograma foi realizado, foram encontrados piroplasmas intraeritrocitários. Apesar de não ser em leucócitos, foi determinante para o fechamento do caso e tratamento do caso. No caso da imagem de esfregaço ao lado, podemos perceber que a proporção leucócitos:hemácias está alterada (há mais leucócitos que o esperado) e isso nos ajuda a interpretar o que está acontecendo com o animal. Alguns autores defendem que os leucócitos não são células residentes no sangue. A maioria dos leucócitos, inclusive, tem uma vida curta, então, quando coletamos o sangue de um animal, estamos pegando um momento específico da vida do paciente, então precisamos entender de onde esse sangue está vindo e para onde ele vai. Então, quando coletamos um sangue periférico para análise, temos que entender como está a medula óssea e o tecido, para tentarmos entender um pouco mais sobre o paciente. Diante de um sangue periférico repleto de leucócitos, é esperado encontrar um tecido também repleto de leucócitos. Porém, também pode acontecer do problema estar na “fábrica” (medula óssea), sendo necessário então um exame de medula. Mas então, por que utilizamos o sangue periférico para fazer as análises? Por ser o mais fácil de ser coletado, permitindo que façamos até mesmo sozinhos a coleta. Etapas do leucograma 1. Concentração de Leucócitos Totais (céls/uL) 2. Exame Diferencial dos Leucócitos - feito no microscópio 3. Morfologia Celular 4. Interpretação Concentração de Leucócitos Totais (céls/uL) Essa contagem pode ser feita em um equipamento automático, onde o sangue passa pela agulha e o equipamento te dá o relatório completo de eritrócitos, leucócitos e plaquetas. Porém, muitas vezes pode ser necessário utilizar a Câmara de Neubauer, que é um contador de células universal, sendo possível colocar qualquer líquido dentro dela. Ela é baseada em dois lados espelhados, subdivididos em 9 quadradinhos, sendo convenção contar os leucócitos nos quadradinhos laterais e as hemácias no central. Como é conhecido o tamanho e a profundidade, é possível calcular quantas células têm por volume. Cada quadradinho tem 1mm x 1mm, mas a Câmara de Neubauer não é um quadrado perfeito, pois ela tem 0,1mm de profundidade. Portanto, o volume total é de 0,1mm³. Para leucócitos, é utilizado a diluição de 1:20, que significa que é utilizado 1 parte de sangue para 20 partes de um líquido específico para contagem de leucócitos, chamado de Líquido de Turk. Quando aproximamos um quadradinho lateral, observamos vários leucócitos e devemos contá-los em L invertido, para evitar que a mesma célula seja contada mais de uma vez. O 10 da fórmula é uma correção da profundidade da Câmara de Neubauer (de 0,1mm para 1mm, transformando em um cubo perfeito). Já o 20 vem do fator de diluição (1:20). Exame Diferencial dos Leucócitos Uma vez que já sabemos o total global de leucócitos, o próximo passo é fazer um esfregaço sanguíneo para o exame diferencial dos leucócitos. Devemos contar cada célula em um botão do aparelho ilustrado ao lado, até dar 100 células. Isso é feito para podermos saber a porcentagem de cada tipo celular, pois isso interfere diretamente no raciocínio (encontrar 70% de neutrófilos é diferente de encontrar 10%, por exemplo). Tipos celulares dos mamíferos São 5 tipos celulares, divididos em 2 grandes grupo: 1. Neutrófilos, eosinófilos e basófilos - polimorfonucleares (granulócitos) 2. linfócitos e monócitos - mononucleares (agranulócitos) Tipos celulares de aves, répteis e anfíbios 1. heterófilos (célula fagocitica semelhante ao neutrofilo em função, mas o mecanismo de ação é diferente), eosinófilos e basófilos - granulócitos 2. linfócitos e monócitos - agranulócitos 3. azurófilos - alguns autores acreditam que algumas espécies possuem, outros já acham que são monócitos diferenciados Obs: nessas espécies não existe a classificação de polimorfonuclear e mononuclear, pois os leucócitos variam a característica morfológica nuclear. Visualização de azurófilos na lâmina. Dinâmica leucocitária Os leucócitos são produzidos na medula óssea, com exceção dos linfócitos, que podem ser produzidos nos linfonodos, mas, de qualquer forma, a célula precursora também está na medula óssea. Didaticamente, a medula óssea é dividida em 3 compartimentos: 1. células tronco, que são pluripotentes e capazes de dar origem a qualquer tipo de célula sanguínea 2. compartimento de proliferação 3. compartimento de maturação e estocagem Saindo do compartimento de maturação e estocagem, são liberados, em animais saudáveis, neutrófilos segmentados que vão para a circulação. Na circulação existe uma divisão: 1. Pool circulante - é onde fazemos a coleta, onde tem o fluxo sanguíneo 2. Pool marginal - as células estão fixadas no endotélio, esperando para fazer a diapedese (transmigração para o tecido) Então, quando coletamos o sangue de um animal, devemos ter em mente que estamos coletando o pool circulante e que essas células coletadas são representativas para 6-10 horas. É importante saber que o tempo de trânsito dos leucócitos serem produzidos na medula óssea até serem liberados na circulação varia de 5 a 7 dias. Isso é importante pois, se há um processo inflamatório/infeccioso, vai demorar 5 a 7 dias para sair de uma célula tronco e chegar a um leucócito. Esse tempo pode ser encurtado dependendo do processo, mas nada imediato. Existem alguns animais, principalmente os cães, que têm o compartimento de maturação e estocagem muito maior, ou seja, existem muitos neutrófilos de reserva, então, diante de uma processo inflamatório/infeccioso, eles são capazes de liberar muitos neutrófilos na circulação de maneira imediata. Por isso, não é incomum encontrarmos cães com leucocitose exagerada. Existe uma diferença na relação Pool Marginal:Pool Circulante entre cães e gatos. Enquanto nos cães essa relação é de 1:1, nos gatos é de 3:1. Diapedese/transmigração leucocitária As células são produzidas na medula óssea e ficam no pool circulante. Quando elas começam a interagir com o endotélio vascular, elas se ligam a receptores específicos e transmigram (saem da corrente sanguínea e infiltram no tecido). Por isso, então, encontramos os leucócitos também nos tecidos. Dinâmica leucocitária Essa dinâmica leucocitária depende de: ● taxa de liberação leucocitária ● produção medular (quando mais responsiva a medula, mais rápida será a resposta; lembrando que animais mais jovens têm a medula óssea mais responsiva que animais mais velhos) ● destruição ● consumo tecidual ● sequestro celular Valores de referência Os valores de referência podem mudar de acordo com o país em que o exame está sendo realizado, e até mesmo de um laboratório para outro há mudanças. O ideal é que cada laboratório crie seu próprio valor de referência para a sua realidade. A tabela ao lado é de caráter informativo, para começarmos a aprender a interpretação. Valores acima dos valores referência: utilizar sufixo “ose” ou “filia” Valores abaixo dos valores de referência: utilizar o sufixo “penia” Relação neutrófilos:linfócitos ● cão: > 2:1 ● gato: > 2:1 ● bovino: 1:2 ● equino: 1,5:1 (3:2) A razão neutrófilos:linfócitos (NLR) é um biomarcador de processos inflamatórios. A inversão dessa relação é um indicador marcante de que está ocorrendo um processo inflamatório/infeccioso. Morfologia e função leucocitária Neutrófilos ● papel fundamentalna fagocitose e nos processos inflamatórios/infecciosos ● polimorfonuclear Eosinófilos ● propriedades fagocitárias e bactericidas ● participa de reações de hipersensibilidade ● participa da resposta inflamatória a estágios larvais e adultos de alguns poucos parasitas Basófilos ● presença de histamina e heparina nos seus grânulos, então possivelmente estão relacionados à reações de hipersensibilidade ● atraem eosinófilos (então não é incomum ter basofilia e eosinofilia associadas) Linfócitos ● linfócitos T - imunidade celular ● linfócitos B - imunidade humoral ● é uma célula com muito núcleo e pouco citoplasma Linfócitos reativos São células sanguíneas de defesa do corpo, com função humoral e celular. Diante de algum estímulo antigênico (vacinação, infecções, processos inflamatórios/infecciosos), alguns linfócitos podem aumentar sua atividade orgânica, produzindo substâncias com a intenção de gerar uma resposta a esse estímulo. Quando isso ocorre há uma mudança de algumas características citoplasmáticas e nucleares que fazem com que eles sejam classificados como linfócitos reativos. A característica mais marcante é que o seu citoplasma fica mais basofílico, eles podem apresentar também aumento no seu tamanho, edentação nuclear e padrão de cromatina mais frouxa (isso é, o núcleo não fica com a cor tão roxa, seu padrão se torna menos homogêneo). Observações: 1- Filhotes geralmente tendem a apresentar mais comumente linfócito reativos quando comparados com adultos 2- Cuidado para não confundir linfócitos reativos com os linfócitos aberrantes que podem estar presentes nos linfomas e leucemias Observação: não é normal, mas é comum encontrar, às vezes, metarrubrícitos, em algumas espécies domésticas, como cães e gatos principalmente quando responsivos a uma anemia. Cuidado para não confundir com linfócito. Monócitos ● função de fagocitose, porém só fagocita coisas grandes (bactérias, grandes microrganismos complexos, como leveduras e protozoários, células danificadas, debris celulares e partículas estranhas) ● participa de resposta a microrganismo intracelulares ● processamento e apresentação de antígenos (o monócito reconhece o antígeno, leva até o linfócito e apresenta a ele) Interpretação Ao analisar o resultado, avaliar a quantidade total de leucócitos e suas respectivas células. Não levar em conta apenas a porcentagem. Cinética leucocitária Fatores que influenciam ● produção ● liberação ● distribuição intravascular ● sequestro celular ● vida média ● diapedese Produção leucocitária A produção é piramidal, partindo de uma célula progenitora (mieloblasto) Desvio Nuclear de Neutrófilos à Esquerda (DNNE) Os neutrófilos segmentados são os comumente encontrados na circulação. A partir do momento que começa a desviar para esquerda, pode-se começar a visualizar células mais jovens na circulação. Chamamos isso de Desvio Nuclear de Neutrófilos à Esquerda (DNNE). Ele é subdividido em duas classificações: 1. Regenerativo: nº de células maduras > nº de células imaturas 2. Degenerativo: nº de células maduras < nº de células imaturas (isso significa que a produção não está sendo suficiente para o consumo) Neutrófilos tóxicos Geralmente, quando há DNNE, vem acompanhado de neutrófilos tóxicos, que são aberrações de maturação, tanto em tamanho da célula, quanto em forma nuclear e características dos grânulos e citoplasma. Temos, como neutrófilos tóxicos: ● basofilia citoplasmática ● presença de grânulos tóxicos ● Corpúsculos de Dohle ● neutrófilos gigantes ● vacuolização citoplasmática ● núcleo em rosca ou anel (Donuts) Esses ocorrem pois, quando a demanda é muito grande, a medula começa a não dar conta da produção, então começam a sair células com “defeitos”. São vistas em pacientes com intensa infecção bacteriana, sepse, condição inflamatória aguda e extensa destruição tecidual. Desvio Nuclear de Neutrófilos à Direita (DNND) É a presença de concentração significativa de neutrófilos hipersegmentados. Isso significa que, ao invés de passar 6-10 horas na corrente circulatória, ele ficou mais tempo. Podem ser diversas as causas que levam a isso, como, por exemplo, falta de citocina, ou inibição do processo de diapedese e destruição fisiológica dos neutrófilos. Neutrofilia Possíveis causas: ● inflamatória/infecciosa ● leucocitose fisiológica, também chamada de estresse de coleta ● leucograma de estresse ● leucemias ● Reação Leucemóide: termo usado para descrever qualquer leucocitose extrema semelhante à leucemia, mas comprovadamente não leucêmica. Esse termo pode ser aplicado apenas restrospectivamente. Leucocitose fisiológica (adrenalina) Ocorre em resposta à adrenalina, sendo uma resposta de luta ou fuga. Tem-se leucocitose por neutrofilia e linfocitose sem DNNE ou com discreta presença de DNNE sem presença de neutrófilos tóxicos. As células que antes estavam coladas no endotélio (Pool Marginal) se desprendem e passam para o Pool Circulante. Nos cães, pode-se visualizar o dobro do número normal de células. Já nos gatos, pode-se visualizar até 3x o valor normal. Essa diferença se dá devido à diferença na proporção Pool Marginal:Pool Circulante que há entre essas duas espécies. Leucograma de estresse (cortisol) Ocorre em resposta ao corticoide/cortisol. Por exemplo, animais que vivem acorrentados ou que sofrem agressão física, muitas vezes desenvolvem o quadro de leucocitose por estresse. O leucograma de estresse é causado por glicocorticóides endógenos ou exógenos e é caracterizado por leucocitose moderada por neutrofilia, linfopenia, eosinopenia, podendo haver ou não monocitose. Muitas vezes, esse quadro é acompanhado de DNND. Neutropenia Causas: ● inflamatória/infecciosa ● destruição ● hipoplasia medular (ex: parvovirose, FeLV, erliquiose) ● produção insuficiente Linfocitose Causas: ● inflamação crônica (viral, como nos casos de FeLV ou bacteriana) ● fisiológica ● leucemia linfocítica ● linfoma ● hipoadrenocorticismo (Doença de Addison) Obs: sempre olhar a morfologia celular para entender melhor a causa Linfopenia Causa: ● aumento nos níveis sanguíneos de corticoide por: ○ hiperadrenocorticismo ○ administração exógena de corticoide ○ animal estressado (psicologicamente ou dor) ● inflamação aguda (viral ou bacteriana) ● hipoplasia medular ○ leucemia ○ infecção ○ quimioterapia Monocitose/monocitopenia Sempre que pensamos nos monócitos, devemos nos atentar na relação sangue:tecido. Os monócitos, uma vez que saem da corrente circulatória e periférica e vão para os tecidos, passam a ser chamados de macrófagos. Inclusões leucocitárias São várias as inclusões que podemos encontrar nos leucócitos. As mais comuns são: ● Erliquiose ● Hepatozoon (ocorre também em animais silvestres) ● Corpúsculos de Lentz (Distemper inclusion) ● Bactérias ● Leishmaniose ● Histoplasmose ● Esporotricose, etc Exemplo de interpretação Esse paciente apresenta: leucocitose por neutrofilia, com desvio nuclear de neutrófilos à esquerda e com linfopenia. É importante também tentar entender o que poderia estar causando isso: ● não pode ser uma leucocitose fisiológica devido à linfopenia e porque o desvio nuclear de neutrófilos à esquerda está alto (o esperado é um desvio discreto) Esse paciente apresenta: leucopenia importante, presença de metamielócitos, neutropenia, linfopenia, eosinopenia e desvio nuclear de neutrófilos à esquerda degenerativo. Esse paciente apresenta: leucocitose por linfocitose. Esse paciente apresenta: leucocitose por neutrofilia, com linfocitose. Suspeita de estresse de coleta.
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