Buscar

Resumo Anestesia Geral 1

Prévia do material em texto

1 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 
Anestesiologia 
ANESTESIA GERAL I 
Definição: 
A anestesia geral é definida como a 
depressão do SNC que resulta em perda da 
capacidade de percepção e de resposta aos 
estímulos ambientais. 
Em um sentido mais amplo, a anestesia geral 
pode ser definida como uma depressão 
global, mas reversível, da função do SNC, 
resultando na perda de percepção e de 
resposta a todos os estímulos externos. Os 
componentes essenciais do estado 
anestésico são a imobilização, a amnésia e 
a diminuição das respostas autônomas aos 
estímulos nocivos. 
Os 4 pilares da anestesia geral são: 
- Analgesia. 
- Hipnose (perda de consciência e amnésia). 
- Proteção de reflexos. 
- Relaxamento muscular. 
Fases da Anestesia Geral: 
- Indução: processo que inicia a anestesia 
geral; a indução pode ocorrer de forma 
inalatória, através do uso de máscara, 
venosa, através da administração de 
agentes hipnóticos por via endovenosa, e 
ainda de forma intramuscular, nasal ou retal, 
que são pouco utilizadas na prática. 
- Manutenção: a manutenção da anestesia 
geral pode ocorrer de forma inalatória, 
venosa ou por meio da combinação destas 
duas formas. 
- Despertar: processo que encerra a 
anestesia geral por meio da interrupção da 
manutenção da anestesia e do uso de 
antagonistas dos agentes anestésicos 
anteriormente administrados. 
A promoção de todas as fases da anestesia 
geral envolvem a necessidade do 
conhecimento da farmacologia das drogas 
anestésicas, tanto em estados fisiológicos 
quanto em estados patológicos. Este 
conhecimento é fundamental para se 
estabelecer a profundidade adequada da 
anestesia geral no paciente. 
Farmacologia da Anestesia Geral: 
O conhecimento da farmacologia dos 
agentes anestésicos divide-se em: 
- Farmacocinética: compreende os 
processos de interação do organismo com a 
droga anestésica, como vias de 
administração, absorção, distribuição, 
biotransformação ou metabolização e 
eliminação. 
- Farmacodinâmica: compreende os 
processos de interação da droga anestésica 
com o organismo, ou seja, representa os 
fenômenos que a droga anestésica produz 
no organismo, como local de ação, 
mecanismo de ação e efeitos. 
O objetivo da administração do anestésico 
inalatório é a produção do estado anestésico 
por meio de uma concentração específica de 
moléculas do agente anestésico no SNC. 
O controle da profundidade da anestesia 
geral com indução e manutenção inalatória 
pode ser realizado por meio da avaliação da 
pressão parcial do agente anestésico no ar 
alveolar (fração expirada do anestésico). 
Quando se utiliza o analisador de gases, 
considera-se que a fração expirada do 
anestésico reflete a sua pressão parcial no 
SNC (córtex cerebral). 
Se um anestésico for inspirado por um 
período de tempo suficiente, ele atingirá o 
equilíbrio com a mesma pressão parcial em 
todos os compartimentos do corpo. Na 
situação de equilíbrio, as pressões parciais 
do agente anestésico nos compartimentos 
do corpo (alvéolos pulmonares, sangue 
arterial e cérebro) estabilizam-se/igualam-
se. 
 
Os anestésicos inalatórios equilibram-se nos 
tecidos corporais com a mesma pressão 
parcial. Entretanto, a velocidade para que o 
 
2 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 
agente anestésico atinja a concentração de 
equilíbrio varia para cada tecido. 
A farmacocinética da anestesia inalatória 
reflete a velocidade de equilíbrio das 
pressões parciais do agente anestésico entre 
os diferentes compartimentos corporais. Os 
fatores que influenciam na velocidade de 
equilíbrio são a solubilidade da droga 
anestésica no tecido, a massa ou o volume 
do compartimento em relação à massa ou ao 
volume total do corpo e o fluxo sanguíneo 
que atravessa cada compartimento. 
Os 3 principais grupos de tecidos corporais e 
suas principais características são: 
Grupos de tecidos 
% do débito 
cardíaco 
% do peso 
corporal 
Tecidos altamente 
vascularizados 
75% 9% 
Tecido muscular 18% 50% 
Tecido adiposo 5,5% 19% 
 
OBS.: Os tecidos altamente vascularizados 
compreendem SNC, fígado e rins. 
Os tecidos altamente vascularizados 
recebem uma porcentagem muito maior do 
débito cardíaco quando comparados aos 
outros tecidos. Além disso, eles representam 
uma porcentagem muito pequena do peso 
corporal total. Isso significa que o agente 
anestésico chega nestes tecidos em uma 
quantidade muito maior e é capaz de saturá-
los de forma muito rápida, fazendo com que 
a velocidade de equilíbrio do anestésico nos 
tecidos altamente vascularizados seja a 
maior de todas. 
Os tecidos muscular e adiposo recebem uma 
porcentagem muito menor do débito 
cardíaco quando comparados aos outros 
tecidos. Além disso, eles representam uma 
porcentagem muito grande do peso corporal 
total. Assim, o agente anestésico chega 
nestes tecidos em uma quantidade muito 
menor e, devido à maior massa, satura-os de 
forma muito mais lenta quando comparada 
aos tecidos altamente vascularizados, 
fazendo com que a velocidade de equilíbrio 
do anestésico nos tecidos muscular e 
adiposo seja muito menor. 
O tempo de saturação, isto é, o tempo para 
se atingir o equilíbrio do anestésico varia 
para cada tecido. Como exemplo, pode-se 
citar o Isoflurano, anestésico inalatório, que 
satura os tecidos altamente vascularizados 
em um tempo médio de 2,1 minutos, o tecido 
muscular em 88 minutos e o tecido adiposo 
em 2.039 minutos. Assim, a velocidade de 
equilíbrio do anestésico nos diferentes 
compartimentos corporais pode ser 
resumida da seguinte forma: 
Tecidos altamente vascularizados > tecido 
muscular > tecido adiposo. 
A constante de tempo para o equilíbrio 
depende do volume (ou massa) dos 
compartimentos corporais e do fluxo 
sanguíneo que os atravessa. A razão entre o 
volume e o fluxo sanguíneo de cada 
compartimento corporal determina a sua 
constante de tempo. 
Constante de tempo = 𝑣𝑜𝑙𝑢𝑚𝑒 𝑓𝑙𝑢𝑥𝑜⁄ 
A constante de tempo para o equilíbrio entre 
a pressão alveolar e a pressão de equilíbrio 
nos diferentes tecidos corporais depende da 
perfusão sanguínea e não da difusão do 
anestésico no tecido. 
 
λ = coeficiente de bipartição (entre sangue 
arterial e alvéolo pulmonar, entre cérebro e 
sangue arterial, entre músculo e sangue 
arterial, entre gordura e sangue arterial, etc). 
O coeficiente de bipartição é diretamente 
proporcional à solubilidade do agente 
anestésico pelo sangue e/ou pelo tecido. 
 
3 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 
A alta solubilidade de um anestésico ao 
tecido em relação ao sangue significa grande 
transferência de anestésico do sangue para 
o tecido e, consequentemente, maior tempo 
para o anestésico completar a saturação do 
tecido, isto é, maior tempo para que as 
pressões parciais do anestésico no sangue e 
no tecido tornem-se iguais. Assim, o 
coeficiente de bipartição permite que 
tenhamos uma estimativa da velocidade de 
aumento ou de diminuição da pressão parcial 
do anestésico em um determinado tecido e, 
consequentemente, do tempo para se atingir 
o equilíbrio entre a pressão parcial do 
anestésico no tecido e a pressão parcial do 
anestésico no sangue. 
Quanto maior a solubilidade do tecido pelo 
anestésico e menor a solubilidade do tecido 
pelo sangue, mais lento será o tempo para o 
equilíbrio entre as pressões parciais do 
anestésico no sangue e no tecido e, 
consequentemente, mais lento será o tempo 
para a saturação do tecido pelo anestésico. 
Por isso, o anestésico ideal é aquele que 
apresenta solubilidade semelhante pelo 
sangue e pelo tecido, de forma que o 
equilíbrio entre as pressões do anestésico no 
sangue e no tecido seja atingido mais 
rapidamente e o efeito anestésico também. 
Quanto menor o valor do coeficiente de 
bipartição e quanto mais próximos os valores 
do coeficiente de bipartição 
sangue/anestésico e tecido/anestésico, mais 
acelerado/rápido será o tempo para o 
equilíbrio, para a saturação do tecido pelo 
anestésico e para o efeito anestésico em si. 
Coeficiente de bipartição tecido/gás: 
 HalotanoIsoflurano Sevoflurano Desflurano N2O 
Sangue 2,4 1,4 0,65 0,45 0,46 
Cérebro 4,5 2,2 1,1 0,55 0,49 
Coração 4,1 2,2 1,1 0,55 0,47 
Músculo 7 3,6 1,7 0,78 0,53 
Gordura 137 70 37 13 1,1 
 
O tempo de indução e o tempo de despertar 
da anestesia geral dependem do coeficiente 
de bipartição tecido/gás. Quanto menor é o 
coeficiente de bipartição tecido/gás, mais 
acelerado/rápido é o tempo de saturação do 
tecido pelo anestésico e, 
consequentemente, menor é o tempo de 
indução e o tempo de despertar do 
anestésico. 
Por exemplo, o halotano, que foi o primeiro 
anestésico inalatório utilizado, apresenta 
coeficientes de bipartição com valores altos, 
fazendo com que o tempo para que ocorra a 
saturação dos tecidos e para que se atinja o 
equilíbrio entre a pressão parcial do gás no 
sangue e nos tecidos seja lento. Dessa 
forma, o halotano apresenta tempo de 
indução e tempo de despertar longos. 
Por exemplo, quando comparamos os 
coeficientes de bipartição cérebro/gás e 
músculo/gás do Isoflurano com o do 
Desflurano, podemos observar que a 
capacidade do cérebro em concentrar 
Isoflurano é 4 vezes maior do que em 
concentrar Desflurano e a capacidade do 
músculo em concentrar Isoflurano é 4,6 
vezes maior do que em concentrar 
Desflurano, fazendo com que o volume de 
Isoflurano necessário para saturar o cérebro 
seja 4 vezes maior do que o volume 
necessário de Desflurano para o mesmo 
objetivo ou que o volume necessário de 
Isoflurano para saturar o músculo seja 4,6 
vezes maios do que o volume necessário de 
Desflurano para o mesmo objetivo. Portanto, 
considerando a mesma velocidade para a 
administração de Isoflurano e de Desflurano 
para o paciente, o tempo para induzir a 
anestesia geral será menor quando 
utilizarmos o Desflurano, visto que os tecidos 
necessitam de menor concentração deste 
gás anestésico para que sejam saturados. 
Portanto, entre os gases anestésicos 
apresentados na tabela, o gás que apresenta 
o menor tempo de indução e de despertar da 
anestesia geral é o N2O e, pelo contrário, o 
gás que apresenta o maior tempo de indução 
e de despertar da anestesia geral é o 
halotano. 
O coeficiente de bipartição óleo/gás 
determina a potência do agente anestésico. 
Quanto maior a lipossolubilidade do 
anestésico, maior o seu coeficiente de 
bipartição óleo/gás e, consequentemente, 
maior a sua potência. Por outro lado, 
entretanto, quanto maior é a 
lipossolubilidade do anestésico, maior é o 
tempo necessário para a sua eliminação do 
organismo. 
 
4 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 
 
 
 
 
 
Assim, o coeficiente de bipartição óleo/gás é 
inversamente proporcional ao tempo de 
recuperação da anestesia geral. 
Portanto, o anestésico inalatório mais 
potente é o halotano, visto que ele apresenta 
o maior coeficiente de bipartição óleo/gás 
quando comparado aos agentes 
anestésicos. Entretanto, o tempo de indução 
e de recuperação da anestesia geral quando 
utilizamos halotano é muito mais lento. Por 
isso, o halotano é muito pouco utilizado 
atualmente. 
O coeficiente de bipartição sangue/gás é 
diretamente proporcional ao tempo de 
indução da anestesia geral. Quanto menor o 
coeficiente de bipartição sangue/gás, mais 
rápido o tempo de indução da anestesia 
geral. Quanto maior o coeficiente de 
bipartição sangue/gás, mais lento o tempo de 
indução da anestesia geral, visto que se o 
anestésico apresenta alta solubilidade no 
sangue, a saturação dos outros tecidos 
(cérebro, músculo, gordura) é mais lenta e o 
tempo de indução da anestesia geral é 
maior. 
Determinantes dos gradientes de pressão 
parciais necessários para a indução da 
anestesia geral: 
- Transferência do anestésico do aparelho de 
anestesia para o alvéolo pulmonar (oferta de 
anestésico para o alvéolo pulmonar): 
→ Pressão parcial de gás anestésico 
inspirada. 
→ Características do sistema de anestesia. 
→ Ventilação alveolar. 
→ Capacidade residual funcional. 
- Transferência do anestésico do alvéolo 
pulmonar para o sangue arterial (remoção de 
anestésico do alvéolo pulmonar): 
→ Coeficiente de bipartição sangue/gás. 
→ Débito cardíaco. 
 
 
 
 
 
 
→ Diferença de pressão parcial entre alvéolo 
pulmonar e sangue arterial. 
- Transferência do anestésico do sangue 
arterial para o cérebro (remoção de 
anestésico do sangue e distribuição para o 
cérebro): 
→ Coeficiente de bipartição cérebro/sangue. 
→ Fluxo sanguíneo cerebral. 
→ Diferença de pressão parcial entre sangue 
e cérebro. 
Há duas diferenças farmacocinéticas 
principais entre a indução e a recuperação 
da anestesia geral: 
- Enquanto o aumento da concentração de 
anestésico acelera a indução da anestesia 
geral, não há como estabelecer uma 
concentração alveolar abaixo de zero para 
acelerar a recuperação da anestesia geral. 
- Todos os tecidos iniciam a indução com 
pressão parcial zero de anestésico. 
Entretanto, na recuperação da anestesia 
geral, cada tecido terá uma concentração de 
anestésico diferente. O músculo e a gordura 
podem continuar absorvendo anestésico por 
horas, devido à redistribuição que se 
mantém até que a pressão parcial alvéolo-
sangue do anestésico torne-se menor que a 
pressão parcial tecido/sangue do anestésico. 
Em relação à biotransformação, a maioria 
dos anestésicos inalatórios praticamente não 
sofre nenhum tipo de reação de 
metabolização, sendo eliminados em sua 
forma nativa por meio da expiração. Os 
anestésicos que são metabolizados têm 
como produto final o ácido trifluoroacético. 
Anestésico Metabolização Eliminação 
Halotano 15-20% 
Fígado (P450) 
Pulmonar (expiração) 
Renal 
Isoflurano 0,2% Pulmonar (expiração) 
Sevoflurano 2-3% Pulmonar (expiração) 
 
5 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 
Desflurano < 0,1% Pulmonar (expiração) 
Óxido Nitroso 
(N2O) 
< 0,1% 
Pulmonar (expiração) 
Pele 
 
A concentração alveolar mínima (CAM) é 
definida como a pressão parcial alveolar de 
anestésico que causa imobilidade em 
resposta a uma incisão cirúrgica em 50% dos 
pacientes. A potência do anestésico é 
inversamente proporcional à sua 
concentração alveolar mínima, visto que a 
presença de uma baixa pressão alveolar de 
anestésico já é suficiente para causar a 
anestesia do paciente. 
A CAM é inversamente proporcional ao 
coeficiente de bipartição óleo/gás e, 
consequentemente, à potência do agente 
anestésico. Se a CAM é baixa, o coeficiente 
de bipartição óleo/gás e a potência do 
anestésico são altas e uma pressão parcial 
relativamente baixa já é suficiente para 
produzir a anestesia geral do paciente. 
Anestésico λ óleo/gás CAM 
Halotano 224 0,7 
Isoflurano 99 1,17 
Sevoflurano 53 1,9 
Desflurano 20 6,0 
Óxido Nitroso 
(N2O) 
1,4 104 
 
OBS.: O valor da CAM diminui com o 
aumento da idade! 
 
 
Mecanismo de ação dos anestésicos gerais: 
Os anestésicos gerais potencializam as 
sinapses inibitórias por meio de sua ação 
sobre os receptores de GABA e de glicina 
(neurotransmissores inibitórios), além de 
exercerem efeito inibitório sobre as sinapses 
excitatórias por meio de sua ação sobre os 
receptores AMPA e NMDA. 
Os anestésicos muito provavelmente 
também atuam sobre canais de sódio e de 
potássio, inibindo a transmissão dos 
potenciais de ação e promovendo a 
hiperpolarização do neurônio. Embora 
existam evidências, ainda não há 
comprovação científica de tal mecanismo de 
ação. 
Apesar do uso amplamente difundido e 
seguro dos anestésicos inalatórios, os 
mecanismos de ação e os locais exatos da 
ação anestésica ainda permanecem 
desconhecidos. 
Efeitos dos anestésicos no organismo: 
- Sistema Nervoso Central (SNC): 
→ Exercem efeito depressor sobre a 
atividade eletroencefalográfica, que é 
proporcional ao aumento da CAM. 
→ Todos os agentes anestésicos 
inalatórios/voláteis aumentam o fluxo 
sanguíneo cerebral de modo dose-
dependente. 
→ Os anestésicos inalatórios diminuem o 
metabolismo e o consumo de oxigênio 
cerebral. 
- Sistema Cardiovascular: 
→ Todos os anestésicos halogenados, 
exceto o halotano, podem causar aumentotransitório da FC. 
→ O efeito direto dos anestésicos inalatórios 
sobre a função miocárdica é depressor de 
modo dose-dependente. 
→ Todos os anestésicos halogenados, 
exceto o Sevoflurano, aumentam a PVC. 
- Sistema Respiratório: 
→ Quando administrados sob ventilação 
espontânea, os anestésicos halogenados 
exercem efeito depressor sobre a ventilação. 
→ Os anestésicos halogenados são potentes 
broncodilatadores. 
 
6 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 
→ Os anestésicos inalatórios alteram a 
distribuição do fluxo sanguíneo pulmonar e, 
consequentemente, podem alterar as trocas 
gasosas. 
- Fígado: 
→ Os anestésicos Isoflurano, Desflurano e 
Sevoflurano apresentam mínimos efeitos 
sobre o fluxo sanguíneo da artéria hepática e 
da veia porta. O halotano, por sua vez, tem 
efeito vasoconstritor sobre a artéria hepática 
com consequente redução de 65% na 
disponibilidade de oxigênio para fígado 
durante a anestesia geral. 
→ O metabolismo oxidativo do halotano 
resulta na produção do ácido trifluoroacético. 
As proteínas hepáticas acetiladas são 
reconhecidas pelo sistema imunológico 
como neoantígenos, com consequente 
formação de anticorpos anti-ácido 
trifluoroacético. 
- Rins: 
→ Os anestésicos halogenados promovem 
redução dose-dependente do fluxo 
sanguíneo renal, da TFG e do débito urinário. 
- Hipertermia maligna. 
- Efeitos obstétricos. 
- Efeitos mutagênicos e sobre a medula 
óssea. 
- Efeitos cardioprotetores: 
→ Alguns estudos demonstram que os 
anestésicos inalatórios apresentam efeitos 
cardioprotetores diretos, isto é, pré-
condicionam diretamente ou aumentam 
indiretamente o pré-condicionamento 
isquêmico, além de promoverem pós-
condicionamento, resultando em proteção 
contra a lesão miocárdica isquêmica 
reversível e irreversível. 
→ Em modelos experimentais de isquemia 
miocárdica ou IAM, o declínio da função 
contrátil induzido por anestésicos inalatórios 
foram bem tolerados e não causaram 
disfunção sistólica significativa. Na verdade, 
os anestésicos voláteis exerceram 
significativos efeitos benéficos sobre a 
função sistólica e diastólica durante a 
isquemia do miocárdio e a reperfusão da 
lesão. Os anestésicos reduziram o tamanho 
do IAM experimental, preservaram as 
integridades estrutural e metabólica durante 
a isquemia e a reperfusão, aumentando a 
recuperação funcional do miocárdio 
lesionado, e melhoraram os índices de 
desempenho diastólico do VE durante a 
breve oclusão da artéria coronária. 
Bloqueadores Neuromusculares: 
Os bloqueadores neuromusculares 
utilizados na anestesia geral são 
classificados em despolarizantes e não 
despolarizantes. 
A contração muscular é induzida pela 
despolarização e consequente geração de 
um potencial de ação da célula muscular. A 
despolarização da célula muscular depende 
da liberação do neurotransmissor 
acetilcolina pelas terminações nervosas do 
neurônio motor (eferente) na fenda sináptica 
e pela consequente ligação do 
neurotransmissor aos receptores nicotínicos 
localizados na superfície celular da fibra 
muscular. 
 
Os bloqueadores neuromusculares são 
substâncias hidrossolúveis e ionizadas cujo 
mecanismo de ação envolve os receptores 
colinérgicos nicotínicos da musculatura 
estriada, provocando paralisia da 
musculatura. 
As drogas despolarizantes produzem seu 
efeito de bloqueio da contração muscular por 
meio da despolarização sustentada da placa 
motora. 
As drogas não despolarizantes 
apresentam efeito de bloqueio da contração 
muscular por meio da inibição competitiva da 
acetilcolina no receptor nicotínico, inibindo a 
despolarização da placa motora. 
 
7 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 
Os principais bloqueadores 
neuromusculares são: 
- Despolarizantes: 
→ Succinilcolina (Suxametônio). 
- Não Despolarizantes: 
→ Aminoesteroides: pancurônio, vecurônio e 
rocurônio. 
→ Benzilisoquinolínicos: atracúrio, 
cisatracúrio e mivacúrio. 
Todas as drogas bloqueadoras 
neuromusculares assemelham-se 
estruturalmente à acetilcolina! 
Mecanismo de Ação das Drogas 
Despolarizantes: 
Ligam-se ao receptor nicotínico e atuam 
como a acetilcolina, despolarizando a placa 
motora e permanecendo ligados ao receptor 
por um longo período de tempo, causando 
paralisia flácida. 
Mecanismo de Ação das Drogas Não 
Despolarizantes: 
- Em baixas doses: 
→ Competem com a acetilcolina pelo 
receptor nicotínico. 
→ Impedem a despolarização da placa 
motora e inibem a contração muscular. 
→ O efeito de bloqueio neuromuscular pode 
ser revertido aumentando-se a concentração 
de acetilcolina na fenda sináptica. O 
aumento da concentração de acetilcolina na 
fenda sináptica pode ser provocado pelo uso 
de inibidores da enzima acetilcolinesterase, 
responsável pela degradação da acetilcolina 
na fenda sináptica. 
- Em altas doses: 
→ Causam bloqueio adicional da 
transmissão neuromuscular e reduzem a 
capacidade dos inibidores da 
acetilcolinesterase de reverterem o efeito de 
bloqueio neuromuscular. 
Train Of Four (TOF): 
- Sequência de 4 estímulos, que são 
pontuados de 0 a 10. 
- Monitora o grau de bloqueio neuromuscular 
do paciente sob anestesia geral. 
- Quanto menor é a pontuação do TOF, 
maior é o grau de bloqueio neuromuscular 
induzido pela anestesia geral. 
- Quanto maior é a pontuação do TOF, maior 
é a atividade de contração muscular do 
paciente. 
- Quanto maior é a pontuação do TOF, 
menor é o risco de o paciente apresentar 
insuficiência respiratória quando for 
extubado após a anestesia geral, uma vez 
que a musculatura respiratória já voltou a 
contrair normalmente. 
Efeitos dos bloqueadores neuromusculares 
no organismo: 
- A Succinilcolina e os Benzilisoquinolínicos 
podem causar aumento da liberação de 
histamina pelos mastócitos, resultando em 
diminuição da pressão arterial (hipotensão), 
broncoespasmo e hipersecreção brônquica. 
- A Succinilcolina pode estimular receptores 
muscarínicos, causando vasodilatação e 
hipotensão arterial. 
- Os Benzilisoquinolínicos podem bloquear 
fracamente receptores muscarínicos, 
causando taquicardia. 
- Os Aminoesteroides podem bloquear 
moderadamente receptores muscarínicos do 
sistema cardiovascular, causando 
taquicardia. 
- A Galamina pode bloquear fortemente 
receptores muscarínicos do sistema 
cardiovascular, causando taquicardia grave. 
Farmacocinética dos bloqueadores 
neuromusculares: 
 
 
Droga 
Início de 
Ação 
Tempo de 
Ação 
Metabolização Excreção 
Succinilcolina < 1 min 3-5 min 
Hepática 
Plasmática 
- 
Pancurônio 3-4 min > 110 min Hepática/Biliar Renal 
Vecurônio 2-3 min 20-40 min Hepática/Biliar Renal 
Rocurônio 1-1,5 min 45-75 min Hepática/Biliar Renal 
Atracúrio 2-3 min 20-30 min Via de Hofmann Renal 
Cisatracúrio 2-3 min 20-30 min Via de Hofmann Renal 
Mivacúrio 1,5-2,5 min 25-30 min Plasmática Renal 
 
8 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 
Os bloqueadores neuromusculares sofrem 
metabolização hepática ou metabolização 
plasmática, por meio da Via de Hofmann, na 
qual ocorre degradação espontânea da 
droga sob pH e temperatura fisiológicas. 
A eliminação dos bloqueadores 
neuromusculares é renal. 
Existem situações nas quais há diminuição 
da ação da enzima pseudocolinesterase, 
responsável pela degradação da 
Succinilcolina (Suxametônio) na fenda 
sináptica. Nestes casos, há aumento da 
concentração da droga na fenda sináptica e 
o bloqueio neuromuscular torna-se mais 
prolongado. As principais situações são: 
- Deficiência congênita de 
pseudocolinesterase (doença autossômica 
recessiva). 
- Gravidez (diminuição da atividade da 
pseudocolinesterase em aproximadamente 
30%). 
- Caquexia, insuficiência hepática e 
insuficiência renal (diminuição da produção 
de pseudocolinesterase). 
- Hipotermia (diminuição da atividade da 
pseudocolinesterase). 
- Uso de inibidores da pseudocolinesterase. 
- Botulismo. 
- Plasmaférese. 
Quando estas situações já são conhecidas 
antes do procedimento anestésico, prefere-
se a administração de um bloqueador 
neuromuscular não despolarizante.Intubação Orotraqueal (IOT): 
As características anatômicas que dificultam 
o manejo das vias aéreas para a realização 
da IOT são: 
 
 
9 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 
O aumento do número de tentativas de IOT 
aumenta a probabilidade de eventos 
adversos. Os principais eventos adversos 
são: 
Evento Adverso ≤ 2 tentativas > 2 tentativas 
Hipoxemia 11,8% 70% 
Regurgitação 1,9% 22% 
Aspiração 0,8% 13% 
Bradicardia 1,6% 21% 
PCR 0,7% 11% 
 
O tempo decorrido desde a pré-oxigenação 
(oxigenação prévia à IOT) para a queda da 
saturação de oxigênio (SpO2) até 90% varia 
quanto ao IMC do paciente. 
Quanto maior é o IMC do paciente, menor é 
o tempo para que ocorra a queda da SpO2. 
Quanto menor é o IMC do paciente, maior é 
o tempo para que ocorra a queda da SpO2. 
Assim, pacientes obesos têm maior risco de 
eventos adversos devido à IOT, pois 
apresentam menor reserva pulmonar de 
oxigênio, além de geralmente apresentarem 
condições anatômicas que predispõem à via 
aérea difícil. 
Para evitar problemas durante a realização 
da IOT, deve-se: 
- Conhecer a anatomia e a fisiologia da via 
aérea. 
- Conhecer e manipular os instrumentos 
necessários para o manejo das vias aéreas. 
- Posicionar o paciente adequadamente. 
- Reconhecer situações de potenciais 
dificuldades para a IOT. 
- Treinar. 
Os materiais que são, ou que podem ser, 
utilizados no período pré-IOT são: 
- Máscara facial. 
- Cânula orofaríngea (cânula de Guedel) ou 
cânula nasofaríngea de tamanhos 
adequados. 
A obtenção da perviedade das vias aéreas 
no período pré-IOT é realizada por meio de: 
- Manobra de Chin-Lift: hiperextensão 
cervical e elevação do mento em pacientes 
sem trauma cervical. 
- Manobra de Jaw-Trust: elevação (tração) 
do ângulo da mandíbula. 
- Cânula orofaríngea: garante a perviedade 
da via aérea evitando a queda da base da 
língua. 
- Cânula nasofaríngea: garante a perviedade 
da via aérea mesmo com a queda da base 
da língua. 
A ventilação do paciente pré-IOT é realizada 
por meio do sistema máscara-balão, que 
representa o primeiro recurso disponível 
para a manutenção da via aérea e da 
ventilação. A máscara deve ter tamanho e 
forma compatíveis com a anatomia do 
paciente. O paciente deve ser posicionado 
com o pescoço estendido e o mento elevado 
(posição olfativa), exceto quando houver 
suspeita de trauma cervical. 
A manutenção da máscara facial na posição 
adequada deve evitar que ocorra 
compressão de partes moles, de forma que 
a tração seja realizada na parte óssea da 
mandíbula. 
Tentativa Ótima de Intubação: 
- Profissional com experiência em IOT (> 3 
anos). 
- Tônus muscular insignificante. 
- Pressão laríngea externa ótima (posição 
adequada da cabeça e do pescoço). 
- Tipo da lâmina e tamanho da lâmina 
adequados. 
- Posição ótima da cabeça e do pescoço. 
O adequado posicionamento da cabeça e do 
pescoço são fundamentais para o manejo da 
via aérea. Quando o paciente está em 
decúbito formando um ângulo de 0º com a 
maca, há desalinhamento entre os eixos oral, 
faríngeo e laríngeo, tornando difícil a 
visualização da via aérea. 
 
 
10 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 
O posicionamento ideal da cabeça e do 
pescoço envolvem a extensão cervical e a 
colocação de um coxim sob a região 
occipital, de modo a alinhar os eixos faríngeo 
e laríngeo e facilitar a visualização e o 
manejo da via aérea. 
 
Ao ser introduzida, a lâmina deve ser 
movimentada da esquerda para a direita de 
forma a ganhar espaço na orofaringe. Ao ser 
introduzido, o tubo endotraqueal deve ser 
rotacionado no sentido anti-horário de forma 
a evitar lesão de aritenoides. 
Uma alternativa à realização da IOT é o uso 
da máscara laríngea, dispositivo de 
localização supraglótica que permite a 
ventilação do paciente mesmo em situações 
difíceis. 
 
A via aérea difícil é definida como a situação 
clínica na qual um profissional treinado tem 
dificuldade em intubar o paciente e/ou de 
manter a ventilação manual por meio da 
máscara facial. 
A velocidade de dessaturação após a 
administração de bloqueador neuromuscular 
de curta duração varia quanto ao IMC do 
paciente e à presença ou ausência de 
comorbidades. Mesmo com recuperação 
rápida, a indução da anestesia geral com o 
bloqueio neuromuscular na impossibilidade 
de ventilação pode resultar em hipóxia.

Continue navegando