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FUNDAMENTOS EDUCAÇÃO DE JOVENS E ADULTOS E EDUCAÇÃO POPULAR Ancora-se nas últimas perspectivas teóricas do campo da EJA, que a toma como um processo contínuo de aprendizagem por toda a vida, não a reduzindo à modalidade escolar, nem a tomando como suplência, mas sim como direito subjetivo, que deve ser garantido a todos os indivíduos não escolarizados ou com baixa escolarização. Inspira-se especialmente nas contribuições teóricas de Paulo Freire, buscando apropriar-se de seus fundamentos políticos, filosóficos e pedagógicos em relação ao caráter libertador e de compromisso com uma escolarização de qualidade para esse segmento social. Aula 1: Os Novos Paradigmas da Educação de Jovens e Adultos: Educar Quem e Para Quê? Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: 1. Situar a Educação de Jovens e Adultos e a Educação Popular no contexto societário brasileiro atual; 2. identificar as relações educacionais e os sujeitos envolvidos na EJA nos dias atuais. Aula 2: Abordagem Histórica da EJA no Brasil – Anos 40/50/60 Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: 1. Relacionar as primeiras iniciativas, em nível nacional, de combate ao analfabetismo ao contexto histórico internacional e brasileiro; 2. analisar criticamente a atuação e os resultados alcançados pelas primeiras campanhas de erradicação do analfabetismo no Brasil; 3. conhecer as experiências de educação popular, destacando as iniciativas do Nordeste e a proposta político-pedagógica de Paulo Freire, amplamente difundida no período inicial da década de 60 no Brasil; 4. entender os novos paradigmas educacionais e sociais que emergiram desse cenário, identificando os principais movimentos e iniciativas e sua importância para a história do país. Aula 3: Abordagem Histórica da EJA no Brasil – Anos 70/80/90 Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: 1. Descrever as reformas e os projetos educacionais implementados pelos governos militares no campo da EJA no Brasil, com especial ênfase aos seus aspectos políticos e ideológicos; 2. analisar as principais políticas implementadas no período da Ditadura Militar, em especial: a Cruzada ABC, o Mobral e a regulamentação do Ensino Supletivo; 3. resgatar o processo histórico de surgimento de novos paradigmas políticos e pedagógicos na EJA no contexto da redemocratização do país; 4. analisar as novas bases legais e curriculares implementadas na Educação de Jovens e Adultos a partir dos anos de 1990: a Constituição de 1988 e a LDB 9394/96. Aula 4: Abordagem Histórica da EJA no Brasil – Anos 2000 Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: 1. Identificar e discutir as principais características da nova legislação e documentos oficiais da EJA nos anos 2000, bem como suas repercussões práticas; 2. analisar as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos - Parecer CEB/CNE 11/2000. Aula 5: Os Condicionantes Socioeconômicos que Explicam o Analfabetismo e Novas Possibilidades Curriculares na EJA Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: 1. Perceber os indicativos socioeconômicos que produzem a exclusão de determinados segmentos sociais no âmbito educacional; 2. relacionar a realidade educacional da EJA na perspectiva de novas possibilidades curriculares para essa modalidade. Aula 6: Sujeitos da EJA: Identidade Juvenil, Juventude e Escola Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: 1. Problematizar o perfil do aluno de EJA, a partir do debate da condição juvenil e dos condicionantes histórico-sociais que permeiam o universo existencial da juventude; 2. refletir a relação da escola com a identidade juvenil e os desafios metodológicos que norteiam a construção do conhecimento em EJA para o aluno jovem. Aula 7: Sujeitos da EJA: Mundo do Trabalho e Escola Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: 1. Analisar a relação entre processo produtivo, escolarização e o mundo do trabalho; 2. identificar a estrutura fragmentada da escola no contexto socioeconômico da produção. Aula 8: Material Didático para a Educação de Jovens e Adultos Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: 1. Possibilitar uma análise crítica de material didático para a EJA que leve em consideração as especificidades dessa modalidade de ensino; 2. analisar elementos que circundam a produção e o uso de material didático para a EJA. Aula 9: Trajetória Intelectual de Paulo Freire: Obra e Vida. Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: 1. Identificar as experiências profissionais de Paulo Freire como aspecto relevante para compreender o desenvolvimento de sua trajetória intelectual; 2. reconhecer a evolução do seu pensamento destacando as principais influências teóricas que marcaram essa evolução e as categorias centrais do seu discurso. Aula 10: Conceitos Freireanos na Educação Popular: Autonomia, Conscientização e Libertação. Ao final desta aula, você deverá ser capaz de: 1. Explicar a dimensão política da educação, relacionado com os conceitos freireanos de autonomia, conscientização e libertação; 2. contrastar práticas educativas transformadoras com práticas educativas conservadoras. Avaliação A avaliação é contínua, integradora, com ênfase nos aspectos colaborativos, incluindo tarefas coletivas, e contempla o diagnóstico, o processo e os resultados alcançados por intermédio de avaliações diagnósticas, formativas e somativas, considerando os aspectos da autoavaliação. A avaliação somativa da aprendizagem é realizada presencialmente pelo aluno no Polo de EAD da IES e segue a normativa da Universidade. A(s) prova(s) presencial(is) segue(m) o calendário acadêmico divulgado para o aluno. Durante o Curso, os alunos realizam atividades propostas, compostas de questões objetivas e discursivas referentes ao conteúdo estudado, podendo ser elas de autodiagnóstico ou de discussão. Bibliografia Fique atento aos livros que servirão de base para o conteúdo das aulas, bem como para sua consulta: BARRETO, José. A educação de adultos na ótica freireana. Tópico nº 5. CIAVATTA, M. Trabalho como princípio educativo na sociedade contemporânea. DAYRELL, J. A escola "faz" as juventudes? Reflexões em torno da socialização juvenil. Educ. Soc. [online]. 2007, vol. 28, no. 100 FÁVERO, Osmar. Materiais didáticos para a educação de jovens e adultos. Cad. CEDES [online]. 2007, vol.27, n.71, pp. 39-62.. FREIRE, A. M. A. A Trajetória de Paulo Freire. In: GADOTTI, M. Paulo Freire: uma bibliografia. São Paulo: Cortez: IPF; Brasília, DF; UNESCO, 1996, p. 32. FREIRE, Paulo. Pedagogia da autonomia. Tópico nº 3.7 - “Ensinar exige reconhecer que a educação é ideológica” (p. 47 a 51). GADOTTI, M. & ROMÃO, J. Educação de jovens e adultos: teoria, prática e proposta. São Paulo: Cortez, 2001. HADDAD, Sérgio; DI PIERRO, Maria Clara. Escolarização de jovens e adultos. Revista Brasileira de Educação, Campinas-SP, n.14, p. 108-130, Mai/Jun/Ago.2000. SAULPÉBER , T. Políticas públicas em alfabetização de jovens e adultos: reflexões sobre a experiência brasileira. SCOGUGLIA, A. Uma síntese do pensamento político pedagógico de Paulo Freire in SCOGUGLIA “A História das Ideias de Paulo Freire e Atual Crise de Paradigmas” (p. 99-105). Os marcos conceituais da EJA foram historicamente construídos sob forte influência da obra de Paulo Freire e ainda, pelas contribuições da Educação Popular. Avanços reconhecidos hoje nas políticas públicas para a EJA expressam essa contribuição, como: o reconhecimento que a educação é por toda a vida; a aceitação de que jovens e adultos são sujeitos da aprendizagem e do conhecimento e produtores de cultura; o desenvolvimento e a aplicação de metodologias participativas; a realidade sociocultural dos jovens e adultos como objeto de estudo e tantos outros procedimentos, que fortalecem o campo da EJA e que precisam ser estudados e aprofundadosna formação inicial de educadores e professores. Fique atento (a) e bom estudo! Aula 1: Fundamentos da educação de jovens e adultos e educação popular Os novos paradigmas da Educação de Jovens e Adultos: educar quem e para quê? Olá! Ao final desta aula, o aluno será ser capaz de: 1. Situar a Educação de Jovens e Adultos e a Educação Popular no contexto societário brasileiro atual; 2. identificar as relações educacionais e os sujeitos envolvidos na EJA nos dias atuais. Nas últimas décadas, a Educação de Jovens e Adultos avançou no campo teórico e metodológico e não podemos deixar de reconhecer a importância da trajetória dos movimentos populares nesse processo, principalmente aqueles ligados às demandas da alfabetização de adultos, que ao longo do seu processo de luta e mobilização incorporaram temas e questões para essa modalidade. Alguns conceitos centrais do pensamento do autor Paulo Freire, como conscientização, libertação, autonomia, e outros termos ligados a procedimentos metodológicos, como a leitura do mundo precedendo a leitura da palavra, se tornaram referências para o debate curricular da Educação de Jovens e Adultos no Brasil. Porém, com o Golpe Civil Militar de 1964, seu trabalho foi interrompido em nosso território. Experiências que vinham sendo desenvolvidas tiveram que ser interrompidas. Mesmo assim, seus pressupostos teóricos e metodológicos continuaram a ser referência em outros países. Nos meados dos anos 80, com a redemocratização do país, a ação dos movimentos sociais passa a demandar ao poder público e ao meio acadêmico a incorporação das contribuições da matriz crítica nas formulações e pesquisas no campo da EJA. Como consequência dessa dinâmica, passa a ocorrer a partir dos anos 2000 a incorporação de novos marcos conceituais e normativos da EJA, na qual se destaca a aprovação do parecer CEB/CNE 11/2000 que fixa as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos. Esse documento é considerado um marco na mudança de concepção e função da educação de adultos; passa-se de um paradigma de educação compensatória (que tinha o papel de suprir a escolarização não realizada na infância e na adolescência) para uma concepção de educação continuada ao longo da vida. Nessa nova perspectiva são reconhecidos e validados os conhecimentos que se cristalizam nos ambientes não escolares, aqueles trazidos pelos alunos dos seus espaços cotidianos de vida. Não podemos deixar de considerar que os avanços nessa modalidade ocorreram mais nos marcos conceituais e normativos do que em políticas públicas e práticas docentes que incorporaram as especificidades teóricas, políticas e metodológicas da EJA. Dessa forma, o professor ainda encara a educação de jovens e adultos numa perspectiva compensatória, tendo como referencial pedagógico o modelo de escolarização de crianças e adolescentes. O conteudismo prevalece, assim como o distanciamento entre conhecimento formal e a realidade do aluno. Podemos considerar que se repete em muitos casos o fenômeno do fracasso escolar. Como podemos reverter esse quadro? Precisamos entender primeiro quem são os indivíduos da EJA. Miguel Arroyo afirma que os sujeitos da EJA são em sua grande maioria trabalhadores urbanos e rurais, oprimidos e pobres, tendo como destaque nesse grupo a participação da população mestiça e negra, expulsa dos bancos escolares ou que não tiveram oportunidade de ingressar na escola na idade desejada. Por que eles fracassam e voltam à escola? Isso ocorre porque os currículos em que os sistemas educacionais estão baseados privilegiam o capital cultural dos grupos economicamente dominantes. O distanciamento entre o conhecimento e os sujeitos envolvidos nesse processo é outra marca da exclusão. O currículo comumente é organizado de modo a cumprir o preenchimento de uma espécie de caixa vazia, onde o educador funciona como elemento detentor do conhecimento e o educando, passivamente, recebe o esperado conteúdo. Essa distância, muitas vezes, cria um ambiente pernicioso para o desenvolvimento da aprendizagem do aluno. Os conteúdos não fazem parte do universo experimental do jovem ou adulto e não consideram as experiências e o universo já vivido pelo educando. O conceito de problematização surge, assim, como uma possibilidade de questionamento do que é apreendido, do que fazemos e vivemos na sociedade e na educação formal. A dimensão que a educação e o conhecimento ganham é a de estarem voltados para uma prática reflexiva do educador e do educando. As práticas curriculares devem obedecer a critérios que deixem claros que a construção do conhecimento estará a serviço da identificação do conflito e das disputas existentes no seio da sociedade. Longe de pretender neutralidade, é a clara intenção de que no processo de elaboração do conhecimento haja estímulo à conquista de valores culturais, políticos e éticos voltados para a transformação social. Isso é necessário porque o contexto histórico atual e as condições sociais, econômicas e educacionais que geraram e geram esse contingente populacional não escolarizado ainda se mantêm inalterados em nosso país. Outro aspecto da EJA que devemos destacar na ligação educação-cotidiano é que o público majoritário dessa modalidade é o jovem ou adulto que já tem vivência no mundo do trabalho. No presente mais recente, esse quadro se torna mais agudo quando percebemos o ingresso cada vez mais precoce das camadas menos abastadas no mercado de trabalho que, por sua vez, se torna sempre mais exigente e excludente. Nesse contexto, a necessidade de emprego e de se manter nele e as exigências das chamadas "competitividades" faz da escolarização uma necessidade urgente. Neste binômio emprego-escola, a escolarização passa a ser o diferencial básico. A ideia de que com mais escolaridade aumentam-se as chances de empregabilidade e que sem ela não há chance de se ingressar no mercado acaba trazendo o jovem ou adulto de volta à escola. Hoje, uma das funções da Escola deve ser a de esclarecer as relações (e diferenças) entre emprego, trabalho e educação, lembrando que: Educação deve ser para a vida toda e não exclusivamente para o mercado de trabalho; sendo direito, deve ser respeitado e atendido pela sociedade com isonomia e qualidade para todos e não acelerada e de perspectiva compensatória. Para tanto, é importante identificar os desafios que a educação de jovens e adultos trabalhadores coloca para a educação escolar brasileira e de como o docente, em sua prática curricular, deve se posicionar. Que escola podemos construir para a escolarização de jovens e adultos? Qual o caminho a seguir para se criar outro entendimento da escola e das práticas curriculares na EJA? Nessa perspectiva de novas práticas curriculares para a EJA, a escola não é concebida somente como um espaço sociocultural de reprodução e verificação de conteúdos e conhecimento, mas principalmente como espaço de socialização, de trocas culturais e de construção significativa do conhecimento escolar e social. Na perspectiva crítica freiriana, a sala de aula de EJA é um espaço de riqueza e desafio, sendo ensinar e aprender um ato político e transformador. A escola deve garantir a inclusão e garantia de acesso ao conhecimento formal, o fortalecimento da identidade individual e grupai, da autoestima e do senso crítico e a construção de alternativas para uma inserção autônoma e participativa no meio social. A heterogeneidade nos níveis de aprendizagem, que marca uma turma de EJA, não deve se constituir uma dificuldade para a ação pedagógica, mas sim contribuir para a autorreflexão do próprio aluno sobre o seu processo de construção do conhecimento. A ideia de "aluno pobre-coitado", que está destinado ao fracasso e à evasão escolar não pode estar presente no universo simbólico de uma sala de aula deEJA. Ao contrário disso, os alunos devem ser estimulados a conhecer sua realidade e seus condicionantes histórico-sociais, construindo alternativas de superação, enfrentamento e fortalecimento da cidadania negada. Consideramos um grande passo no processo da afirmação da identidade e resgate da autoestima a negação e o estímulo ao enfrentamento da suposta fragilidade em que se encontra o aluno jovem/adulto em fase de escolarização tardia, rompendo com a noção de o aluno jovem e adulto, de origem humilde e de baixa escolaridade é ingênuo, frágil e fraco, quase uma criança. Se olharmos o (a) aluno (a) como incapaz, menor, nossa ação vai se dirigir a ele de modo a subestimá-lo (a), de modo à desinvesti-lo (a) das suas múltiplas possibilidades, e esse olhar/ação pode junto com outros fatores ajudar para que ele/ela se acredite assim, incapaz. (...) o que importa é que qualquer aprendiz precisa ser estimulado, incentivado e encorajado; afinal aprender é aproximar-se de novo do desconhecido. Trindade, 2002, p. 12 Assim, a escola para a EJA não pode ser construída a partir de modelos pré- estabelecidos a partir do ensino regular ou exclusivamente voltada para a formação vinculada ao mundo do trabalho.Estamos falando de um processo por meio do qual os sujeitos envolvidos, educadores e educandos, ressignificam suas experiências de escola, de trabalho e de vida na direção da construção de uma escola plural, inclusiva e comprometida com as transformações dos indivíduos e da sociedade. O que vem na próxima aula Na próxima aula, você estudará sobre os assuntos seguintes: Abordagem histórica da Educação de Adultos no início da segunda metade do século XX; os anos de 1940 e 1950: as determinações internacionais em prol da educação de adultos e as Campanhas Nacionais de Alfabetização; os anos de 1960: as iniciativas de Educação Popular e o legado de Paulo Freire. CONCLUSÃO Nesta aula, você: Aprendeu a situar a Educação de Jovens e Adultos e a Educação Popular no contexto societário brasileiro atual; a identificar as relações educacionais e os sujeitos envolvidos na EJA nos dias atuais. Aula 2: Fundamentos da educação de jovens e adultos e educação popular Abordagem Histórica da EJA no Brasil – Anos 40/50/60 Olá! Ao final desta aula, o aluno será capaz de: 1. Relacionar as primeiras iniciativas, em nível nacional, de combate ao analfabetismo ao contexto histórico internacional e brasileiro; 2. analisar criticamente a atuação e os resultados alcançados pelas primeiras campanhas de erradicação do analfabetismo no Brasil; 3. conhecer as experiências de educação popular, destacando as iniciativas do Nordeste e a proposta político-pedagógica de Paulo Freire, amplamente difundida no período inicial da década de 60 no Brasil; 4. entender os novos paradigmas educacionais e sociais que emergiram desse cenário, identificando os principais movimentos e iniciativas e sua importância para a história do país. Os anos de 1940 e 1950 podem ser delimitados como o momento específico onde a Educação de Jovens e Adultos começa a ser considerada como uma necessidade societária significativa no cenário internacional e nacional. Podemos, assim, identificar nesse momento histórico os determinantes políticos e pedagógicos que começaram a escrever a educação de adultos em nosso país, a saber: Cenário Internacional a ação da UNESCO ganha grande visibilidade no cenário internacional, principalmente pelo fomento e incentivo em prol da educação de adultos que esta organização passa a desenvolver em vários países. Cenário Nacional a questão da educação de adultos passa a ser considerada um "problema nacional". Vivíamos um momento de transição entre um modelo agrário- exportador para um modelo urbano-industrial. Nesse momento de redirecionamento da nossa economia, a questão da formação de mão de obra se torna um problema de primeira ordem. Devemos considerar o início de uma política oficial de educação de jovens e adultos, nesse período, como um fenômeno diretamente vinculado a dois processos específicos. O primeiro, o novo modelo econômico em curso necessitava de uma formação/instrução para os novos postos de trabalho nas indústrias, e o segundo, vinculado à necessidade de aumento do contingente eleitoral. Não podemos esquecer que nesse período a alfabetização era um critério para o direito ao voto. Assim, teremos pela primeira vez em nossa legislação o reconhecimento do dever do Estado e do direito do cidadão à educação. A Constituição de 1934 fixa um Plano Nacional de Educação e aponta como responsabilidade do Estado o ensino primário, inclusive aos adultos (artigo 150), estendendo para essa faixa etária o ensino presencial e gratuito. Destaca-se, ainda, a criação do Fundo Nacional de Ensino Primário, em 1942, prevendo o alargamento da rede de educação popular, incluindo o ensino supletivo para adolescentes e adultos analfabetos. Cresce, por parte dos dirigentes da nação, a visão do analfabetismo das grandes massas de adultos como um problema nacional. Com o fim do Estado Novo, o país passa a educar os jovens e adultos da classe trabalhadora, tanto no que tange a alfabetização, através das campanhas nacionais e educação básica, quanto no que se refere a qualificação profissional, sendo, nesse último caso, a criação do Serviço Nacional de Aprendizagem Industrial (SENAI) o exemplo mais significativo. Iniciada em 1947 pelo governo federal, a Campanha de Educação de Adolescentes e Adultos (CEAA), criada pelo Ministério da Educação e Saúde, constitui-se na primeira política pública nacional oferecida a população brasileira n5o escolarizada. Em 1952, foi criada a Campanha Nacional de Educação Rural (CNER). Mesmo com essas iniciativas, a visão estigmatizadora de nossos governantes para a população não escolarizada se mantinha. Tais campanhas tinham um caráter profilático, onde o analfabetismo era considerado uma "doença" e o analfabeto era visto como incapaz e despreparado para o Brasil moderno que estava sendo gestado pelas nossas elites. A primeira campanha durou até 1963 e teve seu período áureo entre 1947 e 1953. A partir de 1954, iniciou-se seu declínio até que, em julho de 1958, foi realizado, em Rio de Janeiro, o 2° Congresso Nacional de Adultos que ficou marcado pelo discurso recorrente de segmentos oficiais sobre o fracasso da campanha. Organizações da sociedade civil reclamavam da concepção dos educadores e gestores de tais campanhas, que consideravam o adulto analfabeto como incapaz; criticavam, ainda, o seu caráter eleitoreiro já que alfabetização em massa era a possibilidade real de uma formação para o jogo eleitoral do período e para o aumento do número de eleitores. 1 Paulo Freire O início dos anos da década de 60 marca a emergência de novas ideias pedagógicas e a instauração de um paradigma educativo para a área. Esse processo se materializa quando uma série de iniciativas oficiais e não oficiais ganham projeção no cenário nacional da educação de adultos. No Nordeste brasileiro, nesse período, tais iniciativas, ancoradas pelos escritos de Paulo Freire, passam a relacionar a questão do analfabetismo à situação de miséria a que estava submetida grande parte da população brasileira. Por esse paradigma, educar é acima de tudo um ato político. Paradigma pode ser entendido por um exemplo, um modelo, uma referência, uma diretriz, um parâmetro, um rumo, uma estrutura ou até mesmo um ideal. Algo digno de ser seguido. Podemos dizer que um paradigma é a percepção geral e comum - não necessariamente a melhor - de se ver determinada coisa, seja um objeto, seja um fenômeno, seja um conjunto de ideias. Ao mesmo tempo, ao ser aceito, um paradigma serve como critério de verdade e de validação e reconhecimento nos meios onde é adotado. O 2° Congresso Nacional de Educação de Adultos, realizado no Rio de Janeiro, em 1958, torna-se o epicentropara o país desse debate e dessa nova concepção para a educação de adultos. A delegação de Pernambuco, da qual fazia parte Paulo Freire, defende, em seu relatório, que o problema do analfabetismo no Nordeste era um problema social, não um problema educacional. Para tais educadores, a miséria da população que gerava o analfabetismo: ou se enfrentava a miséria da população ou não se conseguira enfrentar o analfabetismo de forma verdadeira e eficiente. Temos como destaque, ainda, no cenário dos movimentos sociais em prol da educação de adultos as seguintes iniciativas no período: 1. 2. 3. 4. A Campanha "De Pé no Chão Também se Aprende a Ler", da Secretaria de Educação de Natal/RN, entre 1961 e 1964; Previous Next Essas experiências reuniam uma concepção de adultos que se comprometia a incorporações em suas propostas político-pedagógicas das características socioculturais das classes populares. Tais movimentos de educação e cultura popular eram ligados a organizações sociais, à igreja católica e a governos progressistas que desenvolveram, em conjunto ou não, experiências de alfabetização de adultos, cujos objetivos eram a conscientização e a transformação social. Segundo Fávero (2004), esses movimentos significaram um salto qualitativo em relação às campanhas das décadas de 40 e 50 e representaram um marco por terem inaugurado novas alternativas político-didático-pedagógicas para a educação das classes populares. Um dos movimentos sociais desse tipo de maior relevância foi o Movimento de Cultura Popular (MCP). Os MCP instituíam os círculos de cultura que eram grupos populares que se reuniam com educadores nos Centros de Cultura. Foi em um desses círculos que teria surgido o paradigma que mais tarde influenciaria inúmeros projetos educativos desse período. Considera-se que é no interior desse movimento que nasce o chamado "Método de Alfabetização" de Paulo Freire. Uma vez que os temas tratados nos círculos vinham de uma consulta aos grupos que estabeleciam quais seriam discutidos, cabendo aos educadores tratar a temática proposta pelo grupo. Estava posta a premissa do referencial freireano para a educação de adultos: o diálogo como princípio de uma educação voltada para a libertação. Desse modo, à medida que a tradicional relevância do exercício do direito de todo cidadão de ter acesso aos conhecimentos universais uniu-se à ação conscientizadora e organizativa de grupos e atores sociais, a educação de adultos passou a ser reconhecida também como um poderoso instrumento de ação política. 2 Análise crítica do mundo A principal característica dos movimentos da alfabetização de jovens e adultos era a influência do referencial freireano. Este entende a educação como instrumento de análise crítica da realidade (leitura do mundo) e como ferramenta para transformação de estruturas sociais injustas. Muitas atividades de educação de adultos, desenvolvidas na época, não pretendiam mais se prestar à simples formação de um eleitorado acrítico. No bojo da intensificação do debate político sobre os problemas nacionais e busca de rumos para a sociedade, as chamadas Reformas de Base (reforma agrária, urbana, eleitoral, bancária, educacional etc.) ganham caráter central. Nesse contexto, é promulgada a primeira Lei de Diretrizes e Bases -Lei 4024/61, que reconhece a educação como direito de todos e ampliam-se assim as políticas públicas para a educação de jovens e adultos, destacando-se nesse momento os exames de madureza que possibilitavam a certificação para jovens e adultos não escolarizados. A questão do analfabetismo vai ganhando cada vez mais uma conotação política e o governo federal vão instituir, coordenado pelo MEC, em 1963, o Plano Nacional de Alfabetização (PNA), que tinha como referência pedagógica a produção de Paulo Freire, que foi convidado a coordenar o programa. Tal iniciativa governamental tinha como objetivo alfabetizar cinco milhões de brasileiros sob a perspectiva de conscientização e organização política da população. Porém, com o Golpe Civil-Militar, todas as iniciativas governamentais e não governamentais foram suspensas e muitos dos militantes do campo da educação de jovens e adultos foram presos ou exilados. O que vem na próxima aula Na próxima aula, você estudará sobre os assuntos seguintes: Abordagem histórica da Educação de Adultos no início da segunda metade do século XX; os anos de 1970: o Mobral e o Ensino Supletivo; os anos de 1980/90: a EJA na Constituição de 1988 e na LDB 9394/96. CONCLUSÃO Nesta aula, você: Aprendeu o contexto histórico da Educação de Adultos no início da segunda metade do século XX; analisou os anos de 1940 e 1950 através das determinações internacionais em prol da educação de adultos e das Campanhas Nacionais de Alfabetização; analisou os anos da década de 60 através das iniciativas de Educação Popular e o legado de Paulo Freire. Aula 3: Fundamentos da educação de jovens e adultos e educação popular Abordagem Histórica da EJA no Brasil – Anos 70/80/90 Olá! Ao final desta aula, o aluno será ser capaz de: 1. Descrever as reformas e os projetos educacionais implementados pelos governos militares no campo da EJA no Brasil, dando ênfase aos seus aspectos políticos e ideológicos; 2. analisar as principais políticas implementadas no período da Ditadura Militar, em especial a Cruzada ABC, o Mobral e a regulamentação do Ensino Supletivo; 3. resgatar o processo histórico de surgimento de novos paradigmas políticos e pedagógicos na EJA, no contexto da redemocratização do país; 4. analisar as novas bases legais e curriculares implementadas na Educação de Jovens e Adultos, a partir dos anos 90: a Constituição de 1988 e a LDB 9394/96. O início dos governos militares pode ser apontado como nosso ingresso na fase capitalista monopolista, na qual o Estado sedimenta sua atuação como agente condutor da economia, apostando no acirramento de nossa dependência internacional e desenvolvendo um modelo econômico/social baseado na concentração de renda e na aceleração econômica, pautado em empréstimos internacionais, subordinando, portanto, nossa economia ao capital e à tecnologia externa. Essa estratégia garantiu durante o período um acelerado crescimento econômico, finalizado com a instalação das indústrias de bens de capital em nossa economia. Em relação à sociedade civil, os anos dos governos militares ficaram marcados pelo distanciamento das organizações sindicais e populares da participação política. O rígido controle das iniciativas de organização popular estava inserido na Doutrina de Segurança Nacional, ideologia que marcou o caráter autoritário e excludente dos governos militares. 1 Educação A questão das políticas educacionais ganhou também contornos definidores, já que sob a tutela dos governos militares ocorreu uma relativa ampliação dessas políticas, que passaram a serem usadas, juntamente com o chamado milagre econômico, como espaço de legitimação desses governos. Com efeito, a educação como espaço privilegiado de produção e reprodução das relações sociais não fugiu à regra e foi amplamente reformada e usada pelos tecnocratas do governo ditatorial civil/militar. Uma das maiores marcas da expansão da educação pós-64 esteve pautada na transferência de verbas públicas para o empresariado da educação. Essa expansão ocorreu sobre forte influência de "técnicos" norte-americanos. Seus objetivos seguiram uma orientação que assegurou a adequação do sistema escolar brasileiro aos preceitos da teoria do "capital humano". A educação por meio dessa teoria deveria ser encarada como investimento, resultando consequentemente no aumento da produtividade, levando assim melhorias para a qualidade de vida da população. Conhecimento e habilidades, portanto, são vistos como capital humano, apropriado à medida em que o trabalhador ascende na escala da escolarizaçãoformal. Nesse sentido, o conteúdo programático das escolas supervalorizou as áreas tecnológicas, dando destaque ao treinamento específico em detrimento à formação geral e à perda de importância das áreas humanas e das ciências sociais. No Brasil, o organismo responsável pela disseminação e financiamento foi a agência norte americana USAID, que entre 1964 e 1968 selou 12 acordos com o Ministério da Educação e Cultura. Dos objetivos principais estava o de diagnosticar e solucionar problemas da educação no Brasil, tendo como norte os pressupostos da teoria do “capital humano”. Os acordos MEC-USAID defendiam a teoria do capital humano e por concepção, a desigualdade nos níveis de desenvolvimento dos países seria solucionada por ações educativas que diminuiriam as diferenças sociais entre os indivíduos. Podemos afirmar que a lógica que norteou a reforma educacional de 1968 a 1971 ficou marcada e influenciada pela teoria do capital humano. Acentou-se dessa forma o deslocamento da educação do contexto social e político, enfatizando o caráter eminentemente tecnocrático das ações educacionais. Entre as ações dos governos militares para a Educação, estavam: 1. 2. 3. Após 1970, o Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral); Previous Next Nesse momento, o governo militar substituiu o Plano Nacional de Alfabetização, do período anterior ao golpe, coordenado por Paulo Freire, pela Cruzada da Ação Básica Cristã (Cruzada ABC), que tinha a concepção e coordenação de grupos evangélicos norte-americanos e que usava verbas dos acordos MEC-USAID. Tal iniciativa aponta a tendência de vincular a educação de jovens e adultos à formação para o trabalho e à formação moral. Após os anos 70, o Mobral e o Ensino Supletivo foram ações que reforçaram uma perspectiva de educação compensatória e aligeirada para os adultos. O tecnicismo e o economicismo na educação, principalmente por meio da difusão da Teoria do Capital Humano, foram as marcas das experiências apresentadas no período. Desse modo, passou-se a predominar uma concepção da educação de adultos como preparadora de recursos humanos para as tarefas da industrialização, modernização da agropecuária e ampliação dos serviços. O Movimento Brasileiro de Alfabetização (Mobral), criado em 1967 pelo governo federal, perdurou durante todo o período da ditadura militar com significativa força política e financeira. Desvinculado do MEC e organizado através de comissões municipais responsáveis pela execução direta das atividades, o MOBRAL gozou de enorme autonomia, estabelecendo sua estrutura paralela aos sistemas de ensino existentes. O Mobral pode ser analisado como um instrumento de controle ideológico das massas. Em sua estrutura organizacional, apenas a produção do material didático, a supervisão pedagógica e as suas diretrizes orientadoras mantiveram-se centralizadas. Muitas foram as críticas quanto à atuação do Mobral. Dentre elas destaca-se, principalmente, a que fala da falsidade dos resultados divulgados, seja em relação à alfabetização, seja ao impacto de outras formas de ação do movimento, além da crítica sobre o seu próprio sentido e objetivo. Também é importante ressaltar as diferenças entre as concepções alfabetizadoras e as intencionalidades políticas existentes entre o Mobral e a proposta teórico-metodológica de Paulo Freire. Mesmo que o Mobral tenha buscado assemelhar-se às concepções freirianas na técnica pedagógica e na forma do material didático, era completamente esvaziado da ótica problematizadora e conscientizadora da perspectiva freiriana. O Mobral organizou-se, a partir dos anos 70, em ação paralela ao ensino supletivo, mais especificamente ao Departamento de Ensino Supletivo do MEC. O ensino supletivo foi regulamentado pela Lei nº 5692/71 e concebido dentro de uma visão sistêmica, que compreendia quatro funções: Suplência; suprimento; aprendizagem; qualificação. Tais funções se inter-relacionavam e, juntamente com o ensino regular, compunham o sistema nacional de educação. Com a regulamentação do ensino supletivo pela Lei n° 5692/71, pela primeira vez, o ensino supletivo foi organizado em um capítulo próprio, diferenciando-o do ensino regular básico e secundário, abordando, inclusive, a necessidade da formação de professores especificamente para ele e trazendo avanços significativos para o ensino de jovens e adultos. Apesar de ter sido elaborada no auge do período de ditadura civil-militar, esse instrumento legal representou contraditoriamente a ampliação, em nível legislativo, das oportunidades educacionais. Foi assim, no interior de reformas autoritárias e no ápice do processo de modernização conservadora que o ensino supletivo ganhou estatuto próprio. Diante disso, vários estudos consideram que, oferecendo o Mobral e o Ensino Supletivo, os militares buscariam reconstruir, através da educação, sua mediação com os setores populares. A política de rápido crescimento econômico iniciada pelo Governo Geisel começou a dar sinais de esgotamento no final dos anos 70 e a partir dos primeiros anos dos 80 a economia brasileira conheceu momentos de estagnação. Assim, o início dos anos 80 marcou o ápice da crise do modelo desenvolvimentista econômico, tornando-se urgente uma nova estratégia de sobrevivência para nossas elites. O encaminhamento dado nos anos 80 caracterizou-se pela desaceleração da industrialização e pelo fim do financiamento externo, elementos de um quadro no qual nossa economia se converteu em mero "exportador de capitais e o principal agente interno condutor do crescimento - o Estado se torna deficitário" (BENJAMIM, 1998, p.28). Essa crise econômica aponta para a falência do modelo autoritário de governo e sob o controle dos militares, o Brasil entra em um lento e gradual processo de transição para a democracia. O processo de perpetuação de forças conservadoras como bloco do poder, no término da transição democrática, se deu no cenário do "avanço neoliberal" no qual, a partir da crise do modelo desenvolvimentista de Estado, a burguesia brasileira se alinhou ao projeto neoliberal mundial, procurando dar conta de dois problemas: o primeiro, de se estruturar na crise do capitalismo mundial do período; o segundo, de se perpetuar enquanto classe dominante e dirigente. A globalização é aqui apontada como uma nova divisão internacional do trabalho, na qual a circulação de mercadorias e a mundialização da produção se ampliam progressivamente, a partir do acirramento do processo de internacionalização do capital. Destaca-se também nesse processo a supremacia do capital financeiro sobre os outros setores da economia, exigindo reformas estruturais que protejam a sua circulação mundial. Junto com essa tendência econômica, a cultura é carregada em um bonde transnacional pelas diferentes nações, para um mundo mais interligado, através da apropriação dos padrões econômicos e comportamentais de ordem neoliberal. Em consonância com o receituário neoliberal e conservador, a educação deveria passar por mudanças significativas para se adaptar aos "novos" tempos, se tornando um terreno fértil nos processos de melhorias econômicas e sociais. No campo educacional, essa nova perspectiva é sentida no âmbito do esvaziamento das ações estatais na EJA. Nesse contexto, o Mobral foi substituído pela Fundação Educar, em1985. Tal fundação teve um breve período, em consequência de um modelo de gestão educacional caracterizado pela escassez de recursos e financiamento público para a educação de jovens e adultos trabalhadores. Nesse sentido, o capítulo referente à educação, na Constituição promulgada em 1988, significou um dos mais acirrados palcos de disputa na Constituinte. Congregados em diversas organizações do movimento social, sindical e científico, os defensores da escola pública e gratuita acreditavam ser aquele o momento de garantia de mudanças no sistema educacional brasileiro. A Constituiçãode 1988 introduziu avanços consideráveis para a educação brasileira, no que tange a educação de jovens e adultos, principalmente em seu artigo 208, que aponta: O dever do Estado com a educação será efetivado, mediante a garantia de: I. ensino fundamental obrigatório e gratuito, assegurada inclusive sua oferta gratuita para todos os que a ele não tiveram acesso na idade própria (Art. 208). O Mobral só foi extinto em 1985, já no início da chamada Nova República, após 20 anos de regime militar, transformado na Fundação Educar (1986-1990). Esta, em muitos sentidos, representou a continuidade do Mobral. Devem-se levar em conta algumas mudanças significativas, das quais é digna de destaque a sua subordinação à estrutura do MEC e sua transformação em órgão de fomento e apoio técnico, ao invés de instituição de execução direta. Contraditoriamente, apesar de o MEC apresentar um discurso favorável à Fundação, gradativamente foi-se percebendo um processo de desmonte até seu fechamento. Com a extinção da Fundação, a maior parte das atividades da EJA, no âmbito governamental, ficou praticamente suspensa, dada à precariedade de recursos, de incentivos e até mesmo de apoio técnico. No governo Collor, nos anos 90, um novo sentido das políticas para a EJA começa a se delinear, utilizando um discurso que valorizava o combate ao analfabetismo, em resposta ao Ano Internacional da Alfabetização, convocado pela UNESCO, criou-se o Programa Nacional de Alfabetização e Cidadania (PNAC), que não teve nenhuma ação expressiva. O PNAC foi caracterizado por sua grande divulgação nos meios de comunicação e por seu caráter, tido como demagógico. Tal programa se propunha a criar ações de alfabetização, por meio de comissões municipais, estaduais e nacionais. Na prática, as comissões criadas tiveram pouco ou nenhum controle efetivo sobre os projetos apoiados e recursos distribuídos, causando mais alarde do que ações concretas, morrendo antes mesmo do seu efetivo nascimento, sem apoio financeiro e político, sendo simplesmente esquecidas. Era um avanço legal a questão da garantia do financiamento para os alunos jovens e adultos, entretanto, muitos desafios para a implementação de uma efetiva política educacional pelos sistemas municipais e estaduais, para esse público, ainda seriam concretizados no ano 2000. O que vem na próxima aula Na próxima aula, você estudará sobre os assuntos seguintes: Identificação e análise das principais características da nova legislação e documentos oficiais da EJA, assim como suas repercussões práticas; análise das Diretrizes Curriculares Nacionais - Parecer CEB/CNE 11/200. CONCLUSÃO Nesta aula, você: Identificou e analisou as reformas e os projetos educacionais implementados pelos governos militares no campo da EJA no Brasil, com ênfase nos seus aspectos políticos e ideológicos; estudou o processo histórico de surgimento de novos paradigmas políticos e pedagógicos na EJA, no contexto da redemocratização do país, e analisou as novas bases legais e curriculares implementadas na Educação de Jovens e Adultos a partir dos anos 90: a Constituição de 1988 e a LDB 9394/96. Aula 4: Fundamentos da educação de jovens e adultos e educação popular Abordagem Histórica da EJA no Brasil – Anos 2000 Olá! Ao final desta aula, o aluno será capaz de: 1. Identificar e discutir as principais características da nova legislação e documentos oficiais da EJA nos anos 2000, bem como suas repercussões práticas; 2. analisar as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos - Parecer CEB/CNE 11/2000. Alguns dados do censo escolar de 2001 possibilitam dimensionar a inserção da EJA na escolarização oficial nessa década. Segundo o INEP, no censo escolar de 2001, existia um total aproximado de 3,7 milhões de alunos matriculados na modalidade de EJA. São inclusos nessa modalidade alunos com mais de 15 anos que apresentam distorção idade e série para o ensino fundamental e com mais de 18 anos que apresentam distorção idade e série para o ensino médio. Analisando o impacto dessas matrículas, Sônia Rummert aponta a possibilidade ainda de se somar a esse quantitativo as matrículas de jovens e adultos que, incluídos no ensino fundamental e médio regular, apresentam faixa etária de EJA: 8,4 milhões de matrículas no fundamental e 4,3 milhões de matrículas no ensino médio. São inclusos nessa modalidade alunos com mais de 15 anos que apresentam distorção idade e série para o ensino fundamental e com mais de 18 anos que apresentam distorção idade e série para o ensino médio. Nessa perspectiva, temos no início dessa década um contingente de matrículas de 15,6 milhões de alunos em EJA nas redes públicas brasileiras, concentradas principalmente na esfera municipal, que abarcam nesse período 49,6% das matrículas da modalidade. A ampliação de matrículas na modalidade de EJA nas últimas décadas foi acompanhada pela construção de novos paradigmas político-pedagógicos para a escolarização de alunos jovens e adultos. Porém, a formação de professores não tem acompanhado essa mudança de paradigma. Os professores que atuam na EJA, em sua grande maioria, não tiveram uma formação inicial que levasse em consideração os novos marcos conceituais e normativos da EJA, principalmente o Parecer CEB/CNE 11/2000 que fixa as Diretrizes Curriculares Nacionais para tal modalidade. Esse documento é considerado um marco na mudança de concepção e função da educação de adultos, passa-se de um paradigma de educação compensatória (que tinha o papel de suprir a escolarização não realizada na infância e na adolescência) para uma concepção de educação continuada ao longo da vida. Nessa nova perspectiva, são reconhecidos e validados os conhecimentos que se cristalizam nos ambientes não escolares, aqueles trazidos pelos alunos dos seus espaços cotidianos de vida. O parecer elaborado pelo professor Jamil Cury apresenta três funções para a Educação de Jovens e Adultos: Reparadora restaura o direito à educação que foi negado à grande parcela da população brasileira. Educação que daria acesso a um bem real, social e simbolicamente importante à plena cidadania; Equalizadora proporciona e garante a entrada e reentrada no sistema educacional dos que tiveram uma interrupção; Qualificadora possibilita ao aluno da EJA a oportunidade de se qualificar como sujeito no processo de construção do conhecimento. É o próprio sentido da EJA numa perspectiva de uma educação permanente que pode ser plenamente desenvolvida ao longo da vida. Tais funções, fundamentais na construção do novo paradigma para a EJA, ainda não foram incorporadas como diretrizes pedagógicas nos espaços de formação de professores, pois poucos são os cursos de pedagogia e licenciatura que oferecem habilitação ou disciplinas de EJA. Segundo Di Pierro, dos 1306 cursos de Pedagogia existentes em 2003, apenas 16 ofereciam habilitação em EJA. Dessa forma, o professor ainda encara a educação de adultos e jovens numa perspectiva compensatória, tendo como referencial pedagógico o modelo de escolarização de crianças e adolescentes apresentados nas disciplinas pedagógicas dos cursos de licenciatura e pedagogia. Nesse sentido, torna-se urgente a incorporação pelas universidades e instituições de ensino de disciplinas e habilitações para o ensino de adultos e jovens dentro de suas especificidades e na perspectiva nos novos marcos conceituais e políticos da modalidade. Segundo Di Pierro, dos 1306 cursos de Pedagogia existentes em 2003, apenas 16 ofereciam habilitação em EJA. A realidade que se impõe é que a implementação de políticas públicas eficazes para o enfrentamento dessa problemática caminha a passos lentos. Muitos são os obstáculos e desafios na árdua caminhada em direção ao reconhecimento da importância e das especificidades próprias da escolarização do aluno jovem e adulto trabalhador.No Brasil, existem programas isolados, políticas setorizadas em ações locais, no âmbito do Estado, que ainda não contemplam a diversidade e especificidades do público jovem e adulto. Desse modo, acentua-se na década o atendimento na EJA de forma descontínua e diversificada; as demandas por educação da população jovem e adulta de baixa escolaridade passaram a ser realizadas principalmente por meio da criação de uma rede de cursos de qualificação profissional, cabendo sua gestão e financiamento ao Ministério do Trabalho. A tarefa de execução ficou a cargo de diversas instituições - como empresas, ONGs, entidades sindicais representativas dos trabalhadores, o Sistema S entre outras, os cursos sendo desenvolvidos, em sua maioria, a partir de uma perspectiva acentuadamente assistencialista. Apesar do discurso em relação à autonomia, foram criados mecanismos regulatórios e elaborados como sugestão para os sistemas de ensino, as Propostas Curriculares Nacionais, como a Proposta Curricular para a Educação de Jovens e Adultos, para o Primeiro Segmento (em 1996) e para o Segundo Segmento (em 2001) do ensino fundamental. No que tange à certificação, foi criado em 2002, sob a forma de adesão opcional pelos sistemas de ensino, o Exame Nacional para Certificação de Competências de Jovens e Adultos ENCCEJA, tendo por objetivo a avaliação e a certificação de competências e habilidades de jovens e adultos, no nível de conclusão do ensino fundamental e do ensino médio. Não devemos deixar de considerar o fato de que, em virtude dos diferentes graus e dificuldades enfrentadas pelos sistemas de ensino no que se refere ao financiamento, material didático, formação de professores e, particularmente, à própria visão supletiva sobre a EJA, qualquer documento elaborado e distribuído pelo MEC torna-se, via de regra, quase a única referência. Por fim, cabe ainda destacar, quanto à questão do financiamento, a criação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e Valorização do Magistério (FUNDEF), responsável pela redistribuição dos recursos financeiros destinados ao ensino fundamental para os estados e municípios e, em seguida, a exclusão da EJA dessa forma de financiamento, o que desestimulou a ampliação de vagas. Assim, o veto do presidente Fernando Henrique Cardoso a inclusão da EJA do cômputo das matrículas do ensino fundamental significou uma estagnação e mesmo refluxo no número de vagas na educação de jovens e adultos nos estados e municípios, que, de maneira geral, já não vinham apresentando atuação expressiva em relação à demanda da população adulta existente. No que se refere à questão do financiamento para essa modalidade de ensino, cabe sublinhar que a consequência da exclusão da EJA dos recursos do FUNDEF foi o desestímulo à ampliarão de vagas, contribuindo para que o MEC mantivesse a EJA na posição marginal que ela já ocupava nas políticas públicas de âmbito nacional. Com isso, ocorreu um desestímulo do setor público municipal a expandir o ensino fundamental de jovens e adultos, acentuando um processo de esvaziamento e desresponsabilização da EJA no MEC ao longo dos anos de 1990. Com sua exclusão do FUNDEF, como anteriormente referido, a modalidade permaneceu praticamente sem recursos da União até 2001, quando foi criado o Programa Recomeço, destinando um apoio financeiro a alguns municípios mais pobres. Em 2003, passou a chamar-se Programa Fazendo Escola, estendendo o apoio, por meio de transferência direta de recursos, às redes de ensino que participaram do Programa Brasil Alfabetizado. Convém destacar que o Programa Fazendo Escola foi considerado pelo MEC como transitório, devendo ser encerrado a partir da aprovação do novo Fundo da Educação Básica, o FUNDEB, que atualmente está vigor. Enfim, mais uma vez, observa-se que, por mais que tenham ocorridos avanços na lei no que tange o direito ao acesso, à escolarização e à autonomia pedagógica dos sistemas de ensino, isso não tem correspondido a alterações significativas na inclusão da EJA como política pública de direito que fundamentalmente passa por assegurar aporte contínuo de recursos financeiros necessários para garantir qualidade social às classes de EJA nos sistemas de ensino. CONCLUSÃO Nesta aula, você: Identificou as principais características da nova legislação e documentos oficiais da EJA no ano 2000, bem como suas repercussões práticas; analisou as Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação de Jovens e Adultos - Parecer CEB/CNE 11/2000. Aula 5 Os condicionantes socioeconômicos que explicam o analfabetismo e novas possibilidades curriculares na EJA Olá! Ao final desta aula, o aluno será capaz de: 1. Perceber os indicativos socioeconômicos que produzem a exclusão de determinados segmentos sociais no âmbito educacional; 2. relacionar a realidade educacional da EJA na perspectiva de novas possibilidades curriculares para essa modalidade. Para começar nossa aula reflita: por que ocorre o Analfabetismo? Em pleno século XXI, ainda amargamos uma dura realidade de atraso e exclusão desvelada nas estatísticas que apontam dados alarmantes: Rummert (2002) revela que 10% da população jovem ainda se encontra à margem de uma escolaridade básica, o que pelo censo realizado no ano de 2000 pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) representa aproximadamente cerca de 16,6 milhões de pessoas. Carrano e Peregrino (2005) destacam que, na faixa etária de 15 a 17 anos, mais da metade dos jovens que estudam (52,6%) estão matriculados ainda no ensino fundamental, em que presumidamente deveriam estar apenas crianças e adolescentes entre 7 a 14 anos. A condição de ser analfabeto (jovem – adulto) inserido numa sociedade letrada, onde o código escrito ocupa lugar de privilégio e poder, oferece suficientes elementos para localizarmos onde esses indivíduos se encontram socialmente. (...) a norma tem sido, quase sempre, a de oferecer educação pobre aos pobres, permitindo apenas às elites a possibilidade de acesso a uma educação de excelência. Circuitos diferenciados nos quais o direito à uma educação de qualidade, longe de se fundamentar em um princípio de igualdade, foi se constituindo em um caro privilégio daqueles que têm condição de pagar por ele. Ser analfabeto ou estar à margem de uma escolaridade básica determina uma série de privações que se explicitam em diferentes campos: Mercado profissional; Práticas do convívio social; Acesso ao lazer e cultura; Domínio e uso dos códigos da modernidade; Dentre outros campos. Essas circunstâncias apresentadas ainda não resumem o conjunto da problemática em questão. Ferraro (2003, p. 197) destaca o texto publicado por Paulo Freire, em ocasião do exílio no Chile, que sintetiza a concepção da sociedade acerca do analfabeto: A concepção, na melhor das hipóteses, ingênua do analfabetismo o encara ora como uma ‘erva daninha’ – daí a expressão corrente ‘erradicação do analfabetismo’ -, ora como uma ‘enfermidade’ que passa de um a outro, quase por contágio, ora como uma ‘chaga’ deprimente a ser ‘curada’ e cujos índices estampados nas estatísticas de organismos internacionais, dizem mal dos níveis de ‘civilização’ de certas sociedades. Mas ainda, o analfabetismo aparece também como a manifestação da ‘incapacidade’ do povo, de sua ‘pouca inteligência’, de sua proverbial preguiça. A abordagem dessa questão, ao longo de nossa história, sempre foi marcada pelo preconceito, discriminação e estigmatização. Ao revisarmos os fatos recentes de nosso histórico político nos deparamos com a garantia tardia do direito ao voto para o analfabeto, em decorrência de uma equivocada associação do analfabetismo e marginalidade. Gerado pela ausência e pela insuficiência da escolarização das crianças e adolescentes. Boa parte dos analfabetos jovens e adultos de hoje passaram um ou dois anos na escola; aprenderam mal, masalguma coisa, esquecida pelo desuso. Muitos jovens de hoje estão saindo da escola sabendo mal ler, escrever e contar. Continuamos oferecendo pobres escolas, para as camadas pobres da população. O direito à educação constitui-se como elemento fundamental para a consolidação de uma sociedade democrática. A Constituição Federativa do Brasil de 1988 estabelece como mínimo para a sua nação a conclusão do ensino fundamental, o que significa dizer que toda população com mais de 15 anos, teoricamente, deve ter concluído ao menos as 09 séries do ensino Fundamental. Afirma também que a educação deve ter por princípio a “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola” (art. 206) e ainda aponta que a educação, como um direito de todos, deve “atingir o pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho” (art. 205). As diretrizes apontadas no texto constitucional determinam uma série de garantias que ainda não foram cumpridas. Na verdade, questões como igualdade de condições e o acesso de oportunidades no âmbito da educação impõem-se como um grande desafio para a nossa sociedade, principalmente no que tange à população adulta e juvenil não escolarizada. Tal perspectiva nos fomenta um questionamento e uma inquietude: por que o jovem e o adulto estiveram ou estão fora da escola? Devemos, primeiramente, identificar as razões que produzem a ruptura desses alunos com o ensino formal e refletindo, ainda, as dificuldades atuais de diálogo entre a EJA e a escola e a necessidade de construção de novas possibilidades curriculares para essa modalidade. Quando pensamos o aluno de EJA, não podemos perder de vista que o mesmo tem como característica identitária central uma relação intrínseca com o fracasso na sua trajetória escolar. Isto mesmo. Essa realidade, no caso brasileiro, pode ser atestada com os dados ao lado, do início dos anos 2000, e que corroboram para a constatação de que a produção do fracasso continua como uma marca de nosso modelo de escolarização. Estudo do Ministério da Educação revela que apenas pouco mais da metade (53,8%) das crianças que entraram no ensino fundamental em 2005 deverão concluir o ciclo. Em 1997, o índice era de 65,8%. Um futuro pouco promissor aguarda 2,2 milhões de crianças e jovens brasileiros. São meninos e meninas que, em 2005, ingressaram na 1ª série do ensino fundamental, mas, de acordo com as estatísticas, não deverão chegar à 8ª. O sistema Edudatabrasil, do Ministério da Educação, mostra que apenas 53,8% dos estudantes que iniciaram seus estudos naquele ano — dado mais recente disponível — vão terminar um ciclo completo de ensino, a chamada taxa esperada de conclusão. <www.uff.br/obsjovem>. Acesso em 01/01/2009. Se torna imperativo o reconhecimento de como determinados paradigmas curriculares contribuíram para essa realidade de fracasso escolar e de que forma o debate curricular na EJA. Atualmente, deve levar em consideração esse aspecto no sentido de construir com os jovens e adultos, novas imagens e autoimagens de aluno. Essas impressões estão marcadas no que chamamos de currículo oculto da escola. A marca do fracasso vai atravessar a existência de vida desses indivíduos e determinar sobremaneira a forma como uma turma de Educação de Jovens e Adultos encara o seu lugar como aluno, o papel do professor, a relação com o conhecimento e suas próprias possibilidades e potencialidades cognitivas. Mas, afinal, o que é currículo oculto? E por que ele é tão determinante na produção dessas imagens e autoimagens dos alunos da EJA? Pela definição apresentada por Silva: O currículo oculto é constituído por todos aqueles aspectos do ambiente escolar que, sem fazer parte do currículo oficial, explicito, contribuem, de forma implícita, para aprendizagens relevantes. SILVA, T. "Documento de Identidades: uma introdução às teorias do Currículo”. Belo Horizonte: Autêntica, 2005. Assim, para o teórico, essas aprendizagens relevantes são os valores, atitudes e orientações assimiladas pelos alunos ao longo de sua escolarização. Dessa forma, na perspectiva crítica, esses valores vão contribuindo para marcar o lugar que cada indivíduo, determinado pela sua condição de classe, vai ocupar na esfera escolar e posteriormente nos espaços societários. Vamos identificar agora os autores que contribuíram para a formulação dessa noção: 1. 2. 3. 4. 5. Um dos primeiros campos que reconheceram a existência do currículo oculto não foi à perspectiva crítica, mas sim, o enfoque da sociologia funcionalista, onde se desatacam autores como Philip Jackson e Robert Dreeben. Next Para Silva, o currículo oculto ensina determinados comportamentos sociais por diversos mecanismos. Mas como isso se desenvolve no interior das práticas curriculares? O currículo oculto ensina, ainda, através de rituais, regras, regulamentos, normas. Aprende-se também através das diversas divisões e categorizações explícitas ou implícitas próprias da experiência escolar: entre os mais “capazes” e os menos “capazes”, entre meninos e meninas, entre um currículo acadêmico e um currículo profissionalizante (2005, p.80). Refletindo, observamos que o autor considera importante essa noção crítica de currículo oculto no sentido de sua contribuição enquanto instrumento analítico das práticas curriculares cotidianas e de seus sutis mecanismos de formação. Essa noção formativa e deformativa do currículo são aspectos relevantes quando pensamos quem é o aluno da EJA e de que forma o currículo oculto que atravessou sua formação escolar foi construindo uma autoimagem negativa e de fracasso. Essa perspectiva de romper com um currículo oculto que constrói e perpetua uma imagem de fracasso precisa ser incorporado no debate curricular da EJA e esses últimos elementos apresentados na aula, baseados em um referencial curricular freireano, podem contribuir sobremaneira para esse processo. E como se constroem novas práticas curriculares que rompam com essa visão negativa e fracassada do aluno de EJA? Nessa perspectiva, apontamos algumas questões que devem estar presentes em novas possibilidades curriculares para a EJA: Os educadores não poderão eximir-se das questões atuais que as escolas terão de enfrentar: multiculturalismo, raça, poder, identidade, significado, ética e trabalho. Tais questões exigirão a redefinição do sentido e dos propósitos da escolarização, ou seja, do significado de ensinar e aprender num mundo ao mesmo tempo mais globalizado e mais diversificado. Uma proposta de atuação docente libertadora deve implicar na aprendizagem de habilidades necessárias à promoção de um diálogo que favoreça a dinâmica de crítica e autocrítica. A ideia defendida aqui é a de que toda cultura necessita, ao se encontrar com outras, admitir a possibilidade de desestabilização, relativização e contestação em algumas de suas características básicas. É necessário reconhecer os preconceitos e os estereótipos dos próprios professores. O docente tem que se instrumentalizar, apropriando-se da produção teórica que explicite os processos de discriminação em atividades didáticas e no cotidiano escolar. Dessa forma, criará condições para que ele reflita sobre as suas próprias experiências, tornando-se mais sensível às diversidades na sala de aula e mais capazes de práticas não opressoras. Reconhecer que as categorias de classe social, cultura, conhecimento, poder, ideologia e racismo atravessam o currículo escolar. Dessa maneira, os professores poderão compreender melhor como indivíduos e grupos são oprimidos por fatores relacionados à raça, classe social e gênero. Deve-se reafirmar a ideia de que a escola tem que acolher conhecimentos e valores subjugados e confrontá-los com os saberes dominantes para poder constituírem-se num espaço estimulador e motivador da construção de conhecimentos significativos e relevantespara o aluno e para a sua luta em prol da transformação social. Assim, estabelecerá a diferença entre conhecimento cultural e conhecimento escolar para que o docente possa considerar o conhecimento cultural dos alunos e articulá-lo com o conhecimento escolar. O que vem na próxima aula Na próxima aula, você estudará sobre os assuntos seguintes: Os sujeitos da EJA: construção identitária da juventude e a EJA; relação juventude, conhecimento e escola. CONCLUSÃO Nesta aula, você: Percebeu os indicativos socioeconômicos que produzem a exclusão de determinados segmentos sociais no âmbito educacional; relacionou a realidade educacional da EJA na perspectiva da construção de novas possibilidades curriculares para essa modalidade. Aula 6 Sujeitos da EJA: identidade juvenil, juventude e escola Olá! Ao final desta aula, o aluno será capaz de: 1. Problematizar o perfil do aluno da EJA, a partir do debate da condição juvenil e dos condicionantes histórico-sociais que permeiam o universo existencial da juventude; 2. refletir a relação da escola com a identidade juvenil e os desafios metodológicos que norteiam a construção do conhecimento em EJA para o aluno jovem. Vamos iniciar nossa aula analisando e refletindo sobre a questão da identidade juvenil. Como ponto de partida abordamos os desafios e potencialidades da escolarização de jovens na modalidade EJA. Sabemos que a juventude, ao longo da existência humana, é conceitualmente apresentada como um período intermediário e transitório da vida do indivíduo que se revela a partir de conflitos maturacionais de natureza biológica, psicológica e social, próprios da condição juvenil que se encontram as pessoas na faixa etária de 15 a 24 anos. Para compreendermos o termo condição juvenil, buscaremos a contribuição teórica de Dayrell: (...) existe uma dupla dimensão presente quando falamos em condição juvenil. Refere-se ao modo como uma sociedade constitui e atribui significado a esse momento do ciclo da vida, no contexto de uma dimensão histórico--geracional, mas também à sua situação, ou seja, o modo como tal condição é vivida a partir dos diversos recortes referidos às diferenças sociais — classe, gênero, etnia etc. Dayrell (2006, p. 3). Cabe destacar que os aspectos de transitoriedade e instabilidade, próprios da condição juvenil, não podem ser demarcados unicamente pelo critério de faixa etária, à medida que as experiências sociais, econômicas e culturais produzem variantes que influenciam diretamente nos processos de maturação e socialização da juventude. A própria questão do tempo de transitoriedade nas sociedades pode ser variada de uma realidade para outra, como nos mostra Dayrell (2006, p. 3) a partir do aporte teórico de Giddens (1991): Temos de levar em conta também que essa condição juvenil vem se construindo em um contexto de profundas transformações socioculturais ocorridas no mundo ocidental nas últimas décadas, fruto da ressignificação do tempo e espaço e da reflexividade, dentre outras dimensões, o que vem gerando uma nova arquitetura do social. Uma questão significativa são os condicionantes histórico-sociais que permeiam as relações sociais, posto que estas revelam uma série de complexidade, desafios e consequências para as populações jovens socialmente empobrecidas nesse período transitório da condição juvenil. Para percebermos melhor esta questão, faz-se necessário não somente entender, mas também problematizar a condição juvenil. Essa etapa compreende a adolescência e a juventude. Marcada pela transição da infância para a vida adulta, caracteriza-se pelo conjunto de experimentações e vivências em todos os âmbitos da vida do indivíduo. Nesse momento, experiências diversas favorecem a maturação para a vida adulta e a inserção participativa na sociedade, através do exercício contínuo de exercer e receber influências da realidade ao redor. Esse exercício de reflexão é que vai instrumentalizar o jovem para uma inserção autônoma e participativa no meio social, posto que, quanto maiores forem as possibilidades do jovem conhecer a si, experimentando e descobrindo as suas potencialidades e preferências e ainda, quanto mais ele compreender o funcionamento e os mecanismos próprios da engrenagem de inclusão e exclusão, maiores serão as suas probabilidades de elaboração e implementação de um projeto de vida. CARRANO e PEREGRINO (2005) destacam que a questão dos diferentes níveis de possibilidades de experimentação da condição juvenil ainda está atrelada às condições econômico-sociais dos indivíduos, em que a chamada moratória social — no sentido apresentado por MARGULIS (1996), referindo-se ao espaço de tempo que as instituições sociais oferecem a juventude, permitindo-lhes a experimentação e o alcance da maturidade social sem a imposição de exigências e responsabilidades — é profundamente distinguida pela categoria de classe social dos indivíduos. O que afirmamos aqui é que sociedades desiguais permitem desiguais condições de exercício da condição juvenil, através da mobilização restrita de redes institucionais que garantam tais experimentações. No Brasil, são muitas as evidências que o reconhecimento e a garantia de expressão da condição juvenil dependem da classe ou grupo social ao qual pertença (CARRANO e PEREGRINO, 2005, p. 2). A constatação de que a condição juvenil tende a ser delineada pelos condicionantes histórico-sociais que permeiam as estruturas da sociedade nos remete a refletir os processos de educação apurando como que, de fato, a escola lida com as demandas próprias presentes na identidade juvenil. Nesse sentido, cabe questionar em que medida a escola "faz" a juventude, privilegiando a reflexão sobre as tensões e ambiguidades vivenciadas pelo jovem, ao se constituir como aluno num cotidiano escolar que não leva em conta a sua condição juvenil (DAYRELL, 2007, p. 02). A juventude carrega consigo para a escola uma explosão de conflitos e contradições. Estas contradições são frutos de uma sociedade excludente e que imprimirão profundas marcas em seu curso escolar, impondo novos desafios para a escola, principalmente às destinadas aos jovens e adultos. Outro grande desafio para escola é o de reconhecer as nuances e os aspectos da condição juvenil presentes no aluno, compreendendo sua amplitude de diversidade e heterogeneidade e os processos de maturação bio-psico-social próprios dessa etapa da vida. Também é necessário criar condições que favoreçam os jovens a desenvolverem suas aptidões, capacidades e habilidades de forma a instrumentalizá-los para o enfrentamento dos desafios a eles impostos, minimizando o grau de vulnerabilidade e fortalecendo-os na construção de um projeto de vida que viabilize uma inserção madura, autônoma, participativa e produtiva na vida adulta. Sabemos que as escolas de Educação de Jovens e Adultos recebem como alunos e alunas uma juventude com histórias e experiências de vidas diversificadas: A juventude carrega consigo para a escola uma explosão de conflitos e contradições. Estas contradições são frutos de uma sociedade excludente e que imprimirão profundas marcas em seu curso escolar, impondo novos desafios para a escola, principalmente às destinadas aos jovens e adultos. Outro grande desafio para escola é o de reconhecer as nuances e os aspectos da condição juvenil presentes no aluno, compreendendo sua amplitude de diversidade e heterogeneidade e os processos de maturação bio-psico-social próprios dessa etapa da vida. Também é necessário criar condições que favoreçam os jovens a desenvolverem suas aptidões, capacidades e habilidades de forma a instrumentalizá-los para o enfrentamento dos desafios a eles impostos, minimizando o grau de vulnerabilidade e fortalecendo-os na construção de um projeto de vida que viabilize uma inserção madura, autônoma, participativa e produtiva na vida adulta. Sabemos que as escolas de Educaçãode Jovens e Adultos recebem como alunos e alunas uma juventude com histórias e experiências de vidas diversificadas: Vida profissional; Histórico escolar; Ritmo de aprendizagem; Estrutura de pensamento; Origens, etnias, idades, crenças etc. No entanto, a riqueza desse universo, marcado pela diversidade e pluralidade, não é reconhecida e valorizada no ambiente escolar. Protagonistas de histórias reais e ricos em experiências, a juventude da EJA chega à escola com o imaginário social constituído, trazendo uma visão de mundo influenciada por seus traços culturais de origem e por sua vivência social, familiar e profissional. Na verdade, a proximidade que os une é a condição econômico-social: ser jovem, adulto e com baixa escolaridade em uma sociedade cujo código escrito ocupa lugar de prestígio e poder. Esses alunos, em sua maioria, já trazem consigo uma experiência escolar de insucesso e fracasso, onde pelos mais variados motivos evadiram e abandonaram a escola. O reingresso na escola é uma opção que requer coragem e ousadia. Ao tomar essa decisão, ele acaba por declarar para toda a sociedade a sua condição de pouca escolaridade, num desafio que às vezes se constrói num processo de idas e vindas. Envolve-se, para este aluno, até em algumas situações dependendo de inúmeros condicionantes e atores: Família; patrões; instabilidade no emprego; desemprego; miséria; horários de trabalho; condições de acesso; distância entre casa e escola. A educação escolar nem sempre é concebida como um instrumento de transformação das desigualdades latentes na sociedade. A prática educativa, quando firmada em fatores estruturais que legitimam a exclusão, pode promover a baixa autoestima nos alunos e consolidar a história de fracasso que ele já carrega. Nessa engrenagem, construída ao longo de sua existência, o aluno tende a responsabilizar a si próprio por essa 'condição de fracasso', à medida que sua formação educacional não favoreceu a análise e reflexão crítica acerca dos condicionantes histórico-sociais que são responsáveis por esse processo. Essa condição de baixo rendimento e pouca escolaridade, acrescida da visão preconceituosa e estigmatizada, da qual são submetidas populações socialmente marginalizadas, provoca uma relação de fragilidade nos alunos. As marcas que a escola imprime no aluno jovem e adulto são, definitivamente, complexas e acentuadas. A experiência escolar pregressa do aluno jovem e adulto, quase sempre é marcada pelo: Insucesso; fracasso; exclusão. Para o aluno jovem que vivencia uma bonita experiência de recomeço e resgate do processo de aprendizagem formal, os significados e sentidos extraídos desse experimento devem ser cuidadosamente construídos e sedimentados na relação pedagógica. Diante de tamanha grandeza e responsabilidade, é de fundamental importância que a escola discuta sua ação pedagógica e sua verdadeira intencionalidade. O descompasso entre a cultura escolar e a cultura social vem evidenciando o caráter monocultural da educação, em que a escola terminou por criar uma cultura escolar padronizada, ritualística, formal, pouco dinâmica, que enfatiza processos de mera transferência de conhecimento (CANDAU, 2000). Além desse cenário estático, no qual algumas escolas ainda apresentam uma gritante dificuldade em se organizar a partir da realidade sociocultural e das características dos alunos que a habitam, questões como identidade e alteridade, que insurgem a partir das transformações advindas desse nosso modelo atual de sociedade globalizada, também se apresentam como uma séria problemática. Neste processo crescente de exclusão, que assume novas caras e dimensões no continente, os mais afetados são os ‘outros’, os diferentes, os que não dominam os códigos da modernidade, não têm acesso ao processo de globalização (...), pertencem a etnias historicamente subjugadas e silenciadas, questionam os estereótipos de gênero presente nas nossas sociedades, lutam diariamente pela sobrevivência e pelos direitos humanos básicos que lhes são negados (CANDAU, 2000, p. 47). Candau e Leite (2006) nos apontam que a educação intercultural, cuja perspectiva não pretende romper com a pedagogia crítica, mas sim atualizá-la a partir do atual cenário de mudanças e transformações na sociedade, contribui para o enfrentamento das questões que a diferença deflagra no cotidiano pedagógico. Nesse sentido, as discussões acerca das questões ligadas à identidade e alteridade, que emergem na prática educativa, ganham uma profunda importância no cotidiano pedagógico atual. A interculturalidade orienta processos que têm por base o reconhecimento do direito à diferença e a luta contra todas as formas de discriminação e desigualdade social. Tenta promover relações dialógicas e igualitárias entre pessoas e grupos que pertencem a universos culturais diferentes, trabalhando os conflitos inerentes a esta realidade (CANDAU, 2003, em Candau e Leite, 2006, p. 129). Diante de tanta diversidade, a prática educativa, ao contrário de massificar sua ação pedagógica negando a identidade e alteridade do aluno adulto, deveria reconhecer sua essência existencial, mapeando seus diferentes saberes de forma a traduzi-los em aprendizagem para todos os sujeitos envolvidos nesse dialético processo de ensinar e aprender. Dessa forma, o aluno jovem estabelece uma relação dialética e dialógica com a realidade, da qual extrai seu conhecimento. Reconhecer e interagir com esse conhecimento se constitui como ferramenta indispensável para os educadores que se dizem comprometidos com uma prática transformadora e de qualidade. É preciso ter dignidade para ensinar e aprender com a identidade do outro e com as diferenças impressas em sua alteridade. Essa reflexão precisa estar presente no dia a dia do fazer pedagógico e no interior da escola, envolvendo o imaginário social de todo o universo escolar. Como suporte, apontamos a aplicação e construção de um currículo multicultural, pautado no fortalecimento da identidade e no reconhecimento da alteridade e diversidade, contemplando uma prática educativa docente que seja subjetiva e singular à realidade apresentada pelos alunos, em especial os jovens. O conhecimento da realidade dos educandos, o fomento a construção coletiva e a articulação entre vida, cultura e escola. Aula 7 Sujeitos da EJA: Mundo do Trabalho e Escola Olá! Ao final desta aula, o aluno será capaz de: 1. Analisar a relação entre processo produtivo, escolarização e o mundo do trabalho; 2. identificar a estrutura fragmentada da escola no contexto socioeconômico da produção. Para começar nossa aula, responda: você sabe o que é trabalho? Falar de trabalho nos dias de hoje é entrar em um tema de extrema centralidade. Através dele, agimos sobre a natureza, transformando-a, tentando dominá-la e, como fruto destas ações, cria-se e produz-se um sem-fim de situações ecológicas, sociais e econômicas. Na atualidade, o trabalho tem sido associado, e por vezes confundido, com emprego, com serviço, com desemprego e até com capital, o que o torna um tema ainda mais central e polissêmico. Fonseca faz uma ressalva importante: O que esquecemos muitas vezes é que o trabalho, nas suas formas hoje consideradas, tem uma história e que nossa história atual está intimamente relacionada ao trabalho. Podemos, inclusive, afirmar que só há história por causa do trabalho, a despeito do atual processo de desemprego e de teorias sobre o ‘fim do trabalho’. Fonseca, Fábio Cesar. O trabalho é histórico e a história é história por causa do trabalho. Disponível em http://www.fundeg.br/revista/fabio1.htm Esta relação indissociável estabelecida entre o trabalho e a história nos remete à reflexão sobre a função sócio-histórica do trabalho. Tal função/relação nos remete à ontologia do trabalho, como afirma o mesmo autor: Afirmar
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