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- ÍNDICE - Diagnóstico Diferencial (HYPOTHESIS) Prescrição Desafio diagnóstico Seção 1: A SÍNDROME DE INSUFICIÊNCIA HEPATOCELULAR INTRODUÇÃO AS FUNÇÕES DO FÍGADO MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS ANAMNESE E EXAME FÍSICO DADOS LABORATORIAIS ESTADIAMENTO DA FUNÇÃO HEPÁTICA DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO COMPLICAÇÕES ASSOCIADAS À INSUFICIÊNCIA HEPATOCELULAR ENCEFALOPATIA HEPÁTICA SÍNDROME HEPATORRENAL COMPLICAÇÕES PULMONARES DESNUTRIÇÃO COAGULOPATIA ANORMALIDADES HEMATOLÓGICAS DOENÇA ÓSSEA CARDIOMIOPATIA CIRRÓTICA CARCINOMA HEPATOCELULAR (HEPATOCARCINOMA) Seção 2: A SÍNDROME DA HIPERTENSÃO PORTA INTRODUÇÃO ETIOLOGIA HIPERTENSÃO PORTA PRÉ-HEPÁTICA HIPERTENSÃO PORTA INTRA-HEPÁTICA HIPERTENSÃO PORTA PÓS-HEPÁTICA MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS ESPLENOMEGALIA ENCEFALOPATIA HEPÁTICA ASCITE CIRCULAÇÃO COLATERAL ASCITE INTRODUÇÃO DIAGNÓSTICO INVESTIGAÇÃO TRATAMENTO COMPLICAÇÕES PERITONITE BACTERIANA ESPONTÂNEA OUTRAS COMPLICAÇÕES DA ASCITE VARIZES ESOFAGOGÁSTRICAS INTRODUÇÃO FATORES DE RISCO PARA O SANGRAMENTO ABORDAGEM GERAL TRATAMENTOS INVASIVOS DA HIPERTENSÃO PORTA Seção 3: CIRROSE HEPÁ TICA E SUAS CAUSAS INTRODUÇÃO CAUSAS DE CIRROSE HEPATITES VIRAIS CRÔNICAS MICROBIOLOGIA FISIOPATOLOGIA AVALIAÇÃO INICIAL HEPATITE VIRAL B CRÔNICA HEPATITE VIRAL C CRÔNICA DOENÇA HEPÁTICA ALCOÓLICA INTRODUÇÃO FISIOPATOLOGIA FATORES DE RISCO MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS ACHADOS LABORATORIAIS TRATAMENTO E PROGNÓSTICO DOENÇA HEPÁTICA GORDUROSA NÃO ALCOÓLICA (DHGNA) INTRODUÇÃO FISIOPATOLOGIA DIAGNÓSTICO TRATAMENTO DOENÇA DE WILSON INTRODUÇÃO MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS DIAGNÓSTICO TRATAMENTO HEMOCROMATOSE INTRODUÇÃO MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS DIAGNÓSTICO TRATAMENTO APÊNDICE I CIRROSE CARDIOGÊNICA APÊNDICE II CIRROSE X PROVA DE PEDIATRIA DEFICIÊNCIA DE ALFA-1-ANTITRIPSINA FIBROSE CÍSTICA GALACTOSEMIA TIROSINEMIA ATRESIA DAS VIAS BILIARES CISTOS DE COLÉDOCO COLESTASE INTRA-HEPÁTICA FAMILIAR PROGRESSIVA RAREFAÇÃO DOS DUCTOS BILIARES INTERLOBULARES Diagnóstico diferencial - Hipertensão Porta - Parte I Caso 1 Aloísio, 38 anos, ex-tabagista e etilista eventual (sic), não vem se sentindo bem. Grande apreciador de banho de lagoas, vem evitando a atividade por conta de queixas constantes de náuseas, fadiga e indisposição, o que motivou a procura de um serviço médico. Após avaliação clínica sumária em um posto de saúde, recebeu, surpreso, a prescrição de sulfato ferroso e a recomendação de comer bastante feijão, sendo encaminhado a um serviço de hematologia com o relato de "redução do hematócrito". No entanto, Aloísio, descon�ado, ignorou as recomendações do médico e voltou às suas atividades normais. Duas semanas depois, os sintomas ganharam mais impor tância e teve de voltar ao hospital, dessa vez, ao setor de Emergência. Neste dia, como o hospital estava incrivelmente vazio, recebeu maior atenção. Assim, além de mucosas hipocoradas, os plantonistas acabaram por notar vasos sanguíneos que caprichosamente desenhavam o abdome do paciente. Notaram também que, apesar de plano, o abdome não era completamente atípico, já que uma massa era palpada com a posição de Schuster. De posse destes achados, um dos médicos, que era gastroenterologista, resolveu proceder à videoendoscopia digestiva alta do paciente, cujo resultado está demonstrado a seguir. 1) Qual é o diagnóstico sindrômico deste paciente? Síndrome anêmica. Síndrome de hipertensão porta = circulação colateral + esplenomegalia (detectada pela posição de Schuster) + varizes esofagogástricas. 2) Como você classi�caria este distúrbio? Hipertensão porta sem ascite = pré-hepática ou intra-hepática pré- sinusoidal (TVP e esquistossomose). Como a ascite depende do extravasamento de �uido pelos sinusoides hepáticos, hipertensão porta pré-sinusoidal caracteristicamente cursa sem ascite. 3) Qual seria sua conduta terapêutica diante deste paciente se ele viesse a apresentar hematêmese? Estabilização hemodinâmica com cristaloides. Considerar hemoderivados. Terapia combinada: endoscopia (ligadura elástica) + farmacológica (vasoconstritores – octreodite ou terlipressina). Nos casos sem EDA disponível ou sangramento muito intenso: tamponamento por balão (balão de Sengstaken-Blakemore). Refratários: TIPS e derivação porto-sistêmica não seletiva de emergência (mortalidade de 25%). Caso 2 Jocasta, sexo feminino, 42 anos, enfermeira, procurou o consultório de um endocrinologista para perder peso. Segundo o relato da paciente, há algumas semanas seu abdome vinha aumentando de tamanho, �cou mais doloroso e não conseguia emagrecer. Desde o primeiro momento da consulta, no entanto, o formato mais arredondado da barriga já fazia o médico perceber que o problema era outro... Além disso, durante o exame físico, após a manobra da "arranhadura", observou que a ausculta se tornava mais intensa a 6 cm do rebordo costal direito. A paciente nunca consumiu bebida alcoólica e utilizava apenas anticoncepcionais orais. Tem o relato na família de um irmão, do outro casamento do seu pai, ter uma doença do sangue, mas não sabe dizer exatamente qual seria. Não havia turgência jugular, nem edema de membros inferiores. Trazia consigo, ainda, exames solicitados pelo médico de seu trabalho, mas que não tinham sido interpretados: ALT 20 U/L, AST 15 U/L, proteína total 7,0 g/dl, albumina 4,3 g/dl, bilirrubina total 1,0 mg/dl, TAP 75%, HBsAg negativo, anti-HBs positivo, IgM anti-HBc negativo, IgG anti-HBc positivo, IgG anti-HAV positivo, anti-HCV negativo. 1) Qual é o diagnóstico sindrômico desta paciente? Síndrome de hipertensão porta (ascite + hepatomegalia). 2) Qual é a melhor forma de classi�car este quadro e qual é o provável diagnóstico etiológico? Justi�que. Hipertensão porta pós-sinusoidal - Boa função hepática; - Ascite sem esplenomegalia ou varizes de esôfago. 3) Como você investigaria o caso? Paracentese diagnóstica: ALTO gradiente = hipertensão porta; BAIXO gradiente = doença do peritônio. 4) Caso o aumento abdominal fosse atribuído à cirrose hepática, quais seriam as linhas gerais do tratamento? Restrição de Na e diuréticos (espironolactona, furosemida). Se refratária, paracenteses, TIPS, transplante ou shunt peritoniovenoso. Caso 3 Clara, 42 anos, dá entrada na emergência de um HU com quadro de febre não aferida, dor e desconforto abdominal. Como o médico de plantão estava em outro atendimento, foi avaliada pelo acadêmico do sexto período mais capacitado para a função. O acadêmico logo observou um aumento do volume abdominal. “Será que estaria grávida?” — pensou imediatamente. No entanto, a paciente negava atraso menstrual. Na história pregressa, a paciente relata ser portadora do vírus B há dez anos, mas que nunca fez acompanhamento. Ao exame, identi�cou-se um abdome batraquial, doloroso à palpação profunda, mas sem sinais de irritação peritoneal. Foi observado, também, hipertimpanismo central que prevalecia nos �ancos quando em decúbito lateral. Espaço de Traube estava ocupado. Baço palpável a 3 cm do RCE. Foram solicitados novos exames laboratoriais, cuja principal alteração foi uma pancitopenia (leucócitos frUi 1.700/mm3; hemácias 2.400.000/mm3 e plaquetas 30.000/mm3). 1) Qual é o diagnóstico sindrômico e o possível diagnóstico etiológico desta paciente? Ascite + esplenomegalia + pancitopenia = H. PORTA DEVIDO À CIRROSE POR VÍRUS B. 2) Como justi�car o quadro de febre e a dor abdominal? Peritonite Bacteriana Espontânea, justi�ca tanto a febre como a dor abdominal. 3) Qual é o principal diagnóstico diferencial? Cite 3 características que possibilitam essa diferenciação. Peritonite bacteriana secundária (glicose < 50mg/dl; proteína > 1g/dl; LDH elevada). Insuficiência Hepatocelular - Parte II Caso 1 Carlota Stefenanitz é uma bem-sucedida executiva de 38 anos, que leva uma vida aparentemente invejável. No entanto, o que poucos sabem é que, fora da empresa, ela é uma pessoa solitária e com histórico de etilismo impor tante, inclusive já tendo sido internadapor conta de uma crise de abstinência. Recentemente, ela vem sendo acometida por uma terrível fadiga que a impede de trabalhar adequadamente. Apresenta, ainda, um amarelamento da pele e a mão constantemente vermelha na sua região palmar. Suas mãos também parecem mais rígidas e seus amigos vêm notando que as bochechas estão mais crescidas. Desesperada, tentou fazer dieta, mas de nada adiantou a não ser a�nar ainda mais suas pernas e braços. Procurou então atendimento médico para esclarecer seu problema de saúde, sendo realizados os seguintes exames: 1) Cite dois diagnósticos sindrômicos e a provável causa associada. Síndrome Ictérica. Síndrome de insu�ciência hepatocelular. (hepatopatia crônica). Doença hepática alcoólica. No seu histórico médico, Carlota tem USG de abdome, realizado há alguns anos, com o laudo: "fígado de textura hiperecoica com in�ltração gordurosa difusa". Na época, ela tinha MC 33 kg/m2 e consumo reduzido de álcool. 2) Nesse caso, qual condição também deveria ter sido pensada e qual seria a principal orientação para ela? Doença hepática gordurosa não alcoólica. Orientação: perda ponderal. Caso 2 Teixeira, 55 anos, é um famoso jornalista que acaba de se afastar da mídia por problemas de saúde. Tudo começou por uma de suas avaliações de rotina, em que foram detectadas alterações nas enzimas hepáticas (sic) que o conduziram ao inesperado diagnóstico de hepati te B. O paciente se encontra assintomático e não é hiper tenso, diabético ou por tador de qualquer morbidade. Os demais exames laboratoriais se mostraram normais. Acompanhado por um grande hepatologista, Teixeira está agora em avaliação para saber se deve ou não entrar no protocolo de tratamento antiviral especí�co. Seus achados sorológicos são: HBsAg (+); anti-HBc toTd (+); anti-HBc IgM (-); HBeAg (+); anti- HBe (-); anti-HBs (-); HBV-DNA > 20.000 Ul/ml. Diante destes achados, o médico optou pelo início da terapia antiviral especí�ca. Com base nessas situações clínicas, responda: 1) As drogas que poderiam ser utilizadas no tratamento são: ( ) Interferon e tenofovir. ( ) Sofosbuvir e daclatasvir. ( ) Prednisona. Resposta: Interferon e tenofovir. 2) O que mudaria na conduta se, em vez de sorologia positiva para o vírus B, Sr. Teixeira apresentasse anti-HCV (+)? Deveríamos con�rmar a infecção pelo HCV-RNA e solicitar a genotipagem. O tratamento seria conduzido de acordo com o genótipo do HCV. Caso 3 Júlio, um aplicado estudante de Ciências Aeroespaciais de 25 anos, procurou atendimento médico esta semana, queixando-se de indisposição. Ao exame, mostrava-se ictérico +/4+, afebril, eupneico e hipocorado +/4+. Na ectoscopia, foram observadas formações vasculares no tórax, que sumiam com a digitopressão, rarefação de pelos e mamas aumentadas de tamanho. A pontuação no miniexame do estado mental era de 29 pontos (perdeu um ponto na estação do ano). Relatou que seus pais faleceram muito cedo e a única coisa que sabia era que sua mãe tinha morrido ainda jovem, em uma instituição psiquiátrica. A namorada, que o acompanhava na consulta, contou à equipe médica que, há seis dias, após diversas discussões no seu trabalho, ele foi para casa e resolveu se isolar por alguns dias. Nesse período, passou a notar alguns tremores e di�culdade para realizar alguns movimentos, como a �exão da perna. A�ita, realizou uma pesquisa na internet e imaginou que ele tivesse a mesma doença de celebridades como Michael J. Fox e Muhammad Ali. O que intriga o casal neste momento é que Júlio não recebeu encaminhamento nem para um neurologista, nem um psiquiatra, mas para um oftalmologista... 1) Qual é a sua principal hipótese diagnóstica? Doença de Wilson. 2) Cite o primeiro exame que realizaria na investigação desta suspeita e uma droga utilizada no tratamento. Dosagem da ceruloplasmina sérica. Uso de quelantes de cobre: Trientina. Caso 4 Januário, ex-ator de �lmes adultos, 45 anos, vem ao seu consultório queixando-se de que não consegue mais emprego no ramo. O principal motivo seria uma "queda na performance artística" e, por isso, gostaria de tomar algumas das pílulas azuis que seu vizinho vem usando. Quando questionado, refere também cansaço progressivo nos últimos meses, palpitações e dor abdominal em hipocôndrio direito de moderada intensidade. Graças a essa dor, traz um exame de urina realizado no PS na semana anterior que mostra densidade de 1.018, 2 piócitos por campo, glicosúria +++/4+ e presença de cilindros hialinos. O fígado está palpável a 4 cm RCD e há edema de membros inferiores (++/4+). Antes de terminar o exame físico, você percebe, ao olhar mais atento, uma discreta diferença de coloração, uma espécie de "bronzeado", mais intenso na face, pescoço, regiões extensoras dos antebraços e dorso das mãos e pernas. 1) Qual é o provável diagnóstico deste paciente? Hemocromatose hereditária. 2) Cite dois exames laboratoriais que esperaria que viessem alterados e o tratamento inicial para esta condição. Ferritina e saturação da transferrina. Flebotomias seriadas. PRESCRICAO_MEDICA_MEDCIR01 Prescrição Homem, 56 anos, hepatopata crônico por etiologia alcoólica, classe funcional Child-Pugh C é admitido no pronto-socorro com desconforto abdominal e abdome batraquial. Durante rápida avaliação inicial, observa-se que o paciente apresenta confusão mental, hálito de odor fétido e escleras ictéricas. Não relata episódios de hematêmese, mas refere constipação há aproximadamente 3 dias. Como já era sabidamente portador de ascite e o exame físico não deixava dúvidas disso, foi prontamente submetido à paracentese diagnóstica e de alívio (com a retirada de 6,5 L de líquido) que trazia: líquido amarelo-citrino, contendo 500 leucócitos, 300 polimorfonucleares, glicose 60 mg/dl; LDH normal; proteína 0,9 g/dl. O gradiente de albumina soro-ascite calculado foi de 1,8. Com base nesse quadro clínico, faça a prescrição desse paciente: 1. Dieta oral branda, anticonstipante. Substituir proteína animal por fonte vegetal. Lembrar que não há necessidade de restrição proteica, pois a desnutrição piora o prognóstico desses pacientes. Caso a encefalopatia se mostre acentuada (grau III e IV), pelo risco de broncoaspiração, a dieta deverá ser enteral. Com a punção de acesso vascular, ainda na emergência, caso seja iniciada hidratação venosa, teremos que fazer uma hidratação mais parcimoniosa (ex.: 250 ml em alíquotas e reavaliação seriada ou 1.000 ml em 24h) por conta do paciente já ser um retentor de sal e água. Lembre-se que a vasodilatação típica dos cirróticos leva a uma redução do volume circulante efetivo. 2. Cefotaxime 2 g, IV, 8/8h, por 5 dias (Hoje D0). Cefalosporina de 3a geração utilizada para o tratamento de PBE. Ceftriaxone também poderia ser utilizado, embora o perfil de resistência desenvolvido pela droga desencoraje a sua utilização rotineira em muitos serviços. Amoxicilina + clavulanato seria mais uma alternativa. 3. Albumina humana 20% 1,5 g/kg nas primeiras 6 horas + 1 g/kg no 3º dia. Nos casos de PBE, a albumina está indicada para a profilaxia da síndrome hepatorrenal. Como o paciente já irá receber uma carga elevada de albumina, não haverá necessidade de uma reposição adicional em virtude da parecentese, uma vez que isso traria um risco de sobrecarga de coloide. 4. Lactulose 20 ml, VO, 8/8h. Essa dose pode ser aumentada gradualmente até 40 ml, 4/4h, almejando-se a presença de 2/3 evacuações de fezes pastosas/dia. Considerar neomicina, metronidazol ou rifaximina em casos refratário. A LOLA (L-ornitina-L- aspartato) também é uma opção a ser considerada. 5. Metoclopramida 10 mg, IV, 8/8h ou Bromoprida 10 mg, IV, 8/8h. Embora não haja recomendações formais, a utilização de procinéticos poderia otimizar o trânsito intestinal, além de funcionar como antiemético nessa situação. 6. Dipirona 1 g (2 ml), IV, até de 6/6h em caso de dor ou febre. 7. Pesar o paciente em jejum. Monitorização do edema e da ascite, sobretudo quando for iniciada terapiadiurética. 8. Balanço Hídrico. Atentar para desenvolvimento de oligúria indicativa de SHR. Não há necessidade de sondagem vesical de demora. Caso o paciente não seja cooperativo, formas alternativas de monitorização, como utilização de sondas associadas a preservativos, podem ser utilizadas. 9. Curva térmica e sinais vitais. DESAFIO_DIAGNOSTICO_MEDCIR01 Desafio diagnóstico Anamnese: ID: mulher, 32 anos, casada, professora universitária. QP: vômitos e dor abdominal. HDA: paciente procurou serviço médico com queixa de vômitos sanguinolentos em moderada quantidade, associados a dor abdominal difusa iniciada nos últimos dois meses, mas com piora acentuada há três dias. Nega qualquer padrão de irradiação da dor, associação com alimentação, disúria ou alteração do hábito intestinal. HPP: nega ser hipertensa, diabética ou possuir história de alergia. Não refere história prévia de litíase biliar nem faz uso regular de medicamentos, exceto por anticoncepcionais. H. Fam: pai de 68 anos, hipertenso, e mãe de 59, portadora de doença do re�uxo e varizes essenciais. Tem um �lho sadio e possui história de três abortos espontâneos. H. Fisiol: questionada sobre a história reprodutiva, a�rma por vezes apresentar ciclos menstruais irregulares e, por conta disso, utiliza anticoncepcionais orais. Relata que, durante a gestação, recebeu tratamento para sí�lis após detecção ocasional da infecção num exame de sangue. Hsoc: nega ser tabagista, etilista ou usuária de drogas IV. Dieta sem restrições, levemente hipercalórica. Exame Físico: Ectoscopia: lúcida, hipocorada +/4+, afebril, acianótica, anictérica, eupneica, em bom estado geral. PA 128 x 82 mmHg; FC 88 bpm; FR 18 irpm. ACV e AR: NDN Abdome: atípico, peristáltico, �ácido, com dor abdominal difusa à palpação profunda, sem sinais de irritação peritoneal e sem massas palpáveis. MMII: pulsos palpáveis, isóbaros. Ausência de empastamento de panturrilhas. Nota-se a presença de livedo reticularis. Exames Complementares: Foram inicialmente solicitados hemograma, amilase, transaminases, albumina, TAP, EAS e dosagem de beta-HCG cujos resultados não acrescentaram nenhum valor ao caso. Realizada tomogra�a computadorizada de abdome, cujo achado se mostra abaixo: Com base nesses dados, responda: 1) Qual a alteração observada pelo exame de imagem? Trombose de veia porta. 2) Qual seria a hipótese diagnóstica para o caso? Trombose de veia porta = excluir doença hepática (paciente não tem). Avaliando outras causas... Mulher, história de abortos, livedo reticularis, VDRL positivo + trombose de veia porta = síndrome do anticorpo antifosfolipídeo (a princípio primária). 3) Qual é a conduta terapêutica? Uma grande di�culdade encontrada no manejo de pacientes com doenças trombóticas e sangramento é que os tratamentos se antagonizam. Por ora, o mais importante é a estabilização clínica da paciente. A decisão sobre anticoagulação deve ser postergada até que o risco de ressangramento seja mínimo. A SÍNDROME DE INSUFICIÊNCIA HEPATOCELULAR "O cão de caça alado de Zeus, Deve vir como um convidado espontâneo ao seu banquete. Durante todo o dia ele irá rasgar seu corpo em frangalhos, deliciando-se furiosamente sobre o fígado escuro. Não espere o fim dessa agonia, até que um Deus sofra livremente por você." Ésquilo (em "Prometeu acorren tado") C omo podemos observar neste fabuloso trecho da mitologia grega, o castigo de Prometeu por ter levado o fogo dos deuses aos humanos foi ter um pedaço de seu fígado arrancado diariamente. Graças à sua incrível capacidade de regeneração, este castigo seria "eterno" até que algum Deus o libertasse por piedade... Ao longo desta apostila, apesar de falarmos novamente do fígado (a exemplo da apostila de "Síndrome Ictérica"), você perceberá que teremos um enfoque diferente. Nosso objetivo agora estará voltado basicamente para as hepatopatias crônicas e a cirrose hepática. Estas condições são responsáveis por duas síndromes principais. A primeira, veremos neste capítulo, representada pela síndrome de insuficiência hepatocelular. A segunda, discutida adiante, é a síndrome de Hipertensão Porta (HP). A partir de agora, convidamos você a embarcar num detalhado estudo do fígado e das principais condições que o acometem, um tema que há centenas de anos tanto fascina o ser humano! QUADRO DE CONCEITOS VIDEO_01_MEDCIR01 INTRODUÇÃO MICROESTRUTURA HEPÁTICA O fígado é o mais volumoso órgão interno do corpo humano, pesan do aproximadamente 1-1,5 kg e representando 1,5-2,5% da massa corporal magra. Funcionalmente, ele está organizado em pequenos lóbulos. Observe na que estes lóbulos nada mais são que polígonos construídos a partir de "muros de hepatócitos", (as principais células do parênqui ma), contendo a veia centrolobular no meio e o espaço-porta nos cantos. Cada espaço-porta, por sua vez, é formado por uma tríade portal que possui no seu interior uma vênula (ramo da porta), uma arteríola (ramo da artéria hepática) e um dúctulo biliar. Na observamos ainda que estes "muros de hepatócitos" são revestidos por células endoteliais e fagocitárias (células de Kupffer), compondo o que denominamos de Sinusoides Hepáticos. E é justa‐ mente nestes sinusoides que caminha o sangue que "banha" os hepatócitos. MICROAR QUITETURA Lóbulos Hepáticos (Polígonos) / centro: veia centro lobular / "cantos": espaço-porta (tríade: vênula, arte ríola e dúctulo biliar). Zona 1: peri portal; Zona 2: interme diária; Zona 3: peri‐ venular. PRINCIPAIS FUNÇÕES HEPÁTICAS ● Elimi nação de toxinas. ● Coorde nação do metabo lismo interme diário. ● Síntese de proteínas. ● Metabo lismo da bilirrubi na e síntese dos ácidos bilia res. MANIFES TAÇÕES NA HEPATO PATIA ● Achado mais comum: fadiga. ● Aguda (neuro cardio vascula res) x Crônica ("estig mas hepá‐ ticos"). ESTADIA MENTO DA FUNÇÃO HEPÁTICA ● Geral: escore de Child-Pu gh ("BEATA"): classes A, B e C. ● Transpla nte: escore de MELD. COMPLICAÇÕES DA INSUFICIÊNCIA HEPATOCELULAR ● Encefa lopatia hepática. ● Síndrome hepa torrenal. ● Compli cações pulmo nares. ● Desnutrição. ● Coagulopatia. ● Anorma lidades hemato lógicas. ● Doença óssea. ● Hepato carcinoma. FIGURA 1 FIGURA 2 Figura 1: O Lóbulo Hepático = unidade funcional do fígado. Figura 2: Entre os muros de hepatócitos... Como na verdade o endotélio não está "colado" nos hepatócitos, ainda existe entre eles outro espaço (espaço de Disse). O sangue que chega ao fígado é proveniente de duas grandes vias: arterial (artéria hepática) e venosa (veia porta). Eles chegam ao órgão através de seus ramos terminais no espaço-porta. Assim, percorrem um caminho particular que se inicia pelos cantos do lobo hepático (zona 1 – periportal), percorre os sinusoides (zona 2 – intermediária) até desembocar sequencialmente nas veias centrolobulares (zona 3 – perive nular), sublobulares, supra-hepáticas (duas ou três) e veia cava inferior. Graças a essa disposição anatômica, as células de cada zona são diferentes umas das outras e acabam reagindo de forma diversa às agressões externas. Por exemplo, a zona 1 que é rica em nutrientes e oxigênio, sofre menos nos estados de hipotensão que a zona 3, mais distante do espaço-porta e, portanto, menos irrigada. Essa é uma das explicações para a necrose centrolobular nos casos de hipóxia tecidual. Obs.: se você esqueceu estes conceitos, seria bom revê-los na apostila de "Síndrome Ictérica"... Por último, o fígado ainda dispõe de um sistema onde a bile é secre‐ tada, formado pelos canalículos biliares e que caminha num �uxo contrário ao sanguíneo, vindo do centro para periferia. Estas estruturas também estão descritas com mais detalhes no volume "Síndrome Ictérica". IMPORTANTE: Antes de prosseguir, assista ao vídeo: CIR204030 RESIDÊNCIA MÉDICA - 2014 HOSPITAL UNIVERSITÁRIO DA UFSC – UFSC Assinale a alternativa CORRETA. O sangue venoso portal pode conter patógenos e toxinas entéricas neutralizadas no fígado por células que agem como macrófagos residentes.Essas células são: a) Hepatócitos. b) De Kupffer. c) Colangiócitos. d) Endoteliais dos vasos hepáti cos. e) Hepáticas estelares. R. Agora que acabamos de citar esta célula, �ca mais fácil! Resposta: letra B. AS FUNÇÕES DO FÍGADO Por conta de sua vascularização característica, além de receber sangue do sistema arterial (como qualquer outro órgão), o fígado recebe também todo o sangue originário dos intestinos (através da veia porta). Com isso, acaba por exercer duas funções diferenciadas: eliminação de toxinas e coordenação do metabolismo intermediário. Além dessas funções, por conta da complexidade dos "hepatócitos", �ca a cargo do fígado, também, a produção da maior parte das proteínas plasmáticas do nosso organismo e o metabolismo da bilirrubina/formação da bile. Vamos rever alguns detalhes: 1) Eliminação de Toxinas (biotransformação e detoxifica‐ ção): o fígado é capaz de eliminar substâncias tóxicas e inativar diversos medicamen tos através de reações bioquí micas. Estas são classi� cadas em reações de fase I e fase II e costumam ocorrer sequencial mente. ● Fase I: oxidação, redução ou hidrólise. É nesta fase que encontramos as famosas enzi mas do citocromo P-450. Das 50 isoenzimas já identi�ca das, a mais importante é a CYP3A4. ● Fase II: enzimas conjugado ras como a glutationa, que normalmente resultam em substâncias inativas. No �nal dessas reações, o produto solúvel gerado é excretado na urina ou na bile. Um grande exemplo é a transformação hepática de amônia em ureia (ciclo de Krebs-Henseleit). A amônia é nociva principalmente para o sistema nervoso central e a ureia, além de menos tóxica, pode ser eliminada pelos rins. Curiosamente, embora o papel principal seja desativar subs tâncias nocivas, em alguns casos, é o próprio fígado quem as converte para a forma ativa após metabolização. 2) Coordenação do Metabolis mo Intermediário: o fígado é o "grande maestro" do metabo lismo intermediário, coorde nando os nutrientes que ganham a circulação plasmá tica a partir do sistema porta, de forma a armazená-los e redistribuí-los da melhor for ma possível. SAIBA MAIS O fígado possui uma incrível capacidade de se regenerar e ajustar o seu volume às necessidades do organismo, o que pode ser notado após as hepatectomias e os transplantes hepáticos. Em alguns animais, como os ratos, por exemplo, o fígado é capaz de se regenerar totalmente após sete dias! Você já parou para imaginar um coração infartado ou um rim isquemiado que se renovasse dessa forma?? Seria o fim das diálises e dos trombolíticos!!! ● Aminoácidos: a proteína da dieta é transformada em aminoácidos que circulam no organismo e que são utili zados para a síntese de novas proteínas, hormônios e nucle otídeos. Os aminoácidos em excesso, não aproveitados pelos demais tecidos, são utilizados como fonte de energia no fígado ou convertidos em glicose (glico neogênese), corpos cetônicos ou gorduras. O fígado não é capaz de metabolizar os aminoácidos de cadeia rami �cada, que são, desta forma, utili zados pelo tecido muscu‐ lar. ● Carboidratos: com exceção do momento em que os carboidratos são absorvidos da dieta (atuação da insulina), é o fígado quem de�ne os níveis glicêmicos no organis mo!!! Participam dessa regu lação dois fenômenos: a glicogenólise (quebra dos estoques de glicogênio) e a gliconeogênese (produção de glicose a partir de fontes não glicídicas, como os aminoá cidos). Vários fatores in�uen ciam estimulando ou inibindo estes processos, como insu lina, glucagon, epinefrina, etc. Assim, a doença hepática pode produzir tanto hipogli cemia (doença aguda) quanto intolerância à glicose (doença crônica). ● Metabolismo dos Lipídios: o fígado é o principal local de síntese de ácidos graxos no organismo, gerados pelo excesso de glicose. É no fígado também que os ácidos graxos se unem ao glicerol para formar os triglicerídeos. O fígado gorduroso (esteatose hepática) re�ete habitual mente um acúmulo excessivo de triglicerídeos, resultante de um desequilíbrio entre a biossíntese destes e sua secreção no plasma na forma de lipoproteínas de muito baixa densidade (VLDL). O fígado é ainda a principal fonte de colesterol endógeno e responsável por sua captação, armazenamento e secreção na bile. ● Metabolismo das Vitaminas: o fígado é responsável pelo armazenamento das vitami nas lipossolúveis A, D, E e K e está envolvido com a capta ção e armazenamento de outras vitaminas hidrosso lúveis como a tiamina, ciano cobalamina e piridoxina. HIPOGLICEMIA OU HIPERGLICE MIA? Hipoglicemia leve (45 a 60 mg/dl) ocorre em aproximadamente metade dos pacientes com hepatite viral aguda não complicada. Como regra, estes pacientes não são hiperinsulinêmicos. Se a doença hepática aguda for grave (hepatite fulminante), a hipoglicemia pode ser acentuada e potencialmente fatal. A intolerância à glicose, por outro lado, está associada mais comumente à doença hepática crônica e cirrose. As concentrações plasmáticas de insulina tendem a ser altas, sugerindo um estado de resistência periférica. A resistência à insulina também pode refletir uma maior secreção de glucagon, ou mesmo a presença do shunt portossistêmico dos pacientes cirróticos, que faz com que a insulina secretada pelo pâncreas tenha menos “contato” com o fígado. Naqueles com hepatopatias crônicas associadas a outros distúrbios (ex.: hemocromatose e pancreatite crônica), o diabetes mellitus contribui para a intolerância à glicose. Nestes pacientes, os níveis de insulina sérica, ao contrário, estão baixos. 3) Síntese de Proteínas: o fígado é uma verdadeira "fábrica de proteínas" no organismo. Com exceção das imunoglobulinas (produzidas pelos linfócitos B), a maior parte das proteínas encon‐ tradas no plasma é sintetizada exclusivamente pelo fígado. São exemplos dessas proteínas a albumina, os fatores de coagulação, os carreadores e armazenadores (transferrina, ferritina, ceruloplasmina), a proteína C-reativa, o angioten sinogênio, a alfa- 1-antitripsina, os fatores de crescimento, entre outros. Toda vez que você estiver diante de uma lesão hepática aguda, você deve atentar para os seguintes fatos: Obs. 1: cada proteína possui uma velocidade de renovação diferen ciada. Assim, em situações de falência hepatocelular, proteínas que se renovam rapidamente, como os fatores de coagulação, estarão reduzidas antes das proteínas que têm meia- vida maior, como a albumina. Isso explica porque, na insuficiência hepática, o alarga mento das provas de coagulação precede a redução da albumina sérica. Obs. 2: a concentração das proteínas plasmáticas nem sempre reflete o grau de lesão hepática. Um exemplo disto é o catabolismo acelerado em algumas condições, como coagulação intravascular disseminada (para os fatores de coagulação) e enteropatias perde doras de proteínas (para a albumina). 4) Metabolismo da Bilirrubina e Síntese dos Ácidos Biliares Como vimos no volume 1 de Clínica Médica - "Síndrome Ictérica" - o hepatócito é responsável por captar a bilirrubina indireta, transformando-a em bilirrubina direta, para que seja excretada na bile. Assim, esperamos nas hepatopatias o acúmulo principalmente de bilirrubina direta por lesão hepatocitária ou por di�culdade na excreção de bilirrubina para os canalículos biliares. Vamos aproveitar e entender mais um conceito com essa questão do H.U. Onofre Lopes - UFRN: Nos estados de choque, independentemente da causa, prevalece o status de hipoperfusão tecidual, com hipóxia celular, o que gera um metabolismo anaeróbico, sendo, portanto, a relação lactato/piruvato sérico um importante marcador desse metabolismo. A relação lactato/ piruvato está aumentada, sem, no entanto, haver hipóxia celular: a) Na insu�ciência hepática. b) No pós-operatório de cirurgias de grande porte. c) No diabetes mellitus. d) Na glicólise aeróbica. R. Distúrbio hemodinâmico, que se acompanha de má perfusão tecidual generalizada (estado de choque). Sabemos também que este fenômeno é multifatorial e decorre, principalmente,de uma disfunção generalizada da microcirculação. Os principais mecanismos implicados são os seguintes: (1) menor depuração hepática de substâncias endógenas vasoativas; (2) liberação de actina pelos hepatócitos necrosados, a qual sofre polimerização na circulação periférica e lesa as células endoteliais; (3) ocorrência de CIVD (pela coagulopatia hepática), com piora da disfunção endotelial e isquemia de múltiplos tecidos. Muitos pacientes em falência hepática aguda também apresentam quadro séptico sobreposto às alterações citadas, o que agrava ainda mais o distúrbio hemodinâmico. Evidentemente, este contexto de "caos microcirculatório" é su�ciente para gerar um metabolismo anaeróbio e acidose metabólica lática – que, no caso, estaria associada à má perfusão tecidual e hipóxia celular. Todavia, mesmo os portadores de falência hepática aguda, que ainda não se encontram em franco estado de choque, já apresentam elevação do lactato sérico (ou da relação lactato/piruvato, que não é habitualmente pesquisada na prática clínica). Estes indivíduos possuem um mecanismo adicional para o aumento do lactato sérico, além da má perfusão e hipóxia celular: estamos falando da DEFICIÊNCIA NA DEPURAÇÃO DE LACTATO! Temos que nos lembrar de que o fígado é o principal local de metabolização do lactato sérico e, por conseguinte, diante da perda das funções hepatocitárias, é esperado um aumento do lactato sérico, mesmo que o paciente não tenha evoluído com disfunção microcirculatória. Assim, resposta: letra A. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS Acabamos de rever a estrutura e as principais funções do fígado. Até aqui tudo bem... Foram basicamente conceitos. Mas, na prática, como definir que um paciente realmente apresenta ALTERAÇÃO DA FUNÇÃO HEPÁTICA? ANAMNESE E EXAME FÍSICO Muitos pacientes com doença hepática desenvolvem uma forma clínica oligoassintomática, princi palmente nas fases iniciais da doença, sendo o diagnóstico suspeitado por alterações em exames laboratoriais de rotina. Dentre os principais achados inespecí�cos desta fase temos a fadiga (mais comum), predomi nantemente noturna e intermi tente, e os sintomas gastroin testinais inespecíficos, como náuseas, vômitos, dor em hipocôndrio direito e hiporexia. Quanto aos mais especí�cos, temos que levar em consideração se a falência hepática é aguda ou crônica, se compensada ou descompensada... Na forma Aguda (hepatite B fulminante, por exemplo) vimos que predominavam a icterícia e as manifestações circulatórias e neurológicas, não havendo tempo para o aparecimento das manifes‐ tações clássicas da hepatopatia crônica, os famosos "estigmas hepáticos". Este foi o nosso enfoque na primeira apostila do MED, você se lembra? Na forma Crônica, representada pela cirrose hepática, encontra mos dois momentos distintos. A primeira fase da cirrose hepática é dita "compensada" e o que a diferencia da "fase descompen sada" é a ausência de compli cações da hipertensão porta ou da disfunção hepática. Na primeira fase, a sobrevida média é de 9 anos, sendo que a taxa de evolução para a "descompensada" gira em torno de 5-7% ao ano. Na fase "descompensada", a sobre vida média é de 1,6 ano. Condições como sangramento por varizes, síndrome hepatorrenal e Carcinoma Hepatocelular (CHC) podem reduzir esses intervalos. Doença Compensada Estágio 1 (ausência de varizes ou ascite) – mortalidade de 1% ao ano. Estágio 2 (varizes, sem ascite ou sangramento) – mortalidade de 4% ao ano. Doença Descompensada Estágio 3 (ascite com ou sem varizes que nunca sangraram) – mortalidade de 20% ao ano. Estágio 4 (sangramento por varizes, com ou sem ascite) – mortalidade de 57% ao ano. → Fase compensada: é nesta fase que começam a aparecer os sinais relacionados aos distúrbios endócrinos do complexo hipe‐ restrogenismo – hipoandroge nismo. Na disfunção hepática inicial, algumas vias metabólicas estão alteradas, dentre elas a da metabolização do estrogênio – gerando o hiperestrogenismo. Este leva a alterações vasculares cutâneas representadas pelo eritema palmar e pelas telan giectasias As telangiectasias do tipo "aranha vascular" (ou spider angioma) são caracterizadas por uma dilatação arteriolar central que se liga a capilares dilatados com disposição radial. São encontradas especial mente no pescoço, na porção superior do tronco e dos membros superiores. O eritema palmar é decorrente da vasodilatação cutânea restrita à região palmar, principalmente nas regiões tenar e hipotenar. O �uxo sanguíneo para essa região pode aumentar em até seis vezes. Outra manifestação possível é a vasodilatação do pescoço e tórax anterior, dando o aspecto de "colar hepático" ou "xale hepático". Com relação à testosterona, sabemos que, embora a maior parte seja transformada na forma ativa por ação da 5-alfa-redutase na próstata, uma parte também se dá na pele e no fígado. Assim, na disfunção hepática, temos um estado de hipoandrogenismo, responsável pela queda da libido, impotência masculina, atrofia testicular, redução da massa muscular (atro�a dos interósseos) e rarefação de pelos (a distribuição dos pelos passa a respeitar o padrão feminino). A ginecomastia é decorrente tanto do hipoandrogenismo como do hiperestrogenismo. Outras alterações observadas ainda incluem o baqueteamento digital (ver causas adiante) e os sinais associados à hepatopatia alcoólica, como o entumesci mento de parótidas e a contratura palmar de Dupuy tren Por último, sabemos que a albu mina, produzida exclusivamente pelo fígado, é a grande respon sável pela pressão oncótica (pressão que "prende" o líquido no ambiente intravascular). Portanto, na hipoalbuminemia, o líquido intravascular tende a migrar para o interstício, levando à formação de edema. (FIGURA 4). Figura 3: Manifestações clássicas da cirrose hepática. Figura 4: Telangiectasias e eritema palmar na insuficiência hepática. (FIGURA 5). Figura 5: Contratura palmar de Dupuytren. CAUSAS DE BAQUETEAMENTO (OU HIPOCRATISMO) DIGITAL Forma Hereditária Doenças Intratorácicas e Pulmo nares Carcinoma Broncogênico. Outras neoplasias intratorácicas (Metás tase, Mesotelioma, Tumor de Mediastino). Supurações Crônicas (Empiema Pleural, Abscesso Pulmonar). Bronquiectasias. Fibrose Cística. Fibrose Pulmonar Idiopática. Doenças Cardíacas Cardiopatia Congênita Cianótica (ex.: Tetralogia de Fallot). Endocardite Bacteriana Subaguda. Doenças Gastrointestinais Observe como já apareceu na UFCSPA - RS: A enfermidade de Dupuytren: a) Está relacionada à doença ocupacional. b) Inicia, na maioria dos casos, pelo comprometimento do quarto e do quinto quirodáctilos. c) Adere a músculo e nervos da mão. d) Raramente compromete as duas mãos. e) Acomete mais frequentemente mulheres após a menopausa. R. Na Doença de Dupuytren ocorre uma �brodisplasia da fáscia palmar com espessamento, formação de nódulos e cordas que levam à deformidade em �exão dos dedos. É doença idiopática, apresentando alguns fatores relacionados: DM, alcoolismo, uso de drogas (ex.: anticonvulsivantes). Não existe associação ocupacional comprovada. Tipicamente, afeta homens brancos, em torno da 7ª década de vida. Em geral, é bilateral. Os dedos mais frequentemente acometidos são os ulnares (anular e mínimo) e eventualmente o polegar. Atenção para a alternativa C, pois a doença acomete a fáscia palmar (tecido super�cial, logo abaixo do subcutâneo), porém, durante a cirurgia, muito frequentemente, o tecido doente encontra-se aderido aos tecidos profundos, principalmente aos nervos, com risco de lesão. Resposta: alternativa B. → Fase descompensada: aqui aparecem as complicações da Hipertensão Porta e da Insu�ciência Hepatocelular. Na verdade, essas síndromes não são excludentes, mas convivem de forma bem próxima. O paciente que faz encefalopatia por disfunção hepática, por exemplo, também encontra no shunt portossistêmico da hipertensão porta (desvio do sangue do sistema porta para a circulação sistêmica, sem passar pelo fígado), um mecanismo de�agradorda encefalopatia. Assim, poderíamos dizer que esta fase é marcada por: ● Hipertensão porta e suas consequências (varizes esofago gástricas, ascite, circulação colateral abdominal, esplenome galia); ● Encefalopatia hepática; ● Síndrome hepatorrenal; ● Complicações pulmonares; ● Desnutrição; ● Coagulopatia e anormalidades hematológicas; ● Doença óssea; ● Hepatocarcinoma. Devido às particularidades de cada uma dessas complicações, ao �nal deste capítulo, elas serão abordadas de forma mais especí�ca. A hipertensão porta e suas consequências serão revistas no capítulo seguinte. DADOS LABORATORIAIS Quando se quer avaliar a presença de doença hepática, ouvimos frequentemente o termo "provas de função hepática". No entanto, observe que este não é um nome muito adequado, pois algumas dessas provas não avaliam necessariamente a capacidade de síntese ou metabolização do fígado, mas sim lesão celular ou �uxo biliar obstruído (ex.: ALT e fosfatase alcalina). Além disso, outro cuidado que se deve ter é que os testes nunca são diagnósticos e devem ser avaliados caso a caso, podendo estar normais em hepatopatas graves ou mesmo anormais em indivíduos sem doença hepática. A abordagem inicial de um quadro suspeito de disfunção hepática deve incluir, inicialmen te, os seguintes exames: amino transferases (transaminases), fos fatase alcalina, albumina, bilirru binas e tempo de protrombina. Já falamos bastante das transaminases, da fosfatase alcalina e da bilirrubina na apostila de "Síndrome Ictérica". Você se lembra? Cirrose Hepática. Esquistossomose. Doença Inflamatória Intestinal (Crohn, Retocolite). Diarreia Crônica. Uso de Laxantes. SAIBA MAIS Atualmente, com a identifi cação mais precoce de pacientes com doença hepática crônica pela avaliação não invasiva de fibrose com a Elastografia Transitória (ET), um novo termo foi criado: a doença hepática crônica avançada compensada (do inglês cACLD – compensated Advanced Chronic Liver Disease). Ele seria equivalente ao termo anterior "cirrose compensada". Na ET, os pontos de corte estabelecidos foram: < 10 Kpa (na ausência de outros sinais clínicos, afasta-se cACLD); 10-15 Kpa (necessários outros testes confirmatórios); e > 15 Kpa (altamente sugestivos de doença hepática crônica). Outro termo importante a ser conhecido é a "hipertensão porta clinicamente significa tiva" quando teremos um gradiente venoso de pressão porta (ver adiante) ≥ 10 mmHg e ausência de varizes esofagogástricas. ● Aminotransferases (transami nases): são duas enzimas, a aspartato aminotransferase (AST ou TGO) e a alanina aminotrans‐ ferase (ALT ou TGP), liberadas na corrente sanguínea após lesão da membrana do hepatócito. A ALT é praticamente exclusiva do fígado enquanto a AST pode ser encontrada também no miocár dio, músculo esquelético, rim, cérebro, pâncreas, pulmões, leucócitos e hemácias. Ao contrário do que se poderia esperar, não existe boa correlação entre os níveis de transaminases e o grau de lesão celular! ● Fosfatase Alcalina: enzima localizada na membrana do hepatócito próxima ao canalí culo biliar. Pode estar presente em outros locais como o osso, a placenta e o intestino delgado. Elevações discretas podem estar presentes em idosos, crianças e adolescentes em fase de cresci mento, gestantes e pacientes dos tipos sanguíneos O e B sem doença hepática subjacente. A elevação da Gamaglutamil transferase (Gama-GT) ou da 5' nucleotidase podem diferenciar a elevação da fosfatase alcalina produzida no fígado das produ zidas em outros tecidos. ● Bilirrubina total e frações (direta e indireta): detalhado no volume de "Síndrome Ictérica", este teste se relaciona à função excretora e detoxi�ca dora do fígado. A hiperbi lirrubinemia é um fator de mau prognóstico na cirrose hepática, ocorrendo principalmente à custa da fração direta. Amônia sanguínea e bilirrubina urinária também podem ser utilizadas nesse sentido. Com relação aos demais exames: ● Albumina: como é produzida exclusivamente pelo fígado, trata-se de um teste valioso da função de síntese do órgão. No entanto, como circula durante muito tempo no plasma (meia-vida de 15 a 21 dias, com degradação diária de apenas 4%) é um parâmetro ruim para disfunções leves ou agudas. Os níveis associados à hepatopatia crônica estão abaixo de 3 g/dl. Outras condições associadas incluem desnutrição, síndrome nefrótica, enteropatia perdedora de proteína e infecções crônicas (ação da IL-1 e TNF). Quando solicitamos a dosagem de proteína total do plasma, além da albumina, outra importante classe de proteínas plasmáticas está incluída – as globulinas – entre as quais se incluem as gamaglobulinas (imunoglobuli nas produzidas por linfócitos B). Com a disfunção hepática, menos bactérias oriundas da circulação porta são depuradas e ocorre um aumento na produção de imunoglobulinas. Com isso, as gamaglobulinas encontram-se elevadas na doença hepática crônica, sendo alguns isotipos sugestivos de determinadas doenças, como hepatite autoimune (IgG), colangite biliar primária (IgM) e doença hepática alcoólica (IgA). Obs.: como a albumina é um marcador do estado nutricional, aqueles com maior deficit nutricional são também os que apresentam menor albumina plasmática. No entanto, apesar de alguns pacientes apresentarem hipoalbuminemia grave, não há nenhum estudo que comprove o benefício da sua reposição. Conclusão: cuidado com a restrição proteica nestes pacientes... ● Tempo de Protrombina (TAP): considerando que o fígado é o local de síntese dos fatores de coagulação e que a meia-vida destes fatores é muito mais curta do que a da albumina, as provas da coagulação constituem uma das melhores medidas da função hepática. O fator VII tem uma meia-vida de aproximadamente seis horas e, portanto, é o primeiro a se alterar, tornando-se muito importante para os casos agudos. Apesar de não muito bem validados, existem outros marcadores séricos indiretos de fibrose avançada/cirrose: ● Níveis séricos de laminina, peptídeo pró-colágeno tipo III, ácido hialurônico e a própria plaquetopenia (principalmen te na hepatite crônica C). ● Testes Enzimáticos: guanase (elevada na hepatite viral aguda); desidrogenase glutâ mica (GIDH, associada à necrose hepática mesmo quando as transaminases estão em queda) e a pseu‐ docolinesterase (reduzida no deficit de síntese hepática e de valor prognóstico na evolução da cirrose). ● Testes de Função: clearance do verde de indocianina (depuração hepática exclusi va), teste da aminopirina (medido no ar exalado), capacidade hepática de eliminação da galactose e teste MEGX (injeção intrave nosa de lidocaína). Veja mais esta questão: RESIDÊNCIA MÉDICA – 2014 HOSPITAL DA POLÍCIA MILITAR – HPM – MG Marque a alternativa INCORRETA. São preditores de cirrose em adultos com conhecimento ou suspeita de doença hepática: a) Discriminante de Bonacini de cirrose maior que 7. b) Presença de ascite. c) Presença de aranha vascular. d) Contagem de plaquetas menor que 200.000. R. Vamos aprender um conceito com esta questão! Buscando avaliar a probabilidade de desenvolvimento de cirrose em pacientes com doença hepática suspeita ou conhecida, alguns fatores já foram listados, entre eles: (1) presença de ascite; (2) aranhas vasculares; (3) contagem de plaquetas < 160.000/mm3. Outro parâmetro que pode ser utilizado na prática é o escore discriminante de Bonacini (escore > 7). Este escore utiliza em seu cálculo a contagem de plaquetas, a relação ALT/AST e o INR do paciente. Assim, esta questão para lá de especí�ca, por utilizar um valor inadequado das plaquetas, torna o item D a melhor opção a ser marcada. ESTADIAMENTO DA FUNÇÃO HEPÁTICA Diante de um hepatopata crônico, algumas perguntas se impõem ao médico que o assiste. Qual é o grau de disfunção hepática desse paciente? Quais são os índices de mortalidade nesta faixa de exames laboratoriais? Existem tratamentos que estariam indicados ou contraindicados de acordo com a doença hepática desse paciente? Além disso,imagine que dois médicos, um do México e outro do Paquistão venham a trazer relatos de caso de seus países de origem... Como padronizar a de�nição de um hepatopata leve ou grave??? Na tentativa de melhorar todos esses aspectos, foi desenvolvida a classi�cação de Child-Pugh, base ada num esquema de pontuação e interpretação conforme as tabelas a seguir. Para �ns de transplante e avaliação de risco, considera-se um quadro descompensado a partir da classe B (Child ≥ 7). Gravou a classi�cação??? Então, para facilitar, memorize a imagem! Outro escore funcional adotado para a doença hepática é o MELD (Model for End-Stage Liver Disease), mais simples e com melhor capacidade de prever a sobrevida dos hepatopatas, quan do comparado à classi�cação de Child-Pugh. Este escore baseia-se em apenas três variáveis: bilirrubina, INR e creatinina. Na prática, o escore MELD é utilizado principalmente para pacientes com doença descompensada, a �m de determinar a prioridade na �la do transplante. Outros usos do MELD incluiriam a seleção de pacientes para realização de TIPS e como marcador prognóstico em condições como hepatite alcoólica, síndrome hepatorrenal e hemor ragia digestiva. Observe a seguir a fórmula do escore MELD: Existe ainda uma variação deste escore para crianças menores de 12 anos conhecido como PELD. PONTUAÇÃO CLASSI FICAÇÃO 5 a 6 pontos Grau A 7 a 9 pontos Grau B 10 a 15 pontos Grau C ESCORE MELD (CÁLCULO) 10 x [0,957 x loge (creatinina mg/dl) + 0,378 x loge (bilirrubina mg/dl) + 1,12 x loge (INR)] + 6,43 a) Caso os valores de laboratório sejam menores que 1,0, arredondar para 1,0. b) A creatinina poderá ter valor máximo de 4,0, caso seja maior que 4,0, considerar 4,0. c) No caso de necessidade de realização de diálise duas ou mais vezes na última semana, o valor da creatinina será considerado como 4,0. d) Existem outras fórmulas disponíveis para o cálculo, como o MELD modificado pela UNOS (utilizado pelo serviço de transplantes nos EUA) e o MELD de acordo com o sódio (MELDNa). Obs.: loge = logaritmo neperiano (presente em qualquer calculadora científica). ESCORE PELD (CÁLCULO) 10 x [0,480 x loge (bilirrubina mg/dl) + 1,857 x loge (INR) - 0,687 loge (albumina mg/dl) + 0,436 (se até 24 meses de vida) + 0,667] – se tiver deficit de crescimento menor que duas vezes o desvio-padrão para idade a) Caso os valores de laboratório sejam menores que 1, arredondar para 1,0. b) Cálculo do valor do deficit de crescimento baseado no gênero, peso e altura. c) Ajustamento do PELD para harmonização com o MELD: multiplicar por 3 e arredondar para valor inteiro. RESIDÊNCIA MÉDICA - 2020 HOSPITAL MILITAR DE ÁREA DE SÃO PAULO - HMASP Fazem parte da classi�cação de Child-Pugh para avaliação prog- nóstica da doença hepática crônica, EXCETO: a) Bilirrubina. b) Albumina. c) Ascite. d) Creatinina. e) Encefalopatia. R. A famosa classi�cação de Child-Pugh tem como objetivo estrati�car o indivíduo cirrótico em três grupos de gravidade e sobrevida. Para a de�nição do "Child" de um paciente, analisamos cinco variáveis: bilirrubina total, presença ou não de encefalopatia hepática, presença ou não de ascite, TAP/INR e albumina sérica. Resposta: letra D. RESIDÊNCIA MÉDICA - 2016 PUC - SOROCABA - PUC-SP Um homem de 56 anos, com cirrose grave, procurou hepatolo- gista para avaliar a possibilidade de transplante hepático. Ele foi informado que as prioridades são estabelecidas pela escala MELD. Quais dos seguintes elementos fazem parte da escala MELD? a) Contagem de plaquetas. b) Bilirrubinas totais. c) Albumina sérica. d) Grau de encefalopatia. R. Mais uma questão clássica! O chamado MELD (Model for End- stage Liver Disease) consiste em um escore que avalia a gravidade da doença hepática crônica que utiliza três variáveis laboratoriais (bilirrubina, creatinina e INR), visando predizer a sobrevida em três meses. Devido à sua acurácia em determinar a mortalidade a curto prazo em pacientes com cirrose hepática, o MELD é usado para estabelecer prioridades entre os pacientes que estão aguardando transplante hepático. Resposta: letra B. O ALUNO PERGUNTA Existe alguma forma de diferenciar a pontuação da ascite na classificação de Child-Pugh? Algumas ques tões que não usavam denomi nações como moderada ou refratária me deixaram na dúvida. Esta é uma ótima pergunta! A avaliação da ascite costuma ser mais subjetiva, pautada na observação de cada examinador. Embora não seja consenso, o International Club Ascites, em 2013, propôs o seguinte sistema de gra dação que pode lhe ajudar: Grau 1: ascite leve detectada apenas por USG; Grau 2: ascite moderada que se manifesta por distensão simétrica moderada do abdome; Grau 3: ascite volumosa/grave com distensão abdominal marcante. Mas repare que, mesmo usando essa classificação, ainda continua algo subje tivo. DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO O padrão-ouro para o diagnóstico de cirrose hepática é a biópsia, cuja amostra pode ser obtida por via percutânea, transjugular, lapa- roscópica ou por agulha �na guiada. A biópsia também contribui na investigação da causa e de�nição de prognóstico. Contudo, diante de evidências clínicas, laboratoriais e radiográ�cas fortemente sugestivas, não há necessidade de que seja realizada rotineiramente. Sobretudo se não altera o manejo do paciente! Ao longo da abordagem inicial, algumas causas se mostrarão mais evidentes. Nesse caso, cada uma delas terá um tratamento especí�co e que será discutido adiante, na seção "Causas de Cirrose". Por ora, passaremos para uma análise geral das principais complicações associadas à insu�ciência hepatocelular. COMPLICAÇÕES ASSOCIADAS À INSUFICIÊNCIA HEPATOCELULAR Graças à síndrome de insufi ciência hepatocelular, teremos caracteristicamente na forma crônica "descompensada" das hepatopatias e, por vezes, também em algumas formas agudas (ex.: hepatite fulminante), o surgimento de distúrbios clínicos mais graves. Entre eles, poderíamos destacar a encefalopatia hepática; síndrome hepatorrenal; complicações pul monares; desnutrição; coagulo patias; etc. Abaixo iremos detalhar cada uma delas. Complicações como ascite e varizes de esôfago, que também aparecem nessa fase, devem-se mais à síndrome de hipertensão porta e, por isso, serão revistas no próximo capítulo. QUADRO DE CONCEITOS VIDEO_02_MEDCIR01 ENCEFALOPATIA HEPÁTICA INTRODUÇÃO A Encefalopatia Hepática (EH) é, por de�nição, um quadro reversível, caracterizado por alterações neurológicas de graus variados decorrentes da falência hepática. Pode ser encontrada nas lesões agudas (hepatite fulminan te) ou nas crônicas (mais comum). O mecanismo é relacionado à presença de "toxinas" intestinais que chegam à circulação sem serem depuradas tanto por disfunção primária dos hepató citos (insu�ciência hepatocelular) quanto por shunt portossistêmico (hipertensão porta). Dentre essas substâncias, a mais importante é a amônia, produzida pelos enterócitos a partir da glutamina e pelo catabolismo proteico das bactérias colônicas sobre fontes nitrogenadas como as proteínas ingeridas! Em condições normais, o fígado transformaria a amônia em ureia ou glutamina, eliminando-a pelas fezes e urina, o que não ocorre na disfunção hepática. Como resultado, a amônia arterial está elevada em 90% dos pacientes com EH. Cabe apenas marcar que, apesar de a hiperamonemia levar à encefa lopatia, os níveis séricos desta substância não se correlacionam com a gravidade da EH. Outros componentes participantes seriam: mercaptanos, neurotrans‐ missores inibitórios do SNC como GABA ou seus estimulantes como os benzodiazepínicos endógenos. CLASSIFICAÇÃO Após o Congresso Mundial de Gastroenterologia, realizado em Viena (1998), foi formulada uma classi�cação da Encefalopatia Hepática (EH) que ajudou a entender melhor o comportamen to desta condição, com base no mecanismo subjacente. Vejamos: De acordo com a evolução, a EH pode ser ainda classi�cada em: (1) Encefalopatia Hepática Episó dica (Esporádica); (2) EncefalopatiaHepática Recor rente (períodos de EH com duração de até seis meses); (3) Encefalopatia Hepática Persis tente (alterações permanentes com períodos de exacerbação com EH franca). DIAGNÓSTICO ENCEFALOPATIA HEPÁTICA ● Classificação por condição subjacente: » Tipo A: associada à falência hepática aguda; » Tipo B: associada a by-pass portossistêmico; » Tipo C: associada à cirrose e à hipertensão porta. ● Classificação por evolução: Episódica (esporádica)/Recor rente/Persistente. ● Classificação por gravidade: Mínima/Graus I, II, III e IV. ● Classificação por fator desen cadeante: Espontânea/Precipitada (lem brar hemorragia digestiva, alcalose, hipocalemia e uso diuréticos!!!). ● Tratamento: » Não fazer restrição proteica - substituir fonte animal/repor BCAA; » Medicamentosa: lactulose – associada ou não à rifaximina. Opções: neomicina, metronidazol. SÍNDROME HEPATORRENAL ● Patogênese: » Vasodilatação esplâncnica; » Vasoconstrição renal exacer bada. ● Diagnóstico: » Hepatopatia aguda ou crônica com insuficiência hepá tica avançada e hipertensão porta; » Creatinina elevada que não melhora com reposição de albumina e remoção de diuré ticos; » Parênquima preservado (sem causa pré-renal, renal intrínseca ou pós-renal aparen te). ● Classificação: » Tipo 1: rápida progressão da insuficiência renal (< duas semanas), geralmente precipi tada por PBE. Prognóstico ruim; » Tipo 2: evolução é mais insidiosa, espontânea, associada à ascite refratária. Prognóstico melhor. ● Tratamento: Albumina + vasoconstritor (ter lipressina, octreotide, midodri ne)/transplante hepático. Tipo A EH associada à falência hepática aguda. Tipo B EH associada a by-pass portossistêmico (sem le‐ são hepatocelular intrín seca). Tipo C EH associada à cirrose e à hipertensão porta. Devemos entender que não existe nenhum exame laboratorial que con�rme o diagnóstico de EH, sendo, portanto, eminentemente clínico! Dessa forma, na primeira abordagem de um paciente com suspeitas de EH, outros diagnósticos diferenciais devem ser levados em consideração: Nos casos agudos, o aparecimento dos sintomas é mais rápido e associado a rebaixamento do nível de consciência que pode levar ao coma em algumas semanas. A grande preocupação é com o edema cerebral e o risco de herniação. Nos quadros crônicos, a apresen tação é mais característica e composta por dois fatores: (1) Embora a maior parte dos cirróticos se apresente sem sintomas evidentes (EH mínima), a história típica é daquele paciente que começa a se mostrar confuso, com alteração do ciclo sono-vigília e da personalidade. Depois do primeiro episódio, até o paciente é capaz de reconhecer que está �cando "diferente". Alguns se compor tam de maneira mais agressiva e outros se mantêm sonolentos no leito. Para facilitar a abordagem, foi sugerida uma classi�cação em estágios (veja na tabela a seguir): (2) O paciente apresenta algum fator de descompensação (ainda que possa ser também espontânea). A Hemorragia Gastrointestinal é o principal deles! Veja a seguir os mais importantes: Entendendo os fatores princi pais... ● Hemorragia digestiva: o sangue liberado no tubo digestivo é digerido pelas bactérias colônicas. Do meta bolismo da hemoglobina, forma-se mais amônia. Esta amônia é prontamente absor vida pelos enterócitos, desen cadeando a EH. O acúmulo destas substâncias na consti pação também predispõe ao quadro. FATORES PRECIPITANTES NA ENCEFALOPATIA HEPÁTICA Hemorragia gastrointestinal. Hipocalemia e alcalose metabólica. Constipação. Diuréticos, hipovolemia e desidratação. Excesso de proteínas na dieta. Hipóxia. Infecção (urinária, peritonite, etc.). Medicações (narcóticos, sedativos, etc.). TIPS e procedimentos cirúrgicos. ● Alcalose metabólica: o pH plasmático mais alcalino converte a forma ionizada NH4 + (amônio) na forma não ionizada NH3 (amônia). Esta última, por ser lipossolúvel, passa livremente na barreira hematoencefálica, aumentan do a impregnação cerebral da neurotoxina. ● Hipocalemia: aumenta a produção renal de NH3, por reduzir o pH intracelular das células tubulares proximais (saem íons K+ em troca de íons H+). A maior produção de NH3 e a precipitação de uma alcalose fazem da hipocalemia um fator desen cadeante de encefalopatia hepática. ● Os diuréticos de alça (furose mida) e os tiazídicos podem causar encefalopatia em cir róticos (se usados indiscri‐ minadamente), por provoca rem hipocalemia e alcalose metabólica... RESIDÊNCIA MÉDICA - 2020 SANTA CASA DE MISERICÓRDIA DE RIBEIRÃO PRETO - SCMRP - SP Paciente cirrótico, chegou ao pronto socorro com quadro de sonolência, inversão do ciclo sono-vigília, asterix e ascite. Qual o diagnóstico mais provável e a melhor forma de comprovar a hipótese clínica? a) Encefalopatia hepática; dosagem de amônia sanguínea. b) Encefalopatia hepática; protocolo da ressonância nuclear magnética de manganês que impregna nos núcleos da base. c) Encefalopatia hepática; diagnóstico clínico. d) Hematoma subdural; TC de crânio. R. Paciente cirrótico com quadro de sonolência e inversão do ciclo sono-vigília... Em que pensar? Tais achados neurológicos sugerem encefalopatia difusa, os quais, em conjunção com asterix, nos farão pensar em Encefalopatia Hepática (EH). Não existe nenhum exame laboratorial que con�rme o diagnóstico de EH, sendo, portanto, eminentemente clínico (A e B erradas). Diante de todos os achados descritos, a hipótese de hematoma subdural é muito remota; lembre que asterix assinala etiologia metabólica para o quadro de encefalopatia (D errada). Resposta: letra C. Embora não sejam obrigatórios, na prática, podemos acrescentar alguns testes psicométricos especí�cos (ex.: teste de conexão numérica - NCT; teste dígito e símbolo - DST) e a eletroencefalo-gra�a para auxiliar no diagnóstico e caracterização da EH. Cabe lembrar, no entanto, que não se recomenda rastreamento de EH em assintomáticos. Testes laboratoriais geralmente revelam evidências de disfunção hepática (ex.: hipoalbuminemia, INR alargado) e distúrbios eletro- líticos resultantes da hipertensão porta e do uso de diuréticos. A dosagem da amônia sérica é controversa, pois pode sofrer in�uên cia de outros fatores (ex.: sangramento digestivo, choque, doença renal, NPT etc.). Contudo, apesar de não ser necessária para o diagnóstico, pode ser utilizada na monitorização do tratamento. Outro marcador em estudo é a 3-nitrotirosina, que ainda precisa de validação para uso clínico. TRATAMENTO Os objetivos básicos do tratamen to da encefalopatia hepática são: (1) Identi�cação e remoção dos fatores precipitantes de EH! São medidas para prevenção de fatores precipitantes: ● Pro�laxia para sangramento de varizes gastroesofágicas; ● Para peritonite bacteriana espontânea; ● Uso correto e não abusivo de diuréticos! ● Evitar constipação intestinal (proliferação bacteriana). (2) Dieta: não existe evidência clínica comprovando benefício da restrição proteica nos pacientes com encefalopatia hepática... Pelo contrário, esta medida acabava piorando o grau de desnutrição dos pacientes, sendo hoje uma medida não recomendada. Algum benefício pode ser obtido com a substituição da fonte proteica animal pela vegetal, ou pela reposição de fonte nitrogenada com aminoácidos de cadeia rami� cada (BCAA). (3) Lactulose: 30-120 ml/dia, divididos em quatro toma das, até atingir 2-3 evacua ções de fezes amolecidas. A lactulose (nome comercial Lactulona®) é metaboliza da pelas bactérias colônicas em ácidos graxos de cadeia curta (ácido lático e ácido acético), reduzindo o pH do lúmen colônico para em torno de 5,0. Com o pH mais ácido, o NH3 (amônia) é convertido em NH4 + (amô nio), este último não consegue ser absorvido pela mucosa intestinal. O resultado é a menor absor ção de amônia e a melhora do quadro da EH... Outro mecanismo de ação da lactulose (um dissacarídeo não absorvível) é o seu efeito laxativo, que elimina o mais rapidamente possí vel as fontes proteicas do lúmen intestinal, alémde reduzir a estase intestinal, evitando a proliferação bacteriana. Esta droga também possui um efeito direto no metabolismo bacteriano das proteínas, fenômeno que diminui a formação de NH3... Outras drogas: SAIBA MAIS Sobre o Flapping ou Asterix: CIR204038 Apesar de uma característica clássica da disfunção hepática grave, o flapping não é patogno mônico desta condição. Na prática, ele pode ocorrer em diversas condições como a encefalopatia urêmica, carbo narcose, DPOC, pré-eclâmpsia grave ou eclâmpsia e into xicação pelo lítio. ● Rifaximina: 550 mg, via oral, 12/12h. Menos efeitos adversos e, por isso, considerada a melhor opção para ser adicionada à lactulose. Se não houver disponibilidade da rifaximina, uma medida para reduzir as complicações das outras medicações seria usá-las de forma alternada. ● Sulfato de Neomicina: 500 mg-1 g, via oral, 8/8h. A neomicina é administrada no intuito de reduzir a �ora bacteriana colônica produtora de amônia. Mesmo sendo pouco absorvido, este aminoglicosídeo pode ser ototóxico e nefrotóxico, principalmente quando tomado por longo tempo. ● Metronidazol: 250 mg, via oral, duas a quatro vezes por dia. O grande risco é a neuropatia periférica. (4) Transplante Hepático: após um episódio de encefalopatia hepática, a sobrevida média em um ano é de apenas 40%, devendo o paciente ser submetido a uma avaliação para entrar na �la de transplante hepático (única terapia de�nitiva para sua doença!!!). ATENÇÃO Outras drogas que podem ser incluídas e que agem aumentando a eliminação de amônia do organismo são: ● Complexo L-orinitina L-aspartato (LOLA), que aumenta a transformação de amônia em ureia nos hepatócitos; e ● Benzoato de sódio, que aumenta a excreção renal de nitrogênio. Essas drogas, assim como o sulfato de zinco (200 mg, VO, 8/8h), podem ser utilizadas nos casos refratários. Outras tentativas de relativo sucesso em alguns estudos também já foram feitas com melatonina, naltrexona, antagonistas sero‐ toninérgicos e suplementação com aminoácidos de cadeia ramificada (BCAA). PROFILAXIA Recentemente, alguns estudos mostraram que lactulose ou rifaximina poderiam ser utilizadas como pro�laxia para a encefalopatia hepática após episódio de sangramento. Contudo, não existe ainda uma recomendação formal para a conduta e mais trabalhos são necessários para avaliação do risco/benefício e de quais pacientes estariam sob risco mais elevado. É importante destacar que essa falta de recomendação se aplica apenas à "pro�laxia", mas nada tem a ver com o "tratamento" da encefalopatia, que tem sim estas drogas como opções terapêuticas. SÍNDROME HEPATORRENAL INTRODUÇÃO A Síndrome Hepatorrenal (SHR) se caracteriza por uma insu�ciência renal aguda que ocorre em 10% dos pacientes com cirrose hepática avançada. Caracteris ticamente, o parênquima renal está intacto e a perda progressiva da sua função está associada à vasoconstrição renal exacerbada, que ocorre em resposta à vasodilatação esplâncnica desen volvida nos quadros hepáticos. Mas de onde vem essa alteração hemodinâmica? O mecanismo da SHR até hoje não está muito bem de�nido, mas a vasodilatação arterial periférica parece ser um evento precoce. Sabemos que, na disfunção hepática grave, agentes vasodila tadores, como o óxido nítrico, são acumulados, levando a um quadro hemodinâmico caracte rizado por hipotensão arterial e diminuição do volume circulante efetivo. De acordo com uma recente revisão da New England em 2009, a vasodilatação é provavelmente secundária à produção de citocinas pró-in�amatórias (TNF-alfa, IL-6) nos linfonodos mesentéricos e hipersecreção endotelial de vasodilatadores (óxido nítrico, monóxido de carbono e canabinoides endógenos), após um processo de translocação bacteriana (algumas bactérias conseguiriam ultrapassar a mucosa). Como resultado, teríamos uma vasodilatação principalmente no leito esplâncnico, capaz de "roubar" sangue dos demais locais e desencadear um quadro de hipovolemia... Assim, da mesma forma que num quadro verdadeiro de hipovolemia, surge então vasoconstrição renal (mediado pelo sistema adrenérgico), só que, neste caso, de intensidade desproporcional, ocorrendo uma inversão do �uxo sanguíneo corticomedular. Temos também um estímulo para retenção renal de sódio e água (mediado pelo sistema renina-angiotensina-aldosterona), levando a uma urina pobre em sódio e concentrada. Existiria ainda um terceiro mecanismo relacionado à secreção de vasopressina (com mais retenção de água e vasocons‐ trição), mas só ativado em casos extremos. RESUMINDO A SHR é uma IRA "pré-renal" que não responde a volume! Na verdade, ela reflete um desequilíbrio entre os fatores vasodilatadores e vasocons tritores, resultando no aumento significativo da resistência vascular renal, diminuição da taxa de filtração glomerular e uma ávida retenção de sódio e água. Nestes casos, a reversão só é possível com a recuperação da função hepática ou transplante. É um quadro bastante grave, cuja mortalidade nos pacientes cirróticos chega a 80%!!! DIAGNÓSTICO Toda vez que um hepatopata, geralmente com ascite volumosa, manifestar oligúria ou elevação de escórias nitrogenadas, você deverá pensar na síndrome hepatorrenal! Como estes pacientes também estão sujeitos a outras formas de lesão renal, o primeiro passo é excluir outras causas de IRA, como hipovolemia (hemorragia digestiva, diarreia) e drogas nefrotóxicas. Em segundo lugar, devem ser identi�cados fatores precipitantes que diminuam o volume intravascular, como diureticoterapia vigorosa ou paracentese (IRA iatrogênica). Existem critérios diagnósticos para a SHR que foram de�nidos pelo International Club os Ascites. Veja a seguir: Cabe ressaltar que apenas uma minoria dos pacientes cirróticos que apresentam azotemia possui de fato a SHR. Inclusive, atualmente existem marcadores que podem nos ajudar nesta distinção, como é o caso da lipocalina neutrofílica urinária associada à gelatinase, que se mostra com valores mais elevados na lesão renal aguda (325 ng/ml) que na SHR (105 ng/ml). CLASSIFICAÇÃO Existem dois tipos de SHR: tipo 1 e tipo 2, diferenciados pela velo‐ cidade de progressão da disfunção renal. O tipo 1 é caracterizado pela rápida progressão da insu�ciência renal (< duas semanas), havendo aumento da creatinina sérica para o dobro da inicial (níveis superi ores a 2,5 mg/dl), geral mente precipitada por um quadro de PBE. O prognóstico da SHR tipo 1 é extremamente ruim, com uma sobrevida média de cerca de duas semanas. No tipo 2, a creatinina sérica se situa entre 1,5 e 2 mg/dl, a evolução é mais insidiosa, espon tânea, associada à ascite refratária e com prognóstico melhor. TRATAMENTO A melhor terapia é o transplante hepático, com boa recuperação da função renal! O tratamento clínico é bem menos efetivo e a prevenção deve ser o foco das intervenções, evitando-se o uso inapropriado de diuréticos e corrigindo-se precocemente os distúrbios hidroeletrolíticos, he‐ morragias e infecções. Pacientes com peritonite bacteriana espon tânea podem se bene�ciar da administração precoce de albu mina (ver capítulo de "Ascite") para prevenir o desenvolvimento da SHR. Das abordagens farmacológicas propostas nos últimos anos, o uso de vasoconstritores sistêmicos (terlipressina, noradrenalina, octreo tide mais midodrina) asso ciados à albumina intravenosa (1 g/ kg/dia – 100 g no máximo – por dois a três dias) tem se mostrado como a melhor proposta. Deve ser obtido um aumento de, pelo menos, 15 mmHg na pressão arterial média e a melhora clínica costuma ser observada após a primeira semana de tratamento. As doses indicadas estão a seguir: ● Terlipressina: 0,5-2 mg, a cada quatro ou seis horas; ● Octreotide: 100-200 mcg, subcutâneo, três vezes ao dia; ● Midodrina: 7,5-12,5 mg, oral, três vezes ao dia. Além dos vasoconstritores, outras opções incluem a TIPS e a diálise extracorpórea com albumina, servindo apenas como uma "ponte" até a realização do transplante hepático. Drogasde ação vasodilatadora renal como a dopamina em baixa dose, muito utilizadas no passado, não devem mais ser administradas. CRITÉRIOS DIAGNÓSTICOS PARA A SÍNDROME HEPATOR RENAL ● Doença hepática aguda ou crônica com insuficiência hepá‐ tica avançada e hipertensão porta. ● Creatinina sérica > 1,5 mg/dl (recentemente, a definição de aumento ≥ 0,3 mg/dl em 48h ou ≥ 50% em sete dias passou a vigorar, em consonância com as recomendações das diretrizes das Sociedades de Nefrologia). ● Ausência da melhora da creatinina sérica após, pelo menos, dois dias de retirada de diuréticos e expansão volêmica com albumina (1 g/kg/dia até o limite de 100 g/dia). ● Ausência de causa aparente, entre elas: choque, uso recente ou atual de drogas nefrotóxicas e ausência de sinal ultrassono gráfico sugestivo de obstrução ou doença parenquimatosa renal. ● Hematúria < 50 hemácias por campo de grande aumento e proteinúria < 500 mg/dia. RESIDÊNCIA MÉDICA – 2012 FACULDADE DE MEDICINA DO ABC – ABC – SP A SHR é uma disfunção renal que: a) Acomete de modo irreversível somente os pacientes cirróticos em fase avançada. b) Acomete somente os pacientes cirróticos, mas é potencialmente uma condição reversível. c) Pode acometer tanto pacientes cirróticos como também pacientes com hepatite alcoólica e em falência hepática aguda, sendo que somente a do tipo I deverá ser tratada com drogas vasoativas. d) A SHR do tipo I caracteriza-se bioquimicamente por creatinina acima de 1,5 mg/dl em paciente com função renal prévia normal, habitualmente precipitada por episódio de hemorragia digestiva alta (HDA). R. A síndrome hepatorrenal é uma forma de disfunção renal aguda potencialmente reversível, que acomete pacientes num contexto de perda da função hepática. É mais comum nos indivíduos com cirrose avançada (em geral após evento de�agrador, como a PBE), mas também pode aparecer de forma aguda (na ausência de cirrose preestabelecida), em associação com a hepatite alcoólica grave ou mesmo qualquer outra forma de falência hepática (A e B erradas). A SHR tipo 1 é aquela caracterizada pelo desenvolvimento rápido de azotemia signi�cativa e a creatinina plasmática dobra de valor em menos de duas semanas, �cando > 2,5 mg/dl (D errada). O tratamento consiste em transplante ortotópico de fígado, mas até que o transplante seja realizado, podemos manter o paciente vivo com o emprego de drogas vasoativas, como a terlipressina e a noradrenalina. Este tratamento serve para ambas as formas de SHR, embora a tipo II, associada à ascite refratária, seja insidiosa e tenha um prognóstico melhor. Resposta: letra C. COMPLICAÇÕES PULMONARES São duas complicações principais (síndrome hepatopulmonar e hi‐ pertensão hepatopulmonar), com características particulares em cada uma, que não podem ser confundidas. Veja a seguir: SÍNDROME HEPATOPULMONAR (SHP) INTRODUÇÃO Trata-se de uma condição presen te em 5-10% dos pacientes que aguardam o transplante hepático e se caracteriza basicamente por três achados: (1) Doença hepática estabelecida; (2) Hipoxemia (gradiente alveolo arterial elevado em ar ambien te); (3) Evidência de alterações vascu lares intrapulmonares, referi das como "Dilatações Vascu lares Intrapulmonares" (DVIP). Mas o que está por trás da SHP? SAIBA MAIS Novos Conceitos em Síndro me Hepatorrenal (SHR) Nos últimos anos, novos dados apareceram sobre a SHR, sobretudo em relação a sua patogênese! Atualmente ela é cada vez mais reconhecida não apenas como um distúrbio "funcional", como se achava, mas que também conta com a participação de inflamação sistêmica, estresse oxidativo e dano tubular por sais biliares. Ou seja, a SHR teria um componente estrutural adicional. Com isso, os critérios diagnósticos tradicionais passariam a ser menos confiáveis e a proposta mais recente seria mudar de "tipo 1" e "tipo 2" para a seguinte classificação: Além da mudança nos crité rios, teríamos a ênfase numa abordagem mais precoce da disfunção renal e uma expli‐ cação mais plausível para a falta de resposta ao trata‐ mento farmacológico com vasoconstritores mais albu‐ mina, em alguns casos. Assim, novas abordagens terapêu‐ ticas podem surgir num futuro próximo. Sabemos que o paciente cirrótico é um indivíduo "naturalmente vasodilatado" pela predominância de substâncias, como o óxido nítrico, na circulação. Com isso, o paciente tende a apresentar alterações circulatórias como diminuição do volume circulante efetivo, hiper�uxo compensatório e ativação do sistema renina-angiotensina- aldosterona. A sín drome hepatopulmonar seria uma complicação associada a este mecanismo, só que no leito pul monar... Vamos entender melhor: Normalmente, os capilares pulmo nares são bastante estreitos (cerca de 8 μm) de forma a permitir apenas a passagem de hemácia por hemácia (cada uma mede pouco menos de 8 μm). Esse processo garante uma grande proximidade entre os alvéolos e as células vermelhas, garantindo assim uma boa oxigenação Nos pacientes com SHP, estes capilares estão extremamente dilatados, chegan do a um diâmetro de até 500 μm. O resultado já podemos imaginar... Hemácia passando rápido pelos alvéolos e com pequena proximidade, resultando numa baixa oxigenação Como já é reconhecido na �siologia pulmonar, esse processo se assemelha a um " shunt direito-esquerdo". MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS O paciente apresenta tipicamente dispneia aos esforços, cianose de lábios e extremidades, baquetea mento digital e aranhas vascu lares. No entanto, dois achados são clássicos: a platipneia (dispneia que surge ou se agrava com a posição sentada ou em pé) e a ortodeóxia (queda acentuada da saturação arterial com a posição ortostática). Uma das explicações é a localização preferencial das DVIP nas bases pulmonares. DIAGNÓSTICO Os critérios diagnósticos variam bastante segundo a fonte e não existem valores muito rígidos para con�rmá-los. Em geral, pode mos dizer que: Vejamos alguns detalhes sobre os exames: ● A coexistência de anorma lidades pulmonares, tais como derrame pleural ou obstrução ao �uxo expira tório, comuns em pacientes com doenças hepáticas, não exclui o diagnóstico de SHP. ● Gasometria Arterial: permite avaliar a presença ou não de hipoxemia, hipocapnia, alcalose respiratória e ortodeóxia. Devemos atentar para o fato de que a saturação de O2 pode estar falsamente diminuída nos pacientes com hiperbilirrubinemia. Por aspectos técnicos, o excesso de bilirrubina no sangue poderia levar a uma leitura equivocada da saturação, por in�uenciar o princípio de absorção da luz utilizado na oximetria de pulso; ● Radiografia de Tórax: o prin cipal papel é afastar outras causas de hipoxemia (atelec tasias, derrame pleural, pneu monia, etc.). Na SHP, ela pode ser normal ou mostrar alterações inespecí�cas como um discreto in�ltrado inters ticial bilateral, com acentu ação dos vasos pulmonares tanto na região hilar como na periferia, ou aspecto mosque ado com imagens nodulares, principalmente nas bases pul monares; ● O Ecocardiograma Contras tado é o exame não invasivo mais importante para o diagnóstico. Consiste na admi nistração endovenosa perifé rica de verde de indocianina ou solução �siológica "agi tada" (para a formação de microbolhas). Se houver comunicação intracardíaca anormal aparecerá opaci� cação imediata das câmaras esquerdas após a chegada das microbolhas nas câmaras direitas do coração. Na presença de SHP, ocorrerá opaci�cação retardada nas câmaras esquerdas, entre três a seis batimentos cardíacos após a chegada das micro bolhas no ventrículo direito. Esta técnica não permite a diferenciação entre dilatações pré-capilar, capilar ou pleu rais e comunicações arterio venosas; ● A Cintilografia com macroa gregados de albumina mar cados com 99mTc também pode revelar indícios das DVIP, mostrando �uxo radioativo para o cérebro como resultado do shunt; ● Angiografia Pulmonar: utili zada para os casos de diagnóstico duvidoso. Pode revelar dois padrões – altera ções difusas aracneiformes correspondentes
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