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Monitoria de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental I 6 Agulhas, Fios Cirúrgicos, Anestesia local e Suturas Descontínuas Revisão: Lucas Carvalho Andrade 6.1 Agulhas e Fios Cirúrgicos Existem diferentes tipos de agulhas e fios utilizados em cirurgia. Ainda não se tem o fio e a agulha ideal, que possa ser utilizada em todos os tecidos, cabendo ao profissional conhecer as características inerentes de cada tipo de agulha e fio, o tecido que será reparado (tecidos que apresentam maior resistência como aponeuroses necessitam de agulhas mais robustas e de fios com maior força tênsil, por exemplo) e qual o material que melhor desempenha essa função, a localização e acessibilidade, o tamanho da sutura e a sua finalidade. 6.1.1 Agulhas – Classificação Fundo Traumática Atraumática Corpo Cilíndrico Triangular Retangular Ponta Cilíndrica (tecidos menos resistentes e friáveis) Triangular (tecidos mais resistentes) Retangular (tecidos nobres e delicados) Formato Reta Curva: 1/4 de círculo: oftalmologia e microcirurgia; 3/8 de círculo: profundidade e superficial 1/2 de círculo: áreas confinadas de difícil acesso – cavidades 5/8 de círculo: urologia – facilidade de resgate – cavidades profundas Mista (Haste reta e extremidade curva), Monitoria de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental I 6.1.2 Fios – Classificação • Podem ser monofilamentares ou multifilamentares (torcido, trançado ou trançado revestido). • Podem se apresentar como Sertix (fio agulhado) ou Sutupak (fio não-agulhado). Os fios monofilamentares são, em geral, menos maleáveis que os fios multifilamentares, o que exige maior cuidado na manipulação, e também têm menor potencial de desenvolvimento de infecções. O segundo, por sua vez, possui vários filamentos, sendo torcidos ou trançados, o que garante maior flexibilidade e facilita o manuseio. Podem ser ainda trançados revestidos, contribuindo para diminuição das reações teciduais. Absorvíveis: Animal: Categute Simples e Cromado Sintético: Vycril, Polivycril, Monocryl, Dexon Inabsorvíveis: Animal: Seda Vegetal: Linho, Algodão Sintéticos: Poliamida: Mononylon, Superlon, Ethilon, Dermalon, Nurolon Polipropileno: Prolene, Supralene, Proxolene Poliéster: Mersilene, Dacron, Ethiflex, Ethibond, Supramid Metálico: Aciflex, Surgaloy, Monicrom, Flexon Figura 6.1 Formato e curvatura das agulhas cirúrgicas. Figura 6.2 Corpo das agulhas cirúrgicas. Figura 6.3 Fundo das agulhas cirúrgicas. Monitoria de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental I Os fios de sutura possuem em suas embalagens números de zeros (visto na figura 6.4). Estes números indicam a força tênsil do fio e também o seu calibre: quanto maior o número, menor o calibre e força tênsil e, portanto, mais delicado é o tecido que necessita deste fio. Trata-se então de uma relação inversa. Exemplo: o Mononylon 2.0 tem calibre e força tênsil muito maior que o mesmo fio 4.0. Tabela 6.1 – Características dos Fios Absorvíveis Figuras 6.4 A e B. Fios Cirúrgicos Monitoria de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental I Os diferentes tipos de ferida, nos diferentes tipos de tecidos, oferecem diferentes resistências (força oposta pelos tecidos à sua junção). Para que a resistência do tecido seja vencida e este possa se manter unido até que a ferida seja totalmente cicatrizada, o fio empregado precisa ter a força tênsil necessária para tal. Quanto maior a força tênsil de um fio, menor será o seu diâmetro necessário na sutura, o que é vantajoso para diminuir a quantidade de corpo estranho na ferida. Após completado o processo de cicatrização da ferida, o fio empregado na sutura não tem mais nenhuma função e, idealmente, deve ser retirado já que a sua permanência acarreta em meio potencial de proliferação microbiota. Tratando-se de um fio absorvível, este deve ser degradado por reação enzimática inflamatória (ex: Catgut), que é mais intensa, ou por hidrólise (fios absorvíveis sintéticos, ex: Vycril), que gera pequena reação tecidual. Já um fio inabsorvível possui um tempo de degradação muito elevado (o fio de nylon chega a ser degradado em dois a três anos) e precisa ser retirado através do procedimento correto. Deve-se ter em mente que o fio cirúrgico ideal não existe. Contudo, há o que melhor se aplica a cada ocasião. Essa escolha ocorre através da análise individualizada de cada situação e da sinergia entre estes fatores e as características de cada tipo de fio. São fatores determinantes para a escolha do Tabela 6.2 – Características dos Fios Inabsorvíveis Monitoria de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental I fio: tipo de ferida e sua extensão, órgão ou tecido alvo, propriedades de cicatrização do tecido, particularidades clínicas do paciente, experiência, força tênsil do fio, segurança no nó, reação tecidual, custo e bom senso do cirurgião. 6.2 Limpeza da Ferida e Anestesia Local A limpeza da ferida é um procedimento essencial que permite a recuperação de forma correta e mais eficaz. Para que o processo de cicatrização ocorra bem, a ferida precisa estar limpa, sem a presença de corpos estranhos e tecidos desvitalizados, bem vascularizada, sem infecções e com níveis benéficos de umidade. A lavagem abundante da ferida com solução salina fisiológica se mostra bastante eficaz no processo de limpeza. Esta deve ser aplicada sob baixa pressão, podendo-se utilizar uma seringa ou então pressionar a bolsa da solução para tal. É possível utilizar gaze montada (Pean, Foerster ou até mesmo pinça de dissecção) para auxiliar no processo. O objetivo da lavagem é retirar eventuais corpos estranhos, impurezas e tecidos desvitalizados, que dentro da ferida, prejudicarão a cicatrização correta. É válido salientar que pressões muito elevadas durante a lavagem apesar de terem demonstrado vantagens em feridas contaminadas, causa dano tecidual, que é potencialmente prejudicial à cicatrização correta, e, portanto, não deve ser utilizado de rotina. O debridamento mecânico cirúrgico é essencial para retirar tecidos desvitalizados e outros componentes prejudiciais à cicatrização ideal e deve ser realizada também para evitar infecção local. Deve ser feito com uma lâmina tanto no interior da ferida como também para alinhar as bordas da mesma e permitir melhor resultado na sutura (se necessário). O uso de agentes antissépticos (PVPI, clorexidina etc.) no interior da ferida não deve ser rotina. A ação citotóxica destes é superior à ação antisséptica e prejudicam a formação do tecido de granulação cicatricial e retardam bastante a recuperação ideal da ferida. O uso de solução degermante e antisséptica na pele íntegra, adjacente à ferida, não mostrou desvantagens à cicatrização. Existem soluções antissépticas específicas que apresentam efeito benéfico ao ser utilizadas no interior da ferida. Entretanto, o seu uso é restrito a situações particulares já que o custo dessas substancias é elevada e as mesmas não são encontradas rotineiramente. Figura 6.6 Debridamento mecânico da ferida Figura 6.5 Limpeza da Ferida com presença de tecido de granulação Monitoria de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental I A anestesia local deve ser empregada para procedimentos menores e maiores nos quais o local cirúrgico é infiltrado com um anestésico local, ou então, é realizado um bloqueio regional, ambos com drogas como lidocaína ou bupivacaína. Este tipo de anestesia não envolve perda da consciência e depressão das funções vitais, produzindo perda da sensibilidade temporária (reversibilidade é a sua principal característica), causada pelo bloqueio temporário dos canais de sódio, o que interrompe a despolarização nervosa e retarda acondução do estímulo doloroso. A anestesia bem aplicada propicia além do conforto maior do paciente, a diminuição do sangramento e relaxamento da musculatura, o que facilita procedimentos como suturas, acessos vasculares mais invasivos, punção lombar etc. A maior parte dos anestésicos locais é do tipo amida, incluindo prilocaína, procainamida, articaína, lidocaína (o mais utilizado), mepivacaína, bupivacaína, etidocaína e ropivacaína, os quais raramente determinam reações alérgicas. Os anestésicos do tipo éster são mais tóxicos e possuem uso mais limitado, como pacientes com alergia aos anestésicos derivados das amidas. A procaína, agente anestésico de curta duração é um exemplo do tipo éster. A seleção dos anestésicos locais está basicamente relacionada a duração do efeito e também a algum tipo de contraindicação que o paciente apresente como alergias por exemplo. Assim, são eles classificados em agentes de curta duração (procaína e clorprocaína), duração intermediária (lidocaína, mepivacaína e prilocaína) e longa duração (tetracaína, ropivacaína, bupivacaína e etidocaína). Os anestésicos locais se apresentam na forma com e sem agente vasoconstrictor (em geral, epinefrina). A associação entre o anestésico e o agente vasoconstrictor propicia diminuição do sangramento local, menor absorção sistêmica do anestésico e, portanto, maior duração do mesmo. Em contrapartida, o seu uso ou não depende do local em que a anestesia será realizada, devendo ser evitado em pacientes cardiopatas graves (risco de isquemia miocárdica) e em extremidades (sobretudo dedos) por conta do risco de isquemia e necrose tecidual. Figura 6.7 Material para limpeza da ferida: solução fisiológica, PVPI degermante e gaze. Figura 6.8 Anestésico local, agulhas e seringa Monitoria de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental I É importante ainda conhecer a dosagem máxima do agente anestésico utilizado. Lembrar que estas dosagens variam e associar o vasoconstrictor também é importante. Exceder as doses máximas recomendadas pode levar a complicações graves como toxicidade e comprometimento dos sistemas cardiovascular e nervoso central. 6.2.1 Técnica 1. Antissepsia a. Luvas de procedimento: lavar o interior da ferida com soro fisiológico. Pode-se utilizar gaze montada para auxiliar e uma seringa para elevar a pressão do jato durante a lavagem (este passo pode ser realizado pressionando a bolsa de soro que esteja com “bico” ou agulha acoplada). b. Caso seja necessário realizar o debridamento mecânico, e caso este seja possível sem anestesiar o paciente, deve-se fazê-lo juntamente com a limpeza. Utiliza-se uma lâmina e gazes para auxiliar o processo. c. Realizar degermação em volta da ferida (esponja - escovação - retirar o excesso com gaze) somente na pele integra, nunca dentro da ferida. d. Com luvas estéreis, passar PVPI tintura na pele íntegra em volta da ferida (nunca dentro da mesma) utilizando uma Pean ou Foerster com gaze montada. 2. Colocar campo fenestrado. 3. Retirar o anestésico com a agulha de pavilhão rosa ou vermelho – 1,20 x 25 mm (atento para não tocar a luva estéril no recipiente do anestésico). Retirar o excesso de ar da seringa e, se houver bolhas, bater levemente sobre elas com a ponta do dedo, para deslocá-las. Figura 6.10 Degermação das bordas da ferida. Figura 6.9 Limpeza da ferida com solução fisiológica. Monitoria de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental I 4. Infiltração: 4.1. Para feridas sem sinais de contaminação e limpas: a infiltração deve ser feita diretamente pelo subcutâneo. 4.1.1. Trocar a agulha para de pavilhão verde/preto (intramuscular). Inserir a agulha no tecido subcutâneo diretamente por dentro das margens da ferida. a. Anestesiar a região subcutânea injetando o anestésico na medida em que se retira a agulha (injeção retrógrada); b. Aspirar com a seringa antes de injetar não é necessário, a menos que esteja em região ricamente vascularizada por vasos de maior calibre; c. Realizar a anestesia de toda a área da ferida sempre partindo de local já anestesiado; 4.2. Para feridas potencialmente contaminadas, com sinais inflamatórios, ou muito sujas (presença de corpos estranhos ou abscessos, por exemplo): trocar para a agulha de pavilhão marrom (subcutâneo) e realizar botão anestésico em um dos vértices da ferida (por fora da mesma e não mais por dentro): a. Inserir a agulha na pele a 90º; b. Aspirar com a seringa antes de injetar não é necessário, a menos que esteja em região ricamente vascularizada por vasos de maior calibre; injetar o anestésico. 4.2.1. Trocar para a agulha de pavilhão verde/preto (intramuscular) e introduzir a agulha a partir do botão, a aspiração antes da injeção só é necessária se em região ricamente vascularizada por vasos de maior calibre. Deve-se injetar o anestésico retrogradamente ao redor da ferida (por fora), evitando perfurar a região de possível contaminação, realizando bloqueio regional. Sempre partir do botão anestésico até completar toda a extensão da ferida ou atingir a dose máxima permitida para aquele anestésico. Figura 6.11 Infiltração diretamente pelo subcutâneo. Monitoria de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental I 5. Verificar com a pinça de dissecção traumática o efeito do anestésico: pinçar a região anestesiada e verificar se há dor. 6. Iniciar o procedimento (sutura se houver indicação, drenagem do abscesso, passagem do cateter etc.). 6.3 Síntese Conjunto de manobras destinadas a unir tecidos seccionados, restituindo-lhes sua continuidade anatômica e funcional. A síntese definitiva é realizada pelo processo biológico da cicatrização cujo resultado final dever ser a união firme entre ambas as extremidades aproximadas. A síntese pode ser executada através de agrafes, placas metálicas, grampos metálicos, clips, fitas adesivas, colas ou através da realização de suturas. Sutura é o ponto ou o conjunto de pontos aplicados no tecido com o objetivo de união, fixação e/ou sustentação destes, auxiliando o processo de cicatrização. É uma manobra fundamental para a aproximação de bordas de tecidos seccionados ou ressecados, sobretudo quando estas não possuem a aposição necessária. Tem como finalidade promover a hemostasia, aproximação, sustentação e estética. São úteis na tentativa de coibir hemorragias, quando não é possível identificar o vaso sangrante e quando se pretende reestabelecer a integridade anatômica e funcional dos tecidos. A sutura ideal busca promover o perfeito confrontamento anatômico aliado ao melhor aspecto funcional e estético possível. Obtém-se uma cicatrização mais harmoniosa ao se aproximar as bordas de tecidos quando estas são regulares, livre de infecção, tecido desvitalizado ou necrótico, espaço morto e quando a técnica de execução foi perfeita. Em geral, as suturas são indicadas para ferimentos limpos, sem infecção vigente ou fatores que possam levar a esta evolução desfavorável (sujidade, corpos estranhos, tecidos desvitalizados). As feridas de pele podem ser sintetizadas com suturas até 18 horas sem maiores repercussões (desde que respeitado a ausência de sinais de infecção). Este tempo é variável a depender do local. Em face, por exemplo, pode-se suturar um ferimento com até 24 horas e em casos específicos, até 48 – 72 horas (ausência de sinais de infecção, ferimento limpo, bordas facilmente aproximáveis). Figura 6.13 Bloqueio regional (por fora da ferida). Figura 6.12 Botão anestésico. Monitoria de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental I As suturas são, em geral, contraindicadas em ferimentos contaminados ou potencialmente contaminados, sangrantes ou muito superficiais. Também não devem ser realizadas como primeira escolha quando o resultado estético não será positivo e o ferimentoocorreu há mais de 18 horas. Deve-se atentar para pacientes com comorbidades que irão prejudicar a formação do tecido de granulação: doença arterial periférica, diabetes, feridas crônicas. Estes não devem ser suturados a depender do local da ferida (extremidades, por exemplo, já que a perfusão será menor, ou então, se esta já ocorreu há algum tempo (nestes casos, mais de 6 horas). 6.3.1 Posicionamento das Bordas • Confrontamento/aposição: Justaposição das bordas da ferida entre si, não deixando desníveis (perfeita integridade anatômica, funcional e estética). Sobreposição: Uma borda fica sobre a outra para aumentar a face de contato (herniações). • Eversão: Justaposição das paredes pela face interna (vasculares). A eversão das bordas de uma ferida cirúrgica aumenta a superfície cruenta de contato, aumentando a força da cicatriz com um resultado estético pior. • Inversão: Justaposição das paredes pela face externa (vísceras ocas). A inversão das bordas de uma ferida cirúrgica pode facilitar a deiscência da sutura. 6.3.2 Suturas Contínuas x Descontínuas A escolha da sutura descontínua ou contínua vai depender da necessidade do cirurgião durante a sutura do tecido. Neste momento alguns fatores podem ser analisados como quanto a necessidade de aproximação, sustentação, tensão, hemostasia e estética da cicatriz. Na sutura descontínua os fios são fixados separadamente, podendo variar a tensão individualmente de acordo com a necessidade. A ferida torna-se mais permeável, o que permite melhor drenagem de secreções e com menor quantidade de corpo estranho no interior da sutura. É menos isquemiante que as suturas contínuas e demanda um maior tempo de execução. Entretanto, o rompimento de um ponto não inviabiliza a sutura. Figuras 6.14 A e B: Kit de Sutura. Monitoria de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental I Na sutura contínua o fio é passado do início ao fim sem interrupção, deixando a técnica de mais rápida execução quando comparado com a descontínua. Esse tipo de sutura será melhor abordado em seu capítulo específico. 6.3.3 Preceitos Básicos de um Sutura A pinça de dissecção é selecionada de acordo com os tecidos a suturar: • Pinças delicadas e sem dentes para tecidos delicados e friáveis (vasos, nervos, vísceras); • Pinças com dentes para tecidos mais resistentes (aponeurose, tecidos fibrosos, pele). A agulha geralmente transfixa o lábio da ferida, enquanto a pinça auxiliar ou mesmo a mão sustenta a borda (geralmente evertendo-a). O porta-agulhas toma a agulha em sua porção média deixando-a assim já acomodada para o novo ponto. A extração manual da agulha é deselegante e fere o princípio do não tocar, além de configurar risco para acidentes pérfuro- cortantes. A agulha deve ser dividida em três partes iguais, assim como o porta-agulha. Ela deve ter a transição entre o terço médio para o proximal preso ao terço distal do instrumental. A angulação da mão realizando um movimento giratório ao introduzir a agulha com o porta- agulha é essencial para menor traumatismo dos tecidos e da própria agulha, o que propicia um melhor resultado. Para que os tecidos sejam aproximados corretamente, a agulha deve ser introduzida em mesma quantidade em ambos os lados da ferida, dessa forma, os planos e mantém na mesma altura evitando o fenômeno de superposição. Nas suturas de pele deve-se evitar que o nó interponha os lábios da ferida (evita-se que o nó da sutura fique no leito da ferida), pois dificulta a coaptação das bordas. O nó deve ser posicionado em uma das margens (preferencialmente a margem distal). O nó realizado com o porta-agulha nas suturas segue os mesmos preceitos dos nós manuais. Devem ser feitos no mínimo três: 1º - contenção; 2º - fixação e 3º - segurança. A secção do excesso dos fios para suturas abaixo da pele deve ser próxima aos nós (não deixar orelhas), exceto quando se usa fio de categute ou fio rígido, devendo-se deixar pontas de pelo menos 2 mm, para prevenir a soltura do nó. Para suturas em pele, procura-se deixar 1 cm de orelha. O excesso do fio deve ser cortado com tesoura Mayo, que será reta quando a sutura estiver sendo feita em superfície (pele) e curva quando a sutura for realizada em cavidade. 6.4 Suturas Descontínuas Trata-se de um procedimento estéril, portanto, deve-se calçar as luvas apropriadas. 6.4.1 Ponto Simples Padrão ouro - sutura mais comumente empregada. Importante determinar a distância entre o local de entrada e saída do fio e o espaço entre um ponto e outro. A distância entre pontos consecutivos deve ser proporcional à distância entre a borda da ferida e o ponto de penetração da agulha. A distância entre os quatros locais de penetração Monitoria de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental I do fio, em dois pontos consecutivos, deve formar um quadrado. Na maioria dos pontos na cirurgia geral essa distância é de aproximadamente 1 centímetro. Nas suturas estéticas os pontos serão mais próximos e menos profundos. Para qualquer ponto usado na pele a coaptação dos lábios da lesão deverá ser perfeita ou a má justaposição das bordas repercutirá em cicatrizes pouco estéticas. Passo-a-passo 1. Com a agulha devidamente fixada ao porta-agulha deve-se introduzi-la na borda distal da ferida no sentido distal-proximal (a borda deve ser pinçada com a pinça dente-de-rato para facilitar a visualização e passagem da agulha); 2. Após passar a borda distal, pega a agulha com o porta-agulha e a fixa novamente ao instrumental, procedendo para a borda proximal. 3. Deve-se observar a quantidade suficiente de fio para realizar o nó, assim, evita-se desperdício. 4. Para realização do nó com o porta-agulha deve-se: a. Enrolar o fio que contém o lado agulhado (atentando para não pegar na agulha e não se acidentar) duas vezes para frente no porta-agulha. b. Enrolar o fio que contém o lado agulhado uma vez para o lado oposto ao primeiro (no caso, para trás) c. Enrolar o fio que contém o lado agulhado mais uma vez para frente. d. Prender com o porta-agulha a extremidade mais curta do fio (extremidade não agulhada) e. Tracionar o lado agulhado do fio em direção ao lado oposto, mas mantendo o porta- agulha próximo ao ponto. 5. Cortar o excesso de fio com tesoura de Mayo (curva para cavidade, reta para fora desta) e proceder para o próximo ponto. 6.4.2 Ponto Simples Invertido ou Ponto de Halsted Tem as pontas para dentro, ficando o nó oculto dentro do tecido como no subcutâneo ou para o lado da mucosa, em órgãos ocos (esse ponto não deve ser retirado). Figura 6.15 Ponto Simples Monitoria de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental I Pontos dérmicos são relaxadores de tensão para fechamento da pele. São pontos de sustentação permanentes cuja finalidade é reduzir a tensão na linha de sutura. São pontos invertidos, de nó escamoteado, executados sobre a parte mais profunda da pele, usando-se agulhas delicadas e fio categute fino ou mesmo fios inabsorvíveis. Alguns profissionais não recomendam a sutura do subcutâneo. É dito que a contribuição em reduzir a fora tênsil da ferida como um todo é muito pequena e que a baixa capacidade de defesa desse tecido em meio à presença de corpo estranho pode constituir em uma facilitação potencial para infecção. Outros, afirmam reduzir os espaços mortos e a possibilidade de formação de coleções serohemáticas. Passo-a-passo 1. Com a agulha devidamente fixada ao porta-agulha deve-se introduzi-la na borda proximal da ferida no sentido distal-proximal (a borda deve ser pinçada com a pinça de dissecção para facilitar a visualização e passagem da agulha); 2. Após passar a borda proximal, pega a agulha com o porta-agulha e a fixa novamente ao instrumental, procedendo para a borda distal no sentido distal-proximal. 3. Deve-seobservar a quantidade suficiente de fio para realizar o nó, assim, evita-se desperdício. 4. Para realização do nó com o porta-agulha deve-se proceder da mesma forma que no anterior, lembrando que desta vez, o ponto deve ficar no interior e não para fora. 5. Cortar o excesso de fio com tesoura de Mayo (curva para cavidade, reta para fora desta) e proceder para o próximo ponto. 6.4.3 Ponto em U Horizontal Forma um quadrado perfeito onde as extremidades de sutura saem ou pelo mesmo lado ou pela mesma borda da ferida. Descreve um U deitado. Figura 6.16 Ponto Simples Invertido Monitoria de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental I Quando adequado, promove uma leve eversão das bordas, que aumenta a área de contato e, por conseguinte, aumenta excessivamente a cicatrização podendo torná-lo inestético. O mesmo pode ser utilizado para suturas com tensão, sendo os pontos colocados preferencialmente afastados da linha de incisão. A agulha deverá transfixar a aponeurose junto ao nó precedente e avançar com um passo de 1 a 1,5 cm. Recomenda-se ainda que as transfixações sejam feitas a distâncias variáveis das bordas para evitar os esgarçamentos através de uma linha de fraqueza da aponeurose. Os pontos em U são particularmente vantajosos na pele grossa como mãos e pés. Passo-a-passo 1. Com a agulha devidamente fixada ao porta-agulha deve-se introduzi-la na borda distal da ferida no sentido distal-proximal (a borda deve ser pinçada com a pinça de dissecção para facilitar a visualização e passagem da agulha), da mesma forma que um ponto simples; 2. Após passar a borda distal, pega a agulha com o porta-agulha e a fixa novamente ao instrumental, procedendo para a borda proximal no sentido distal-proximal, da mesma forma que o ponto simples. 3. Após passar a borda proximal, deve-se inverter a agulha de modo que agora o sentido da sutura será proximal-distal. 4. Terminar a sutura passando com a agulha invertida também na região distal, no sentido proximal-distal. 5. Deve-se observar a quantidade suficiente de fio para realizar o nó, assim, evita-se desperdício. 6. Para realização do nó com o porta-agulha deve-se proceder da mesma forma que no ponto simples, colocando o nó na borda distal (preferencialmente). 7. Cortar o excesso de fio com tesoura de Mayo (curva para cavidade, reta para fora desta) e proceder para o próximo ponto. Figura 6.17 Ponto em U Horizontal Invertido Monitoria de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental I 6.4.4 Ponto em U Vertical ou “Donatti” Usado na pele junto com o subcutâneo consta de duas transfixações, sendo uma transdérmica a 2 mm da borda e outra perfurante, incluindo a tela subcutânea de 7 a 10 mm da borda. Tem a vantagem de associar a supressão da tensão ao nível da sutura com a coaptação perfeita dos lábios da ferida. O ponto maior tem a finalidade de sustentação da pele e o ponto menor confronta as bordas e evita sua inversão. Tem uso amplo em cirurgia geral nas bordas das feridas que tendem a invaginar ou com tensão. Promove uma aposição completa e precisa das bordas, com leve eversão após a confecção dos nós. Quando os pontos não são retirados precocemente promove maior repercussão na pele. Passo-a-passo 1. Com a agulha devidamente fixada ao porta-agulha deve-se introduzi-la na borda distal da ferida, mais distal do que os outros tipos de ponto (o que torna o ponto mais profundo) no sentido distal-proximal (a borda deve ser pinçada com a pinça de dissecção para facilitar a visualização e passagem da agulha). 2. Deve-se então passar a agulha na borda proximal da ferida, mais proximal do que os outros tipos de ponto (o que torna o ponto mais profundo). 3. Após passar a borda mais proximal, pega a agulha com o porta-agulha e deve-se inverter a mesma, de modo que o sentido da sutura agora será proximal-distal. 4. Passar a agulha pela borda proximal, mais próxima da ferida no sentido proximal-distal. 5. Terminar o ponto passando a agulha pela borda menos distal no sentido proximal-distal. Figura 6.18 Ponto em U Vertical ou “Donatti” Monitoria de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental I 6. A ordem dos pontos ficou: Mais distal – Mais proximal – Menos proximal – Menos distal, ou então: “Longe, longe, perto, perto”. 7. Deve-se observar a quantidade suficiente de fio para realizar o nó, assim, evita-se desperdício. 8. Para realização do nó com o porta-agulha deve-se proceder da mesma forma que nos pontos anteriores, colocando o nó na borda distal (preferencialmente). 9. Cortar o excesso de fio com tesoura de Mayo (curva para cavidade, reta para fora desta) e proceder para o próximo ponto. 6.4.5 Ponto em “X” Externo Pode ser chamado também de ponto cruzado ou de reforço. É usado para aumentar a superfície de apoio na sutura para hemostasia ou aproximação. Usado em fechamento de paredes e suturas em aponeuroses, musculares, principalmente quando os músculos são seccionados transversalmente. São bastante utilizados em tecidos muito vascularizados como couro cabeludo, pois promove maior hemostasia. Também por ser um ponto muito hemostático, é utilizado para ligaduras em massa ou ligadura de vaso sangrante oculto. Passo-a-passo 1. Com a agulha devidamente fixada ao porta-agulha deve-se introduzi-la na borda distal da ferida, no sentido distal-proximal (a borda deve ser pinçada com a pinça de dissecção para facilitar a visualização e passagem da agulha), como se fosse um ponto simples. 2. Após passar a borda distal, pega a agulha com o porta-agulha e a fixa novamente ao instrumental, procedendo para a borda proximal no mesmo sentido. 3. Após passar a borda proximal, pega a agulha com o porta-agulha e sem cortar o fio, deve-se realizar outra passagem no sentido distal-proximal, como se outro ponto simples fosse ser realizado ao lado do primeiro. Figura 6.19 Ponto em “X” Externo Monitoria de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental I 4. Terminar o ponto de forma que se apresente como dois pontos simples paralelos “contínuos” no sentido proximal-distal. 5. Deve-se então proceder para o nó da mesma forma que os pontos anteriores, de modo que os fios ao se cruzarem para o nó, formem um “X”. 6. Deve-se observar a quantidade suficiente de fio para realizar o nó, assim, evita-se desperdício. 7. Cortar o excesso de fio com tesoura de Mayo (curva para cavidade, reta para fora desta) e proceder para o próximo ponto. 6.4.6 Ponto em “X” Interno Muito semelhante ao “X” externo, é realizado no plano da derme sem transpassar a epiderme, por isso, passa a ser denominado X Interno, servindo principalmente para sustentação de tecidos. Este ponto é interno, não devendo ser retirado. Passo-a-passo 1. Com a agulha devidamente fixada ao porta-agulha, deve-se introduzi-la na borda proximal da ferida, no sentido distal-proximal (isto é: sem inverter a agulha. A borda deve ser pinçada com a pinça de dissecção para facilitar a visualização e passagem da agulha), como se fosse um ponto simples invertido. 2. Após passar a borda proximal, pega a agulha com o porta-agulha e a fixa novamente ao instrumental, procedendo para a borda distal, lateralmente ao primeiro ponto. 3. Após passar a borda distal, lateral ao primeiro ponto, deve-se proceder no sentido distal- proximal para a borda proximal, paralela ao último ponto. 4. Terminar o ponto fazendo a última passada da agulha na borda distal, paralela ao primeiro ponto, no sentido proximal-distal, formando um “X”. 5. Deve-se então proceder para o nó da mesma forma que os pontos anteriores, de modo que os fios se cruzem para o nó mantendo a formação do “X”. Desta vez, o nó deve ficar no interior da ferida. 6. Deve-se observar a quantidade suficiente de fio para realizar o nó, assim, evita-sedesperdício. 7. Cortar o excesso de fio com tesoura de Mayo (curva para cavidade, reta para fora desta) e proceder para o próximo ponto. 6.5 Retirada dos Pontos A retirada das suturas segue o princípio básico: O ponto que estava do lado de fora durante todo o tempo de recuperação da ferida não pode entrar em contato com a ferida ao ser retirado (ou seja, o que está por fora não pode passar por dentro) para evitar contaminação. Para retirar a sutura, utiliza- se basicamente uma Tesoura de Spencer e uma pinça de dissecção Atraumática. Cada tipo de ferimento a depender de sua extensão, se está ou não livre de sinais inflamatórios e de contaminação, tipo de tecido, comorbidades do paciente etc apresentará tempos diferentes para Monitoria de Técnica Operatória e Cirurgia Experimental I retirada dos pontos. Em geral, alguns exemplos podem ser dados de quanto tempo deve-se esperar para retirar o ponto (considerando a ferida limpa): Rosto: 5 dias Couro cabeludo: 7-14 dias Tronco e MMSS: 7 dias MMII: 8-10 dias. Passo-a-passo 1. Com a pinça de dissecção atraumática deve-se folgar o ponto com cuidado para que este não se rompa. 2. Deve-se posicionar a Tesoura de Spencer bem em baixo do ponto, cortando sempre nas posições ímpares (1 e 3). Ou seja, no local em que a agulha passou primeiro e em terceiro lugar (considerando que nos pontos ensinados, a agulha passa no máximo 4 vezes por ponto). 3. No caso do ponto simples, basta cortar bem rente ao ponto e puxar com a pinça do outro lado. Referências 1. Schatz M. Allergic reactions to local anesthetics. UpToDate. 2015. [Acesso em 27 de Junho de 2015]. Disponível em: http://www.uptodate.com/contents/allergic-reactions-to-local- anesthetics?source=search_result&search=Allergic+reactions+to+local+anesthetics&selected Title=1~150 2. Armstrong DG; Meyr AJ. Basic principles of wound management. UpToDate. 2015. [Acesso em 27 de Junho de 2015]. Disponível em: http://www.uptodate.com/contents/basic- principles-of-wound- management?source=search_result&search=Basic+principles+of+wound+management&sele ctedTitle=1~150 3. Lemos D. Closure of skin wounds with sutures. UpToDate. 2015. [Capturado 27 de Junho de 2015]. Disponível em: http://www.uptodate.com/contents/closure-of-skin-wounds-with- sutures?source=search_result&search=Closure+of+skin+wounds+with+sutures&selectedTitl e=1~150 4. Hsu DC. Infiltration of local anesthetics. UpToDate. 2015. [Acesso em 27 de Junho de 2015]. Disponível em: http://www.uptodate.com/contents/infiltration-of-local- anesthetics?source=search_result&search=Infiltration+of+local+anesthetics&selectedTitle=1 ~150 5. Marques, RG. Técnica Operatória e Cirurgia Experimental. Guanabara Koogan; 2005. 6. Goffi, FS. Técnica Cirúrgica: bases anatômicas, fisiopatológicas e técnicas da cirurgia. 4ª edição. São Paulo: Atheneu; 2007. 7. Cirino, LMI. Manual de Técnica Cirúrgica para Graduação. São Paulo: Sarvier; 2006. 8. Massaia, IFDS; Pinheiro, KMK; Saraiva, MD; Dinis, VG; Marrochi, LCR; Oliveira, RB. Procedimentos do Internato à Residência Médica. São Paulo: Atheneu; 2012.
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