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Guilherme Rios – Módulo I – p6 TRANSTORNO BIPOLAR E DEPRESSIVO 1. ELUCIDAR O TRANSTORNO BIPOLAR (DEFINIÇÃO, EPIDEMIOLOGIA, FATOR DE RISCO, FISIOPATOLOGIA, QUADRO CLÍNICO, DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO): DEFINIÇÃO: → O transtorno bipolar (TB) é uma doença mental de elevado impacto no indivíduo, na família e na sociedade. → Caracteriza-se pela alternância de episódios de humor depressivo e maníaco (eufórico ou irritável) com períodos de humor relativamente inalterado (chamados de eutimia). OBS: Atualmente, tornou-se evidente que, além da sua característica cíclica, o TB também apresenta progressão ao longo do tempo em relação a apresentação clínica, resposta ao tratamento, neurobiologia e incapacidade funcional. → CLASSIFICAÇÃO (formas clássicas): ○ Transtorno Bipolar I (TB I): Corresponde às manifestações CLÁSSICAS da doença, com episódios de MANIA e de depressão, ou apenas de mania, sucedendo-se ao longo da vida do indivíduo. ○ Transtorno Bipolar II (TB II): Cursa com episódios de HIPOMANIA e depressão, com predomínio da última, em que os sintomas maníacos são mais brandos (um quadro clínico denominado hipomania). Muitas vezes são erroneamente tratados como depressão unipolar. EPIDEMIOLOGIA: → É considerada pela OMS como a 6ª causa de incapacidade em indivíduos na faixa etária entre 15 e 44 anos ao redor do mundo. → Cerca de 2,4% da população mundial apresenta TB ao longo da vida. → Apesar de menos diagnosticado, o TB II é mais prevalente que o TB I. → Sua prevalência tem aumentado ao longo dos anos e os possíveis motivos são: ○ Mudanças nos critérios diagnósticos adotados. ○ Melhor reconhecimento da doença. OBJETIVOS: 1. Elucidar o Transtorno bipolar (definição, epidemiologia, fator de risco, fisiopatologia, quadro clínico, diagnóstico e tratamento). 2. Compreender o transtorno depressivo (definição, epidemiologia, fator de risco, fisiopatologia, quadro clínico, diagnóstico e tratamento) e suicídio. 3. Entender a entrevista psiquiátrica e o exame mental. Guilherme Rios – Módulo I – p6 ○ Aumento real da prevalência em razão da exposição a diferentes fatores ambientais por mecanismos epigenéticos (p. ex., dieta, estresse, privação de sono). → Segundo pesquisas, há maior risco de desenvolver a doença indivíduos com história familiar de TB, ou seja, apresenta alta herdabilidade e grande influência genética. → Apresenta distribuição igual entre os sexos. → Estudos têm evidenciado diferenças quanto à epidemiologia, manifestações e comorbidades entre os gêneros. → Costuma ter início por volta dos 20 anos (mais precoce que a depressão). → Pode-se notar uma incidência mais alta que a média em grupos com condição socioeconômica mais elevada. → A prevalência de TB não difere significativamente entre as raças. → Cerca de 25 a 50% de indivíduos com TB tentam suicídio pelo menos uma vez em suas vidas e 8 a 19% cometem o suicídio. OBS: É a doença, dentro da psiquiatria, com o maior número de suicídio (sanar). FATOR DE RISCO: → Hereditariedade ○ Parentes de primeiro grau apresentam risco de 5 a 10% de apresentar a doença ao longo da vida, bem como para outras condições como esquizofrenia e depressão unipolar. ETIOLOGIA / FISIOPATOLOGIA: → Alta influência genética por herança poligênica. → Etiologia multifatorial. → Dentre os neurotransmissores envolvidos pode-se mencionar o GABA, Glutamato, Monoaminas (nora e dopa). Guilherme Rios – Módulo I – p6 → Está relacionado a proteínas intracelulares (começa com a proteína G e finaliza com a criação da PKA). → Ao contrário do que ocorre na depressão, em que a noradrenalina está baixa, no TB, devido à mania, está alta. QUADRO CLÍNICO: → Existem, como o nome da doença sugere, dois polos de sintomas. Entretanto, por não serem opostos, tais polos podem coexistir em diferentes combinações. Essas situações são chamadas de estados mistos. → MANIA: ○ A principal característica do humor, na mania, é a EUFORIA (alegria patológica), a expansão e a elação com grandiosidade ou engrandecimento do eu, muitas vezes acompanhado de taquipsiquismo (agitação psicomotora, logorreia, taquilalia e pensamento acelerado ou com fuga de ideias). • Tal humor pode alternar-se ou evoluir para IRRITABILIDADE ou AGRESSIVIDADE, normalmente sem objetivo preciso. ○ A ATENÇÃO geralmente está prejudicada, com desbalanço entre a atenção espontânea (aumentada) e a atenção voluntária (diminuída). ○ O COMPORTAMENTO mostra-se alterado de forma prejudicial (o paciente passa a adotar comportamentos de risco, como hipersexualidade, jogos em excesso, desinibição sexual). • Tais comportamentos divergem dos adotados pelo indivíduo quando não está em pleno episódio maníaco. ○ A IMPULSIVIDADE pode estar presente e são frequentes compras e gastos em excesso. ○ SINTOMAS SOMÁTICOS: • Além do humor, esses episódios também afetam ou podem afetar o sono, o nível de energia, a atividade psicomotora, o apetite e o processamento das informações sobre si mesmo e o ambiente. • O paciente refere sensação de maior energia e disposição, menor necessidade de sono sem prejuízo funcional no dia seguinte ou mesmo marcada agitação psicomotora. ○ O paciente em mania deve ter, pelo menos, 7 DIAS DE SINTOMAS, ou um período menor, caso necessite de internação. ○ Ao diagnóstico, o paciente deve ter um humor elevado ou disfórico (irritado), associado a: (3 ou 4) • Grandiosidade ou autoestima elevada. • Redução da necessidade de sono. • Fala acelerada (loquaz) ou pressão para falar. • Pensamento acelerado ou fuga de ideias. • Distraibilidade. • Ausência de atividade ou agitação psicomotora. • Envolvimento em atividades de risco. OBS: Adiciona-se ainda os episódios prejudicarem a vida do paciente e ser afastado o uso de substâncias como causadores do episódio de mania. Guilherme Rios – Módulo I – p6 → HIPOMANIA: ○ Consiste em uma síndrome caracterizada pela presença de sintomas maníacos de intensidade mais leve, à exceção dos sintomas psicóticos (p. ex., delírios e alucinações) que estão AUSENTES. ○ Não causa o impacto funcional tão expressivo como na mania. ○ Tempo mínimo para o diagnóstico é de 4 dias. ○ Por vezes, acaba compreendido pelo indivíduo como um período mesmo benéfico, de maior energia. Portanto, por vezes não recebe atenção médica. → DEPRESSÃO: ○ Os episódios de depressão no TB são muito semelhantes/ indistinguíveis aos encontrados no transtorno depressivo maior (também chamado de depressão unipolar), sendo, muitas vezes, de difícil distinção. ○ Na maioria dos casos, portadores de TB experimentam vários episódios de depressão antes do desenvolvimento da mania/hipomania e, para a maioria deles, há predominância de episódios depressivos ao longo do curso longitudinal da doença. ○ Os sintomas depressivos tendem a permanecer em intensidades mais leves (subsindrômicos) nas fases de remissão da doença e, mesmo assim, podem comprometer a qualidade de vida (QV), prejudicar a funcionalidade e aumentar o risco de recaídas e recorrências dos episódios de manias/hipomanias e depressões. → ASPECTOS CLÍNICOS DA PSICOPATOLOGIA DO TRANSTORNO BIPOLAR: ○ CICLAGEM RÁPIDA: • Consiste em uma variante no curso da doença com alto impacto negativo para o indivíduo, que promove menores taxas de eficiência dos tratamentos. • É caracterizado pela ocorrência de 4 ou mais fases da doença: Mania, hipomania ou depressão, em um período de 12 meses, podendo ser descrita ao longo da vida ou no último ano. • Entre os episódios de humor alterado devem existir períodos de remissão dos sintomas por pelo menos 2 meses ou deve haver troca imediata para episódio de polaridade oposta, como um episódio depressivo logo seguido por hipomania. ○ IDEAÇÃO SUICIDA: • Bastante frequente em pacientes portadores de TB. • Nesse sentido,é obrigatória a avaliação do risco de suicídio em portadores de TB e deve ser abordada de maneira preventiva e precoce. • Os sinais de alerta incluem ameaça de se machucarem, procura por meios de se matar (p. ex., medicamentos ou armas) e desenvolver falas ou escrever sobre morte. • Os fatores de risco para o suicídio no TB incluem: Início precoce da doença, histórico de comportamento suicida prévio, histórico de atos suicidas na família, comorbidade com personalidade borderline, comorbidade com transtornos por uso abusivo de substâncias tanto lícitas como ilícitas e desesperança. ○ COMORBIDADES PSIQUIÁTRICAS E NÃO PSIQUIÁTRICAS: Guilherme Rios – Módulo I – p6 • O TB está associado a comorbidades (psiquiátricas ou não) tanto por possíveis bases fisiopatológicas quanto por hábitos e estilos de vida (p.ex., sedentarismo, dieta não balanceada, obesidade, uso de substâncias como álcool, tabaco e cocaína). • As principais doenças são as metabólicas e cardiovasculares, bem como distúrbios respiratórios (asma, doença pulmonar obstrutiva crônica) e neurológicos (enxaqueca, esclerose múltipla e epilepsia). • Evidências sugerem que, além das doenças médicas gerais, a maioria dos indivíduos com TB também preencha critérios para algum outro transtorno do eixo I do Manual de Diagnóstico e Estatística de Transtornos Mentais (DSM). ○ CURSO LONGITUDINAL DO TRANSTORNO BIPOLAR: • O prejuízo funcional que acompanha a progressão dessa doença tem sido negligenciado. • A cada episódio o paciente vai piorando cognição e funcionalidade (devido à neurotoxicidade dos NT). • Além disso, os tratamentos visam a estabilização dos episódios de humor e a prevenção de recaídas, não existindo abordagens terapêuticas com o intuito de prevenir o surgimento desse transtorno. • De maneira geral, é uma doença de pior prognóstico que a depressão maior. • SEQUÊNCIA PREVISÍVEL DE PROGRESSÃO DO TB: ♦ A maioria das crianças pré-mórbidas desenvolvia transtorno do sono e sintomas de ansiedade que evoluíam para sintomas depressivos subsindrômicos e sensibilidade ao estresse aumentada durante a puberdade. Posteriormente, no período da adolescência, esses indivíduos desenvolviam episódios depressivos maiores e, cerca de 3 anos mais tarde, a conversão para TB ocorria com o aparecimento de episódios maníacos e hipomaníacos. ○ ESTADIAMENTO CLÍNICO DE PACIENTES COM TB: • Fase latente: Indivíduos que apresentam sintomas de humor e ansiedade subsindrômicos e história familiar de TB. • Estágio I: Pacientes com TB que apresentam períodos bem estabelecidos de eutimia e ausência de morbidade psiquiátrica entre os episódios. • Estágio II: Pacientes que apresentam sintomas durante os períodos entre os episódios que são principalmente relacionados com comorbidades. • Estágio III: Pacientes que apresentam marcado prejuízo do funcionamento e da cognição. • Estágio IV: Pacientes que são incapazes de viver de maneira autônoma em virtude do comprometimento do funcionamento. OBS: O primeiro passo para as mudanças de paradigma nas estratégias preventivas e terapêuticas que possam reverter o curso longitudinal consiste em caracterizar os estágios prodrômicos e os estágios funcionais dos pacientes com TB. OBS: Vale ressaltar que, o curso do TB, após o seu diagnóstico, é extremamente variável. DIAGNÓSTICO: Guilherme Rios – Módulo I – p6 → O diagnóstico é obtido através da entrevista psiquiátrica do exame do estado mental, podendo ser realizados em uma ou mais ocasiões. → O paciente será o protagonista do atendimento, entretanto, caso se faça necessário, informantes podem ser entrevistados (p.ex., familiares, amigos ou colegas), uma vez que alguns pacientes perdem a crítica. → Devido à flutuação na psicopatologia, é comum que seja necessário acompanhar o paciente por um período maior, a fim de confirmar ou descartar o diagnóstico. O critério evolutivo é fundamental. → É importante solicitar exames a fim de excluir outras causas, especialmente nos episódios com sintomas psicóticos. → Avaliar a presença de mania ou hipomania em um paciente com episódios depressivos. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL: → Os diagnósticos diferenciais para os episódios depressivos são os mesmos que os próprios de transtornos depressivos unipolares. → Extensão mais grave da depressão maior. TRATAMENTO: → Os pilares do tratamento são: ○ Remissão sintomatológica. Guilherme Rios – Módulo I – p6 ○ Prevenção de recaídas (evitar a piora do episódio vigente). ○ Prevenção de recorrências (aparecimento de novos episódios). → Deve-se focar, também, na redução dos déficits cognitivos, o que culminara em uma boa recuperação funcional. → A diminuição dos impactos sociais e pessoais é essencial a fim de atingir melhora na QV. → TERAPIAS BIOLÓGICAS: ○ FARMACOLÓGICAS: • ESTABILIZADOR DE HUMOR (HE): Carbonato de lítio*, antipsicóticos atípicos (AA) e alguns anticonvulsivantes (p. ex., ácido valpróico e lamotrigina). A escolha dependerá da apresentação clínica e resposta prévia do paciente, se houver. • Os AD podem ser utilizados, porém apenas em combinação com EH ou AA nos episódios agudos de depressão, assim como em alguns casos na fase de manutenção, principalmente naqueles pacientes em que há predomínio da polaridade negativa, nos quais episódios de depressão representam pelo menos 3/4 dos episódios totais apresentados pelos pacientes, com a cautela de monitorar o risco de virada para mania/hipomania. ○ NÃO FARMACOLÓGICAS: • Terapias, mindfulness, melhora do sono e da alimentação, atividades físicas e etc. • Eletroconvulsoterapia (ECT). • Estimulação magnética transcraniana (EMT). • Estimulação vagal. → TRATAMENTO DA MANIA/HIPOMANIA: ○ Apesar de iniciar a conduta com medidas não coercitivas, estabelecendo uma relação de confiança e tranquilização, o profissional deve-se atentar quanto ao risco de comportamento violento. ○ No primeiro momento, o profissional deve avaliar a capacidade do paciente em colaborar com o tratamento, o grau de crítica e a necessidade de internação. ○ O manejo deve seguir princípios gerais: 1. Intervenção comportamental/ambiental. 2. Definição do local de tratamento: Emergência, ambulatório ou internação. 3. Descontinuação dos AD se estiver em uso. 4. Investigação de desencadeadores/perpetuadores do episódio (p. ex., cafeína, álcool, drogas ilícitas, corticosteroides e doenças clínicas, como o hipertireoidismo). ○ No mesmo momento ou, a depender do paciente, após a contenção do mesmo, inicia o tratamento farmacológico. • Os grupos de medicações mais indicadas nas fases da mania/hipomania são os AA (praticamente todos podem ser utilizados) e os EH (p. ex., LÍTIO, DIVALTROATO DE SÓDIO, carbamazepina e oxcarbamazepina) que, por sua vez, podem ser utilizados em monoterapia ou em combinação entre eles, a depender da gravidade do quadro. Guilherme Rios – Módulo I – p6 OBS: A associação com BZD na menor dose possível pode ser utilizado quando a tranquilização for prioridade. Além disso, o uso do BZD evita dosagem excessiva de antipsicóticos, reduzindo o risco de efeitos colaterais. → TRATAMENTO DA DEPRESSÃO BIPOLAR: ○ FASE AGUDA: • As medicações para o tratamento da depressão bipolar I e II são poucas e incluem os AD e os AGONISTAS DOPAMINÉRGICOS, entretanto, esses fármacos contribuem para o risco de surgimento de sintomas hipomaníacos/maníacos. OBS: Se o clínico optar pelo uso de AD, o paciente deve ser monitorado de perto. Se houver suspeita de sintomas de mania, os AD devem ser descontinuados. • Em casos de pacientes que não fazem uso de medicação e apresentam um episódio agudo de depressão bipolar, é indicado o LÍTIO (monoterapia) como 1ª escolha, pois tem ação profilática e não induz elevação do humor. Se não surtir efeito, troca. • Também são indicados por alguns guidelinesAA, divalproato, lamotrigina e etc. Guilherme Rios – Módulo I – p6 ○ TRATAMENTO DE MANUTENÇÃO: • A fase de continuação começa imediatamente após a remissão dos sintomas agudos. • O principal objetivo do tratamento nessa fase é manter a estabilidade do humor e evitar a recaída. • Nesse período transitório, os sintomas mais intensos já cederam, mas ajustes terapêuticos ainda podem ser necessários para controle de algum sintoma persistente, como alteração do ciclo de sono-vigília ou também para controle de efeitos colaterais. → INTERVENÇÕES PSICOSSOCIAIS (PSICOTERAPIA): ○ Podem ser utilizadas em combinação com as farmacoterapias e em qualquer fase do tratamento, entretanto, apresentam melhores resultados em pacientes no início do curso da doença. ○ Possuem fatores a serem avaliados: • GENÉTICA: Observar se há história na família e qual é a evolução. • NEUROBIOLOGIA: Pequenas mudanças na neuroquímica cerebral podem favorecer quadro agudo de mania, depressão, ciclagem rápida e risco de suicídio. • ESTILO DE VIDA: Estressores da vida cotidiana podem desencadear ou agravar as oscilações de humor no TB. Podem ser aconselhados mudanças de comportamento. • SAZONALIDADE: Variações em certos períodos (mania mais comum na primavera e depressão, no inverno). OBS: É fundamental um canal de comunicação entre psicoterapeuta e o psiquiatra para benefício do paciente. ○ A PSICOEDUCAÇÃO ajuda o paciente a reconhecer e a controlar as flutuações do humor, e a reconhecer os sinais precoces de descompensação da doença (sintomas emergentes), diminuindo a necessidade de medicamentos e hospitalização, e auxiliando no aumento do nível de funcionalidade e adesão à medicação. ○ POSSÍVEIS ABORDAGENS: Terapia cognitivo-comportamental (TCC), a terapia de ritmo interpessoal e social (TRIS), a análise do comportamento, as psicoterapias breves, atenção plena (mindfulness), psicoeducação em grupo, a terapia com foco na família (uma abordagem centrada nos familiares e projetada para ajudar os cuidadores a melhorar as habilidades de gerenciamento da doença e seu próprio autocuidado) e etc. Guilherme Rios – Módulo I – p6 2. COMPREENDER O TRANSTORNO DEPRESSIVO (DEFINIÇÃO, EPIDEMIOLOGIA, FATOR DE RISCO, FISIOPATOLOGIA, QUADRO CLÍNICO, DIAGNÓSTICO E TRATAMENTO) E SUICÍDIO: DEFINIÇÃO: → O termo “depressão” significa “redução do funcionamento” e é usado em várias disciplinas médicas. No entanto, hoje se tornou um termo mais comumente associado à depressão mental. → Esse transtorno é considerado pela OMS como o “mal do século”. → A depressão é um transtorno de humor comum, caracterizado por períodos prolongados de tristeza excessiva, que incapacita o indivíduo e prejudica seu funcionamento social e ocupacional. → Além dos sintomas relacionados ao humor, o indivíduo pode apresentar distúrbios cognitivos, neurovegetativos ou somáticos. EPIDEMIOLOGIA: → A depressão é o transtorno psiquiátrico mais comum na população geral, apesar disso, ainda há muita subnotificação. OBS: Muitos dos que são diagnosticados não recebem ou mesmo não seguem o tratamento adequado. OBS: Essa subnotificação também resulta da dificuldade do paciente em falar sobre seus sintomas depressivos. Isso se deve a fatores como a crença de que a depressão não é uma doença “real”, o medo de estigmatização, a preocupação com a quebra de sigilo e o receio em se tornar “dependente” de antidepressivos, entre outros. → A depressão unipolar é a principal causa de anos vividos com incapacidade. → Apresenta elevada recorrência (40% em 2 anos e 75% após dois episódios). → Transtorno psiquiátrico mais associado ao suicídio. (?) → Apresenta importante morbimortalidade (especialmente associado ao uso abusivo de substâncias) e impacto econômico associado (acomete jovens em idade produtiva). → A depressão é altamente prevalente ao redor do mundo e parece estar aumentando com o passar do tempo. ○ O Brasil tem uma prevalência de 12,6%. ○ A prevalência em doentes crônicos pode chegar a 25%. → Quanto à IDADE: ○ Aproximadamente 50% dos quadros surgem entre os 20-50 anos (mais tardio que o TB). ○ A depressão pode ocorrer em qualquer idade. ○ Algumas populações de idosos (em especial os que apresentam doenças agudas e/ou crônicas) são mais suscetíveis. ○ O aumento da incidência de DM em pessoas mais jovens (≤ 20 anos) pode estar associado ao uso abusivo de álcool e sustâncias psicoativas. → Quanto ao ESTADO CIVIL: Guilherme Rios – Módulo I – p6 ○ Pessoas divorciadas ou sem relacionamentos interpessoais de caráter íntimo apresentam maior propensão para DM em relação às que possuem relacionamentos íntimos duradouros. → Quanto aos FATORES SOCIOECONÔMICOS e CULTURAIS: ○ A depressão ocorre mais em áreas rurais do que em áreas urbanas. ○ Não existe clara correlação entre a condição socioeconômica e a DM. → Quanto ao SEXO: ○ As MULHERES são mais propensas do que aos homens a desenvolver DM. ○ As justificativas são acerca de fatores estressores psicossociais distintos entre os sexos, efeitos do parto e etiologia hormonal. OBS: Como exceção, nas crianças pré-púberes, os meninos têm maiores taxas de depressão. FATOR DE RISCO: → Sexo feminino. → Fatores genéticos. → Familiares de primeiro grau. → Relações interpessoais conflituosas. → Área rural. → Uso de álcool e substâncias psicoativas. ETIOLOGIA / FISIOPATOLOGIA: → Não existe uma teoria única que explique a depressão. ○ Neurotransmissores; Teorias inflamatórias e citocinas; Teorias neuroendócrinas (tireoide ou adrenal); Teorias genéticas e epigenéticas; Mecanismos intraneuronais; Estressores sociais e pessoais; Teoria de formação de personalidade e educação; Influência dos pais; Fatores ambientais e etc. → Ainda não é bem esclarecida, mas é provável que resulte da interação de fatores biológicos, psicológicos e sociais. → Os estressores psicossociais podem atuar tanto como precipitantes quanto como fatores de perpetuadores do transtorno. → FATORES GENÉTICOS: ○ Não está relacionada a perda ou ganho de função de um gene, mas sim de pequenos e múltiplos efeitos genéticos. ○ Um estudo identificou relevante evidência de ligação ao locus para a proteína ligadora do elemento de resposta ao monofosfato de adenosina (AMP) cíclico (CREB1) no cromossomo 2 ao surgimento de DM. ○ Também é sugerida a relação entre eventos adversos da vida com o gene transportador de serotonina culminando com o aumento do risco para desenvolver depressão. Guilherme Rios – Módulo I – p6 → FATORES BIOLÓGICOS: ○ As AMINAS BIOGÊNICAS, em especial a serotonina e a adrenalina, quando em baixas quantidades, estão associadas ao surgimento da depressão. ○ A importância do sistema serotoninérgico já é evidente pelo importante efeito que os inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRS) demonstram no tratamento da depressão. • Quando o TRIPTOFANO, aminoácido precursor da serotonina, é esgotado rapidamente, nota-se recaída grave de pacientes previamente em remissão pelo tratamento com ISRS. OBS: Concentrações baixas de triptofano já foram identificados em pacientes com impulsos suicidas. ○ As CATECOLAMINAS (dopamina e norepinefrina) também têm relação importante no desenvolvimento da depressão. ○ A redução da dopamina também está associada ao surgimento da depressão. ○ Foram encontrados níveis reduzidos de glutamina e ácido gama-aminobutírico (GABA) no córtex pré-frontal de pacientes depressivos não medicados. Os receptores GABA sofrem aumento quando se administram antidepressivos. ○ RELAÇÃO ENTRE DEPRESSÃO E DOENÇAS BIOLÓGICAS: • Em pacientes deprimidos, supõe-se que a superprodução de hormônio liberador de corticotrofina (CRH) cause intensa atividade no eixo hipotálamo-hipófise-suprarrenal (HHS). ♦ Tal fato demonstra uma ligação entredepressão e o surgimento estresse crônico, uma vez que cerca de 40 a 60% dos internados deprimidos apresentam-se com maior atividade do eixo HHS. • A depressão cursa comumente com insônia inicial e sono insatisfatório. • As alterações no ritmo circadiano também se associam à depressão. Os distúrbios no ritmo circadiano alteram a temperatura corporal, a pressão sanguínea, a norepinefrina, o hormônio tireoestimulante (TSH) e a melatonina. → FATORES PSICOSSOCIAIS: ○ O convívio familiar conflituoso pode tanto gerar quanto perpetuar a depressão. ○ Isolamento e críticas de amigos e vizinhos também são fatores contribuintes. ○ Eventos estressantes durante a vida têm mostrado forte associação com o aumento do risco de desenvolver transtorno depressivo. ○ A psicologia cognitiva tem apontado para a relação entre pessoas vulneráveis à depressão e padrões negativos de pensamento (pensamentos negativos próprios, de mundo e de futuro), ocorrendo significativa piora das distorções cognitivas em estados depressivos. CLASSIFICAÇÃO E SUBTIPOS DE DEPRESSÃO: → As classificações a seguir foram definidas pelo DSM-5. → DEPRESSÃO MAIOR UNIPOLAR (transtorno depressivo maior) Guilherme Rios – Módulo I – p6 ○ Caracteriza-se por história de um ou mais episódios depressivos maiores e SEM história de mania ou hipomania. ○ A DM não é resultado direto de uma substância ou condição médica geral. ○ Os sintomas causam transtorno significativo ou comprometimento psicossocial. ○ SUBTIPOS DE EPISÓDIOS DEPRESSIVOS: (transtorno depressivo maior) • DOR ANGUSTIANTE: (2 ou mais dos seguintes sintomas durante maior parte do episódio) ♦ Tensão. ♦ Inquietude. ♦ Concentração comprometida devido à preocupação. ♦ Temor de que algo horrível possa acontecer. ♦ Medo de perder o autocontrole. • CARACTERÍSTICAS ATÍPICAS: (3 ou + dos seguintes durante os episódios depressivos) ♦ Reatividade aos estímulos prazerosos (ou seja, sente-se melhor em resposta a eventos positivos). ♦ Aumento do apetite ou ganho de peso. ♦ Hipersonia (p. ex., dormir, pelo menos, 10 horas por dia ou, pelo menos, 2 horas mais do que o habitual quando não deprimido). ♦ Sensação de membros pesados. ♦ Padrão de longa data de sensibilidade de rejeição interpessoal (ou seja, sentir profunda ansiedade, humilhação ou raiva com a menor rejeição de outros), que não se limita aos episódios de humor e causa conflitos sociais ou ocupacionais. • CATATONIA: ♦ As características catatônicas são distúrbios psicomotores proeminentes (aumento ou diminuição da atividade), que ocorrem durante a maior parte do episódio depressivo. • RECURSOS MELANCÓLICOS: (ao menos 4 dos seguintes durante o episódio depressivo) ♦ Perda de prazer na maioria das atividades. ♦ Estágios não reativos geralmente prazerosos (ou seja, não se sente melhor em resposta a eventos positivos). ♦ Humor deprimido marcado por desespero profundo, desespero ou melancolia. ♦ Despertar no início da manhã (p. ex., 2 horas antes da hora normal de despertar). ♦ Retardo ou agitação psicomotora. Guilherme Rios – Módulo I – p6 ♦ Anorexia ou perda de peso. ♦ Culpa excessiva. • CARACTERÍSTICAS MISTAS: ♦ A depressão maior unipolar pode ser acompanhada por sintomas subliminares (não cumprem critérios completos) de hipomania ou mania e é chamada de depressão maior com características mistas. (todos os critérios para DM +, pelo menos, 3 dos seguintes) ♦ Humor elevado ou expansivo. ♦ Autoestima inflamada ou grandiosidade. ♦ Mais falante do que o habitual ou discurso pressionado (maior eloquência, acelerada e difícil de interromper; o paciente pode continuar falando, mesmo que ninguém esteja ouvindo). ♦ Voo de ideias (mudanças abruptas de um tópico para outro, com base em associações compreensíveis) ou pensamentos acelerados. ♦ Aumento de energia ou atividade direcionada a objetivos. ♦ Diminuição da necessidade de dormir. Dormir menos do que o habitual e ainda sentir-se descansado e enérgico. A diminuição da necessidade de sono difere da insônia, que é marcada por dificuldade de adormecer ou se manter dormindo e má qualidade do sono. ♦ Envolvimento excessivo em atividades prazerosas que têm alto potencial para consequências dolorosas (p. ex., excesso de compras ou indiscrições sexuais). • DEPRESSÃO PERIPARTO: ♦ Consiste no aparecimento de episódios de humor deprimido durante a gravidez ou nas 4 semanas após o parto. • CARACTERÍSTICA PSICÓTICA: ♦ Consiste nos delírios (crenças falsas, fixas) e alucinações (percepções falsas sensoriais), que podem ocorrer a qualquer momento durante um episódio depressivo. • PADRÃO SAZONAL: ♦ Refere-se a uma relação temporal regular entre o início de episódios depressivos maiores e uma determinada época do ano, nos últimos 2 anos. Guilherme Rios – Módulo I – p6 → TRANSTORNO DEPRESSIVO PERSISTENTE (DISTIMIA): ○ O DSM-5 consolidou o transtorno distímico e a depressão maior crônica no termo transtorno depressivo persistente. ○ É um quadro depressivo leve e crônico. ○ Consiste em 3 ou mais dos seguintes sintomas durante, pelo menos, 2 anos consecutivos (pelo menos um sintoma deve ser um humor deprimido): • Humor deprimido na maior parte do dia, na maioria dos dias (o período de eutimia não pode passar de 2 meses). • Diminuição ou aumento do apetite. • Insônia ou hipersonia. • Baixa energia ou fadiga. • Baixa autoestima. • Concentração ou tomada de decisão comprometidas. • Falta de esperança. → TRANSTORNO DISRUPTIVO DA DESREGULAÇÃO DO HUMOR: ○ Sua apresentação clínica deve ser cuidadosamente distinguida das apresentações de outras condições relacionadas, em particular o transtorno bipolar na infância. ○ A característica central do transtorno disruptivo da desregulação do humor é a irritabilidade crônica grave. ○ Essa irritabilidade grave apresenta duas manifestações clínicas proeminentes, sendo a primeira as frequentes explosões de raiva (essas explosões tipicamente ocorrem em resposta à frustração e podem ser verbais ou comportamentais). A segunda manifestação de irritabilidade grave consiste em humor persistentemente irritável ou zangado que está presente entre as explosões de raiva. → TRANSTORNO DISFÓRICO PRÉ-MENSTRUAL: (tensão pré-menstrual patológica) ○ Consiste em sintomas emocionais e comportamentais que ocorrem repetidamente durante a semana anterior ao início da menstruação e remissão com o início da menstruação ou alguns dias depois, interferindo em algum aspecto da vida da paciente. ○ A paciente deve ter, ao menos 5 dos 11 critérios. → TRANSTORNO DEPRESSIVO INDUZIDO POR SUBSTÂNCIA/MEDICAÇÃO: ○ Se caracteriza por um humor persistentemente deprimido ou irritado, ou interesse ou prazer diminuídos na maioria das atividades que ocorre durante ou logo após o uso de substâncias para fins recreativos ou usando medicamentos prescritos (p. ex., após o intenso uso de cocaína). → TRANSTORNO DEPRESSIVO DEVIDO A OUTRA CONDIÇÃO MÉDICA: ○ Consiste em um transtorno de humor que se caracteriza por humor persistentemente deprimido ou irritável, ou interesse ou prazer diminuído na maioria das atividades causado por outra condição médica (p. ex., insuficiência suprarrenal, doença de Huntington, hipercortisolismo, hipotireoidismo, mononucleose, Guilherme Rios – Módulo I – p6 esclerose múltipla, apneia obstrutiva do sono, doença de Parkinson, AVE, LES, câncer de pâncreas, lesão cerebral traumática ou insuficiência de vitamina B12) . ○ O início do transtorno de humor geralmente ocorre durante o primeiro mês do início da outra condição médica. → OUTRO TRANSTORNO DEPRESSIVO ESPECIFICADO: ○ Aplica-se a pacientes com sintomas depressivos que causam angústia significativa ou prejudicam o funcionamento psicossocial, mas não atendem aos critérios completos para um transtorno depressivo específico.→ DEPRESSÃO MENOR: ○ Consistem em humor deprimido, além de um a três outros sintomas de depressão maior. ○ Duram, no mínimo, 2 semanas e causam comprometimento clinicamente significativo ou sofrimento. → TRANSTORNO DEPRESSIVO NÃO ESPECIFICADO: ○ Aplica-se a pacientes com sintomas depressivos que causam angústia significativa ou prejudicam o funcionamento psicossocial, mas não atendem aos critérios completos para um transtorno depressivo específico. ○ Este diagnóstico é usado quando os médicos decidem não especificar o motivo pelo qual a síndrome de apresentação não atende aos critérios completos para um transtorno depressivo específico. ○ Pode incluir situações em que não há informações suficientes para fazer um diagnóstico mais específico (p. ex., no setor de emergência). QUADRO CLÍNICO: → Existe, na depressão, dois sintomas cardinais que devem – ao menos um – estar presente. São eles a TRISTEZA ou a ANEDONIA (falta de prazer nas coisas da vida). → O transtorno depressivo maior (TDM) é marcado por um ou mais quadros depressivos sem episódios de mania ou hipomania prévios. → As manifestações clínicas são heterogêneas, variando desde a sintomatologia, até a etiologia, a gravidade, o subtipo e a recorrência. → Durante um episódio depressivo, o paciente relata o seu humor como deprimido, com desesperança, “vazio”, inutilidade, ansiedade ou até queixas somáticas (p. ex., idosos), irritabilidade (p. ex., crianças e adolescentes). → O paciente pode se queixar de fadiga, mesmo sem realizar esforço. → Os distúrbios psicomotores (agitação ou retardo psicomotor) são bem menos comuns, mas representam maior gravidade do quadro, assim como culpa delirante. ○ As alterações de psicomotricidade podem ser de lentificação, catatonia, agitação ou inquietação. → A perda do interesse ou prazer quase sempre está presente, em grau variado (especialmente por coisas que gostavam de fazer antes). Guilherme Rios – Módulo I – p6 → O apetite pode apresentar-se aumentado ou diminuído, acompanhado em casos mais graves com alterações de peso significativas. → Alterações de sono (insônia ou hipersonia). → Alterações de libido e sexuais. → Sintomas álgicos. → Alterações cognitivas (p. ex., redução da capacidade cognitiva) e de concentração (p. ex., desatenção) são frequentes. → Distorção de realidade (foco nas coisas tristes) e pensamentos repetitivos/ruminativos. → Sintomas ansiosos podem estar presentes. → SUICÍDIO: ○ A depressão é o transtorno psiquiátrico mais comum em pessoas que morrem por suicídio. ○ Os pensamentos sobre a morte podem variar desde uma ideia vaga até ideação suicida, plano específico e tentativa de suicídio. ○ Queixas de desesperança, sensação de inutilidade e desejo de não ser uma “carga” para os outros podem ser alguns dos sintomas. ○ Fatores de risco: Sexo masculino, idosos, história familiar de transtorno psiquiátrico, tentativa de suicídio prévio, depressão grave, desesperança e existência de outras comorbidades psiquiátricas. CURSO E PROGNÓSTICO: → A maioria dos quadros de episódio depressivo permanece, em média, cerca de 20 semanas, e aqueles sem tratamento podem apresentar uma duração de até 13 meses. → A retirada precoce de terapia farmacológica frequentemente resulta na retomada dos sintomas depressivos. → Pacientes inicialmente diagnosticados com TDM podem eventualmente apresentar sintomas maníacos e alterar seu diagnóstico inicial para transtorno bipolar tipo I ou II. Estima-se que tal alteração possa ocorrer em até 20% dos pacientes, geralmente cerca de 6 a 10 anos após o episódio inicial. → Um dos principais fatores de risco de pior prognóstico é o número de episódios depressivos prévios. → Em geral, quanto mais episódios depressivos o paciente apresenta, com menor período de eutimia entre eles, pior será o desfecho. → São marcadores de pior prognóstico: Comorbidade com transtorno de uso abusivo de álcool ou outras substâncias, a existência de um dos transtornos de ansiedade associados e o histórico de traumas e/ou abusos na infância. → Indicadores de melhor prognóstico: Idade de início avançada, boa rede de apoio social e familiar, ausência de transtorno psiquiátrico comórbido, ausência de episódios psicóticos, episódios de internações curtos e sintomatologia de grau leve. DIAGNÓSTICO: → O diagnóstico é eminentemente clínico, fundamentado na história clínica e no exame do estado mental. Guilherme Rios – Módulo I – p6 → O quadro caracteriza-se pela existência de CINCO OU MAIS dos seguintes sintomas a seguir, com DURAÇÃO CONTÍNUA de, no mínimo, 2 SEMANAS e mudança com relação ao status físico e mental prévio. Pelo menos um dos sintomas deve ser humor deprimido ou perda do interesse ou prazer (anedonia): ○ Humor deprimido na maior parte do dia, quase todos os dias. * ○ Perda ou diminuição significativa do interesse ou do prazer em todas ou quase todas as atividades diárias, quase todos os dias. * ○ Perda ou ganho significativo de peso sem causa explícita e/ou redução ou aumento do apetite diário. ○ Insônia ou hipersonia, quase todos os dias. ○ Retardo psicomotor ou agitação, quase todos os dias, observáveis por outras pessoas. ○ Fadiga e/ou perda de energia, quase todos os dias. ○ Sentimentos de culpa e inutilidade excessivas ou inapropriadas, que podem ser delirantes, quase todos os dias. ○ Diminuição na capacidade de concentração ou de pensamento, ou indecisão, quase todos os dias. ○ Pensamentos recorrentes de morte (não somente medo de morrer), ideação suicida, plano específico para realização ou tentativa de suicídio. → Deve-se excluir a presença de outra condição clínica ou efeitos fisiológicos devido ao uso de substâncias e, do mesmo modo, condições psiquiátricas que expliquem de melhor maneira a sintomatologia depressiva. → Não deve haver quadros de mania e/ou hipomania anteriores. → Além disso, o quadro atual deve representar um aspecto de sofrimento e prejuízo significativo na vida social e/ou profissional do paciente. → EXAMES COMPLEMENTARES: ○ São realizados na suspeita de doenças subjacentes que provoquem sintomas depressivos, a fim de confirmar ou excluir a hipótese. ○ São eles: Hemograma; TSH; Vitamina B12; Ácido fólico; Eletrólitos (cálcio, fósforo, magnésio); Teste rápido de HIV; Creatinina e ureia; Testes de função hepática; Testes toxicológicos de sangue e urina; Gasometria arterial; Cortisol livre em urina de 24 horas; Hormônio adrenocorticotrófico (ACTH). Guilherme Rios – Módulo I – p6 → EXAMES DE IMAGEM: ○ A neuroimagem ajuda a esclarecer a natureza da doença neurológica que pode estar produzindo sintomas psiquiátricos. ○ Os mais solicitados são: TC e RM de crânio (principalmente se, associado ao sintoma depressivo, estiver déficit neurológico focal). DIAGNÓSTICOS DIFERENCIAIS: → CONDIÇÕES CLÍNICAS: ○ Doenças clínicas devem ser consideradas ao se avaliar um paciente com possível quadro de TDM ou TB. ○ Assim, o quadro depressivo pode ser secundário a uma doença de base, a qual deve ser afastada ou confirmada através de uma boa anamnese, exame físico e exames complementares. → TRANSTORNOS PSIQUIÁTRICOS: ○ A depressão pode ser manifestação de praticamente qualquer transtorno mental. ○ Entre os principais transtornos que comumente apresentam manifestações depressivas estão os transtornos por uso abusivo de álcool ou outras substâncias, transtornos de ansiedade, transtornos alimentares, transtorno de ajustamento com humor deprimido, esquizofrenia, transtorno esquizofreniforme e transtorno de somatização, TDAH, assim como vários subtipos dentro do espectro dos transtornos depressivos e do transtorno bipolar. ○ É importante, também, saber diferenciar a depressão de sensações que são inerentes à vida humana, como o luto e a tristeza. De modo geral, essa diferenciação baseia-se na duração e nagravidade dos sintomas, as quais não contemplam os critérios diagnósticos. TRATAMENTO: → A psicoterapia, a farmacoterapia e uma combinação de psicoterapia e farmacoterapia são métodos de tratamento eficazes para a depressão. → TRATAMENTO FARMACOLÓGICO: ○ CONSIDERAÇÕES SOBRE O TRATAMENTO: • Para pacientes com TDM leve e moderado, recomenda-se o tratamento farmacológico como escolha terapêutica inicial. • Para os casos graves de TDM, o tratamento farmacológico é fundamental. • O objetivo desse tratamento é o restabelecimento funcional e a remissão total dos sintomas depressivos, o que gera TAXAS DE SUICÍDIO MAIS BAIXAS. • Alguns cuidados devem ser adotados após a prescrição da farmacoterapia, como evitar prescrever medicamentos em subdoses e por um período muito curto e não aumentar a dose da medicação se uma dosagem baixa resultar em não melhora clínica do paciente. • Alguns antidepressivos, após o início de seu uso, podem induzir ou agravar ideias e comportamentos suicidas e agitação. (ATENÇÃO!) OBS: O tempo médio de início da resposta terapêutica eficaz dos antidepressivos é de 3 a 4 semanas. Dessa forma, devo esperar 1 mês a 1,5 mês até considerar um fármaco como ineficaz. Guilherme Rios – Módulo I – p6 • As causas mais comuns de falha do tratamento são: Intolerância aos efeitos colaterais, resposta clínica inadequada, erro diagnóstico e má adesão aos fármacos. • O tratamento do transtorno depressivo maior dura em torno de 6 a 12 meses e, para interromper a medicação usada, deve-se diminuir gradualmente a dose ao longo de 2 semanas, pelo maior risco de reação de descontinuação se houver interrupção abrupta. Eventos adversos graves podem justificar a descontinuação rápida. ○ ESCOLHA DA MEDICAÇÃO: • Quanto à eficácia, pouco se difere entre os AD, entretanto, o que muda e define a escolha de um em detrimento de outro são os efeitos colaterais, interações medicamentosas e sintomas decorrentes da descontinuação do uso. • Para orientar a escolha do tratamento farmacológico, devemos considerar: A duração, o curso, a gravidade, o perfil de sintomas da depressão, as condições clínicas gerais, outras condições psiquiátricas associadas, a resposta a tratamentos prévios, as medicações em uso e a preferência do paciente, assim como a tolerabilidade e os prováveis efeitos colaterais do fármaco indicado, o custo e a facilidade do uso. ○ INIBIDORES SELETIVOS DA RECAPTAÇÃO DE SEROTONINA (ISRS): • É a classe de primeira escolha no tratamento do TDM. • O fármaco mais prescrito é a SERTRALINA (associada ou não ao escitalopram). • Crianças e adolescentes → Sertralina e fluoxetina. • Idosos → Sertralina, Citalopram, reboxetina e nortriptilina. ○ Outros fármacos como ISRSN, a mirtazapina e a bupropiona podem ser utilizados, mas são reservados para casos de falha da primeira linha de escolha. OBS: Em caso de TDM associado à ansiedade ou insônia, baixas doses de BZD podem ser indicadas por um período de 1 a 2 semanas, quando então é reavaliado. ○ Os inibidores da monoamina oxidase (IMAO) são reservados para pacientes nos quais a terapia antidepressiva de primeira linha não tenha sido eficaz e para aqueles com sintomas atípicos, para os quais os ISRS e a bupropiona também são úteis. ○ Nos episódios de TDM associado a sintomas psicóticos, é necessário combinar um antidepressivo a um antipsicótico atípico inicialmente. ○ TRATAMENTO DA DEPRESSÃO MAIOR GRAVE: • Geralmente, necessita de terapia combinada (farmacoterapia mais psicoterapia), farmacoterapia isolada ou eletroconvulsoterapia e, por vezes, hospitalização, em vista de sua gravidade. • Os fármacos de primeira linha, nesses casos, são ISRSN (principalmente) e ISRS. • Outras alternativas são AD tricíclicos, pois são mais eficazes que os demais. ○ TRATAMENTO DO TRANSTORNO DEPRESSIVO PERSISTENTE: • Os ISRS são os fármacos de escolha em associação à terapia cognitivo-comportamental. Guilherme Rios – Módulo I – p6 OBS: Deve-se considerar uma classe de antidepressivos diferente depois de mais de uma falha com uma classe específica e a adição de um segundo antidepressivo, quando há resposta parcial com a medicação atual e boa tolerabilidade a ela. ○ MEDICAMENTOS ADICIONAIS: • Podem ser utilizadas para potencializar a ação antidepressiva. • Dentre eles estão a QUETIAPINA ou o LÍTIO (1ª linha) e risperidona, olanzapina ou mirtazapina (2ª linha). • Podem ser utilizados, também a bupropiona, buspirona, lamotrigina e triptofano. OBS: Foi reforçada a orientação do uso de um estabilizador junto com um antidepressivo mesmo para o transtorno depressivo unipolar. ○ EFEITOS COLATERAIS DOS ANTIDEPRESSIVOS: • Diarreia; Vômitos; Disfunção sexual; Insônia; Náuseas; Sonolência; Aumento de peso; Agitação. → MEDIDAS NÃO FARMACOLÓGICAS: ○ Melhora do sono e da nutrição, prática de exercícios físicos, remoção de estressores e etc. → ELETROCONVULSOTERAPIA (ECT): ○ É destinada ao tratamento de depressão grave, resistente a outros métodos terapêuticos ou em pacientes intolerantes a psicofarmacoterapia. ○ Esse método terapêutico é a primeira escolha nas situações de emergência e urgência, como estupor depressivo, níveis extremos de angústia, desnutrição, perda de peso grave e desidratação secundária a recusa de líquidos e alimentos e aqueles com ideação suicida ou comportamentos com risco de vida. ○ Os efeitos adversos relacionados com esse tratamento são, a curto prazo, dor de cabeça, náuseas, vômito e, mais raramente, breve confusão. No entanto, o efeito colateral de maior preocupação é o comprometimento cognitivo relacionado a memória para eventos passados (amnésia retrógrada) e eventos atuais (amnésia anterógrada), que pode durar meses após um curso de tratamento com ECT. → TRATAMENTO PSICOTERÁPICO: ○ A psicoterapia pode ser utilizada de maneira isolada ou associada a outros métodos terapêuticos. ○ Essa abordagem psicoterápica visa ajudar os pacientes a aprender a lidar efetivamente com a depressão, aliviando os sintomas de fase ativa. OBS: Uma vantagem desse tratamento, que difere da farmacoterapia, é que seus benefícios frequentemente persistem. Dessa forma, melhora a QV do paciente, evitando futuras recidivas. ○ A combinação da psicoterapia e da farmacoterapia está indicada para o tratamento inicial da depressão maior unipolar e em casos de depressão resistente, pois o tratamento combinado foi mais efetivo que qualquer uma dessas terapêuticas sozinhas. Guilherme Rios – Módulo I – p6 ○ A psicoterapia isolada está indicada para o tratamento inicial de pacientes com depressão leve, quando a relação risco-benefício não justifica o uso de medicamentos para sintomas relativamente leves. ○ TERAPIA COGNITIVO-COMPORTAMENTAL: • A TCC é a terapia mais amplamente praticada e se destina a pacientes com baixa disfunção cognitiva, atenção seletiva a aspectos negativos e com expectativas mórbidas não realistas, e quando o tratamento psicológico é usado como monoterapia para depressão recorrente. • São empregadas técnicas que ajudam a identificar pensamentos disfuncionais, emoções e comportamentos derivados desses pensamentos e a gerenciar os sintomas. • Além disso, há uso de reforços positivos para mudar padrões comportamentais mal adaptativos. • Seu objetivo é minimizar os episódios depressivos e evitar sua reincidência, desenvolvendo formas de pensar alternativas, flexíveis e positivas. ○ TERAPIA INTERPESSOAL: • Essa técnica foca um ou dois dos conflitos interpessoais do paciente, avaliando sua rede de relacionamentos e incentivando o indivíduo a analisar ativamente a contribuição destes para seus sintomas depressivos. 3. ENTENDER A ENTREVISTA PSIQUIÁTRICA E O EXAME MENTAL: INTRODUÇÃO: → A psiquiatria, tem um diferencial em relação às outras áreas da medicina, pois nelaos conhecimentos agregados pelas ciências naturais (fisiologia, química, neuroanatomia) quanto as ciências humanas (antropologia, sociologia, psicologia) são igualmente importantes. Em outras palavras, tanto os dados estatísticos mais precisos e objetivos quanto as informações mais subjetivas e no campo das ideias ganham relevância. → A entrevista psiquiátrica é o próprio instrumento de avaliação do estado mental/psíquico do paciente. ENTREVISTA PSIQUIÁTRICA: → A sensibilidade e capacidade empática, nesse momento, são tão importantes quanto o conhecimento teórico. OBS: A comunicação médico-paciente é praticamente a única ferramenta para a propedêutica e o diagnóstico psiquiátricos. → O médico deve garantir conforto e segurança ao paciente no momento do atendimento para que o entrevistado se sinta confiante e seguro para falar sobre suas queixas. → Inicialmente o paciente expõe suas queixas livremente (o que já alivia o psiquismo) e, em um segundo momento, as perguntas devem ser mais direcionadas e profundas. → O médico deve se atentar para não induzir respostas do paciente. → Após a formulação das hipóteses diagnósticas, o médico as deve expor de maneira clara ao paciente e tirar as eventuais dúvidas acerca das mesmas. Guilherme Rios – Módulo I – p6 → O tempo da entrevista psiquiátrica é muito variável e depende de fatores como: Disponibilidade do médico e paciente, local de atendimento (p. ex., UBS, PS, hospital, consultório), dificuldade em estabelecer as hipóteses diagnósticas e o plano terapêutico. OBS: A entrevista psiquiátrica assume, com maior frequência que em outras especialidades, um caráter terapêutico importante. Os pacientes experimentam algum grau de alívio apenas por expressar e partilhar seus sentimentos e problemas com um profissional. → PRIVACIDADE: ○ A privacidade do local onde será realizada a entrevista é muito importante, uma vez que favorece uma maior abertura do paciente (entretanto é difícil mantê-la em alguns locais). ○ É importante que o médico entreviste o paciente a sós, mesmo quando este estiver acompanhado, solicitando que os demais retornem à sala para acrescentar informações pertinentes. → Preconiza-se que o entrevistador não faça anotações prolongadas durante a avaliação, uma vez que poderá comprometer a relação com o paciente, além da observação de suas reações. ○ Entretanto, o relato completo da anamnese e condutas tomadas são fundamentais ao final da entrevista, para fins assistenciais e, eventualmente, judiciais. → ORDEM DA ENTREVISTA: ○ Não é fixa, uma vez que inúmeras variáveis podem alterá-la (como a cooperação do paciente), mas tem um padrão similar às demais. ○ Inicia com a apresentação do entrevistador (nome, função e objetivo da abordagem) e a identificação do paciente (nome, idade, proveniência, ocupação, situação conjugal, religião). ○ Queixa principal e duração (QPD) e HDA (enfatizando o início dos sintomas, apresentação, periodicidade e possíveis tratamentos medicamentosos ou internações prévias). ○ Antecedentes: • Biográficos (como seu comportamento durante a infância e adolescência, história ocupacional e conjugal, padrão de relacionamentos interpessoais e características de personalidade pré-mórbida). • Pessoais (p. ex., doenças de base, traumatismos, cirurgias). • Familiares (com ênfase na presença de doenças psiquiátricas e dependência de drogas entre os parentes). ○ Hábitos (em especial o uso de drogas). OBS: Deve ser avaliada a possível correlação entre antecedentes, hábitos e sintomas do paciente (p. ex., depois de um acidente, o paciente passou a adotar determinados comportamentos [Phineas Gage e a barra de ferro]). → SITUAÇÕES DE ENTREVISTA: ○ O próprio fato de, em determinadas entrevistas, o paciente não ser cooperativo ou ter dificuldade em oferecer informações já se configura como informação sobre o estado mental do paciente, como nível de consciência ou agitação psicomotora. OBS: Em casos de paciente que, por algum motivo, não sejam colaborativos, conta-se com a ajuda de um informante, o qual será o responsável pelo fornecimento de detalhes. ○ DISSIMULAÇÃO: Guilherme Rios – Módulo I – p6 • Ocorre quando algum sintoma questionado é negado, apesar de sua existência. • Se a dissimulação ocorrer por medo ou vergonha, caberá ao médico – sem julgamentos – transmitir segurança e confiança ao paciente, para que o mesmo relate. ○ SIMULAÇÃO: • O paciente relata sintomas que não existem. • Em casos de suspeita de simulação, a entrevista deve ser mais refinada, procurando encontrar inconsistências na história ou na forma como o sintoma relatado é vivenciado. ○ PACIENTES AGRESSIVOS: • Primeiramente, o médico deve avaliar se há possibilidade de realizar um contato verbal efetivo com o paciente ou se seu senso de realidade está muito comprometido. • No caso de impossibilidade de entrevista, o paciente deverá ser medicado ou mesmo contido fisicamente até se mostrar mais calmo, cuidando o médico de manter o melhor contato possível com o paciente, esclarecendo o motivo de precaução de danos das atitudes tomadas. ○ PACIENTES POTENCIALMENTE SUICIDAS: • A entrevista deve ser realizada em ambiente seguro (p. ex., grades nas janelas, sem materiais pontiagudos). • O paciente deve ser HOSPITALIZADO ou protegido de outra forma (p. ex., internação domiciliar, mediante compromisso escrito dos responsáveis). OBS: Tanto a equipe médica quanto os familiares não podem jamais subestimar o risco de suicídio do paciente. EXAME MENTAL/PSÍQUICO: → Nessa etapa, o psiquismo é dividido em funções que, embora funcionem em conjunto, podem ser descritas de forma independente. → Para cada pergunta realizada nesse momento, o examinador deve ter em mente as possíveis respostas que uma pessoa razoável poderia dar naquele contexto. OBS: O examinador pode se abster de termos técnicos e detalhar de forma pormenorizada aquilo que percebeu durante a avaliação. Essa conduta torna mais rica a descrição, reduzindo confusões diagnósticas. OBS: O exame mental faz um recorte transversal do psiquismo do paciente, enquanto na anamnese esse recorte é longitudinal. OBS: As funções serão elencadas a seguir de maneira hierarquizada, ou seja, caso uma esteja comprometida, as posteriores também estarão. 1. CONSCIÊNCIA: → O nível de consciência e de alerta, além do grau de atividade do SNC são importantes para o exame psiquiátrico. OBS: Quando há alteração em um desses graus, o paciente é dito como “rebaixado” ou “confuso”. → A ordem decrescente de nível de consciência é: ○ ESTADO VIGIL: Grau de maior alerta. Guilherme Rios – Módulo I – p6 ○ SONOLÊNCIA: O paciente oscila entre dormindo e acordado e, com algum esforço, desperta e estabelece contato. ○ TORPOR (obnubilado): O paciente torporoso acorda com dificuldade, não plenamente despertando e permanecendo um tanto confuso. ○ ESTUPOR (semicomatoso): O paciente estuporoso só acorda mediante estímulos muito vigorosos, não sendo capaz de se manter alerta espontaneamente. ○ COMA: O comatoso não acorda, apresentando o maior grau de rebaixamento de nível de consciência. → Também é avaliada a QUALIDADE DA CONSCIÊNCIA, uma vez que pode estar alterada. ○ O paciente pode manifestar estreitamento da consciência, quando o foco fica restrito (p. ex., devido à alta ansiedade, intoxicações ou crises epiléticas). ○ Pode apresentar dissociação da consciência, quando vivencia momentos dos quais não se lembra ao retomar a integridade da consciência (p. ex., a perda de memória após beber muito). 2. ATENÇÃO E CONCENTRAÇÃO: → A ATENÇÃO consiste na capacidade de focalizar um objeto ou situação de maneira intencional. ○ A atenção pode ter natureza voluntária (ativa), quando se pretende direcionar a atenção a determinado objeto, ou involuntária (passivaou espontânea), quando a atenção é direcionada a um foco secundário, denotando a capacidade de mudar de foco. OBS: Quanto maior o grau de atenção voluntária, menor o de atenção involuntária e vice-versa. → A CONCENTRAÇÃO consiste na capacidade de manter a atenção voluntária. 3. ORIENTAÇÃO: → Capacidade do indivíduo de estimar precisamente o tempo, o espaço e as pessoas (inclusive a si mesmo). ○ Orientação temporal: Capacidade de se localizar adequadamente quanto a dias, datas e horários (pode ser comprometida por concentração profunda, emoção forte ou quadros orgânicos). ○ Orientação espacial: Capacidade de saber onde mora e onde se encontra (alterada mais tarde no processo mórbido). ○ Orientação autopsíquica: Refere-se ao conhecimento do próprio nome e da identidade pessoal (prejudicada em casos avançados de deterioração orgânica). 4. MEMÓRIA: → Memória de longa duração (remota): • Fatos gravados há mais tempo e recordações antigas. Avaliada ao pedir ao paciente para contar sua história. → Memória de curta duração (recente): • Consiste na memória que será mantida por pouco tempo (p. ex., número de telefone até que ele seja discado). → Memória imediata (de trabalho): Guilherme Rios – Módulo I – p6 • Está intimamente ligada à atenção e permite, por exemplo, que um leitor entenda a coerência de uma frase, embora já não lembre exatamente quais eram as primeiras palavras da sentença. → Podem ser utilizados testes específicos (p. ex., gravar palavras ou nomes, contar histórias, perguntar sobre fatos históricos e etc). OBS: É importante que o profissional saiba as respostas corretas ou que tenha um informante na sala para que possa confirmá-las, uma vez que o paciente pode confabular, ou seja, criar falsas memórias ou respostas para substituir as lacunas abertas na memória (p. ex., demência). 5. PENSAMENTO: → Avalio o pensamento do paciente por meio do seu DISCURSO. → Devo avaliar: ○ FORMA DO PENSAMENTO: • Corresponde à maneira como as ideias são encaixadas ao longo do raciocínio. • Alterações formais ocorrem, principalmente, nos quadros psicóticos ou maniformes. ♦ Afrouxamento de associações: As ideias são relacionadas de forma pobre entre si. ♦ Arboriforme: Tendência à desorganização, mas mantendo ainda a meta do raciocínio. ♦ Fuga de ideias: Ideias levam a novas ideias, perdendo a meta (típica dos quadros maniformes). ♦ Desagregado: Quando há perda completa da relação aparente entre as ideias. ○ CURSO E VELOCIDADE DO PENSAMENTO: • Podem acelerar, principalmente em síndromes maníacas, ou lentificar, quando o pensamento vai mais devagar, comum em depressões. • Bloqueio de pensamento: Consiste no fenômeno em que o fluxo de pensamento é interrompido abruptamente. • Roubo de pensamento: O paciente interpreta tal fenômeno como se o pensamento lhe houvesse sido roubado. ○ CONTEÚDO DO PENSAMENTO: • O conteúdo do pensamento é praticamente ilimitado, entretanto, deve-se avaliar se há algum tema prevalente, que domine e/ou impeça a ocorrência de outros temas. • O valor atribuído ao conteúdo pode conferir caráter delirante ao pensamento. ○ O “adoecer do pensamento”, embora extenso, perpassa mais por temas como: Culpa e pecado, religiosidade, sexualidade, morte, riqueza e poder ou ruína, perseguição ou adoecimento. OBS: OUTROS FENÔMENOS: • Inserção de pensamento → É a vivência de um pensamento não próprio ocorrendo ao paciente, interpretado como inserido por terceiros (típico da esquizofrenia). Guilherme Rios – Módulo I – p6 • Sonorização do pensamento → Tem um componente também de alucinação auditiva, pois o paciente ouve um som que não foi produzido (seu pensamento). 6. LINGUAGEM: ○ Avaliado quanto ao componente verbal (principalmente), sua forma e conteúdo. ○ FORMA: • Avalia-se a velocidade do discurso, a qual pode estar: ♦ Lentificada: Normalmente se nota pela latência entre a pergunta do entrevistador e a resposta do paciente). OBS: Em alguns pacientes pode-se verificar ainda o mutismo (p. ex., depressão e catatonia). ♦ Acelerada: Fala rápida. OBS: Quando o paciente, além de falar rápido, fala em grande quantidade, o chamamos de logorreico. Se, associada à logorreia, houver fala em alto volume e ininterrupta, fala-se em pressão de discurso (ocorre normalmente em mania e em quadros ansiosos mais graves). OBS: Automatismos verbais possíveis de serem identificados • Musitação: Semelhante à uma reza contínua em voz baixa. • Verbigeração: Repetição sem sentido de frases ou palavras incessantemente. • Ecolalia: Repetição automática das palavras pronunciadas pelo interlocutor. ○ CONTEÚDO: • Acompanha, usualmente, o conteúdo do pensamento (já comentado). • Deve-se afastar quadros de afasia com propedêutica adequada no exame da linguagem. 7. SENSOPERCEPÇÃO: → ALUCINAÇÕES: ○ Definidas como a presença de uma percepção sensorial na ausência de um estímulo real. ○ Podem ser visuais, auditivas, olfativas, gustativas e das sensações corporais (sendo esta última dividida em cinestésicas [músculos e articulações], viscerais [órgãos internos] ou superficiais [hepáticas]). ○ Deve identificado o conteúdo (p. ex., o que as vozes falam), duração do fenômeno, circunstâncias em que ocorrem e etc. OBS: Quando o paciente tem as alucinações, mas sabe que são “coisas de sua cabeça”, são chamados de alucinoses. → ILUSÕES: ○ São distorções da percepção, ou seja, o estímulo existe, mas é percebido de forma diferente pelo paciente. 8. JUÍZO E CRÍTICA: → JUÍZO: Guilherme Rios – Módulo I – p6 ○ O juízo é a capacidade de dar valor a fatos e ideias e apresenta-se alterado no paciente que tem delírios. ○ DELÍRIOS: São certezas subjetivas de algo, não encadeadas no fluxo normal de pensamentos, não compartilhadas (não fazem parte de um conjunto de crenças culturalmente aceitas), irrefutáveis e de conteúdo improvável. O delírio pode surgir por: • Interpretação delirante: Quando o paciente interpreta fatos corriqueiros de forma psicótica. • Intuição delirante: Quando o delírio simplesmente surge, como uma revelação inquestionável que não carece de explicação. • Percepção delirante: Quando, ao receber um estímulo qualquer, o paciente o entende como explicação para os delírios (p. ex., ao ver a garrafa de cerveja na mesa, o paciente descobre que a mulher o estava traindo). → CRÍTICA: ○ É definida como a capacidade do paciente de entender sua condição, podendo ela estar preservada, abolida ou ser parcial (o paciente entender que algo está diferente, mas não consegue definir bem o que é). 9. AFETO E HUMOR: → AFETO: ○ Consiste na manifestação da resposta emocional de alguém a eventos internos e externos, pensamentos, ideias, memórias evocadas e reflexões. ○ Quanto à qualidade, pode ser de alegria, raiva, tristeza, ansiedade, interesse, vergonha, culpa, surpresa. ○ Quanto ao tônus afetivo (volume do afeto), pode estar aumentado, diminuído ou embotado (estado de quase ausência de afetos ou de modulação e ressonância afetiva). OBS: MODULAÇÃO é a capacidade de variar entre afetos. RESSONÂNCIA é a capacidade de sintonizar com o ambiente, reagindo adequadamente à situação em que se encontra. Ambos podem ser aumentados ou diminuídos, sendo caracteristicamente menores nas depressões, maiores na mania e praticamente ausentes na esquizofrenia (daí o descrever como embotamento afetivo). → HUMOR: ○ É o todo da vida emocional, é algo como a média dos afetos, podendo, portanto, estar polarizado (para depressão, hipomania ou mesmo mania). ○ O humor é o tônus afetivo, estado emocional basal e difuso. ○ O humor não é contínuo, podendo oscilar – naturalmente – ao longo do dia. ○ Quanto ao humor, o paciente pode ser caracterizado em: • HIPOTÍMICO/ DISTÍMICO: Quando se mantém levemente deprimidode forma constante. • HIPERTÍMICO: Quando há manutenção de um estado de leve elevação constante. • EUTÍMICO: Quando o humor não apresenta clara tendência para um ou para outro lado ao longo do tempo (é o humor normal). 10. VOLIÇÃO, IMPULSO E PROSPECÇÃO: Guilherme Rios – Módulo I – p6 → VOLIÇÃO: ○ Vontade é um empenho ou intenção dirigida ao objetivo, com base em motivação cognitivamente planejada. ○ A redução ou abolição da vontade, em quadros de grande desânimo, denominam-se hipobulia ou abulia, respectivamente. → IMPULSO: ○ É a inclinação para satisfazer certas necessidades primárias. ○ Atos impulsivos podem ser esporádicos ou repetidos, com os mais diversos fins (p.ex., impulso suicida, impulsos de compra, de roubo, alimentares, de fuga). → PROSPECÇÃO: ○ É a capacidade de projetar os desejos para o futuro e fica limitada em diversas síndromes psiquiátricas. 11. PSICOMOTRICIDADE: → Consiste na exteriorização comportamental motora dos estados psíquicos e pode ser dividida em: ○ SÍNDROMES HIPERCINÉTICAS: • Há aumento da atividade motora e o paciente pode ser apresentar INQUIETO (p. ex., dificuldade de permanecer parado, senta-se e levanta repetidas vezes, mexe-se constantemente na cadeira) ou AGITADO (quando já perdeu o controle do seu comportamento, podendo ser desde agitação leve, até grave, em que ocorre atos agressivos e destrutivos). ○ SÍNDROMES HIPOCINÉTICAS: • São caracterizadas por inibição motora, com lentificação, inibição e até catatonia – quando há total ausência de atividade motora concomitante à flexibilidade cérea (em que o paciente assume posição em que é deixado, como se fosse um boneco de cera) e catalepsia (aumento do tônus e rigidez muscular). 12. INTELIGÊNCIA: → Normalmente a inteligência não é testada de modo estruturado no exame mental, mas no próprio decorrer da entrevista já se pode ter uma noção do seu nível. IMPORTANTE! As funções mentais também podem ser agrupadas de acordo com o modo como são acessadas durante a entrevista. Dessa forma, a aparência, o nível de consciência e o comportamento psicomotor serão imediatamente perceptíveis à observação. Durante a conversação, poderão ser avaliados: Atenção e concentração, fala, linguagem e pensamento, orientação, memória e afeto. Mediante exploração ativa, por fim, serão analisados humor e volição, percepção, conteúdo do pensamento, crítica e julgamento.
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