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1 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 Otorrinolaringologia PERDA AUDITIVA Definição: A perda auditiva é definida como a diminuição da capacidade de ouvir e/ou de compreender a fala e os sons ao seu redor. Epidemiologia: - A perda auditiva representa uma das deficiências sensoriais mais comuns e pode acometer indivíduos de todas as idades. - A perda auditiva pode manifestar-se como sintoma isolado ou como parte de um conjunto de sinais e sintomas. - A perda auditiva pode ser gradual/progressiva ou abrupta e, além disso, pode ser transitória ou permanente. - A perda auditiva é comum, mas geralmente não é reconhecida por médicos e pacientes, sendo subdiagnosticada e subtratada. - A prevalência da perda auditiva clinicamente significativa dobra a cada década de vida. Etiologia: Orelha Externa: - Obstrução Mecânica: → Qualquer coisa que bloqueie a transmissão do som por meio do conduto auditivo externo em direção à membrana timpânica e à cadeia ossicular pode causar perda auditiva condutiva. → O excesso de cerúmen representa uma das causas mais comuns de deficiência auditiva, acometendo 1 a cada 10 crianças e 1 a cada 20 adultos. → A presença de corpo estranho no interior da orelha externa, inserido principalmente por crianças ou, às vezes, por adolescentes e adultos ao coçarem o conduto auditivo externo ou tentarem remover cerúmen, pode diminuir a transmissão do som até a orelha média. → O câncer de orelha externa é raro e geralmente apresenta-se como massa dolorosa e com sangue que desenvolve-se no conduto auditivo externo, podendo causar perda auditiva devido à obstrução da orelha externa. O tipo mais prevalente de câncer do meato acústico externo é o carcinoma de células escamosas (carcinoma epidermoide/espinocelular). → Outras causas mais raras de obstrução da orelha externa que podem causar perda auditiva são exostomas, osteomas e pólipos benignos do conduto auditivo externo. - Trauma: → O trauma do conduto auditivo externo inclui escoriações, lacerações e hematomas. A maioria dos traumas da orelha externa ocorre quando os pacientes tentam limpar ou inserir objetos no interior do conduto auditivo externo. → Os pacientes que fazem uso de anticoagulantes apresentam risco aumentado de sangramento secundário a traumas pequenos do conduto auditivo externo. O sangramento pode bloquear o meato acústico externo e causar perda auditiva condutiva. - Malformações Congênitas: → As principais malformações congênitas da orelha média são atresia e estenose do conduto auditivo externo, que causam obstrução à transmissão do som em direção à membrana timpânica e à cadeia ossicular, resultando em perda auditiva condutiva. - Infecções: → A otite externa é comum e manifesta-se por otalgia e otorreia de intensidades variáveis. Quando há edema e inflamação mais intensos do conduto auditivo externo, pode desenvolver-se perda auditiva condutiva. → A maioria das infecções da orelha externa são causadas por Staphylococcus aureus e Pseudomonas aeruginosa. → A otite externa é mais frequente em pacientes diabéticos e imunodeprimidos. Orelha Média: - Infecções: → A otite média aguda e a otite média crônica causam inflamação da membrana timpânica, podendo diminuir sua capacidade de vibração em resposta à chegada do som, resultando em perda auditiva condutiva. 2 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 → As otites médias podem causar disfunção tubária, resultando em retração da membrana timpânica e em presença de efusão/secreção no interior da orelha média (otite média secretora/serosa), que também diminui a capacidade de vibração da membrana timpânica e da cadeia ossicular, resultando em perda auditiva condutiva. - Tumores: → Os tumores da orelha média são raros. O tipo mais comum de tumor da orelha média é o tumor glômico vascular, que manifesta-se com zumbido pulsátil associado à perda auditiva condutiva. - Trauma: → O trauma da orelha média e/ou do osso temporal causam perda auditiva em aproximadamente 24% dos casos. Agudamente, os pacientes apresentam hemotímpano (presença de sangue no interior da orelha média), que impede a vibração da membrana timpânica e da cadeia ossicular. À medida que o sangue é reabsorvido, a audição geralmente melhora. → O trauma da orelha média que cursa com fratura ossicular causa perda auditiva que não melhora mesmo após a resolução do hemotímpano. → A perfuração da membrana timpânica representa outra causa traumática muito comum de perda auditiva condutiva. A perfuração pode ser causada por TCE (lesão do osso temporal), por uso de hastes flexíveis de algodão (cotonetes), por infecção aguda ou crônica da orelha média (otite média), por barotrauma (alterações abruptas da pressão atmosférica, como mergulho) ou por iatrogenia, devido à ausência de resolução da perfuração timpânica após a remoção de tubos de drenagem da orelha média. - Disfunção Tubária: → Retração da membrana timpânica e/ou presença de efusão no interior da orelha média, impedindo a vibração adequada da membrana timpânica e da cadeia ossicular, o que resulta em perda auditiva condutiva. - Malformações Congênitas: → As malformações congênitas da cadeia ossicular, mais comumente do estribo, podem causar perda auditiva condutiva. - Otosclerose: → A otosclerose representa uma das principais causas de perda auditiva adquirida e apresenta causas genéticas e ambientais. A otosclerose caracteriza-se por crescimento ósseo anormal, principalmente do estribo, diminuindo sua capacidade de movimentação/vibração e resultando em diminuição da quantidade de som transmitida em direção à cóclea (perda auditiva condutiva). - Doença Óssea: → A Doença de Paget, caracterizada por crescimento ósseo anormal, também afeta diretamente a capacidade de movimentação/vibração da cadeia ossicular, resultando em perda auditiva condutiva. → A osteogênese imperfeita pode causar fraturas dos ossículos da orelha média, resultando em perda auditiva condutiva. Orelha Interna: - A perda auditiva causada por anormalidades da orelha interna e/ou das vias auditivas do SNC, denominada perda auditiva neurossensorial, geralmente manifesta-se com conduto auditivo externo (orelha externa), membrana timpânica e cadeia ossicular (orelha média) normais. - As causas mais comuns de perda auditiva adquirida em adultos são idade (presbiacusia) e ruído (perda auditiva induzida por ruído). - Medicamentos Ototóxicos: → Alguns medicamentos associam-se à ototoxicidade. A perda auditiva geralmente é reversível se o medicamento for suspenso precocemente, mas se o medicamento for continuado, a perda auditiva pode tornar-se permanente. → Os antibióticos aminoglicosídeos (amicacina, estreptomicina, gentamicina, neomicina, tobramicina) são ototóxicos de forma dose-dependente. Outros medicamentos que também podem causar ototoxicidade são diuréticos de alça (em 3 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 dose alta), antimaláricos, salicilatos e antineoplásicos (cisplatina). → Os medicamentos ototóxicos causam lesão da cóclea, resultando em zumbido e em perda auditiva neurossensorial, que geralmente inicia-se por frequências mais altas (sons agudos). Eventualmente, as drogas ototóxicas também podem causar lesão do sistema vestibular, resultando em vertigem. - Infecção ou Inflamação: → A labirintite, definida como a infecção ou a inflamação do labirinto, geralmente de causa viral, apresenta-se com perda auditiva neurossensorial abrupta associada a plenitude auricular, vertigem e zumbido. → O herpes-zóster auricular caracteriza-se por infecção dos nervos facial e vestibulococlear, causando, além de lesões cutâneas, perda auditiva abrupta, zumbido, vertigem e paralisia facial. - Doença de Menière: → A Doença de Menière apresenta manifestação clínica semelhante à labirintite (perda auditiva neurossensorial, plenitude auricular,vertigem e zumbido). Entretanto, os sintomas são recidivantes/recorrentes. - Trauma: → O TCE com fratura de osso temporal pode causar otorreia com eliminação de líquido cefalorraquidiano (líquor) ou de sangue, perda auditiva condutiva ou neurossensorial, vertigem e paralisia facial. → O trauma acústico caracteriza-se por perda auditiva abrupta/súbita causada por exposição a ruído altamente intenso e de curta duração (ex. explosão), resultando em lesão da membrana timpânica e da cóclea, com perda auditiva imediata, grave e, possivelmente, permanente. Além da perda auditiva neurossensorial ou mista, também pode haver otalgia, zumbido e vertigem. - Tumores: → O principal tumor associado à perda auditiva neurossensorial é o neuroma acústico ou schwanoma vestibular, tumor que acomete o nervo vestibulococlear (VIII par craniano) causando perda auditiva unilateral, zumbido e vertigem. - Infecções Congênitas: → As infecções congênitas, como citomegalovírus, sífilis e toxoplasmose, representam importante causa de surdez neurossensorial devido à lesão da cóclea. → O CMV representa a principal causa de infecção intrauterina e a principal manifestação clínica da infecção congênita por CMV é a surdez neurossensorial. - Doenças Neurológicas: → O acidente vascular cerebral (AVC) e a esclerose múltipla podem causar perda auditiva, e até mesmo surdez, neurossensorial ao afetarem a transmissão dos estímulos nervosos por meio do nervo vestibulococlear (VIII par craniano) tanto por lesão isquêmica (AVC) quanto por lesão desmielinizante (esclerose múltipla). → As infecções adquiridas, como meningite, principalmente causadas por Streptococcus pneumoniae (pneumococo), podem causar lesão às estruturas da orelha interna por infecção direta ou inflamação, resultando em perda auditiva neurossensorial, que pode ser transitória ou permanente. → A neuropatia auditiva representa causa rara de perda auditiva neurossensorial que acomete principalmente crianças nas quais a função coclear é normal, mas a transmissão do estímulo nervoso em direção ao córtex auditivo primário não ocorre adequadamente. - Doença Sistêmica: → O diabetes mellitus (DM) associa-se a risco aumentado de perda auditiva neurossensorial. A causa exata é desconhecida, mas acredita-se que a perda auditiva seja causada por lesão da microcirculação da orelha interna e dos nervos da orelha interna. → O lúpus eritematoso sistêmico (LES) e a granulomatose de Wegener também podem causar perda auditiva neurossensorial. - Fístula Perilinfática: → A fístula perilinfática é definida como a comunicação anormal entre a orelha média e a orelha interna, que pode causar perda auditiva abrupta/súbita e vertigem. A fístula perilinfática frequentemente manifesta-se em associação com outras malformações 4 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 congênitas da orelha média e/ou da orelha interna. As principais causas de perda auditiva abrupta/súbita, condutiva, neurossensorial ou mista, que exigem o encaminhamento com urgência ao otorrinolaringologista, são: - Neoplasia de conduto auditivo externo. - Otite externa maligna. - Labirintite. - Doença de Menière. - Fratura de osso temporal. Classificação: A perda auditiva classifica-se, quanto à causa, em: - Condutiva: anormalidades da orelha externa (conduto auditivo externo) e/ou da orelha média (membrana timpânica e cadeia ossicular). - Neurossensorial: → Sensorial: anormalidades da orelha interna (cóclea). A região apical da cóclea é responsável por audição de sons graves (baixa frequência), já a região basal da cóclea é responsável por audição de sons agudos (alta frequência). → Neural: anormalidades do nervo vestibulococlear (VIII par craniano) e/ou das vias auditivas do SNC (lobo temporal). - Mista: perda auditiva condutiva + perda auditiva neurossensorial. A principal causa de perda auditiva em adultos é a neurossensorial, que pode estar associada a anormalidades cocleares ou a anormalidades retrococleares (nervo vestibulococlear e vias auditivas do SNC). O tempo de evolução da perda auditiva neurossensorial indica as possíveis causas do distúrbio: - Perda auditiva abrupta (horas ou dias): labirintite ou Doença de Menière. - Perda auditiva progressiva ao longo de semanas: ototoxicidade induzida por drogas/medicamentos. - Perda auditiva progressiva ao longo de anos: perda auditiva induzida por ruído. A perda auditiva classifica-se, quanto à gravidade, segundo a audiometria, em: - Leve: 26-40 dB do nível de audição. - Moderada: 41-60 dB do nível de audição. - Grave: 61-80 dB do nível de audição. - Profunda (Surdez): > 80 dB do nível de audição; paciente que comunica-se apenas por meio de leitura labial e/ou de linguagem dos sinais. A perda auditiva subclínica é definida como a audição que está dentro dos limites populacionalmente definidos como normais (≤ 25 dB do nível de audição). A perda auditiva subclínica foi independentemente associada a deficiência cognitiva e a sintomas depressivos, indicando a possibilidade de que o efeito da perda auditiva possa iniciar mais cedo, ainda em fases subclínicas. Fatores de Risco: Os principais fatores de risco associados à perda auditiva em crianças são: - História familiar de perda auditiva na infância. - Permanecer na UTI neonatal por > 5 dias (infecções, ototoxicidade induzida por antibióticos, ruídos, etc). - Anormalidades craniofaciais, incluindo anomalias de orelha. - Síndrome associada à perda auditiva (Síndrome de Alport, Síndrome de Waardenburg). - Doença neurodegenerativa (esclerose múltipla). - Meningite. - Quimioterapia. 5 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 - TCE. Os principais fatores de risco associados à perda auditiva em adultos são: - Idade. - Exposição ao ruído. - História familiar de perda auditiva. - Exposição a medicamentos ototóxicos. - Tabagismo. - Diabetes mellitus. Avaliação Clínica: A avaliação clínica do paciente com queixa de perda auditiva baseia-se em anamnese, exame físico/otorrinolaringológico e exames complementares (audiometria, exames de imagem, etc). Na anamnese, deve-se avaliar a presença das seguintes características: - Perda auditiva abrupta/súbita ou gradual/progressiva. - Excesso de cerúmen e uso de cotonetes. - Introdução de corpo estranho no conduto auditivo externo. - História de otite externa de repetição: presença de otalgia, otorreia, etc. - Presença de pólipo, osteoma ou exostose do conduto auditivo externo. - Realização de atividades associadas à exposição recorrente à água, como mergulho e natação. - História de otite média aguda: presença de febre, otalgia, plenitude auricular, etc. - História de otite média crônica, com ou sem perfuração da membrana timpânica, e/ou de colesteatoma. - História de otite média secretora/serosa: presença de plenitude auricular e história de IVAS e/ou rinite alérgica. - História de TCE com fratura de osso temporal. - Perda auditiva abrupta associada a náuseas, vômitos, vertigem e zumbido sugerem o diagnóstico de labirintite. - Episódios recorrentes de vertigem com perda auditiva flutuante e zumbido sugerem o diagnóstico de Doença de Menière. - História de exposição a níveis altos e sustentados de ruído por meio de utilização de ferramentas elétricas (britadeira, furadeira) ou de atividade de recreação (corridas de automóveis e motocicletas, prática de tiro) associa-se ao diagnóstico de perda auditiva induzida por ruído. - Perda auditiva bilateral gradual/progressiva de evolução insidiosa associada à idade indica o diagnóstico de presbiacusia. Tal padrão de perda auditiva em adultos jovens associa-se ao diagnóstico de otosclerose. - Perda auditiva unilateral associada a vertigem, náuseas, vômitos, zumbido e fraqueza facial sugerem o diagnóstico de neuroma acústico. - Perda auditiva associada a zumbido pulsátile plenitude aural associa-se ao diagnóstico de tumor glômico/schwanoma vestibular. - História familiar de distúrbios auditivos. - História de infecções maternas durante o período pré-natal (infecções congênitas): CMV, sífilis, toxoplasmose. - Uso de medicamentos conhecidamente associados à ototoxicidade (antibióticos aminoglicosídeos). - Presença de doenças sistêmicas, como DM, LES, doença cerebrovascular e esclerose múltipla. No exame físico, deve-se avaliar a presença dos seguintes achados: - Otoscopia: → Presença de excesso de cerúmen no interior do conduto auditivo externo. → Estenose do meato acústico externo por presença de exostose, osteoma ou pólipo. → Eritema e edema da pele do conduto auditivo externo indica o diagnóstico de otite externa. → Perfuração da membrana timpânica. → Abaulamento e hiperemia da membrana timpânica indica o diagnóstico de otite média. → Retração da membrana timpânica e presença de efusão no interior da orelha média indica o diagnóstico de disfunção tubária e/ou otite média secretora/serosa. 6 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 → Presença de hemotímpano pode indicar fratura do osso temporal. → Presença de tumor de localização retrotimpânica associado a otorreia purulenta sugere o diagnóstico de colesteatoma. → Membrana timpânica hipomóvel sugere a presença de efusão no interior da orelha média e/ou hipomobilidade da cadeia ossicular (otosclerose). → Membrana timpânica hipermóvel sugere fratura de ossículo da orelha média e/ou fratura de osso temporal. Se a otoscopia for normal, ou seja, se não houver nenhuma anormalidade do conduto auditivo externo nem da membrana timpânica, a perda auditiva é secundária à doença da orelha média (perda auditiva condutiva) ou à doença da orelha interna (perda auditiva neurossensorial), havendo necessidade de outros testes para realizar o diagnóstico diferencial. - Teste de Rinne: posiciona-se o diapasão sobre o osso mastoide (espaço retroauricular) para avaliar a condução óssea do som e, posteriormente, posiciona-se o diapasão próximo à orelha externa para avaliar a condução aérea do som; normalmente, a condução aérea é mais alta que a condução óssea, indicando teste de Rinne positivo; se a condução óssea do som for mais alta que a condução aérea do som, o teste de Rinne é negativo, indicando a presença de perda auditiva condutiva na orelha examinada. - Teste de Weber: posiciona-se o diapasão sobre a testa, na linha média, e pergunta-se em qual orelha o som é mais alto; se o paciente ouvir o som igualmente em ambas as orelhas, o teste de Weber é normal; se o paciente ouvir o som mais alto em uma das orelhas, o teste de Weber é anormal, indicando a presença de perda auditiva condutiva para o lado em que o som se aproxima ou de perda auditiva neurossensorial para o lado em que o som se afasta; por exemplo, se o teste de Weber apresenta lateralização para a direita, há indicação de perda auditiva condutiva à direita ou de perda auditiva neurossensorial à esquerda. Imagem: Teste de Weber. A: perda auditiva condutiva à direita. B: perda auditiva neurossensorial à direita. Exames Complementares: Os principais exames complementares que podem ser realizados para avaliar a causa da perda auditiva, condutiva, neurossensorial ou mista, são: - Biópsia de lesões suspeitas de malignidade localizadas no conduto auditivo externo. - Swab microbiológico de secreção da orelha externa com o objetivo de direcionar a antibioticoterapia. - Audiometria: → Exame padrão-ouro para confirmar o diagnóstico de perda auditiva, determinar o grau de perda auditiva e diferenciar a perda auditiva condutiva da perda auditiva neurossensorial. → Os principais testes audiométricos são a audiometria tonal, a audiometria vocal e as emissões otoacústicas. 7 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 → A audiometria tonal baseia-se em emissão de sons com frequência de 250-8.000 Hz, mas intensidades variáveis. → A audiometria vocal baseia-se em apresentação de palavras em intensidade de som padrão e em ambiente de ruído. A capacidade de discriminação da fala em ambientes com e sem ruído indica boa resposta à amplificação dos sons. → O gráfico da audiometria representa a via aérea direita (O), a via aérea esquerda (X), a via óssea direita (<) e a via óssea esquerda (>). → No eixo X, representa-se a frequência do som (em Hz). No eixo Y, representa-se a perda auditiva em relação à audição normal (em dB). → As frequências representadas no gráfico da audiometria são: 125 Hz (baixa), 250 Hz (moderada) e 500 Hz (alta). → A audição normal apresenta perda de até 25 dB. A perda > 25 dB indica perda auditiva, que classifica-se em condutiva, neurossensorial ou mista. → Na perda auditiva condutiva, há perda de audição da via aérea, mas a audição da via óssea é normal. → Na perda auditiva neurossensorial, há perda de audição tanto da via aérea quanto da via óssea com a mesma intensidade. → Na perda auditiva mista, há perda de audição tanto da via aérea quanto da via óssea com intensidades diferentes, formando gap entre as 2 curvas. A perda de audição da via aérea é maior que a perda de audição da via óssea. - TC de crânio: → Recomendada em casos de suspeita de fratura de osso temporal, otite média crônica, mastoidite crônica e malformações congênitas da orelha externa, média e/ou interna. 8 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 - RM de crânio: → Recomendada para a investigação de pacientes com perda auditiva neurossensorial unilateral associada ou não a zumbido, principalmente quando há suspeita de neuroma acústico/schwanoma vestibular, tumor glômico e esclerose múltipla. Prevenção Primária: As principais medidas de prevenção à perda auditiva são: - Evitar exposição a ruídos em atividades de trabalho e de lazer (uso de protetor auricular). - Evitar uso de medicamentos ototóxicos e de substâncias químicas potencialmente ototóxicas. - Acompanhar pacientes com otites de repetição. - Evitar traumatismo cranioencefálico (TCE), principalmente de osso temporal. Prevenção Secundária: Os principais testes que podem ser realizados para o rastreamento de perda auditiva, em pacientes que não apresentam queixa de perda auditiva, são: - Esfregar os dedos: o examinador esfrega suavemente os dedos a 15 cm de distância da orelha do paciente; o teste é positivo quando há falha em identificar o som do esfregar dos dedos em ≥ 2 de 6 tentativas. - Teste do sussurro: o examinador sussurra combinações de 6 palavras ou 6 números a 60 cm de distância da orelha do paciente; o teste é positivo quando há falha em repetir ≥ 3 de 6 palavras ou 6 números. - Audiômetro portátil: o examinador utiliza audiômetro próximo à orelha do paciente, emitindo sons com frequência de 1.000- 2.000 Hz; o resultado é positivo quando há falha em identificar os sons emitidos em uma ou em ambas as orelhas. Encaminhamento ao Otorrinolaringologista: O paciente que apresenta perda auditiva deve ser encaminhado ao otorrinolaringologista nas seguintes situações: - Perda auditiva abrupta/súbita ou perda auditiva associada à trauma. - Plenitude auricular. - Infecções graves ou recorrentes da orelha externa ou da orelha média. - Perda auditiva associada à vertigem (possível diagnóstico de labirintite ou Doença de Menière). - Perda auditiva condutiva. - Perda auditiva flutuante. - Falha dos aparelhos auditivos, devido à possibilidade de abordagens alternativas, como o implante coclear. Presbiacusia: - A presbiacusia é definida como a perda auditiva neurossensorial associada ao aumento da idade, ou seja, ao envelhecimento. - A presbiacusia acomete principalmente idosos, sendo mais comum a partir dos 60 anos de idade. - A perda auditiva associada ao envelhecimento é gradual/progressiva e insidiosa, podendo estar associada à presença de zumbido.- O paciente frequentemente relata que ouve, mas que não entende o que é dito. - Na audiometria, a presbiacusia manifesta- se por perda de audição tanto da via aérea quanto da via óssea, com rampa descendente e simétrica, ou seja, em ambas as orelhas. - Inicialmente, a perda auditiva associada à presbiacusia é observada apenas para sons de alta frequência. 9 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 - Em casos de perda auditiva neurossensorial assimétrica sem causa óbvia (otite externa ou otite média com ou sem perfuração timpânica, trauma da orelha, etc), deve-se realizar exame de imagem (RM de crânio) para investigar a causa da perda auditiva, como lesão retrococlear (neuroma acústico ou schwanoma vestibular) como possível diagnóstico diferencial. - Algumas doenças metabólicas também podem causar perda auditiva que manifesta- se com curva semelhante à da presbiacusia na audiometria, exceto o hipotireoidismo, que caracteriza-se por perda auditiva neurossensorial simétrica plana (em linha reta) na audiometria, sem causar rampa descendente. Perda auditiva induzida por ruído: - A perda auditiva induzida por ruído é definida como a perda auditiva associada à exposição crônica a ruídos, principalmente em ambiente de trabalho. - A exposição crônica a sons de alta frequência associa-se à lesão lenta e progressiva do órgão de Corti (estrutura da cóclea), com destruição das células ciliadas externas e internas, resultando em perda auditiva neurossensorial simétrica de evolução gradual e insidiosa que manifesta- se para sons de alta frequência (sons agudos). - A perda auditiva induzida por ruído é mais comum em homens e associa-se à exposição prolongada (ao longo de anos) a ruídos, principalmente em ambiente de trabalho. - À medida que a perda auditiva induzida por ruído evolui, a perda de audição manifesta- se para sons mais graves, ou seja, para sons de frequência mais baixa. - Na audiometria, a perda auditiva induzida por ruído manifesta-se por rampa descendente com padrão “em gota acústica” em frequências de 3.000-6.000 Hz. Doença de Menière: - A perda auditiva associada à Doença de Menière caracteriza-se por perda auditiva neurossensorial abrupta/súbita e assimétrica, que manifesta-se para sons de baixa frequência (sons graves). 10 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 - Na audiometria, a perda auditiva associada à Doença de Menière manifesta-se por rampa ascendente, com perda de audição apenas para sons graves, ou seja, com frequência < 2.000 Hz. - A perda auditiva associada à Doença de Menière também relaciona-se ao diabetes mellitus. Assim, o controle glicêmico associa- se à possibilidade de recuperação da audição para sons de baixa frequência (sons graves). Perda auditiva congênita: - A perda auditiva congênita, ou seja, associada a causas genéticas caracteriza-se por perda auditiva neurossensorial simétrica que manifesta-se para frequências médias. - Na audiometria, a perda auditiva de causa genética caracteriza-se por padrão em “cookie-bite” ou “mordida de biscoito” simétrica em ambas as orelhas. Otosclerose: - A otosclerose representa importante causa de perda auditiva condutiva ou mista unilateral em adultos jovens. A doença caracteriza-se por desmineralização de estruturas da orelha média, principalmente do estribo, diminuindo a sua capacidade de vibração e a transmissão do som em direção à orelha interna (perda auditiva condutiva). Além disso, a otosclerose também pode acometer a cóclea, diminuindo a transmissão do estímulo sonoro em direção ao SNC (perda auditiva neurossensorial). Assim, a otosclerose causa perda auditiva mista (condutiva + neurossensorial). - Na audiometria, a otosclerose avançada caracteriza-se por perda auditiva mista, com perda de audição na via aérea maior que a perda de audição na via óssea, formando gap entre as 2 curvas. Classicamente, a audiometria da otosclerose também caracteriza-se por presença do Entalhe de Carhart, definido como a perda auditiva abrupta/súbita a partir da frequência de 2.000 Hz. Tratamento: O tratamento da perda auditiva depende do tipo de perda auditiva (condutiva, neurossensorial ou mista) e da causa de perda auditiva. O tratamento da perda auditiva condutiva, em geral, é mais fácil que o tratamento da perda auditiva neurossensorial, pois geralmente apresenta causa reversível, como acúmulo de cerúmen no interior do conduto auditivo externo. O tratamento da perda auditiva condutiva associada ao acúmulo de cerúmen na orelha externa baseia-se em uso de ceruminolíticos, lavagem otológica e/ou remoção manual do cerúmen do conduto auditivo externo. O manejo terapêutico da perda auditiva abrupta/súbita, que desenvolve-se em até 72 horas, podendo ser unilateral ou bilateral, baseia-se em realização de audiometria em até 14 dias desde o início dos sintomas, mas idealmente, em até 7 dias desde o início dos sintomas, e corticoterapia em até 14 dias desde o início dos sintomas em casos de perda auditiva abrupta de causa desconhecida. Os corticoides podem ser 11 Bruno Herberts Sehnem – ATM 2023/2 administrados por via oral ou por via intratimpânica. Recomenda-se uso de prednisona ou equivalente na dose de 1 mg/kg/dia (dose máxima de 60 mg/dia) por 7- 14 dias, seguido de diminuição gradual da dose ao longo de 10-14 dias. Os corticoides intratimpânicos podem ser utilizados como alternativa de tratamento aos corticoides sistêmicos ou como terapia de resgate em casos de falha dos corticoides sistêmicos em até 2-6 semanas desde o início dos sintomas. Em casos de perda auditiva abrupta associada à presença de lesão cutânea suspeita de herpes-zóster auricular, deve-se iniciar o uso de aciclovir em até 48 horas desde o início dos sintomas. Além do tratamento das causas reversíveis de perda auditiva, o tratamento da perda auditiva irreversível baseia-se em medidas de suporte, principalmente por meio do uso de aparelhos auditivos/próteses auditivas (aparelho de amplificação sonora individual). As principais adaptações ambientais e estratégias de comunicação recomendadas para pacientes com perda auditiva são: - Sempre considerar a presença de algum grau de perda auditiva em adultos mais velhos. - Não obscurecer a boca com as mãos. - Perguntar ao paciente como ele prefere comunicar-se. - Falar em direção ao melhor ouvido, quando for o caso. - Reduzir ruídos de fundo. - Falar lentamente e não gritar. - Ter a atenção do paciente. - Monitorar os sinais de que o paciente está acompanhando a conversa. - Reformular a frase em vez de repetir. - Anotar os principais pontos da conversa. Causas mais prevalentes de Perda Auditiva Impactação de cerúmen Corpo estranho Tumores benignos (exostose, osteoma, pólipo) Otite externa Otite média aguda Otite média secretora/serosa Colesteatoma Labirintite Perda auditiva induzida por ruído Trauma do conduto auditivo externo Complicação da meningite Acidente vascular cerebral (AVC) Presbiacusia
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