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Ian Dondoni | Gastroenterologia | Medicina Ufes DIARREIA E CONSTIPAÇÃO DIARREIA DEFINIÇÃO • Diminuição da consistência das fezes ou aumento da frequência de evacuações (mais de 3 vezes/dia) • Hábito intestinal normal → até 3 vezes/dia ou até 3 vezes/semana EPIDEMIOLOGIA • Alta mortalidade em idosos e crianças < 5 anos (principalmente em países em desenvolvimento) • Rotavírus → principal causa de diarreia fatal em crianças o Hoje em dia já temos vacina (gotinha) que diminui bastante essa mortalidade pela diarreia pelo rotavírus • Crianças de até 3 anos → em média 3 episódios de diarreia/ano CLASSIFICAÇÕES FISIOPATOLOGIA Ian Dondoni | Gastroenterologia | Medicina Ufes • Absorção de líquidos o Aporte de 10L/dia para o intestino (ingerimos + produzidos pelas nossas secreções) o Maior parte é absorvida no jejuno ▪ Logo, doenças de jejuno afeta a absorção de líquido. Então, diarreias altas, acometendo o intestino delgado, geralmente são mais volumosas, com mais líquido e de maior quantidade o 1 a 1,5L chega no cólon o 10% (100 a 150mL) eliminados nas fezes • Osmolaridade da luz intestinal o Líquido se direciona do compartimento de menor osmolaridade para o de maior osmolaridade o Exemplo → ingestão de açúcares não absorvíveis (manitol e Lactulose) • Mucosa intestinal o Função protetora importante o Barreira física o Aspectos funcionais → secreção de imunoglobulinas, camada de muco e de defensinas que ajudam na barreira de proteção • Sistema nervoso entérico o Mediadores → peptídeo intestinal vasoativo (VIP), somatostatina (inibe a secreção de alguns hormônios), norepinefrina, serotonina, acetilcolina e outros ▪ Uma hipersecreção desses mediadores (hormônios) pode levar a diarreia o Funções → contração da musculatura lisa do intestino (peristalse), transporte de íons, processos absortivo e secretor, funções endócrinas • Microbiota intestinal o Simbiose → saúde da mucosa e modulação do sistema imune o Fatores desreguladores → antibióticos e alterações no pH, por ex. • Motilidade intestinal o Nem toda diarreia é consequência da aceleração do trânsito intestinal! o Diarreia funcional o Diarreia por doenças endócrinas (hipertireoidismo, VIPoma, tumor carcinoide) o Síndrome do Intestino irritável do polo diarreico DIARREIA AGUDA ETIOLOGIA • 80% dos casos → agentes infecciosos (bactérias, vírus e protozoários) • 20% restante → medicamentos, inflamações pélvicas (ex.: apendicite aguda) e isquemia intestinal • Vírus → principal causa de diarreia aguda o Transmissão → fecal-oral (água ou alimento contaminado/pessoa a pessoa) o Surtos epidêmicos o Mais prevalentes → rotavírus e norovírus • Bactérias → segunda causa mais frequente de diarreia aguda o Campylobacter → síndrome de Guillain-Barré (1:1000) ▪ Síndrome de Guillain-Barré • Polineuropatia ascendente que começa nas extremidades • Causado por imunidade cruzada (a imunidade que é criada contra a bactéria acaba atingindo os nervos/neurônios) o Clostridioides difficile → relacionada ao uso de antibióticos o Escherichia coli ▪ Enterotoxigênica, enteroagregante e enteropatogênica → diarreia aquosa Ian Dondoni | Gastroenterologia | Medicina Ufes ▪ Enteroinvasiva e entero-hemorrágica → disenteria (diarreia associada a elementos anormais nas fezes e dor abdominal importante) ▪ Enterotoxigênica → toxina shiga que pode gerar a síndrome hemolítico-urêmica o Salmonella ▪ S. Typhi → febre tifoide o Shigella → diarreia mucossanguinolenta o Staphylococcus → toxina (sintomas 2-8h após ingestão) que agride a mucosa causando diarreia o Vibrio cholerae → diarreia volumosa e alto risco de desidratação o Yersinia enterocolítica → ileíte terminal • Protozoários o Cryptosporidium o Giardia lamblia → pode levar a diarreia crônica com má-absorção o Entamoeba histolytica → a infestação pode causar amebíase invasiva intestinal o Strongyloides stercorallis → strongilodíase disseminada em imunocomprometidos MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS O que devo perguntar na anamnese para um paciente com diarreia? • Fezes gordurosas → mais claras, espumosas e boiam no vaso sanitário • Tempo de evolução da diarreia o Diarreia por toxina → início de 4-24h após a ingesta com melhora em 1-2 dias o Diarreia infecciosa (bactéria, vírus ou protozoário) → início 48h após a ingesta. Virais duram 3-4 dias e bacterianas podem durar até 7 dias. • Dados epidemiológicos o Perguntar se teve contato com indivíduos com histórias semelhantes, epidemias locais o Viagens → diarreia do viajante (agente mais frequente → E. coli) o Refeições em ambiente que não o domicílio o Uso de medicamentos o Internações ou uso de antibióticos recente (fator de risco para infecção pelo Clostridioides difficile Ian Dondoni | Gastroenterologia | Medicina Ufes DIAGNÓSTICO Devo solicitar esses exames para todo paciente com diarreia aguda? Não Então para quem devo pedir exame de fezes? Pedir para os pacientes que tenho que ter certeza do agente etiológico → imunossuprimidos, febre, sangue nas fezes, persistência maior que 1 semana da diarreia. CASO CLÍNICO Para esse paciente é mandatório solicitar exames diagnósticos? Não, pois o paciente não tem nenhuma imunossupressão. Prescrever um soro, probiótico, orientar dieta. TRATAMENTO • Hidratação → VO ou IV • Medicamentos antidiarreicos → Loperamida (exceto naquelas com disenteria) ou Rececadotrill (propriedade antissecretória) • Antibióticos o Primeira escolha → ciprofloxacina ou levofloxacina (3 dias) o Alternativa → sulfametoxazol-trimetoprim (5 dias) o Clostridioides → Vancomicina VO. Casos recorrentes → transplante fecal. Ian Dondoni | Gastroenterologia | Medicina Ufes DIARREIA CRÔNICA ETIOLOGIAS • Síndrome do Intestino Irritável • Diarreia funcional → doenças funcionais • Diarreia colerética → diarreias que acontecem após a retirada da vesícula ou do íleo terminal • Deficiência de lactose → intolerância à lactose • Diarreias relacionadas a dieta → uso excessivo de adoçantes (Sorbitol), cafeína, álcool (efeito direto sobre a mucosa causando diarreia) • Neoplasia colorretal • Doença Inflamatória Intestinal (doença de Crohn e retocolite ulcerativa) • Colites microscópicas (colite colagenosa e colite linfocíticas) • Doença celíaca → intolerância relacionado ao glúten • Medicamentos → antibióticos, AINEs, metformina, medicamentos contendo Mg • Supercrescimento bacteriano → uso de inibidor de bomba de prótons, diabetes, cirurgias abdominais • Colite isquêmica • Pancreatite crônica → esteatorreia em casos mais avançados por má absorção devido a diminuição das enzimas pancreáticas/digestivas • Enteropatia actínica • Hipertireoidismo → por hiperestimulação da motilidade • Diabetes → pode acometer a parte neuronal da mucosa causando diarreia • Infecções (giardíase, Clostridioides, HIV) • Doença de Whipple → doença infecciosa pela Tropheryma whipplei • Tumores hormônio-secretores (VIPoma, gastrinoma, tumores carcinoides) • Cirurgia by-pass gástrico, colectomia, ressecção ileal, colecistectomia, gastrectomia • Gastroenterite eosinofílica • Diarreia factícia → diarreia por abuso de laxativos MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS • Peculiaridades da anamnese e exame físico o História da doença atual ▪ Esteatorreia, restos alimentares nas fezes (pode sugerir uma má absorção), bloating (sensação de muitos gases e distensão abdominal), cólica abdominal, perda de peso e edema → pensar em causas absortivas ▪ Fazer diário alimentar com o paciente (avaliar ingestão de lactose, adoçantes, cafeína, álcool etc) ▪ Febre e dor abdominal → pensar em diarreias inflamatórias o Interrogatório sintomatológico ▪ Manifestações extraintestinais da doença inflamatória intestinal → dor articular, alterações oculares, lesões de pele (eritema nodoso, pioderma gangrenoso),úlceras orais ▪ Dermatite herpetiforme → doença celíaca ▪ Sinais/sintomas de disabsorção → parestesia, ataxia, glossite (vitamina B12) o História patológica pregressa ▪ Comorbidades → diabetes, hipertireoidismo, pancreatite crônica, HIV ▪ Uso de medicamentos → antibióticos, AINEs, metformina ▪ Radioterapia prévia → lesões na mucosa intestinal secundárias a radioterapia (enteropatia actínica) Ian Dondoni | Gastroenterologia | Medicina Ufes ▪ Cirurgias prévias → by-pass, colectomia, gastrectomia, ressecção ileal, colecistectomia o História familiar ▪ Neoplasia colorretal, doença inflamatória intestinal, doença celíaca, diabetes DIAGNÓSTICO • História clínica e exame físico detalhados permitem o diagnóstico etiológico da diarreia crônica em 25-50% dos casos!!!! • Avaliação inicial o Hemograma → para avaliar anemia e leucocitose o Eletrólitos → para ver perda o PCR → marcador inflamatório o Albumina → para avaliar algum grau de desnutrição, se você suspeita de uma diarreia má absortiva (disabsortiva) o Ferritina, vitamina B12, vitamina D, ácido fólico → para avaliar a absorção o Anti-transglutaminase IgA, IgA total → rastreio para doença celíaca o Glicemia de jejum e Hb glicada → investigação de diabetes o TSH e T4 livre o Anti-HIV o Parasitológico de fezes (3 amostras) o Calprotectina fecal → componente que deriva da degranulação de neutrófilos ▪ Quando temos um processo inflamatório intestinal, temos muitos neutrófilos circulantes. Esses neutrófilos, quando degranulam, liberam calprotectina que é pouco absorvida no intestino, então quase tudo que é produzido é secretado nas fezes ▪ Calprotectina elevada = acima de 200-250 → pode ter uma doença inflamatória no intestino ▪ VPN que é o mais importante → calprotectina abaixo de 50, a chance de ter alguma inflamação intestinal é muito pequena. Provavelmente esse paciente tem alguma doença funcional (p. ex. Síndrome do Intestino Irritável) o Investigação para Clostridioides se história sugestiva → paciente internado recentemente, que recebeu algum antibiótico recentemente Nesses casos devemos pensar em uma investigação mais aprofundada (colonoscopia, endoscopia e tomo ou RNM). Se o paciente tem <40 anos, sem sinais de alarme e com critérios para síndrome do intestino irritável/diarreia funcional, não é necessária nenhuma investigação adicional! • Síndrome do Intestino Irritável → dor abdominal que se relaciona com a evacuação e melhora depois de evacuar e é associada a alteração da frequência e/ou da consistência das evacuações • Diarreia funcional → alteração da frequência e/ou da consistência das evacuações sem dor abdominal Ian Dondoni | Gastroenterologia | Medicina Ufes Se com história clínica, o exame físico, os exames laboratoriais/endoscópicos/imagem não foi possível chegar ao diagnóstico etiológico da diarreia → pensar em causas mais raras • Tumores hormônio-secretores → gastrina de jejum, calcitonina, somatostatina, VIP, 5-HIAA em urina (o ácido 5-HIAA é um metabólito da serotonina que é um hormônio produzido por tumor carcinoide → causa de diarreia secretora • Diarreia factícia → diarreia por abuso de laxativos TRATAMENTO • Tratamento etiológico específico • Tratamento empírico para casos selecionados • Tratamento sintomático Tratamento etiológico específico Tratamento empírico para casos selecionados • Antibioticoterapia empírica para supercrescimento bacteriano (Rifaximina, tetraciclina, sulfametoxazol-trimetoprim, metronidazol, ciprofloxacina etc) → por 14 dias o Se o paciente tem recorrência dos sintomas → ciclos de antibióticos (1 semana por mês ele vai usar 1 antibiótico diferente) • Restrição de lactose da dieta de pacientes com clara relação dos sintomas com a ingesta o Ficar 2 semanas sem ingerir lactose para ver se tem melhora • Colestiramina na suspeita de diarreia colerética o Colestiramina é um quelante de sal biliar → quelar o sal biliar e diminuir o contato com a mucosa intestinal Tratamento sintomático • Antidiarreicos → Loperamida, racecadotrila • Análogos de somatostatina (Octreotide) → inibe a secreção de hormônios (tumor carcinoide) Ian Dondoni | Gastroenterologia | Medicina Ufes CONSTIPAÇÃO INTESTINAL DEFINIÇÃO • Cíbalos: fezes em bolinhas • Critérios da Síndrome do Intestino Irritável: dor abdominal que melhora após a evacuação associada a alteração tanto da frequência quanto da consistência das fezes EPIDEMIOLOGIA • Prevalência → 2 a 28% • Fatores de risco o Idade → prevalência aumentada em idosos o Sexo feminino → 1,5 a 3x mais frequente em mulheres o Baixo nível socioeconômico o Ingestão inadequada de fibras e líquidos o Baixo nível de atividade física o Gravidez → prevalência de 11 a 38% ETIOLOGIA E FISIOPATOLOGIA • Constipação intestinal secundária a alguma doença • Constipação intestinal funcional (idiopática) Constipação intestinal secundária Ian Dondoni | Gastroenterologia | Medicina Ufes • Doença de Hirschsprung: doença genética em que o paciente começa a ficar constipado desde que nasceu, costuma dar megacólons enormes e tem relação com o sistema nervoso entérico → paciente não produz os gânglios que são responsáveis pela motilidade intestinal corretamente Constipação intestinal funcional (idiopática) • Trânsito colônico normal • Trânsito colônico lento o Inércia colônica → casos mais graves ▪ Sem aumento da motilidade colônica após as refeições ou uso de estimulantes (bisacodil ou neostigmina) ▪ Diminuição dos plexos mioentéricos e das células de Cajal que atuam na motilidade colônica • Distúrbio de defecação (na hora de expulsar as fezes) o Evacuação retal prejudicada → alteração nas forças propulsoras do reto e/ou aumento da resistência à evacuação o Anismo, contração paradoxal do músculo puborretal, discinesia ou dissinergia do assoalho pélvico (durante a contração do reto, ao invés de relaxar a musculatura do esfíncter anal, ela contrai) o Fatores desencadeantes → trauma, dano obstétrico e abuso sexual Manometria anorretal. MANIFESTAÇÕES CLÍNICAS • História da doença atual o Forma das fezes o Frequência das evacuações o Esforço evacuatório o Sensação de evacuação incompleta o Necessidade de manobras manuais o Sangramento nas fezes o DIÁRIO ALIMENTAR • História patológica pregressa o Comorbidades (diabetes, hipotireoidismo, doenças neurológicas) o Uso de medicamentos • História familiar o Neoplasia colorretal Classificação de Bristol. Ian Dondoni | Gastroenterologia | Medicina Ufes • Exame físico o Distensão abdominal o Massas palpáveis o Exame da região perianal ▪ Inspeção → fissuras, hemorroidas, lesões neoplásicas, prolapso retal ▪ Toque retal → esfíncter anal hipertônico ou assimetria na contração ▪ Ausência de relaxamento do esfíncter e músculo puborretal junto com a contração abdominal ao solicitar o paciente para simular defecção • Na presença de sinais de alarme → fazer colonoscopia ou fazer enema opaco (RX contrastado do cólon), TSH, T4 livre, glicemia de jejum, cálcio • IMPORTANTE! Para aqueles pacientes sem sinais de alarme recomenda-se como exame complementar apenas um hemograma. Iniciar tratamento empírico para esses casos sem a necessidade de solicitação de nenhum outro exame. Introdução de uma sonda pelo canal anal do paciente e vai pedindo para o paciente fazer diversas manobras (relaxar, fazer força de evacuar) e essa sonda vai medindo as pressões da musculatura retal. Ian Dondoni | Gastroenterologia | Medicina Ufes Defecografia: para ver como que a musculatura se comporta quando o paciente faz manobras de evacuação. Paciente ingere cápsulasradiopacas → avaliar com qual velocidade essas cápsulas saem → dentro de 5 a 7 dias repate o RX de abdome, se tiver mais de 20% das cápsulas que você deu para o paciente ainda retidas no intestino, você pode inferir que esse paciente tem um tempo de trânsito colônico lento. TRATAMENTO • Medidas gerais: o Atividade física regular o Aumento da ingesta de líquidos e fibras o Criar o hábito de evacuar depois das refeições o Suspender medicamentos constipantes, se possível PEG (Polietilenoglicol – Muvinlax). Ian Dondoni | Gastroenterologia | Medicina Ufes • Biofeedback: fisioterapia da musculatura do assoalho pélvico. • Cirurgia o Inércia colônica → colectomia total o Retocele ou prolapso retal
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