Prévia do material em texto
@NOVAIISVITORIA VITÓRIA NOVAIS – MEDICINA UFJF 1 FARMACOLOGIA IV CASO CLÍNICO – DIABETES MELLITUS: MCS, 62 anos, pardo, caminhoneiro, residente em Juiz de Fora e natural de Santos Dumont, sem acompanhamento médico há dois anos, chega ao seu consultório para “controle da saúde”. Senhor MCS é sabidamente hipertenso há 16 anos, obeso (IMC 34,5), portador de DM tipo 2 há 12 anos. Está em uso de Metformina 850 mg, 3 comprimidos ao dia, num total de 2550 mg por dia e de Glibenclamida 5mg, 4 comprimidos ao dia, totalizando 20 mg diários. Além dos hipoglicemiantes orais, utiliza Hidroclorotiazida 25mg, Nifedipino 30mg. Durante a consulta você avalia a PA de M.C.S e encontra um valor de 138 x 82 e presença de certo hálito cetônico, sem demais alterações no exame físico a não ser um sinal típico de resistência à insulina – a Acantose Nigricans: MCS relata ainda perda de peso nos últimos 3 meses, sem ter feito quaisquer mudanças na dieta ou na atividade física (perda ponderal de 6 kg, de 108 para 102kg). Quinze dias após a consulta, senhor MCS retorna ao seu ambulatório e traz os exames solicitados: Glicemia de jejum: 188 Hemoglobina glicada: 9,2 Creatinina: 1,6 (TFG estimada pelo método MDRD 46,7) DRC estágio III Alguns dados da história do senhor chamam a sua atenção para a falência endócrina do pâncreas- longa data do DM, perda ponderal recente inexplicável, ausência de controle glicêmico com doses máximas de biguanida e sulfoniluréia. Foram dadas as orientações adequadas sobre uma dieta rigorosa e prática de atividade física regular. Agora é necessário ajustar os medicamentos do paciente. Responda de forma concisa: 1) a) Explique o mecanismo de ação das Sulfoniluréias e seus efeitos colaterais. @NOVAIISVITORIA VITÓRIA NOVAIS – MEDICINA UFJF 2 FARMACOLOGIA IV As sulfoniluréias são fármacos higlicemiantes que reduzem a glicemia através da estimulação da secreção de insulina pelo pâncreas. Seu mecanismo de ação consiste em bloquear os canais de potássio sensíveis a ATP na célula beta pancreática o que resulta em redução do efluxo de potássio que leva a uma despolarização transiente pelo influxo de sódio na célula. Tal influxo de sódio promove a abertura de Canais de Cálcio Voltagem Dependentes com consequente influxo de cálcio que, por sua vez, mobiliza vesículas contendo insulina e a libera no plasma. Como consequência da maior liberação de insulina, o uso de sulfoniluréias pode levar a hipoglicemia e, em casos mais graves, coma. Assim, são contraindicadas para gestantes, etilistas, hepatopatas, nefropatas, lactantes e idosos. b) Quais os cuidados devemos tomar com o uso da metformina neste paciente? A metformina é um anti-hiperglicêmico da classe das biguanidas e, por isso, atua aumentando a atividade da enzima AMPK que participa da sinalização intracelular da insulina, melhorando o quadro de resistência insulínica através da melhor sensibilização dos tecidos à mesma. Dessa forma, ela evita episódios de hiperglicemia e raramente causa hipoglicemia. No entanto, este paciente apresenta sinais que contraindicam o uso de metformina como: hálito cetônico, um indicativo de acidose metabólica (cetoacidose diabética) e doença renal crônica em estágio 3 com creatinina levemente aumentada e taxa de filtração glomerular diminuída. Além disso, adicionado ao fato de o paciente apresentar doença renal crônica com diminuição da função renal, ele faz uso de anti-hipertensivo (hidroclorotiazida) e nifedipino, dois medicamentos que também interferem na função renal. 2) Além das sulfoniluréias e das biguanidas, que outras classes de drogas orais existem para tratar o DM2? Explique os seus mecanismos de ação e suas vantagens terapêuticas. Considerando que as glinidas possuem mesmo mecanismo de ação e efeitos adversos que as sulfonilureias, outros fármacos que podem ser usados para o tratamento do diabetes mellitus tipo 2 são os pertencentes às classes de agonistas do receptor de GLP-1, Inibidores da DPP-4, Tiazolidinadionas e Inibidores do SGLT2. Além das insulinas, nos casos mais graves de DM 2. Sobre seus mecanismos de ação e vantagens terapêuticas: 1) Os Agonistas do Receptor de GLP-1 são fármacos hipoglicemiantes que ativam o receptor de GLP-1 na célula beta-pancreática estimulando a síntese e secreção de insulina, pois este receptor é uma incretina (um hormônio insulinotrópico). Suas vantagens são a redução da hemoglobina glicada, perda de peso e possibilidade de administração única diária (liraglutida subcutânea antes da refeição). 2) Os inibidores da DPP-4 também são hipoglicemiantes que diminuem a glicemia através da maior secreção de insulina. Entretanto, seu mecanismo de ação é diferente do anterior. Os inibidores da DPP-4, provocam o aumento das incretinas através da inibição da DPP-4, uma enzima que inativa as incretinas GIP e GLP-1 e, dessa forma, essas incretinas não são @NOVAIISVITORIA VITÓRIA NOVAIS – MEDICINA UFJF 3 FARMACOLOGIA IV inativadas e aumentam em concentração no plasma, levando à maior secreção de insulina. São administrados por via oral em dose diária única e atuam por 12 horas. 3) As Tiazolidinadionas são, assim como as biguanidas, fármacos anti- hiperglicêmicos e, por isso, atuam de maneira diferente das duas classes anteriores. Os anti-hiperglicêmicos são fármacos que evitam a hiperglicemia ao tratar a resistência à insulina. As Tiazolidinadionas atuam como agonistas do receptor nuclear PPARγ que, ao ter sua ativação aumentada, modulam a transcrição gênica melhorando o quadro de resistência insulínica. Possui efeitos semelhantes aos da metformina e, quando comparada à metformina, a troglitazona tem maior efeito potencializador da ação periférica da insulina e menor efeito em diminuir a produção hepática de glicose. A associação de tiazolidinediona com metformina é interessante, pois tem efeitos aditivos. 4) Os inibidores do SGLT2 são uma classe mais recente e, na maioria das vezes, são usados em associação a outras classes. O SGLT2 é um co-transportador de sódio-glicose nos rins e, por isso, reduzem a glicemia através do aumento da excreção de glicose pela urina. Apresentam vantagens de reduzirem também os eventos cardiovasculares e renais e, consequentemente, a mortalidade. Reduzem a hemoglobina glicada, o peso e a esteatose hepática. 3) O que você sugeriria fazer neste caso descrito, no qual persiste elevada a glicemia de jejum a despeito da associação de 2 hipoglicemiantes orais em doses máximas? Inicialmente, sugeriria a troca da associação entre metformina (biguanida) e glibenclamida (sulfolinuréia) por outra associação. Um sensibilizador de insulina como, por exemplo, a tiazolidinadiona rosiglitazona que não tem sua farmacocinética alterada pela insuficiência renal leve a moderada, associada a inibidores do SGLT2 (dapagliflozina,, empagliflozina e canagliflozina), pois estes reduzem os eventos cardiovasculares e renais além de diminuírem a glicemia, HbA1c, dentre outras vantagens. Além das instruções a cerca da importância de mudar os hábitos alimentares e dar início à prática regular de atividade física. 4) Explique um esquema inicial de insulinoterapia para o paciente, no qual você mantenha a medicação oral. Inicialmente, um esquema de insulinização para este paciente seria a associação da medicação oral com a insulina. Neste caso, considerando que o paciente possui contraindicação para o uso de metformina, o único sensibilizador de insulina possível é a rosiglitazona. Dessa forma, associaria este anti-hiperglicêmico (para melhorar a resistência insulínica do paciente) à insulina noturna. Caso, ainda assim, o paciente não apresentasse melhora, a ultima opção de tratamento passa ser a insulinização plena. 5) Após tentar o esquema inicial, passado 4 meses, MCS é relutanteem seguir a dieta e tem apresentado grande dificuldade de controlar sua glicemia. Traz exames: @NOVAIISVITORIA VITÓRIA NOVAIS – MEDICINA UFJF 4 FARMACOLOGIA IV Glicemia de jejum: 240, HbA1c: 11,3, glicemia pós prandial 290. Você decide por abandonar as medicações orais e iniciar a insulinização plena de MCS. Esquematize um esquema de insulinoterapia intensiva para o paciente (agora com 96kg). A indicação da insulina no tratamento do DM2 reserva-se para diabéticos sintomáticos, com hiperglicemia severa, cetonemia ou cetonúria, ou para diabéticos que não respondam ao tratamento com dieta, exercício e/ou hipoglicemiante oral, anti-hiperglicemiante ou sensibilizadores da ação de insulina, que é o caso do paciente em questão. A insulina humana e a insulina suína associam-se frequentemente em hexâmeros e a velocidade de dissociação em monômeros e a de absorção pelo subcutâneo são lentas. Como consequência, a glicemia 1 a 2h após a refeição se eleva muito. Quando se administra insulina regular ou simples por via subcutânea resulta numa inapropriada hiperinsulinemia (4 a 5h após), a qual aumenta a chance de hipoglicemia entre as refeições. Os análogos de insulina de ação mais rápida do que a insulina humana diminuem este risco. Diversos tipos de análogos de insulina já foram recentemente sintetizados: a lispro, a aspart e a glargina. A insulina lispro (Humalog), tem ação ultra-rápida e a lispro NPL (neutralprotamine lispro), tem ação intermediária. A lispro tem troca das posições da prolina e lisina na cadeia beta da insulina, com mais rápida dissociação de dímeros e hexâmeros em monômeros, com mais rápida absorção e ação da insulina. O pico da lispro ocorre 1h após sua administração, com duração de efeito durante 4h. A insulina aspart (Novorapid) tem uma substituição de prolina por ácido aspártico na posição 28 da cadeia beta da insulina e o seu pico e duração de ação é semelhante à insulina lispro. A insulina glargina (Lantus), tem ação intermediária, a qual tem modificação no peptídio terminal da cadeia beta da insulina com adição de duas moléculas de arginina e troca do aminoácido asparagina por glicina na cadeia alfa da insulina, o que lhe confere maior estabilidade e absorção contínua, mais lenta e mais prolongada, sem pico, o que a difere da insulina NPH, com menos episódios de hipoglicemia noturna. A insulina glargina não deve ser misturada com insulinas de ação rápida, mas pode ser associada à insulina lispro. Dessa forma, uma opção de esquema para insulinização plena deste paciente, é a associação entre 3 ou 4 doses de insulina bolus ou pré-prandial a uma dose de uma insulina de longa duração (basal). Neste caso, a insulina lispro associada à glargina é uma boa opção.