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Conversão Pastoral - José Carlos Pereira

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2
ÍNDICE
Capa
Rosto
Introdução
Capítulo I - O documento 100 da CNBB e seu contexto
Capítulo II - Sinais dos tempos, sinais da igreja
Capítulo III - Paróquia, comunidade de comunidades. Vida e missão
Capítulo IV - A paróquia: Evolução e conversão pastoral
Capítulo V - A comunidade como resultado da conversão pastoral
Capítulo VI - Renovação paroquial. Os sujeitos da conversão pastoral
Capítulo VII - As proposições para a conversão pastoral da paróquia em comunidade de comunidades
Considerações finais
Questões para reflexão
Coleção
Ficha Catalográfica
3
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“A conversão pastoral de nossas comunidades
exige que se vá além de uma pastoral de mera conservação
para uma pastoral decididamente missionária.”
(Documento de Aparecida, n. 370)
4
INTRODUÇÃO
A palavra conversão significa, entre outras coisas, transformação,
mudança, alteração de sentido, de rumo ou de direção; substituição de uma
coisa por outra; mudança das características de uma ação ou procedimento;
mudança fundamental de atitude ou opinião; passagem de uma atitude oposta
ou neutra a outra. Enfim, há muitos significados, porém todos são similares.
Quando falamos de conversão pastoral, podemos empregar qualquer uma
dessas definições, pois estamos falando de mudança de prática pastoral,
passando de uma modalidade que comprovadamente não está mais dando o
resultado esperado para outra, que promete renovar as estruturas da paróquia.
Em poucas palavras, seria mais ou menos isso, mas o Documento 100 da
CNBB completa bem essa definição.
Ao tratar da conversão pastoral, o Documento 100 não dá uma definição
precisa do termo, mas deixa claro o que se quer quando se fala de conversão
pastoral: “a conversão pastoral que o texto propõe recorda as palavras do
papa Francisco: quero lembrar que a pastoral nada mais é que o exercício da
maternidade da Igreja. Ela gera, amamenta, faz crescer, corrige, alimenta,
conduz pela mão...” (Doc. 100, p. 12), ou seja, a proposta aqui é redescobrir
as entranhas maternas dessa Igreja, voltando para essa perspectiva do
acolhimento, como a mãe acolhe o filho. Assim, conversão aqui quer dizer
voltar àquilo que a Igreja tem como princípio, mas que por muitos fatores e
situações se desviou. Por outro lado, o Documento lembra que essa conversão
das paróquias em Comunidade de comunidades é uma volta às origens das
primeiras comunidades cristãs.
Explica também o Documento 100 que conversão implica o abandono de
um caminho e a escolha de outro, para passar de uma pastoral de mera
conservação para uma pastoral decididamente missionária (n. 51). Temos
aqui a explicação mais clara e objetiva do Documento 100 sobre conversão
pastoral. Ela é, portanto, uma mudança de postura, de prática, que supõe uma
mudança de mentalidade, ou seja, uma conversão pastoral supõe uma
conversão pessoal — elas andam juntas (n. 55) — e “remete a uma renovada
conversão a Jesus Cristo” (n. 52).
Assim sendo, este livro propõe refletir sobre o Documento 100, tendo como
eixo de reflexão a conversão pastoral. Para tanto, propomos um mergulho no
5
Documento, parte por parte, para extrair dele os princípios e os procedimentos
básicos para que essa conversão aconteça de fato e renove as estruturas de
nossas paróquias, transformando-as em Comunidade de comunidades.
Dividimos essa reflexão em sete partes, passando capítulo por capítulo do
Documento, e tocando naquilo que é essencial. No primeiro capítulo deste
livro, falamos do Documento 100, numa visão geral e conjuntural, mostrando
de modo panorâmico seus textos e contextos. O segundo capítulo traz os
sinais dos tempos como sinais para a Igreja pensar as mudanças, a conversão,
e agir, respondendo aos desafios. No terceiro capítulo enfocamos a vida e a
missão da Igreja nesta paróquia que está em processo de mudança, passando
de uma estrutura centralizadora para uma Comunidade de comunidades,
setorizada em unidades menores. Esse capítulo faz uma ponte com o
seguinte, no qual mostramos a evolução da paróquia e a conversão pastoral
que começa a se concretizar. No quinto capítulo vemos a comunidade como
resultado da conversão pastoral. No sexto, enfocamos a renovação paroquial
e os sujeitos da conversão pastoral. Por fim, o sétimo capítulo e as
considerações finais tratam da parte mais prática, ou seja, as proposições para
a conversão pastoral, de modo que a paróquia se torne uma Comunidade de
comunidades.
Em suma, este livro foi elaborado tendo em vista ajudar as comunidades a
se aprofundarem no Documento 100 da CNBB, entendendo cada parte e o seu
todo. Assim ficará mais fácil colocá-lo em prática.
6
CAPÍTULO I
O DOCUMENTO 100 DA CNBB E SEU CONTEXTO
Coloco aqui uma série de textos curtos que visam esmiuçar o Documento
100 da CNBB, com o objetivo de conhecê-lo para aplicá-lo no dia a dia de
nossas paróquias. A ideia é explicá-lo, numa linguagem simples e didática,
para que todos entendam não apenas o seu conteúdo, mas também sua
didática, ou método, e os seus propósitos, que vêm coroar uma caminhada da
Igreja no Brasil, despontada na V Conferência do Episcopado Latino-
americano e do Caribe, ocorrida em Aparecida, em 2007. Essa conferência
originou o Documento de Aparecida e um Projeto de Evangelização de
dimensões continentais, conhecido como Missão Continental, do qual a Igreja
no Brasil participa efetivamente com o Documento (n. 88) O Brasil na missão
continental.
Assim, antes de tratar do Documento 100 propriamente dito, é preciso
voltar um pouco no tempo e fazer um breve resgate do seu contexto e dos
documentos que o antecederam. Para encurtar a história, começamos em
2007, com o Documento de Aparecida. Podemos afirmar que esse documento
é um dos mais importantes que a Igreja produziu nos últimos anos. Do
Documento de Aparecida surgiram outros, inclusive a Exortação Apostólica
Evangelii Gaudium, do papa Francisco, porém todos fundamentados e
referendados nesse documento tão importante para a vida pastoral e
missionária da Igreja, de modo que, embora sejam documentos novos, não
trazem novidades além daquilo que o Documento de Aparecida traz. Todos
esses documentos, inclusive o Documento 100, são aprofundamentos do
Documento de Aparecida, que representam tentativas concretas de fazer com
que os propósitos pastorais e missionários do Documento de Aparecida sejam
aplicados ou vividos na prática pastoral de nossas paróquias.
Desse modo, entendemos o nascedouro do Documento 100. Antes, porém,
de se ter elaborado esse documento, outros igualmente importantes foram
produzidos, num processo contínuo de avanço da missão evangelizadora da
Igreja, cuja meta é resgatar ou imprimir uma identidade missionária em sua
existência. Entre esses documentos, encontram-se o Documento da Missão
Continental (n. 88), como já foi dito, as Diretrizes Gerais da Ação
Evangelizadora da Igreja no Brasil: 2011-2015 (n. 94), o Documento de
7
Estudos da CNBB (n. 104), entre outros. Esses documentos foram como que
afunilando propostas do Documento de Aparecida, até obtermos o que temos
hoje no Documento 100, que representa a proposta mais inovadora da Igreja
no Brasil quanto à renovação de suas estruturas. Como introdução, vejamos
rapidamente cada um deles.
O Documento de Aparecida despertou a consciência para a necessidade da
missão. Nossa Igreja (dioceses e paróquias) precisa resgatar urgentemente a
sua dimensão missionária para não correr o risco de perder aquilo que lhe é
essencial: a evangelização. No entanto, para que isso aconteça, é fundamental
que cada batizado recupere sua missionariedade recebida no batismo, isto é, a
sua missão profética, e para isso é preciso uma série de medidas – entre elas,
que nos tornemos verdadeiros discípulos missionários. Mas esse resgate não
se faz num passe de mágica. É preciso que a Igreja tome algumas iniciativas
fundamentais, como, por exemplo, a de renovar suas estruturas, passando de
uma pastoral de manutenção para uma pastoral decididamente missionária.
Mas isso não se faz sem mudança de mentalidade. Além disso, essa iniciativanão pode ser apenas teórica, é preciso que sejam apontados caminhos
concretos, e esses caminhos foram delineados no Projeto de Evangelização da
Missão Continental. Assim, os sujeitos principais dessa missão são as
dioceses, nas quais as orientações de Aparecida devem impregnar a Igreja
particular para que, a partir das dioceses, passando pelas paróquias e, nas
paróquias, em cada comunidade e em cada fiel, leigos e consagrados, essas
mudanças aconteçam. Como o próprio nome diz, a Missão Continental é para
a Igreja de um continente, o continente Latino-americano e o Caribe. A Igreja
no Brasil, empenhada nessa missão, lançou um documento próprio, o Projeto
Nacional de Evangelização, o Brasil na Missão Continental (n. 88), cujo
objetivo é colocar a Igreja do Brasil em sintonia e em comunhão com todas as
Igrejas particulares (dioceses) da América Latina e Caribe, que estão
empenhadas nas propostas da Conferência de Aparecida.
No caminho aberto pela V Conferência de Aparecida e pelo Projeto Nacional
de Evangelização, a Missão Continental, a Igreja no Brasil ampliou suas ações
nessa linha com as DGAE (Diretrizes Gerais da Ação Evangelizadora da Igreja
no Brasil: 2011-2015), nas quais foram apontadas as cinco urgências na
ação evangelizadora. Essas urgências foram extraídas do Documento de
Aparecida e ressaltadas nas DGAE/2011-2015. São elas: 1) Igreja em estado
permanente de missão; 2) Igreja: casa de iniciação cristã; 3) Igreja: lugar de
8
animação bíblica da vida e da pastoral; 4) Igreja: Comunidade de
comunidades; 5) Igreja a serviço da vida plena para todos. Dessas cinco
urgências, foi escolhida uma, a quarta urgência, como a urgência das
urgências. Assim sendo, foi escolhida a urgência “Igreja: Comunidade de
comunidades” como a primordial entre todas as urgências. Sem atender essa
urgência, as demais dificilmente seriam alcançadas.
Por que essa é a urgência das urgências? Porque a Igreja no Brasil
percebeu que se nossas paróquias não forem verdadeiras comunidades, elas
perdem a razão de ser e de existir. A comunidade é a base de tudo na Igreja.
Se numa paróquia não existir comunidade, ou vida de comunidade, ela pode
ser qualquer coisa, uma empresa, por exemplo, mas não será Igreja no
sentido estrito do termo. Portanto, a comunidade é a “tábua de salvação” da
Igreja. Em vista disso, todos os esforços devem ser canalizados para
transformar as paróquias em Comunidade de comunidades. Mas não qualquer
comunidade. Comunidade no sentido bíblico do termo, inspirada nas primeiras
comunidades cristãs. Daí nasceram propostas como as da setorização da
paróquia em unidades menores, de modo que cada setor se transforme numa
célula viva da paróquia e as paróquias sejam células vivas da diocese.
A Igreja no Brasil lançou o Documento de Estudos (n. 104) “Comunidade
de Comunidades: uma nova paróquia”, para que todas as dioceses pudessem
estudar as indicações desse documento e enviar sugestões e emendas à CNBB,
para que fosse elaborado um documento definitivo com essa temática, e com
as propostas que fossem pertinentes no processo de renovação de nossas
paróquias, para que se tornem Comunidade de comunidades. O Documento de
Estudos abordou temas medulares da vida da Igreja, como os grandes
desafios que teremos para viver essa urgência da evangelização, que é a vida
de comunidade, fundamentada nas primeiras comunidades cristãs que
encontramos no livro dos Atos dos Apóstolos. Entre esses desafios, foram
apontados empreendimentos no âmbito da pessoa, da comunidade e da
sociedade, e constatada e indicada a urgência da renovação paroquial. Porém,
essa renovação só será possível se houver conversão pessoal e pastoral. Com
base nesses dois grandes desafios, temos, assim, o Documento 100, que
preservou como tema e objetivo geral a Igreja, Comunidade de comunidades,
acrescentando um complemento — uma nova paróquia — evidenciando a
necessidade da renovação paroquial acenada no Documento de Estudos (n.
104) e nos que o antecederam. Além disso, o Documento 100 acrescentou
9
um subtítulo que explicita ainda mais o seu objetivo: a conversão pastoral da
paróquia.
Conversão significa mudança de rumo e direção, mudança de estruturas,
mudança de mentalidade, enfim, mudança na maneira de pensar e de agir.
Não dá mais para permanecer num modelo de paróquia que desenvolve suas
ações em torno da manutenção estrutural (do templo) e sacramental, sem
compromisso com a vida de comunidade. Esse modelo de paróquia, ainda
predominante no Brasil, não faz a diferença na sociedade, e se ela não faz
diferença, não faz falta, e se não faz falta não tem razão de existir.
Permanecer nesse modelo é assinar um atestado de fracasso na missão.
Percebendo isso, o Documento 100 tratou de trazer para estudo e ação
situações e elementos que são fundamentais para a renovação da paróquia,
começando pela conversão pessoal e pastoral de todos, sobretudo de quem
está à frente, como bispos, padres e demais agentes de pastoral, leigos e
consagrados.
Na esteira do Documento de Aparecida e das Diretrizes Gerais da Ação
Evangelizadora da Igreja no Brasil: 2011-2015, o Documento 100 fez uso do
método “ver, julgar e agir”, mostrando que essa é a metodologia mais
indicada para aplicar o seu conteúdo em nossas paróquias. Assim,
conhecendo o seu conteúdo, sua estrutura e seu método, o passo seguinte é
viabilizá-lo e aplicá-lo, de modo que suas indicações sejam vividas nas bases
de nossas paróquias, convertendo-as pastoral e estruturalmente, em
Comunidades de comunidades.
No próximo capítulo tratarei de expor mais sobre o método que o
Documento 100 utiliza, suas divisões por temas e um pouco do seu conteúdo,
sobretudo da primeira parte.
10
CAPÍTULO II
SINAIS DOS TEMPOS, SINAIS DA IGREJA
A pauta de nossa reflexão neste livro está sendo o Documento 100 da
CNBB, e continuamos com o processo de conhecimento, através de um
mergulho no seu texto e contexto. Este capítulo trata de expor um pouco
sobre o método que foi usado na elaboração do documento, bem como as
divisões do documento por temas, e um pouco do seu conteúdo, sobretudo da
primeira parte. Tudo isso no intuito de usar a mesma metodologia usada no
documento e de contribuir para que ele seja conhecido, compreendido e
vivido.
O método, como já foi apontado no primeiro capítulo, é o “ver, julgar e
agir”. O método surgido na Bélgica, na década de 1950, com a Ação Católica
foi trazido para a América Latina alguns anos depois e aqui tem sido aplicado
com eficácia até os dias de hoje, por diversas instituições, sobretudo pela
Igreja, na elaboração de documentos, como os documentos conclusivos das
Conferências do Episcopado Latino-americano e do Caribe (exemplo: Medellín,
Puebla, Aparecida). O Documento de Aparecida, como vimos, fez uso desse
método, e a CNBB tem também se utilizado dele. A equipe de elaboração e
redação do Documento 100 também fez uso desse método, embora ele não
esteja tão visível em sua estrutura como está no Documento de Aparecida.
O texto do Documento 100 está dividido em seis capítulos, além da
apresentação e introdução. Comumente, os documentos aplicam os passos do
método supracitado de uma forma mais didática, como vimos no Documento
de Estudos (n. 104), em que o primeiro capítulo correspondia ao passo “Ver”;
o segundo, ao passo “Julgar”, e o terceiro e quarto capítulos, ao passo “Agir”.
No Documento 100 não encontramos essa forma de aplicação do método,
dividida por capítulos. Os três passos do método (ver, julgar e agir) estão
presentes em cada capítulo, formando um todo, o que facilita o seu
entendimento mais rápido. Por exemplo, o primeiro capítulo, do qual tratamos
aqui, utiliza o método nos seus três momentos, o que lhe confere uma
unidade indivisível, ao mesmo tempo que insere o leitor no capítulo seguinte,
em que o documento começa a delinear sua proposta central. Ele nos faz ver
a realidade, julgar ou iluminar essa realidade e, ao mesmo tempo, apresenta
propostas concretas para agir dentro dessa realidade vista e avaliada. Assim,
11
cada capítulo possui certa autonomia,ao mesmo tempo que mantém estreito
vínculo com os demais capítulos. Essa foi uma das novidades estruturais do
Documento 100 que pode passar despercebida aos olhos dos leitores menos
atentos a questões metodológicas.
Por que chamar a atenção para esse dado estrutural, ou organizacional, do
Documento 100? Porque a questão metodológica e de planejamento é muito
importante no trabalho pastoral. Muitas vezes, é por falta de metodologia,
organização e planejamento que os trabalhos pastorais não dão certo, ou não
vão adiante. Assim sendo, ao estudar o Documento 100, ou qualquer outro
Documento da Igreja, é muito importante estar atento ao método, à maneira
como ele está organizado. Essa observação, além de ajudar a entendê-lo,
ajuda na hora de colocá-lo em prática, pois essa é a finalidade dos
Documentos da Igreja. Eles foram elaborados para ser aplicados. Uma vez
compreendido o método utilizado na elaboração do documento, ele deve ser
aplicado na hora de colocar em prática o estudo feito. Por essa razão, sugiro
que, para o estudo e aplicação do Documento 100, utilize-se esse mesmo
método.
Ele deve funcionar da seguinte maneira. Primeiro, veja o documento, isto
é, conheça-o. Essa é a primeira proposta que trazemos neste trabalho.
Conhecer o documento significa mergulhar nele de modo que ele se torne o
mais conhecido possível, e isso se faz lendo e estudando parte por parte.
Quanto mais conhecimento se tiver do documento, mais possibilidade de
aplicá-lo nós teremos. Assim sendo, procure fazer estudos sistemáticos para
conhecer e aprofundar o documento. Depois de conhecê-lo é hora de refletir
sobre o seu conteúdo e aplicá-lo de acordo com a realidade pastoral. Costumo
dizer que o segundo passo, o “julgar”, é o coração do método. É nesse
momento que se avaliam, iluminam e apontam os passos para a ação, de
modo que aquilo que foi visto e avaliado seja aplicado da melhor forma.
Assim, o segundo passo é o momento do estudo aprofundado do documento.
Os meios para aprofundar os estudos dependem de cada um, ou seja, de cada
diocese, de cada paróquia ou de cada organismo pastoral. Quanto mais
criativos formos nesse estudo, mais possibilidade teremos de extrair dele
aquilo que vamos viver ou aplicar na nossa realidade diocesana, paroquial ou
de organismo pastoral. Por essa razão, o passo seguinte, o “agir”, ou a prática
do documento, vai depender desses dois primeiros passos, sobretudo do
segundo, o julgar, que é o passo elementar do método. Vistas a metodologia e
12
as sugestões, adentramos agora o conteúdo do primeiro capítulo do
documento.
Ele começa por ver a realidade e, simultaneamente, a avalia e indica as
necessidades de ação. Essa visão da realidade, fica claro, “não é um olhar
puramente sociológico. Trata-se, na verdade, de um autêntico discernimento
evangélico” (n. 10). Ou, em outras palavras, “é o olhar do discípulo
missionário que se nutre da luz e da força do Espírito Santo” (idem; cf. EG, n.
50) para poder iluminar e agir nessa realidade vista. Por essa razão, o
documento aponta os chamados sinais dos tempos, e mostra a necessidade
urgente de conversão pastoral para que se responda de modo eficaz a esses
sinais. Podemos entender por sinais dos tempos os desafios pastorais da
Igreja, ou, como o próprio documento define: “sinais da presença de Deus”.
Ou seja, somos convocados a ver os sinais da presença de Deus na realidade
que temos, seja ela qual for. De um modo resumido, a realidade na qual
precisamos enxergar os sinais dos tempos pode ser dividida em três aspectos:
negativos, transitórios e positivos. Negativos são aqueles aspectos que
prejudicam a vida e toda a criação de Deus; transitórios são aqueles que
podem conduzir tanto para algo bom como para algo ruim, dependendo do
uso que se faz deles; e positivos são aqueles que contribuem para a qualidade
da vida, promovendo-a. Sem querer fazer juízo de valor, essa subdivisão, ou
classificação da realidade, é meramente didática, e seu objetivo é favorecer o
entendimento do texto e do seu contexto, visualizando os sinais dos tempos e
a aplicação das indicações do documento dentro da realidade que temos.
Vejamos então como esses aspectos estão dispostos no documento e como
neles despontam os sinais dos tempos. Embora esses aspectos não estejam
assim, didaticamente separados, eles estão presentes no documento, como
parte do método, e vamos encontrá-los, direta ou indiretamente, em todos os
capítulos.
Aspectos negativos: uma sociedade cada vez mais consumista; uma
cultura individualista; a perda de sentido de comunidade; rejeição de valores
herdados da fé, reflexo do processo de secularização; imediatismo; alto índice
de pobreza, miséria e exclusão; acentuado egoísmo; felicidade reduzida à
satisfação do ego; sociedade descartável, que valoriza somente o que é útil,
entre outros aspectos.
Aspectos transitórios: o progresso científico; as novas tecnologias; o
avanço da informática; as emergentes questões ecológicas; a valorização do
13
sujeito ou valorização da pessoa; as grandes cidades; os meios de
comunicação de massa, entre outros.
Aspectos positivos: a preocupação com a ecologia; crescimento do
voluntariado; empenho pela tolerância e o respeito pelo diferente; consciência
de integração do planeta; mobilização contra as ditaduras, corrupções e
injustiças, ou contra a violação dos direitos humanos, entre outros.
Em suma, essa é um pouco a realidade vista pelo Documento 100, que traz
muitos desdobramentos. Esses desdobramentos configuram o campo de ação
pastoral da Igreja e seus desafios, nos quais agregam as realidades paroquiais,
que carecem ser levadas em consideração no processo de evangelização local.
Assim, diante desses contextos surgem novos contextos, e estes apresentam
desafios e oportunidades de evangelização que urge mudanças de
procedimentos e de mentalidades. Por exemplo, diante dessa realidade ampla
e complexa, urge a renovação das estruturas de nossas paróquias. O
Documento 100 é categórico ao afirmar: “a renovação paroquial exige novas
formas de evangelização tanto no meio urbano como no rural” (n. 21). Aqui
está um dos grandes desafios apresentados, que cada diocese e paróquia deve
encontrar a melhor forma de enfrentar, indo além de um modelo de ação
tipicamente rural ainda vigente em muitas paróquias urbanas. Por essa razão,
as dioceses e paróquias precisam levar em consideração a sua realidade e a
realidade global, com seus “novos cenários da fé e da religião”, em que o
sentimento de pertença à comunidade e o engajamento na paróquia estão em
crise (n. 27). Constata-se que em boa parte de nossas dioceses e paróquias
ainda falta planejamento e plano pastoral, e quando há planejamento ou
plano, nem sempre eles estão sintonizados com a Igreja (n. 29). Predomina
ainda o modelo de “pastoral de manutenção”, e a evangelização “se reduz à
catequese de crianças, restrita à instrução da fé, sem os processos de uma
autêntica iniciação cristã” (idem). Assim, uma das propostas do Documento
100 neste primeiro capítulo é que as paróquias saiam em missão, deixando de
ocupar-se apenas com a rotina e com as mesmas pessoas que já estão na
comunidade, indo ao encontro das pessoas (n. 30). É a proposta que também
faz o papa Francisco quando fala de uma Igreja de “saída” (EG, n. 20). Ele
exorta a vencer a mesmice e ver a pastoral em chave missionária, sem se
acomodar no critério pastoral do “fez-se sempre assim”. Essa mentalidade do
“fez-se sempre assim”, ainda presente na maneira de pensar e de agir de
muitos agentes de pastoral, tanto leigos como consagrados, precisa mudar se
14
quisermos uma paróquia em estado permanente de missão, conforme vêm
pedindo os Documentos da Igreja desde a Conferência de Aparecida.
Precisamos levar em conta, nessas mudanças estruturais propostas pelo
Documento 100, a nova territorialidade, e dentro dela rever estruturas e
práticas obsoletas que pouco ou nada contribuem para a evangelização. Para
isso, é preciso urgentemente a conversão pastoral. “A conversão pastoral
sugere renovação missionária das comunidades,para passar de uma pastoral
de mera conservação para uma pastoral decididamente missionária” (n. 51).
Isso supõe mudança de mentalidade, pois somente teremos mudanças
estruturais e eclesiais se antes houver mudança de mentalidade, conversão
pessoal, conversão pastoral e missionária.
Enfim, esse primeiro capítulo do Documento 100 desafia a paróquia a
renovar suas estruturas diante das aceleradas mudanças deste tempo. Se as
paróquias não aderirem às mudanças propostas, elas correrão sérios riscos de
não apenas não cumprir com sua missão evangelizadora, mas de fenecer
enquanto Igreja, tornando-se assim uma instituição que não cumpre o seu
papel na sociedade e no mundo atual; não sendo sinal dos tempos, isto é,
sinal de Deus, não tem, portanto, razão para continuar a existir.
Diante dessa realidade emergencial, cabe perguntar: como anda sua
diocese nesse processo de adesão às propostas de renovação da Igreja no
Brasil? Como anda sua paróquia no processo de renovação de suas
estruturas? Como anda a conversão pastoral dos agentes de pastoral, leigos e
consagrados? As respostas a essas e outras questões darão o retrato da
caminhada pastoral e missionária de sua diocese e paróquia.
No próximo capítulo tratarei do tema da comunidade, tema central do
Documento 100 e preocupação primordial da Igreja no Brasil.
15
CAPÍTULO III
PARÓQUIA, COMUNIDADE DE COMUNIDADES. VIDA E
MISSÃO
Vimos nos dois primeiros capítulos um pouco da conjuntura geral do
Documento 100 da CNBB e o método utilizado (ver, julgar e agir). Entramos
no primeiro capítulo deste documento, no qual nos foram apresentados os
sinais dos tempos e a necessidade de conversão pessoal e pastoral diante
desses sinais. Vimos que não podemos ficar de braços cruzados diante dos
novos contextos sociais e eclesiais, porque estes representam não apenas
desafios, mas também oportunidades de renovação para as estruturas
paroquiais, pois, diante dos novos cenários da fé e da religião, precisamos ter
também novos procedimentos e novas respostas. Não dá mais para ficar
numa pastoral de manutenção, quando as demandas pastorais e missionárias
são gritantes. Somente assim estaremos afinados com a realidade paroquial e
as suas novas territorialidades, que precisam ser contempladas no nosso agir
pastoral. Para isso, o Documento 100 nos apontou, neste primeiro capítulo, a
necessidade de revisão das estruturas paroquiais, porque muitas são obsoletas
e não respondem mais a esses desafios, permanecendo apenas na
manutenção, seja de estruturas arcaicas, de sacramentos ou de ambos, e que
pouco ou nada contribuem para a formação de comunidade e de compromisso
comunitário. Por essa razão, esse primeiro capítulo chamou a atenção para a
conversão pastoral, apresentando-a como uma urgência. Urgência é algo que
não se pode esperar, portanto a Igreja (dioceses e paróquias) não pode mais
esperar para refletir sobre esse tema, a conversão, pois dela depende a missão
da Igreja. Assim, esse primeiro capítulo acentua a necessidade da conversão
pastoral e da conversão para a missão, pois ambas estão estreitamente
ligadas. Sem conversão pastoral não haverá mudança.
Na sequência dessa reflexão, passamos agora para o segundo capítulo do
Documento 100, que aplica com mais destaque o segundo passo do método, o
julgar, embora estejam presentes também, como já foi dito, os outros dois
passos, o ver e o agir. É o momento em que somos convidados a iluminar
essa realidade, à luz da Palavra de Deus, e avaliar a vida e a missão das
nossas comunidades paroquiais. Para isso o documento faz um resgate
histórico, buscando elucidar o conceito de comunidade, bebendo na fonte das
16
primeiras comunidades cristãs (NT) ou das comunidades de Israel (AT). Essa
fundamentação histórica é muito importante porque ajuda a esclarecer um
conceito bastante amplo e discutível, que é o conceito de comunidade. Vale
lembrar que quando o Documento 100 trata de Comunidade, ele está se
referindo exclusivamente à comunidade eclesial, e não a comunidade no
sentido sociológico do termo, ou comunidade puramente sociológica, pois a
comunidade eclesial, a Igreja, apresenta outro modelo de comunidade, cuja
origem e finalidade estão presentes nas primeiras comunidades cristãs e com
valores e critérios bem distintos de outros modelos de comunidade. Assim, o
texto trata de uma comunidade que se deixa guiar pelo Espírito Santo, mas
que não cruza os braços, esperando milagres, ou que Deus faça tudo por ela.
Isso seria alienação. É uma comunidade que age junto, que partilha, que
colabora, que vive na unidade respeitando a diversidade. Aqui está um dos
diferenciais da comunidade eclesial da comunidade puramente sociológica, em
que essa última se forma a partir de afinidades e identidades, excluindo o
diferente. A comunidade eclesial acolhe o diferente, respeita as diferenças e se
une nos ideais, tendo Cristo e sua proposta como eixo comum. Somente
conhecendo esse modelo de comunidade nós poderemos possibilitar que
nossas paróquias sejam Comunidade de comunidades, em que não haja
competições e rivalidades, mas em que todos estejam em prol de um bem
comum.
Assim, as bases da comunidade que queremos se encontram no Israel
antigo, que se firmava pela Aliança com Deus, isto é, o compromisso com
Deus, e isso determinava todo o agir da comunidade, seja a vida em família
ou a vida social de um modo geral. Era uma comunidade que interagia e
interferia diretamente na sociedade, propondo modelos de vida pautados em
valores determinados por essas comunidades. Eram, portanto, comunidades
que faziam a diferença na sociedade. Hoje podemos perguntar: nossas
comunidades eclesiais fazem a diferença na sociedade? Creio que ainda falta
muito, embora haja situações e locais em que a Igreja exerce sua missão
profética de maneira mais acentuada e afinada com o projeto de Jesus Cristo,
vivendo valores diferentes dos que a sociedade vive. Essas comunidades
mostram que é possível ser diferente, viver de modo diferente, respeitando a
vida e o meio em que se vive.
Dentro desse contexto primitivo temos as primeiras comunidades cristãs
que se formaram pautadas nos valores e nos ideais de Jesus Cristo, que
17
apresenta um novo modo de ser pastor, isto é, de ser liderança dentro e fora
dessas comunidades. São comunidades que nasceram com um compromisso
maior com a vida, que defendiam a vida como o pastor defende suas ovelhas.
Daí nasce o conceito de pastoral que usamos hoje em nossas paróquias.
Nossas paróquias, para serem de fato Comunidade de comunidades, precisam
ser cada vez mais “comunidade pastoral”, composta de bons pastores, e não
apenas de gestores no âmbito financeiro e patrimonial, ou de manutenção de
estruturas. Nelas precisam existir pessoas que ajam como pastores, líderes que
tenham um cuidado especial, sobretudo com os doentes, afastados e
distanciados. Essa é a temática que perpassa todo o Documento 100, pois
essa tônica faz profundos apelos para que as paróquias possam ir ao encontro
dos afastados e distanciados, saindo de seus templos, de suas sacristias, como
pede o papa Francisco, na Exortação Apostólica Evangelii Gaudium (n. 20),
ao falar de uma Igreja “em saída”.
Assim, a comunidade que queremos é a comunidade de Jesus, e a
comunidade de Jesus é uma comunidade que tem como perspectiva o Reino
de Deus. Por esse motivo, a razão de essa comunidade ou essas comunidades
existirem é a construção do Reino de Deus neste mundo, e a construção do
Reino de Deus se faz com amor, justiça, perdão. Ela se faz sendo solidária e
com compromisso com a vida. Uma comunidade que valoriza a família, a
comunhão, a igualdade e dignidade humana, sem uniformização, mas com
respeito ao diferente e às diferenças, dentro e fora dessas comunidades,
sempre em prol de um bem maior que é a vida e a vida em plenitude. É uma
comunidade de partilha dos bens e dos dons; de amizade fraterna; de serviço,
e não de poder; de perdão e de oração em comum; sempre na alegria de
evangelizar, como pede o papa Francisco na Exortação Evangelii Gaudium
(Alegria do Evangelho).Comunidade em que podemos afirmar com convicção
que vivemos a alegria de ser missionário. E isso só vai ser possível se nessa
comunidade existir hospitalidade, partilha, comunhão de mesa e de ideais e,
sobretudo, de acolhida aos excluídos. Todos esses elementos nós encontramos
nas primeiras comunidades cristãs, as quais são fundamentos para as nossas
comunidades hoje.
Por essa razão, o Documento 100 afirma que, ao falar de comunidade, ou
de Comunidade de comunidades, não podemos deixar de ter diante de nós os
quatro elementos fundamentais que distinguiam a Igreja primitiva: o
ensinamento dos apóstolos; a comunhão fraterna; a fração do pão e a oração.
18
Esses são os quatro pilares que sustentam também nossas comunidades hoje.
Se faltar um desses pilares, ou se não for dada a devida atenção a eles, nós
não estaremos vivendo as propostas do Documento 100, que são de uma
Igreja Comunidade de comunidades, convertida pastoralmente. Nós não
teremos uma nova paróquia, pois uma paróquia renovada é uma paróquia
que está atenta a esses pilares e cuida deles com esmero e atenção. A
paróquia renovada é a paróquia que está atenta à formação, em todos os
sentidos; é a paróquia que vive a comunhão, isto é, a vida de comunidade;
que partilha o pão e os dons e que celebra a vida nas suas liturgias; que leva
uma vida de oração; que não descuida da espiritualidade, porque a
espiritualidade é o nosso “combustível” para a missão. Quando um agente de
pastoral, seja ele leigo ou consagrado, descuida da espiritualidade, da sua vida
de oração, ele acaba por cair num ativismo árido e, mais cedo ou mais tarde,
irá se desencantar da missão, afastando-se dela, como acontece com as
pessoas que se afastaram de nossas comunidades, inclusive padres que se
desencantaram com a missão, acomodando-se numa estrutura obsoleta de
paróquia, sem inovação ou renovação, ou mesmo chegando ao extremo de
deixar o sacerdócio.
A partir dessa compreensão, o segundo capítulo do Documento 100
fundamenta o conceito de Comunidade nas comunidades bíblicas, sobretudo a
comunidade dos apóstolos, para que desse fundamento formemos o
fundamento de nossas comunidades atuais. Tudo isso porque, de acordo com
a visão bíblica, não somos seres isolados e autônomos. Nós dependemos uns
dos outros, e se não existirem princípios éticos, morais e religiosos que
norteiam esses indivíduos interdependentes, formaremos uma sociedade na
qual uns devoram os outros de modo selvagem e primitivo, no pior sentido do
termo, como vemos acontecer muitas vezes. Assim, a comunidade é a
“salvadora da pátria”. A comunidade é a tábua de salvação da Igreja, das
nossas paróquias. Se elas não forem comunidades nesse sentido bíblico, elas
perdem a razão de ser e de existir, pois não farão a diferença no mundo e na
sociedade em que estão presentes. Por isso, “essas primeiras comunidades de
cristãos servem de inspiração para toda comunidade que pretende ser
discípula missionária de Jesus Cristo” (n. 104). Assim sendo, nossas
paróquias devem formar comunidades nas quais as pessoas possam se sentir
sujeitos de sua história, partícipes e não meros espectadores; nas quais se
possa prestar o culto devido a Deus, participando das celebrações, cuidando
19
uns dos outros, como irmãos e irmãs que se amam verdadeiramente;
formando comunidades de amizade e caridade, partilhando seus bens e
talentos, e sendo fiéis à doutrina da Igreja, se comprometendo com a missão
de anunciar e testemunhar Jesus Cristo.
Enfim, embora não exista um modelo único de comunidade na Bíblia, o
Novo Testamento “apresenta elementos e critérios comuns para a vivência
comunitária da fé cristã nos diferentes contextos culturais e em épocas
distintas” (n. 105), e isso é fundamental para renovarmos nossas paróquias,
de modo que elas sejam Comunidade de comunidades baseadas nesses
elementos e critérios.
No próximo capítulo tratarei do tema da paróquia propriamente dita,
resgatando um pouco de sua história e a evolução que ela teve ao longo dos
anos até os nossos dias, conforme o terceiro capítulo do Documento 100 da
CNBB.
20
CAPÍTULO IV
A PARÓQUIA: EVOLUÇÃO E CONVERSÃO PASTORAL
Conhecer a paróquia de que participamos é muito importante, mas
podemos servir melhor se conhecermos não apenas a história de nossa
paróquia, mas do próprio conceito de paróquia e como ele evoluiu ao longo da
história. É essa a proposta do terceiro capítulo do Documento 100, e também
a proposta neste capítulo. Ou seja, a partir de um olhar histórico, buscar
entender o presente da nossa Igreja.
Esse capítulo do Documento 100 tem início com o resgate de um dos
aspectos medulares desse subsídio, que é a dimensão comunitária. Tendo em
vista que a comunidade é tema central, não dá para olhar a história da
paróquia, sua evolução e seu peregrinar até nossos dias por outro viés que
não seja o da comunidade, embora iremos perceber que a comunidade nem
sempre foi prioridade. Vemos nesse apanhado retrospectivo que a paróquia,
na sua dimensão comunitária, teve “diferentes formas de se concretizar
historicamente, desde a Igreja Doméstica até chegar à paróquia na acepção
atual” (n. 106). Com o passar dos anos, muita coisa mudou, renovou,
evoluiu, mas não perdeu aquilo que ela tem de essencial, que é ser
instrumento para a construção da identidade cristã, católica, lugar onde o
cristianismo se tornou e se torna visível.
Assim, esse terceiro capítulo do Documento 100 trata, em primeira
instância, das comunidades na Igreja antiga, ou, como costumamos chamar,
da Igreja primitiva, ou para ser mais preciso ainda com o tema central do
Documento 100, das primeiras comunidades cristãs. Essas comunidades
tiveram um jeito peculiar de transmitir a Palavra de Deus que se tornou base,
ou referência, para as nossas comunidades, hoje. Os membros dessas
primeiras comunidades tiveram dificuldades, e podemos concluir que foram
dificuldades muito maiores do que as nossas, mas isso não os impediu de
serem perseverantes na fé, na partilha e na solidariedade. Vale lembrar que
existiu, nos três primeiros séculos do cristianismo, muita perseguição, e
muitas das comunidades cristãs viviam na clandestinidade, sobretudo no
período do Império Romano, o que dificultava uma vida plena de comunidade.
Porém, se não fosse a vida de comunidade, de ajuda mútua, eles não teriam
sobrevivido. Diz o Documento 100 que, nesse contexto, “a comunidade era o
21
refúgio para os cristãos que viviam na clandestinidade” (n. 106). Vemos aqui
a importância da comunidade como lugar de segurança e amparo, lugar de
refúgio, mas não de fuga; lugar de amor e de perdão; lugar que possibilitava
visualizar o rosto do Cristo ressuscitado. Essas devem ser ainda hoje algumas
das características da comunidade eclesial, paroquial, ou de uma paróquia que
pretende ser Comunidade de comunidades. Lugar onde as pessoas encontrem
segurança umas nas outras e possam ser mais fortalecidas para lutar por um
mundo melhor, mais justo e mais fraterno, tendo como referencial a pessoa de
Jesus Cristo e seus ensinamentos.
Esse foi então o período em que se acentuou a experiência da fraternidade
cristã, “de tal forma que as comunidades sentiam-se responsáveis umas pelas
outras” (n. 108). Reforça-se aqui o sentido de irmandade, de família, mesmo
não existindo grau de parentesco entre as pessoas. Esse cuidado de uns para
com os outros era uma forma de sobrevivência diante de um mundo que
ceifava vidas. Foi preciso se unir para sobreviver. Isso hoje não é diferente.
Num mundo em que impera o individualismo, dificilmente as pessoas
conseguem sobreviver. Sobrevivem os mais fortes, ou mais espertos, e os
fracos e vulneráveis se tornam vítimas dessa sociedade excludente, violenta,
que elimina o pequeno, o fraco, os que vivem sem ninguém para defendê-los.
Assim, urge a necessidade de resgatar a comunidade eclesial, porque somente
ela poderá fortalecer as pessoas, para que não fiquem à mercê de situações,
pessoas ou grupos que se unem contra a vida de outros. A Igreja levanta a
bandeira da defesa da vida em todas as suas circunstâncias,e a paróquia,
como comunidade eclesial, deve ser o espaço concreto onde essas lutas e
defesas acontecem.
Pautadas em princípios cristãos, essas primeiras comunidades se uniam em
defesa da vida, em todas as suas circunstâncias, sobretudo contra tradições e
costumes estranhos às práticas cristãs, algo que hoje vemos com muita
frequência e que interpela a formação de comunidades cristãs, conscientes de
seus princípios e de sua missão, para defender esses valores que dizem
respeito à vida. Valores que os meios de comunicação procuram descartar ou
desvalorizar. Assim, essas primeiras comunidades, que deram origem às
paróquias, tinham como princípio estar no mundo sem se identificar com ele,
como diz a Carta a Diogneto (n. 110). Estar no meio de um mundo que
provoca tragédias, como a sociedade atual em que vivemos, mas não
compactuar com ele, ou seja, combatê-lo. Aqui está a essência do ser
22
missionário, de uma paróquia missionária ou em estado permanente de
missão, como pede esse e outros documentos da Igreja.
Podemos sinalizar a origem da paróquia no período em que a liberdade
religiosa foi declarada, com o Édito de Milão, no ano 313 d.C. Nesse período
amenizou-se a perseguição dos cristãos e se podia manifestar publicamente a
fé cristã, sem ser perseguido ou morto, como até então vinha acontecendo.
Começa a crescer o número de cristãos e as assembleias vão se tornando mais
anônimas, pois quanto maior, mais difícil fica para as pessoas se
relacionarem. Onde há muita gente reunida, a tendência é o anonimato. Por
essa razão se contesta hoje paróquias com templos grandiosos, em que as
pessoas chegam e saem anônimas, sem formação de verdadeira comunidade
cristã, sem se conhecerem, sem um compromisso de uns para com os outros.
Foi nesse período que as comunidades cristãs passaram a se organizar em
sintonia com a vida social e se estabeleceram territorial e
administrativamente, visando responder aos desafios e demandas da época.
Está aqui o germe daquilo que hoje temos como paróquia, no seu conceito
jurídico. Isso, porém, fez com que a Igreja Doméstica, a Igreja-casa, se
enfraquecesse. Foi quando precisou ser criada uma estrutura na qual um
responsável, isto é, um presbítero, pudesse dirigir esses grupos numerosos de
fiéis, chamados no ambiente urbano de Roma de titulus (n. 112). Porém, na
área rural, onde moravam o bispo e seu presbitério, ela já era chamada de
paróquia, pois as áreas rurais de então eram muito povoadas. Daí a origem
rural, agrária das paróquias, as quais ainda hoje são reproduzidas dentro de
ambientes urbanos, sobretudo em grandes metrópoles, o que dificulta a
missão nessa realidade, pois aplicar modelos e procedimentos rurais no
mundo urbano pode não dar resultados satisfatórios na missão e tornar a
Igreja apenas uma caricatura. Assim, se quisermos pensar na renovação das
estruturas pastorais das paróquias, precisamos pensar nessas mudanças
primordiais, ou seja, passar de uma pastoral de cunho rural para uma pastoral
mais urbana, mas para isso será preciso conversão pastoral, no sentido de
mudar os rumos e a direção de nossa prática pastoral, passando do modelo
rural para o modelo urbano. Isso pode parecer óbvio, mas na prática ainda
estamos muito atrasados pastoralmente. Os desafios do mundo urbano ainda
não foram contemplados em nossa prática de pastoral paroquial, e essa tem
sido uma das preocupações da Igreja quando fala em conversão pastoral. É
preciso pensar numa pastoral urbana, mas até o termo pastoral tem origem
23
rural porque se refere a pastor de ovelhas, referência de um mundo agrário
distante de muitos de nós. Deverá usar-se outro termo para a missão no
mundo urbano, ou nas paróquias urbanas.
Voltando ao século V, vemos que aquilo que era chamado de paróquia
começa a ganhar mais autonomia, sobretudo com os presbíteros que estão à
sua frente, com funções elementares como as práticas sacramentais (presidir a
Eucaristia, batizados, reconciliação etc.), e que eram delegados pelo bispo (n.
112). Essa autonomia rural chega até as cidades, em que os locais fixos de
reunião irão se transformar em paróquias territoriais, no modelo muito similar
ao que temos hoje em muitos lugares. Foi a territorialidade que determinou a
transformação social das comunidades cristãs primitivas em paróquias (n.
112). Hoje se está tentando fazer um caminho inverso, embora se esteja
ainda longe de mudanças estruturais dessa natureza, ou seja, de transformar
novamente essas paróquias territoriais em verdadeiras comunidades cristãs.
Assim surgem as dioceses, e “a diocese surgiu como expansão das
comunidades eclesiais urbanas” (n. 112). Em suma, a origem da diocese está
na transformação das comunidades urbanas em paróquias. A criação de
paróquia demanda a criação de dioceses, e a diocese oficializa a paróquia,
criando assim essa estrutura que temos hoje, de difícil mudança, pois tudo
está muito arraigado em tradições e estruturas que não são fáceis de ser
transformadas em curto prazo. Assim sendo, para a transformação ou
renovação da paróquia, urge transformar e renovar também a diocese, mas
sobre isso ainda pouco se fala. Porém, ao falar de conversão pastoral, tudo
está incluído, desde a diocese, passando pelas paróquias e suas respectivas
comunidades.
Naquele tempo, o elo principal que ligava a paróquia e a diocese ia além de
sua estrutura jurídica. Elas estavam — e ainda estão — vinculadas pela
Eucaristia. A celebração eucarística conferia a unidade entre a paróquia e a
diocese. Lembramos hoje essa unidade na celebração dos santos óleos,
durante a semana santa, em que todos os presbíteros, de todas as paróquias
da diocese, são convocados; ela é conhecida ainda hoje como celebração da
unidade. A unidade do clero com o seu bispo, o pastor da diocese; a unidade
da paróquia com a Igreja particular, a diocese; a unidade da Igreja particular, a
diocese, com a Igreja Universal, na pessoa do Santo Padre, o papa.
Nesse processo de evolução da paróquia, passamos também pelo período
em que o mundo se dividiu em dois poderes: o temporal e o espiritual, em que
24
o papa coroava o Imperador. O papa Gregório VII (1073-1085) promoveu a
reforma gregoriana, com o intuito de fazer a Igreja retornar às suas origens e
retomar suas forças diante dos senhores feudais (n. 117). Foi um período de
grandes mudanças na Igreja, de renovação, porém ela se firmou mais como
instituição jurídica do que sacramental e mais tarde esses dois elementos
seriam reforçados, formando o que temos hoje na maioria de nossas dioceses:
paróquias com acento mais jurídico e sacramental que pastoral e missionário.
Alguns dos perfis da paróquia desse período foram confirmados no Concílio
de Trento. Porém, esse Concílio insistiu para que o pároco residisse na
paróquia; ali foram instituídos os seminários para a formação do clero,
delineando os modelos atuais. Nesse Concílio reforçou-se também a questão
da territorialidade e a criação de mais paróquias, graças ao crescimento
populacional, outra prática em vigor ainda hoje, pois à medida que um bairro
cresce em população, aventa-se a criação de uma nova paróquia na
localidade, e isso ocorre muitas vezes sem que haja de fato uma comunidade
no território. É uma prática tridentina, como bem se pode perceber. Assim,
vale lembrar que “as determinações do Concílio de Trento delinearam
substancialmente o modelo de paróquia que chegou até o Concílio Vaticano II”
(n. 118).
Embora o Concílio Vaticano II não tenha um documento específico sobre as
paróquias, ele apresenta uma chave de leitura muito importante para
pensarmos a renovação das paróquias hoje e a sua conversão pastoral. A
Lumem Gentium (n. 26) afirma que a Igreja de Cristo está presente na Igreja
particular, isto é, na diocese. Embora a paróquia não seja a diocese, ela está
estreitamente, isto é, juridicamente ligada à diocese, ou seja, está em
comunhão, o que forma o primeiro conceito de rede, o qual será aplicado às
comunidades das paróquias para que elas sejam redes de comunidades como
a diocese e as paróquias são redes de comunidades,vivendo na unidade da
Igreja. Além disso, o Concílio Vaticano II, através dessa mesma Constituição
(LG), permitiu alargar a compreensão da missão da Igreja no mundo e,
consequentemente, da missão da paróquia, o que foi confirmado pela
Constituição Pastoral Gaudium et Spes, mostrando que o mundo é o lugar dos
discípulos, convocados para formar a sua Igreja, Comunidade de
comunidades, comunidade missionária.
O Decreto do apostolado dos leigos — Apostolicam Actuositatem —
destacou o protagonismo dos leigos, sendo confirmado e reforçado na
25
Conferência de Aparecida em 2007, em que os leigos foram chamados de
discípulos missionários na construção de uma Igreja em estado permanente de
missão. Essa conferência veio coroar um processo de renovação e conversão
pastoral iniciado na década de 1960, com a Conferência de Medellín (1968),
depois com a Conferência de Puebla (1979) e de Santo Domingo (1992), que
marcaram o processo de renovação paroquial e conversão pastoral da Igreja
na América Latina e no Caribe.
No Brasil podemos afirmar que essas mudanças chegaram bem antes, ou
seja, desde 1962, quando, na esteira do Concilio Vaticano II, “foi implantado
o Plano de Emergência com o objetivo de enfrentar os problemas da época e
revitalizar as paróquias” (n. 140). A ideia era vitalizar e dinamizar as
paróquias para que elas pudessem responder aos desafios daquele momento,
algo muito parecido ao que se pretende hoje, com os desafios da atualidade.
Foram traçadas linhas para a pastoral de conjunto; foi criada a Campanha da
Fraternidade (1964), lembrando que o tema da CF de 1965 foi “Paróquia em
Renovação”, tema muito atual em nossos dias.
De lá para cá muitos passos foram dados nesse processo, porém ainda há
muito por fazer, pois os desafios continuam. Daí a necessidade de repensar a
paróquia, enfatizando sua dimensão de comunidade, porque somente a
comunidade poderá responder aos desafios do mundo, como vimos nos
primórdios da paróquia. Essa tem sido a preocupação da CNBB ao lançar o
documento de estudos (n. 104) “Comunidade de comunidades, uma nova
paróquia” e o Documento 100, resultado desse estudo. O papa Francisco tem
contribuído e muito nesse processo, quando afirma que não podemos ficar
fechados em nossas paróquias, nos nossos templos, mas devemos ir para a
missão numa Igreja de “saída”.
No próximo capítulo refletiremos sobre o capítulo quatro do Documento
100, a comunidade paroquial.
26
CAPÍTULO V
A COMUNIDADE COMO RESULTADO DA CONVERSÃO
PASTORAL
O capítulo quarto do Documento 100 trata especificamente da comunidade:
a comunidade paroquial; as comunidades que se formam, ou que deveriam se
formar, dentro do território de nossas paróquias. Assim, já podemos perceber
que esse capítulo é medular, essencial no Documento 100, porque é ele quem
dá o título do documento, ou seja, “Comunidade de comunidades: uma nova
paróquia”. A paróquia só será renovada quando investir na formação de
comunidades, e comunidades dentro das características que sugerem esse
documento, que, como já dito, tem suas bases no Documento de Aparecida.
Este capítulo está divido em oito subitens, facilitando o nosso
entendimento do tema comunidade. Em primeiro lugar, ele trata da Trindade
como fonte e meta de toda a comunidade. Portanto, a comunidade que não
tiver como base, ou fundamento, a Santíssima Trindade dificilmente viverá o
real sentido do que é de fato uma comunidade eclesial, pois toda comunidade
eclesial deve estar alicerçada na Trindade Santa, para que seja também santa,
ou que esteja no caminho da santidade, pois é essa a primeira missão da
comunidade. Além disso, é preciso ter a Trindade como meta a ser alcançada
para a vida da comunidade, isto é, a comunidade deve estar sempre na busca
da perfeição, porque a Santíssima Trindade, além de ser a melhor
comunidade, é a comunidade perfeita, revelando sua unidade na diversidade,
pois o Pai, o Filho e o Espírito Santo são três Pessoas distintas num só Deus.
Assim sendo, os demais passos na busca da formação da comunidade vão
sendo dados com mais facilidade e no rumo certo.
Não dá para falar de comunidade eclesial sem falar do seu contexto, ou dos
espaços em que elas se formam. Por isso, em seguida, o Documento 100 trata
da diocese e da paróquia, espaços físicos e jurídicos em que se formam as
comunidades. Destaca a importância da diocese nesse processo, e o papel da
paróquia na concretização desse ideal que é a formação de comunidade.
Dentro do contexto diocesano e paroquial, o documento busca definir o que se
entende por comunidade eclesial, definindo o conceito de paróquia. Aqui há
um breve resgate desse conceito, no qual não me estenderei, mas apenas
quero apontar que é importante conhecer um pouco da história da formação
27
do conceito de paróquia para entendermos as raízes da comunidade eclesial
que se quer hoje. A partir do entendimento do que é a paróquia, e o que ela
representa, adentramos a comunidade dos fiéis que se forma neste território, a
paróquia. Nesse espaço administrativo, jurídico e geográfico denominado
paróquia, devem ser formadas as comunidades de cristãos, comunidades de
pessoas comprometidas com a vida e com a missão da Igreja. Desse modo,
esse quarto capítulo vai tocando no tema essencial da vida da Igreja e de
nossas paróquias: a missão. Temos, assim, um destaque especial para a vida
e a missão de nossas comunidades. Vejamos agora, passo a passo, cada um
desses temas tratados no capítulo quarto do Documento 100 e como ele nos
vai encaminhando para os seus pontos essenciais.
Vemos neste capítulo que o diferencial da comunidade eclesial, ou seja, da
comunidade cristã se dá no fundamento dela no mistério trinitário, como foi
indicado no início desta reflexão. É o Espírito Santo que conduz essa
comunidade na busca e no conhecimento da verdade. Se assim não for,
nossas comunidades perdem o seu foco, e passam a ser apenas agrupamentos
de pessoas. Talvez seja por essa razão que muitas supostas comunidades
cristãs não perseveram, pois não têm o seu fundamento essencial. Por isso, o
documento é enfático ao afirmar que a presença do Espírito Santo é que
garante que a comunidade cristã não seja reduzida a uma realidade apenas
sociológica, ou psicológica (n. 152). Quando perdemos, ou não entendemos
esse sentido trinitário das nossas comunidades, corremos o risco de esvaziar a
vida comunitária daquilo que lhe é essencial e que lhe dá sentido e razão de
ser. Por isso, a Trindade é fonte e ao mesmo tempo meta da comunidade. Em
outras palavras, a Trindade é princípio e fim da comunidade cristã.
Assim sendo, não podemos esquecer que, enquanto Igreja, nossas
comunidades são, ou deveriam ser, projetadas pelo Pai, criadas pelo Filho e
vivificadas pelo Espírito Santo. É o “tripé”, ou os “pilares” de sustentação da
comunidade. Esses três elementos, ou pilares de formação e sustentação da
comunidade eclesial, é que lhe garantirão solidez na missão. Sem eles a
missão não dá fruto porque não resiste aos obstáculos. Sem esse parâmetro, a
comunidade se perde, e em vez de despertar amor entre seus membros, e
ardor missionário, despertará competição, rivalidades, desânimo e falta de
sentido na missão e nessa forma de vida. Uma comunidade fundamentada na
Trindade é uma comunidade onde é o amor que distingue a paróquia das
outras formas de agrupamentos sociais. “Vejam como eles se amam”, dizem
28
os pagãos, segundo Tertuliano. Somente uma comunidade alicerçada na
Trindade poderá revelar esse amor de uns para com os outros, porque o Pai
ama o Filho e o Filho ama o Pai. Ambos estão amalgamados pelo Espírito
Santo, que concretiza esse amor e o impulsiona para a sua vivência,
expandindo-o por toda a terra. É, portanto, a essência da missão da
comunidade, porque não há comunidade cristã que não seja missionária,
porque se ela não for missionária, ela não pode dizer que é cristã. A
comunhão trinitária inspira a missão da comunidade, através do sopro do
Espírito Santo que envia os discípulos missionários, de dois em dois, isto é,
em comunidade. Essa será, portanto,uma comunidade que vive o amor,
porque o desejo da Trindade é que todos conheçam e participem desse amor.
Em vista disso, ao tratar do tema da comunidade neste capítulo, o
Documento 100 contextualiza essa comunidade dentro da diocese e da
paróquia. As paróquias como células vivas da diocese, e as comunidades
como células vivas dentro das paróquias, dando assim, essa noção da Igreja
como corpo místico desse Deus que é Pai, Filho e Espírito Santo. Essa visão
da Igreja como corpo, composto de células, lhe confere vida e vida em Cristo
Jesus. Assim, “a Igreja se organiza em dioceses, nas quais estão as paróquias
e as comunidades na busca de viver a comunhão trinitária” (n. 157).
Se nós tomarmos o Código de Direito Canônico, e consultarmos sua
definição de diocese, veremos que “a diocese é a porção do povo de Deus
confiada a um bispo com a cooperação de um presbitério” (n. 158, CDC, cân.
369). Temos assim o sentido de colegialidade, que nada mais é que o sentido
de comunidade. Assim, a própria diocese é definida como comunidade. O
sentido dela é comunitário. Cada paróquia que é criada na diocese é uma nova
comunidade que é criada. Portanto, a criação de paróquia não é divisão, mas
multiplicação de comunidades. A mesma coisa acontece na paróquia. Cada
comunidade que é formada na paróquia não é uma divisão, ou
enfraquecimento da paróquia, é fortalecimento no sentido de que cada
comunidade soma com a conjuntura da paróquia, tornando-a mais viva e
dinâmica. Assim, do mesmo jeito que a paróquia mantém estreitos vínculos
com a diocese, as comunidades devem manter estreito vínculo com a sua
paróquia. Assim, a paróquia é diferente apenas no sentido jurídico; a igreja
matriz é a mãe de todas as comunidades, e ela deve ser uma comunidade
como qualquer outra da paróquia, sem concentração de funções. Desse modo,
esse capítulo busca romper com essa ideia de que a igreja matriz é diversa das
29
demais comunidades. Ela precisa descentralizar suas ações para somar forças
e romper com dependências e exclusões, porque quando tudo está
centralizado na chamada “igreja matriz”, as demais comunidades perdem sua
força e ficam dependentes, quebrando o sentido de verdadeira comunidade.
Neste capítulo, depois de trazer algumas definições do conceito de
paróquia, com fundamentações bíblicas, patrísticas e do Catecismo da Igreja, o
Documento 100 mostra a transitoriedade desse conceito. A paróquia não pode
ser algo estagnado, parado no tempo, cristalizado nas suas ações. Ela deve
ser algo que revela a dinâmica da missão. Esse dado faz com que mudemos
os nossos conceitos de paróquia e de Igreja, e nos coloquemos a caminho,
sempre prontos para sair e servir, sem criar raízes, sem tomar posse, como se
tudo se resumisse naquele templo onde estamos, ou naquele espaço
geográfico em que atuamos. Paróquia é meio e não fim. Por isso, ao falar da
“comunidade de fiéis”, dentro da paróquia, o Documento 100 recorda que “a
paróquia encontra no conceito de comunidade a autocompreensão da sua
realidade histórica. Ela é, portanto, uma comunidade de fiéis que, de alguma
maneira, torna presente a Igreja num determinado lugar” (n. 168). Ela deve
ser a facilitadora da formação de comunidades, e não o contrário. Se ela não
formar comunidade, e comunidade cristã, ela não estará cumprindo o seu
papel como Igreja. Essa tem sido a preocupação da Igreja hoje, sobretudo do
papa Francisco, que vem acentuando a importância das paróquias serem
Comunidade de comunidades, lugares onde se desenvolvam relações
fraternas, de amor ao próximo, espaços onde Deus se revela. Por isso, o termo
comunidade, no seu sentido teológico, “significa a união íntima ou comunhão
das pessoas entre si e delas com Deus Trindade” (n. 179). Por isso, a
paróquia, ao se tornar Comunidade de comunidades, lugar de conversão
pastoral e pessoal, torna-se também “local onde se ouve a convocação feita
por Deus, em Cristo, para que todos sejam um e vivam como irmãos” (n.
171). Portanto, é a Igreja que está onde as pessoas se encontram. Desse
modo, nós devemos romper com aquela ideia de que Igreja é templo, ou
apenas templo. Não precisa necessariamente que se tenha um templo, uma
capela, para que ali haja Igreja. Basta que exista uma comunidade de pessoas
que vivam os ensinamentos de Cristo que ali estará a Igreja. Muitos de nós,
inclusive padres, temos aquela ideia fixa de que a construção de um templo é
essencial para que haja comunidade. Quando agimos assim, invertemos o
processo, pois primeiro a comunidade de pessoas deve existir, depois o
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templo, a capela. O templo é consequência de uma comunidade de pessoas
que se organizam e que buscam um espaço para celebrar. É o sentido
comunitário que realiza e reforça a dimensão pessoal de cada cristão, e que
lhe dá o sentido de igreja, e não o templo. Além disso, comunidade não é
sinônimo de uniformidade. Pelo contrário, a verdadeira comunidade é aquela
que possui diversidade. Diversidade de dons, de talentos, de maneiras de ser.
É aquela que acolhe o diferente e enxerga nele a riqueza da comunidade.
Portanto, “a unidade da comunidade não extingue a pluralidade de pessoas”
(n. 173). Pelo contrário, “os dons e carismas individuais, partilhados,
colaboram para o enriquecimento de toda a comunidade paroquial” (idem).
Quanto ao território, outro tema abordado dentro da temática da
comunidade, o Documento 100 afirma, fundamentado no Código de Direito
Canônico (cân. 518), que “onde for conveniente, constituam-se paróquias
pessoais”, ou seja, comunidades onde sejam respeitadas as diferenças, como,
por exemplo, rito, línguas, nacionalidades de fiéis ou outra razão que favoreça
o entendimento e a vida de comunidade. Assim, o território é apenas algo
técnico ou jurídico. Hoje, mais do que nunca, precisamos pensar na questão
das paróquias afetivas, pois se queremos que nossas paróquias sejam
Comunidades de comunidades, precisamos saber que a comunidade se forma
pela identificação, e não apenas por áreas de jurisdição. Áreas de jurisdição
nem sempre conseguem formar comunidades, pois uma pessoa pode
pertencer territorial e juridicamente a uma paróquia e, afetivamente se sentir
membro de outra. Isso acontece naturalmente nos grandes centros urbanos.
Por isso, precisamos romper com uma mentalidade rural de que paróquia é
somente território.
Paróquia é onde se formam verdadeiras comunidades, e comunidades de
verdadeiros cristãos, “casa de cristãos”, como afirma o Documento 100. “A
ideia de comunidade como casa fornece o conceito de lar, ambiente de vida,
referência e aconchego de todos que transitam pelas estradas da vida” (n.
178). Se a pessoa não se sente em casa naquele espaço, ali não é comunidade
para ela. Aqui cabe perguntar: as pessoas se sentem em casa em nossas
paróquias? Elas sentem ali um ambiente acolhedor, aconchegante? Elas se
sentem valorizadas nos seus dons e talentos, e encontram espaço para
partilhá-los? Essa comunidade, como casa, deve ser casa em todos os
sentidos, sobretudo casa da Palavra, onde se possa ouvir, entender e colocar
em prática a Palavra de Deus. Deve ser casa do pão, isto é, lugar onde a
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Eucaristia seja o centro de tudo, e que as pessoas possam encontrar-se com
Deus, com elas mesmas e com a comunidade através da Eucaristia, e
satisfazer suas necessidades espirituais. Deve ser casa da caridade, isto é,
onde as pessoas se ajudem e possam ajudar os que estão fora, porque “a vida
fraterna do cristão não pode limitar-se ao âmbito de uma comunidade” (n.
184). A comunidade deve ser lugar de fortalecimento para a missão,
sobretudo nos lugares de desafios, na sociedade como um todo. Quando a
comunidade se fecha, formando um grupo isolado, ela não entendeu o sentido
do que é uma comunidade cristã. Infelizmente nossas paróquias estão cheias
de “grupinhos” que às vezes até se intitulam comunidade, mas que não
conseguem enxergar nada fora deles, tendo ações religiosas voltadas para si,
sem perceber os desafios do mundo, e dos que estão fora do grupo.
Enfim, o sentido da comunidade é a missão, e a missão fora dela. A
formaçãode comunidade é para a missão e não para a autoproteção de quem
dela faz parte. A proteção é consequência de uma ação de fraternidade e de
amor, mas não é o fim último da comunidade. Para ser paróquia missionária,
verdadeira comunidade, a paróquia precisa ir ao encontro das pessoas, dos
que estão afastados, dos que ainda não fazem parte da comunidade (n. 189).
É isso que caracteriza uma paróquia Comunidade de comunidades, e uma
paróquia de comunidades missionárias. Ela precisa proporcionar o encontro
entre a iniciativa de Deus e a ação humana. Por isso, a descentralização da
paróquia em unidades menores, valorizando os pequenos grupos, isto é, as
pequenas comunidades, deve ser a missão paroquial se ela pretende ser
Comunidade de comunidades. É nesse processo que se dá a conversão
pastoral, passando de uma paróquia centralizadora para uma paróquia rede de
comunidades, em estado permanente de missão. Enfim, como diz o papa
Francisco, resumindo bem o que significa conversão pastoral: “o que derruba
as estruturas caducas, o que leva a mudar os corações dos cristãos é,
justamente, a missionariedade” (n. 191). Se a paróquia não se preocupar em
ser missionária, sem investir na formação missionária, dificilmente se dará a
conversão pastoral, e sem conversão pastoral não haverá mudanças, nem de
estruturas, nem de mentalidades.
No próximo capítulo tratarei dos sujeitos e das tarefas da conversão
paroquial e pastoral, tema do quinto capítulo do Documento 100.
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CAPÍTULO VI
RENOVAÇÃO PAROQUIAL. OS SUJEITOS DA CONVERSÃO
PASTORAL
Entramos agora diretamente no tema medular do Documento 100, a
conversão pastoral. Para que a paróquia se converta em Comunidade de
comunidades é preciso que haja antes a conversão pastoral, e como já foi dito,
ela só será possível se existir antes conversão pessoal. Ambas estão juntas, e
uma supõe a existência da outra. Assim sendo, o quinto capítulo do
Documento 100 trata dos sujeitos e das tarefas da conversão pastoral para
que a paróquia se transforme em Comunidade de comunidades, em estado
permanente de missão, com uma estrutura renovada.
Quando falamos de sujeitos, falamos daqueles que estão e são diretamente
responsáveis pela conversão pastoral da Igreja, isto é, das paróquias. Sabemos
que todos são responsáveis, mas existem os que são os primeiros
responsáveis, e então o documento retoma a hierarquia da Igreja para
apontar, por ordem de grau, ou função, os primeiros responsáveis, a saber: os
bispos, os padres, os diáconos permanentes, os consagrados e as consagradas
e os leigos. O fato de os fiéis leigos virem em último lugar na ordem do
tratamento dos sujeitos dessa conversão não quer dizer que eles não tenham
importância nesse processo, mas que são a base, e estão lá onde as coisas
acontecem de fato, e onde a conversão deve se concretizar. Nesse sentido,
vamos também aqui usar essa mesma ordem porque ela de fato ajuda a
entender e a realizar a conversão pastoral na Igreja.
Sabemos que em primeiro lugar depende do bispo essa mudança, ou
conversão pastoral. Se numa diocese o bispo, como pastor daquela Igreja
particular, não se preocupar em fazer com que essa conversão pastoral
aconteça, ou se ele não se converter pastoralmente conforme a orientação da
Igreja, o processo de mudança se torna mais difícil naquela diocese e,
consequentemente, nas suas paróquias. Por essa razão, o bispo é sujeito
primordial da conversão pastoral.
Em segundo lugar estão os presbíteros, ou seja, os padres. Não basta o
bispo desejar a conversão pastoral, é preciso que os padres abracem essa ideia
e busquem fazer com que a conversão aconteça. Se os padres assumirem as
mudanças, e comungarem com os ideais do bispo, no sentido desta conversão
33
pedida pela Igreja, a diocese e as paróquias atingirão as metas da conversão
pastoral. Quanto mais padres assumirem as propostas da Igreja apresentadas
no Documento 100, mais rápida essa conversão pastoral da paróquia se dará.
Sabemos que nem sempre é fácil haver 100% de adesão dos padres em
qualquer projeto, por menor que seja a diocese, ou por menor que seja o
número de padres da diocese, mas sabemos também que essa conversão só
vai acontecer de fato quando um maior número de padres caminhar na
mesma direção com a sua diocese. Aqui está um dos grandes desafios da
conversão pastoral: conseguir que um maior número de padres assuma a
proposta do Documento 100. Esse desafio é de todos, sobretudo do bispo e do
Conselho de presbíteros, pois são eles que irão motivar e impulsionar os
padres neste processo de conversão pastoral.
E os diáconos permanentes, que importância eles têm nesse processo de
conversão pastoral? Eles têm também muita importância. Os diáconos fazem
parte da hierarquia da Igreja e formam um elo importante entre o povo de
Deus e o clero. Esse elo, quando bem estreito, faz com que padres e leigos
estejam sintonizados e caminhem juntos, numa mesma linha pastoral.
Lembrando que estamos falando de conversão pastoral, ou seja, mudança nos
rumos pastorais da paróquia, para que ela se torne Comunidade de
comunidades. Quem vai formar essas comunidades e nelas viver são leigos,
por isso é importante que haja uma boa sintonia entre os leigos e os padres, e
o papel do diácono permanente nessa mediação é muito importante. Além
disso, eles são sujeitos desse processo porque farão com que essas
comunidades se concretizem, vivendo e participando delas, já que são
homens casados, que vivem com suas famílias dentro da paróquia e,
naturalmente, dentro dessas comunidades que vão sendo formadas a partir
dessa nova proposta.
Outros sujeitos desse processo são os consagrados e as consagradas que,
além de fazerem parte dessa Igreja, estão presentes nas dioceses e paróquias,
dando a sua importante contribuição. Como agentes de pastoral consagrados
eles precisam se preocupar e se interessar pela conversão pastoral. Se não
houver a colaboração desses agentes, o processo se dificulta. Destacamos aqui
a importância dos trabalhos das religiosas consagradas, as freiras, nessa
mudança. Elas têm um papel importante nesse processo porque, como os
diáconos, estão diretamente ligadas com o povo, fazendo muitas vezes
trabalhos de base, em contato direto na formação de opinião e, sobretudo, na
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formação de comunidades. Por essa razão, o papel das consagradas é de suma
importância para que a conversão pastoral aconteça. Se os consagrados e as
consagradas não se converterem pastoralmente, eles não poderão ajudar
nesse processo, e serão assim mais pedra de tropeço do que pedra que ajuda a
edificar a construção dessa Igreja pastoralmente convertida.
Por fim, os leigos de um modo geral. Eles são os sujeitos, ou os que vão
fazer essas comunidades existirem de fato. A importância dos leigos nesse
processo é fundamental, porque não basta o bispo querer, os padres e
diáconos quererem, e os consagrados quererem se não tiver sido trabalhado
com esses leigos a importância dessa mudança, de modo que eles se
conscientizem da necessidade de se viver em comunidade. Assim, essa
conversão pastoral só vai existir entre os leigos se houver investimento em
formação, pois boa parte de nossos leigos vivem em paróquias de modelo
tradicional e, consequentemente, com mentalidade tradicional, ou mesmo
clerical. Assim, esses sujeitos do processo de conversão pastoral são
importantes para que essa conversão aconteça. Cada um na sua instância, na
parte que lhe cabe, deve contribuir para que a conversão pastoral da paróquia
se concretize.
Além desses sujeitos, ou categorias de sujeitos, temos também os
organismos de nossas paróquias. Os organismos são compostos de pessoas,
por essa razão as pessoas vieram primeiro, mas não podemos nos esquecer de
instâncias como as Comunidades Eclesiais de Base (CEBs); os movimentos e
associações de fiéis; as comunidades ambientais e transterritoriais e as
pastorais. Assim, na ordem de tratamento dos sujeitos da conversão pastoral,
o capítulo quinto coloca numa segunda parte essas instâncias, ou organismos.
Falaremos também brevemente delas e destacaremos asua importância nesse
processo de mudança pastoral, para que as estruturas da paróquia se
transformem em Comunidade de comunidades.
Assim sendo, o capítulo quinto do Documento 100 destacou de início que
todos estão envolvidos nesse processo de renovação paroquial, cada um com
as suas diferentes tarefas, nas suas diferentes instâncias e espaços onde
podem contribuir. Porém, é imprescindível que se tome consciência de que o
fortalecimento da concretização da paróquia como Comunidade de
comunidades supõe a multiplicação de ministérios e serviços dos discípulos e
discípulas missionários, ou seja, supõe o envolvimento de todos, pois essas
mudanças propostas significam multiplicação de serviço e isso demanda mais
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agentes, mais pessoas envolvidas e mais pessoas convertidas pastoralmente.
Não dá para querer mudanças estruturais e pastorais dessa natureza e
continuar um pequeno grupo de pessoas fazendo sempre as mesmas coisas,
sem abertura e expansão das ações, sem conversão. Lembrando que estamos
tratando aqui de conversão pastoral e os seus sujeitos, e as tarefas de
conversão pastoral dependem de um encontro pessoal com Jesus Cristo, daí a
necessidade da conversão pessoal para que a conversão pastoral aconteça.
Porém, esse encontro pessoal com Jesus Cristo só vai ocorrer se a estrutura da
Igreja favorecer. E sabemos que boa parte de nossas estruturas paroquiais,
sobretudo estruturas pastorais, não favorecem esse encontro com Cristo.
Então, o que falta para que essa conversão aconteça? Falta algo essencial: o
acolhimento.
O acolhimento é um elemento fundamental. Não podemos negligenciar ou
descuidar do acolhimento, em todas as instâncias e entre todos os sujeitos
desse processo. Por isso, o Documento 100 recorda que não podemos perder
de vista a pessoa de Jesus Cristo, o Bom Pastor, que acolhe o seu povo,
sobretudo os pobres. Uma paróquia que não se preocupa com acolhimento,
sobretudo dos pobres e marginalizados, não pode dizer que está no caminho
da conversão pastoral. Portanto, pessoas e estruturas mais acolhedoras são
elementos primordiais na conversão pastoral da paróquia. O agir de Jesus
revela um novo jeito de cuidar das pessoas, e o papa Francisco vem dando
esse exemplo. Agora cabe aos bispos, presbíteros, diáconos, consagrados e
consagradas e leigos seguir esse exemplo para que a conversão pastoral da
paróquia aconteça. O Documento 100 diz que a renovação paroquial depende
de um renovado amor à pastoral, e só vai haver amor à pastoral se existir
conversão pessoal e pastoral de cada agente.
Assim sendo, é preciso que todos os sujeitos da conversão pastoral se
comprometam a ser presença evangelizadora, pessoas acolhedoras, próximas
umas das outras, especialmente junto aos marginalizados, aos que se
encontram nas periferias, sejam periferias geográficas ou existenciais, porque
não existe apenas uma categoria de marginalizados ou de periferias. Por essa
razão, não importa a localização geográfica de sua paróquia, pois ali vai
existir algum tipo de marginalizado, e de periferia, e é preciso que os agentes
de pastoral estejam atentos a eles para acolhê-los e recebê-los.
O papa Francisco disse em uma de suas homilias (Mensagens e homilias
— JMJ, Rio 2013, p. 95) que “no anúncio evangélico, falar de periferias
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existenciais descentraliza, e, habitualmente, temos medo de sair do centro. O
discípulo-missionário é um descentrado: o centro é Jesus Cristo, que convoca e
envia”. Ou seja, se queremos que a conversão pastoral aconteça, precisamos
deixar de querer ser o centro das coisas e dos acontecimentos e precisamos
voltar para as diferentes formas de exclusões e periferias que existem no
mundo de hoje e na Igreja. Assim sendo, é preciso que haja mudança de
mentalidade. A conversão pastoral supõe mudança de mentalidade, e “a
mudança de mentalidade e de atitude depende, portanto, da superação do
medo que impede a missão” (n. 194). Em suma, a conversão pastoral supõe
algumas mudanças elementares: mudança de mentalidade, mudança de
atitude, superação do medo, superação do comodismo, superação de
preconceitos e acolhimento fraterno a todos.
Assim, os bispos devem ser os primeiros a fomentar, em toda a diocese, a
conversão pastoral das paróquias e de seus pastores. O documento afirma que
eles são os responsáveis por desencadear o processo de renovação das
comunidades (n. 195), e que o papa Francisco vem estimulando a serem
pastores, a estarem mais próximos das pessoas, usando a paciência e a
misericórdia. Isso serve também para os padres, pois esse gesto de
acolhimento é fundamental para essas mudanças pastorais. Por isso, o papa
Francisco questionou bispos e padres ao perguntar: “Procuramos que o nosso
trabalho e o de nossos presbíteros sejam mais pastorais que
administrativos?”. O papel do bispo de imprimir uma linha mais pastoral que
administrativa na diocese é importante para essa mudança de mentalidade (n.
198). O Documento 100 não quer dizer com isso que haja um descuido
administrativo, mas que nós não fiquemos apenas voltados para o
administrativo, pois essa parte os leigos podem fazer muito bem, sem que
gastemos a maior parte de nosso tempo, de pastores, apenas com
administração burocrática, e não com pessoas que carecem de pastores,
missionários, evangelizadores.
O mesmo apelo feito aos bispos é feito também aos padres. Enquanto os
bispos devem ajudar os padres a enfrentar os desafios diários da missão e as
dificuldades pastorais, os padres devem ajudar os leigos, sendo animadores de
comunidade, pastores da comunidade, dedicados, generosos, acolhedores e
abertos ao serviço da comunidade (n. 199). Lembra que quantidade de
trabalho não é sinônimo de qualidade, e alerta para o excesso de atividades
dos padres como um sinal preocupante: “pode prejudicar o equilíbrio pessoal
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do padre” (n. 199), e um padre pessoalmente desequilibrado não ajuda a sua
comunidade. Portanto, é preciso ter cuidado com o ativismo, com o excesso
de atividades, com a correria do dia a dia que nem sempre significa que o
padre esteja sendo um verdadeiro pastor. Por outro lado, também não se deve
acomodar e não ter ações pastorais que contribuam para a conversão pastoral.
Na parte que toca a conversão pastoral dos padres, o Documento 100 faz
diversos alertas e traz importantes recomendações, entre elas a preocupação
com o excesso de atividades e o ativismo, como já foi citado, mas também
com a falta de formação, de atualização do padre. Se se quer conversão
pastoral é preciso atualizar, acompanhar as mudanças, receber formação
permanente. Alerta também para a postura do padre na comunidade, sendo
coerente entre o que diz e o que faz; sendo presença e presença acolhedora,
atendendo as pessoas e cultivando uma profunda experiência de Cristo. Assim
sendo, a renovação paroquial requer novas atitudes dos párocos (n. 204),
sendo servidor do povo.
Quanto aos diáconos permanentes, o Documento 100 retoma uma
recomendação do Documento de Aparecida, sugerindo que eles “acompanhem
a formação de novas comunidades eclesiais, especialmente nas fronteiras
geográficas e culturais, onde ordinariamente não chega a ação evangelizadora
da Igreja” (DAp, n. 205). Sobre os consagrados e as consagradas, o
Documento 100 diz que eles são chamados a participar diretamente da
renovação paroquial (n. 207), destacando que, através dos seus carismas e
de uma ação pastoral muito próxima do povo, eles podem contribuir de
maneira eficaz nesse processo. Já dos leigos é pedido que superem o
clericalismo, cresçam em responsabilidades e participem ativamente nas
comunidades, nos Conselhos Paroquiais e na administração da paróquia. Para
isso, é preciso que se invista em formação, em todos os níveis e áreas, para
que eles possam compreender-se como sujeitos da comunidade eclesial e
assim se engajar cada vez mais na missão (n. 212).
Por fim, esse capítulo quinto traz as instâncias, instituições e categorias
que devem contribuir nesse processo de renovação paroquial, através da
conversão pastoral, a saber: a família e, dentro dela, as mulheres, os jovens

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