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1 A Importância do Reposicionamento de Marcas no Contexto Competitivo – O Caso das Sandálias Havaianas Autoria: Francisco Antonio Serralvo, Karen Perrotta Lopes de Almeida Prado, Cirstine Andrade Musso Leal Resumo: tendo por base a premissa de se revitalizar o desempenho de produtos, enfocou-se o reposicionamento de marcas como fator de ampliar a ação dos produtos em mercados de elevada competitividade. O objetivo do estudo foi estudar as mudanças essenciais necessárias para a revitalização das marcas e como o reposicionamento pode se constituir em um fator de melhoria no desempenho de produtos. Pautado em um estudo de caso exploratório – o das sandálias Havaianas, tendo como referencial teórico o modelo de reposicionamento de marcas da McKinsey, os resultados apontaram para a eficácia dos efeitos resultantes da aplicação do modelo. O slogan “Todo mundo usa” constituiu-se na grande promessa e garantia que todas as pessoas realmente usariam a “nova” Havaianas, conferindo, assim, credibilidade à mensagem, alterando então a imagem do produto aos consumidores atuais e novos. Finaliza- se com a validação das premissas, que as mudanças reais e simbólicas podem reposicionar o produto e, por decorrência, melhorar o seu desempenho competitivo. Palavras-chave: reposicionamento, marca, imagem de marca. INTRODUÇÃO A dinâmica da complexidade dos mercados tem estabelecido as premissas centrais do ambiente dos negócios, marcado essencialmente pelo acirramento da competição nos mais diversos segmentos, notadamente os de consumo de massa. Tornar-se mais competitivo tem sido uma premissa dominante no mundo dos negócios. A cada dia, novas dificuldades se apresentam aos gestores das organizações que precisam resolver situações, via de regra, relacionada ao desempenho do produto. As dúvidas e incertezas nessa área quase sempre recaem para as possibilidades de reversão das tendências de queda ou estagnação do desempenho. Como lidar com as questões relativas ao desempenho do produto? Como aumentar o potencial competitivo de uma marca? Como revitalizar produtos e marcas existentes no mercado que se encontram desgastados ou sem perspectivas de crescimento? Os objetivos deste trabalho centram-se no estudo das mudanças essenciais para a revitalização das marcas e como o reposicionamento pode contribuir na melhoria da imagem e no desempenho de produtos sem perspectivas de crescimento no mercado. As premissas centrais partem do estudo do reposicionamento das marcas no mercado fundamentado nas mudanças reais (intrínsecas) ou simbólicas (extrínsecas) do produto. Os pontos essenciais focam a importância de se realizar essas mudanças e como elas podem ser operacionalizadas no âmbito dos mercados consumidores. A reflexão parte, portanto, dos fundamentos da marca – suas funções e finalidades. Passa pela necessária categorização das marcas, analisa os princípios do posicionamento e investiga os modelos de reposicionamento da marca. O estudo de caso das sandálias Havaianas complementa o conjunto de estudos na verificação do modelo de reposicionamento investigado, que é o proposto pela McKinsey (COPELAND, 2001). METODOLOGIA 2 A abordagem ao problema ora formulado se deu em duas etapas: a primeira constituiu- se na revisão da teoria tendo como objetivos identificar as bases fundamentais que norteiam a delimitação teórica do fenômeno e como suas dimensões essenciais podem ser investigadas e focalizadas. A segunda pautou-se no desenvolvimento de um estudo de caso com vistas a se verificar a aplicação das teorias investigadas. PRIMEIRA FASE – REFERENCIAL TEÓRICO O constructo teórico foi desenvolvido tendo-se por base as fundamentações e postulações conceituais relativas a marcas (suas origens e fatores determinantes da sua gestão), classificação das marcas (grau de importância e variáveis centrais que permitam a categorização dos diferentes tipos de marcas), posicionamento (como se constitui e se operacionaliza o posicionamento das marcas e sua importância no processo de influência das atitudes dos consumidores) e, por fim, o reposicionamento tendo sido estudado os modelos de Kapferer (1992), Marder (1997), Keller (1998) e McKinsey (COPELAND, 2001), em que a escolha para a análise do fenômeno recaiu para o modelo desenvolvido pela McKinsey. SEGUNDA FASE – ESTUDO DE CASO O procedimento para as verificações dos postulados teóricos (modelo de reposicionamento) apoiou-se na elaboração de um estudo de caso, dado as particularidades do fenômeno em estudo (o reposicionamento das marcas) e as características exploratórias determinantes da investigação do fenômeno. Yin (1993, p. 5) classifica os estudos de caso de acordo com a abordagem da pesquisa, que pode ser exploratória, descritiva e causal. Ademais, o estudo de caso pode ser único ou múltiplo, o que gera a possibilidade de seis combinações. Stake (1995, p. 3), por sua vez, classifica os estudos de caso em intrínseco (particularidade do estudo – sem generalizações) e instrumental (entendimento do fenômeno pela análise específica do caso). Stenhouse (1988, p. 50) classifica os estudos de caso como avaliativo (julgamento do mérito); educacional (auxílio da compreensão e aplicação dos fenômenos) e pesquisa ação (busca do refinamento do processo decisório). Optou-se por um estudo de caso único de caráter exploratório, em virtude de se buscar uma melhor delimitação conceitual e entendimento do fenômeno do reposicionamento de marcas. PROTOCOLO DO ESTUDO DE CASO Para Yin (2001, p. 89), “um protocolo para o estudo de caso é mais do que um instrumento. O protocolo contém o instrumento, mas também contém os procedimentos e as regras gerais que deveriam ser seguidas a se utilizar o instrumento”. O protocolo apresenta quatro seções: a) visão geral do projeto do estudo de caso; b) procedimentos de campo; c) questões do estudo de caso; d) guia para o relatório do estudo de caso. a) Visão geral do projeto A temática em tela – identificar fatores que possam alavancar o desempenho competitivo de um produto – pautada no estudo das marcas e como elas podem contribuir para a melhoria do desempenho competitivo dos produtos, notadamente em situações nas quais as demais variáveis do composto de marketing não conseguem os efeitos e resultados desejados, tinha como ponto central a identificação de um produto de consumo de massa que tivesse passado por um processo de redefinição de toda a sua estratégia de marketing, com conseqüente reposicionamento de marca. Dos casos de maior destaque no segmento de bens de consumo de massa, duas situações estavam em evidência: a Assolan e a Havaianas. A escolha da análise do caso da Havaianas se deu em função da aceitação por parte da empresa em participar do estudo. b) Procedimentos de Campo 3 Na coleta de informações para a formulação do estudo de caso, foi realizado, no início deste trabalho, um levantamento documental em dados secundários de domínio público e em vários documentos especializados nos assuntos referentes ao tema deste artigo como reposicionamento e marcas. Além disso, foram realizadas pesquisas em material da própria empresa e revistas de grande circulação do país devido à atualidade do tema. Além desses levantamentos, realizaram-se três entrevistas no mês de abril deste ano. Foram feitas entrevistas com: o Diretor de Comunicação e Mídia, Rui La Laina Porto, a Diretora de Planejamento Estratégico, Andrea Koschnitzki e a Consultora Executiva de Comércio Exterior, Ângela Hirata. As entrevistas possuíam um roteiro e foram aplicadas pessoalmente pelos pesquisadores e autores deste artigo. c) Questões do estudo de caso Os principais assuntos abordados durante as entrevistas foram: identificação do momento adequado de se fazer um reposicionamento de marca na empresa, objetivos com o reposicionamento, identidade e imagem da marca, processo de reposicionamento, participação de mercado, verba de marketing, concorrência e resultadosalcançados. d) Plano de análise O caso em pauta foi desenvolvido tendo por base a “estrutura analítica linear” (YIN, 2001, p. 171), que se caracteriza pela seqüencialidade das análises realizadas. A estrutura organizada para este caso foi a seguinte: contextualização do produto no mercado brasileiro, pressupostos do ambiente operacional da empresa (fatores internos e externos), identificação do problema, caracterização das ações desenvolvidas (verificadas em torno do modelo teórico selecionado), análise dos resultados (principais evidências resultantes das análises realizadas). FUNDAMENTAÇÃO TEÓRICA Utilizada desde o final dos anos 1800 nos Estados Unidos, a gestão das marcas (ou, do original em inglês branding) tem assumido importância cada vez maior no ambiente de negócios das organizações. Centrado especialmente nos expressivos resultados obtidos pelo desempenho dos produtos, o processo de gestão das marcas tem se especializado a ponto de se transformar em uma nova competência do marketing, sendo resultado, em grande parte, da intensificação da competição nos mais variados setores da economia dos tempos atuais. Embora ligada ao “P” do Produto (na gestão do composto de marketing), a gestão de marcas tem sido evocada como uma variável dinâmica e estratégica na gestão dos negócios. Todavia, em que pese a seu favor a progressiva coleção de bons resultados, resta saber em quais dimensões a marca pode contribuir efetivamente para o fortalecimento da competitividade das organizações, em especial àquelas voltadas para a produção e comercialização de bens de consumo de massa. O termo marca tem suas origens na antiga palavra norueguesa que significava queimar to burn (SCHULTZ, BARNES, 2001, p.36) e, desde então, tem sido utilizado para identificar os bens e serviços no campo dos negócios. Keller (1998, p. 27) identifica o uso das marcas como forma de controle que as guildas (espécie de associação comercial – dos artesãos – na Idade Média) estabeleciam para determinar a origem e, portanto, a qualidade dos produtos comercializados pelos artesãos da época. No sentido moderno, a gestão das marcas no plano dos negócios surgiu nos Estados Unidos com o desenvolvimento do sabonete Ivory da Procter & Gamble no final dos anos 1800 (KELLER, 1998, p. 27), em que as técnicas da estrutura de valores e diferencias do produto foram, pela primeira vez, associadas à dimensão da marca de forma organizada e planejada. Ao se analisar a formação estrutural do conceito, nota-se uma convergência nas definições voltada para dois fatores centrais: a identificação dos produtos e a diferenciação 4 da oferta. De certa forma, percebe-se que esses fatores centrais guardam estreita relação com os fatores que originaram o uso da marca (NILSON, 1998, p. 57). Assim é que, ao se analisar as definições mais usualmente empregadas para o vocábulo, podem ser observados os pontos de convergências anteriormente citados. As definições pesquisadas apresentaram os seguintes enunciados: Para McCarthy e Perreault, o conceito centra-se no fator “identificação” e focalizam a definição da marca como: Marca significa o uso de um nome, termo ou símbolo ou design, ou uma combinação desses elementos, para identificar um produto (McCARTHY; PERREAULT, 1997, p.157) Os autores Boone e Kurtz acrescentam ao fator “identificação”, outro fator, o da “diferenciação” ao proporem a seguinte definição: Marca é um nome, termo, sinal, símbolo, desenho ou alguma combinação usada para identificar os produtos de uma empresa e diferenciá-los das ofertas dos concorrentes (BOONE; KURTZ, 1998, p.281) Caminham na mesma direção Pride e Ferrel ao estabelecerem que: Marca é um nome, termo, desenho, símbolo ou qualquer outro aspecto que identifique um bem ou serviço de um vendedor e que o distinga dos bens e serviços de outros vendedores (PRIDE; FERRELL, 2001, p. 225) Por fim, corroboram com todas as posições acima Etzel e outros ao fazerem a seguinte afirmativa: Marca é um nome e/ou símbolo que pretende identificar o produto de um vendedor ou grupo de vendedores e diferenciar o produto da concorrência (ETZEL et al., 2001, p. 246). É bem verdade que todas essas definições têm uma origem em comum, a definição oficial estabelecida pela AMA – American Marketing Association, que traz o seguinte enunciado: Marca é um nome, termo, sinal, símbolo, ou qualquer outra característica que identifique um bem ou serviço do vendedor, em distinção a outros dos demais vendedores (BENNETT, 1995, p. 26). Por outro lado, autores que se dedicaram a pesquisar especificamente as marcas, entre eles Aaker (1996), Keller (1998), Kapferer (1992) e outros, adotam definições absolutamente similares, ou mesmo idênticas à preconizada pela AMA. Todavia, ainda que o tecido conceitual atualmente estabelecido permita, de certa forma, delimitar o campo das marcas no sentido de identificar e diferenciar a oferta das opções que competem no mercado cabe refletir se esse escopo é suficiente para dimensionar as marcas no atual nível de complexidade que tem caracterizado o ambiente de negócios das organizações. Dessa forma, o que se questiona é se a dimensão atual do conceito é suficiente para expressar de forma ampla os principais constructos inerentes à dinâmica das marcas. Em outras palavras, o que as atuais definições das marcas não abordam? O que é, na atualidade, mais relevante na função das marcas? Em uma dimensão mais abrangente, observa-se que as marcas hoje vão mais além do que identificar ou diferenciar o produto no mercado frente os concorrentes. Prefere-se, pois, desenvolver uma visão mais ligada ao processo de “ancoragem do produto”, ou seja, determinar os “referenciais mercadológicos” no sentido de dar a sustentação ao produto – na verdade, entende-se que a função central das marcas deva ser a de criar referenciais que a credenciem no mercado, dando sentido, vida e dinamismo a tal ponto de poder estabelecer a preferência pelo produto, não só influenciando o consumidor, como também determinando 5 padrões de comportamento. Outra dinâmica relativa à ancoragem dos produtos refere-se à lealdade a marcas, que se traduz, em última instância, por “uma relação de continuidade que se estabelece entre o consumidor e a marca em perspectiva, na busca de recompensas de bem- estar e satisfação pessoal” (SERRALVO, 1999, p. 164). Uma possível construção da definição da marca nessa perspectiva é, portanto: “marca é o conjunto de referenciais físicos e simbólicos capazes de influenciar e determinar a preferência para os produtos, tendo por base a oferta de valor a ela associada”. O sistema de preferência assume o sentido de estima capaz de determinar as razões de escolha da marca, estando amparado nos atributos do produto combinados com as outras variáveis gerenciais do composto de marketing, notadamente o preço e a distribuição, além da própria promoção, fator central nas ações de posicionamento da marca. CLASSIFICAÇÃO DAS MARCAS Mais do que delimitar conceitualmente as marcas, a dinâmica da sua gestão implica, dentre outros fatores, na determinação de variáveis que permitam o estabelecimento de critérios gerenciais mais específicos. A classificação ou categorização das marcas é, por decorrência, um desses fatores gerenciais substanciais para a gestão da marca. Todavia, esses critérios não estão definidos de maneira uniforme e são, em geral, pouco abrangentes. Restam, portanto, muitas indagações, tais como: Como as marcas podem ser classificadas? Por que classificar as marcas? Qual a possível abrangência da classificação das marcas? Em geral, os procedimentos de classificação ou categorização de conceitos esbarram na natural dificuldade de se determinar as fronteiras que discriminam uma categoria (ou classe) das demais. O entrelaçamento das fronteiras usualmente cria inúmeros obstáculos nos pontos de sobreposição de uma categoria para outra, podendo chegar a tal ponto de se descaracterizara separação proposta. O desafio é, portanto, estabelecer os limites do alcance das categorias. No entanto, dificuldades a parte, classificar as marcas é um pressuposto essencial para o desenvolvimento do conceito de posicionamento. Os tipos de classificação mais usualmente encontrados apontam para três grupos: marca do fabricante (quando a marca é de propriedade e identifica o fabricante do produto – ex. Nestlé), marca do intermediário (quando a marca pertence ao canal – atacado ou varejo – ex. Pão de Açúcar), e marca genérica (quando não há a identificação do produto, apenas indica a sua categoria – ex. legumes). Nesse sentido, Boone e Kurtz (1998, p. 286-7) classificam as marcas em dois grupos: de fabricantes (ou nacionais) e marcas particulares. Nessa mesma perspectiva, Etzel e outros (2001, p. 246-7), também classificam as marcas como marca de produtores e marca de intermediários. Para Churchill Jr. e Peter (2000, p. 256- 7), no entanto, as marcas estão categorizadas em marcas de fabricantes, marcas próprias e marcas genéricas. Pride e Ferrell (2001, p. 231) concordam com essa classificação mais ampla, ao categorizarem as marcas como do fabricante, próprias (privadas) e genéricas. Boone e Kurtz (1998) ao assumirem como sinônimo as marcas do fabricante e marcas nacionais, partem do princípio que uma marca do fabricante tem sempre uma ampla cobertura e é, portanto, distribuída nacionalmente. Os autores partem, no entanto, de uma premissa falsa, pois a marca pode ser do fabricante e ter distribuição regional. Existem inúmeros exemplos que contradizem a visão dos autores, como café torrado e moído (Café Tupã, Da Serra etc.), refrigerantes (Convenção, Jesus, Arco-Íris etc.), entre outros. Por outro lado, classificar como marcas genéricas há intrinsecamente uma incongruência, pois por marca genérica se assume a “ausência de marca”. Semenik e Bamossy (1996) atribuem o surgimento do conceito de “produtos genéricos” (ou sem nomes) na França, nos anos 70, com o apelo de boa qualidade e baixo preço. A transposição de produto genérico para marca genérica ocorre logo após. Nickels e Wood (1999, p.168-9) afirmam que uma “marca genérica não possui um nome de marca, ela é identificada apenas pela categoria do produto”. Em sentido análogo, Etzel e outros (2001, p. 231) estabelecem que as marcas 6 genéricas “indicam apenas a categoria do produto”. Há, portanto, uma apropriação inadequada do conceito de “marcas genéricas”, sendo preferível apenas o termo “produto genérico”, este sim com ampla aplicação, notadamente as commodities. As diferenças nas terminologias entre marca do canal (intermediário) e marca particulares ou privadas, mais parecem com impropriedades de tradução dos originais do que propriamente diversidade de conceituação. Em suma, pode-se afirmar que uma classificação mais adequada deve estabelecer dois grupos (tipos) de marcas: 1) a dos fabricantes e 2) a dos canais de marketing (atacado ou varejo). Ademais, essas duas grandes categorias podem ser subdivididas em duas outras categorias cada: 1) dos fabricantes em: 1.1) marcas líderes (que se caracterizam pelas marcas de maior expressão no mercado – independentemente de serem as líderes de mercado – e que apresentam fortes apelos de preferência pelos consumidores), 1.2) marcas de primeiro preço (também denominadas de marcas B, e que se caracterizam pela classe de marcas que, em geral, apresentam um menor nível de demanda, e que são vendidas, em essência, mais pelo forte apelo do baixo preço). As marcas dos canais de marketing também podem ser subdivididas em duas classes: 2.1) marcas próprias (quando a marca é identificada pela mesma marca do canal – ex. Carrefour), 2.2) marcas exclusivas (quando a marca é de propriedade de um canal de marketing, mas adota um nome diferente da marca do canal – ex. Great Value da Rede Wall Mart). A marca exclusiva diferencia-se da marca do fabricante pelo fato de ser distribuída apenas na rede que detém a sua propriedade. POSICIONAMENTO Por vezes confundido com o posicionamento competitivo, o posicionamento de marca é um conceito relativamente novo e, por decorrência, ainda pouco claro para pesquisadores e praticantes do marketing nas organizações. Ademais, é de elevada complexidade de estudo, uma vez que, lida essencialmente com os mecanismos mentais dos consumidores, sendo de extrema dificuldade a pesquisa nessa área. A própria revisão da literatura indica, de certa forma, essa imprecisão com que os autores tratam a temática. De difícil precisão, os enunciados conceituais abordam, em geral, de forma mais genérica, como refletem as definições relacionadas abaixo. Posicionamento é um conceito de ampla aplicação. Ele indica que um produto não é nada até que seja claramente posicionado na mente das pessoas em contraste com os produtos dos competidores (KAPFERER, 1992, p. 40) Embora procurando traçar a comparação inerente à relatividade competitiva, Kapferer (1992) apenas indica que o posicionamento é um processo mental. O posicionamento da marca é a bússola de sua identidade, que alavanca a sua posição competitiva e estabelece uma melhor relação com os consumidores em potencial (UPSHAW, 1995, p. 110). Upshaw (1995) procura articular as questões relacionadas à identidade de marca, posição competitiva e grau de relacionamento, como forma de se realizar o posicionamento da marca. Cabe salientar, no entanto, que essas variáveis são muito amplas e pouco delimitam o conceito, pois uma ação promocional de venda pode obter esses mesmos efeitos. O posicionamento proporciona o significado contextual da marca e define como ela é comparada com as marcas concorrentes (DUNCAN e MORIARTY, 1997, p. 73) Os autores não esclarecem adequadamente o “significado contextual da marca”, ficando vago e sem referenciais como o posicionamento é, ou pode ser realizado. Ainda mais, apenas os aspectos comparativos são elementos muito tênues para se estabelecer uma delimitação conceitual. 7 A essência do posicionamento da marca é a existência de alguma vantagem competitiva representada por uma ‘proposta única de venda’ que leva o consumidor a ter alguma razão para escolher essa determinada marca (KELLER, 1998, p.77). Muito embora não se refira especificamente aos processos mentais, Keller (1998) aponta para fatores um pouco mais específicos, ao enfatizar a “proposta única de venda” e os determinantes de “razão para compra”. Uma vez mais, observa-se que a ampla generalização conceitual permite a aplicação das mesmas bases para outros conceitos do marketing. Os criadores do conceito, Ries e Trout (1996), ao lançarem a idéia do posicionamento (a publicação do texto original em inglês se deu em 1981), também não foram específicos na fundamentação, pois ficaram apenas na perspectiva intrínseca da “manipulação da mente” do público alvo. O posicionamento é o que você faz com a mente do cliente potencial, ou seja, você posiciona o produto na mente do seu cliente (RIES, TROUT, 1996, p. 4-5). Na concepção apresentada por Kotler (2000), porém, o posicionamento assume uma forma um pouco mais objetiva e o autor consegue estabelecer os princípios de forma um pouco mais clara, ao determinar que se trata de “ocupar um lugar de destaque” na mente dos clientes-alvo por meio do desenvolvimento da “imagem da empresa”. Posicionamento é o ato de desenvolver a oferta e a imagem da empresa para ocupar um lugar destacado na mente dos clientes-alvo (KOTLER, 2000, p. 321). Muito embora o termo ainda careça de precisão maior, há um ponto que perpassa todas as visões relativas ao conceito – o processo mental. Posicionar uma marca no mercado significa dizer o desenvolvimento de ações capazes de criar o “referencial interno”, ou seja, que a marca mantenha-se sempre na lembrança do consumidor e seja a primeira a ser lembrada quando uma situação de compra ou de consumo estiver em evidência. Fundamentado essencialmente no processo de comunicação(em todas as suas dimensões: propaganda, promoção de vendas, merchandising, venda pessoal, relações públicas, fatores visuais do produto, marca e embalagem, entre outros), além das características e benefícios inerentes ao produto, o posicionamento é obtido por meio da influência da opinião e crenças do consumidor (geração da imagem) com vistas a incutir uma atitude favorável à marca. REPOSICIONAMENTO Como pode ser observado, posicionar uma marca no mercado requer um planejamento de comunicação muito bem elaborado, inteiramente vinculado às características do produto. Reposicionar uma marca, no entanto, assume riscos ainda maiores, pois se trata de mudar os referenciais existentes para novos referenciais. A forma com que isso é realizado pode gerar resultados absolutamente diversos dos pretendidos. Dentre as propostas encontradas foram analisados os modelos de Kapferer, Marder, Keller e da McKinsey. Para Kapferer (1992) o reposicionamento parte da distinção da oferta – procurando se por que, para quem e quando deve ser realizado o reposicionamento, tendo ainda por perspectiva contra quem (competidores) a marca deve se reposicionar. As variáveis incluídas no processo são: personalidade, cultura, auto-imagem, reflexão, relacionamento e psique da marca em relação ao mercado objetivado. Marder (1997) estabelece, em linhas gerais, que o reposicionamento pode ser ofensivo ou defensivo e consiste em um conjunto de duas variáveis: as promessas e o desempenho da marca frente às opções concorrentes. 8 Keller (1998) assume que o reposicionamento requer o estabelecimento de um conjunto maior de pontos diferenciais da concorrência, tais como “relembrar o público alvo das virtudes da marca” (p. 531) com vistas a obter a paridade e o alinhamento com as novas realidades do mercado, novos paradigmas e/ou reversão de atitudes negativas relacionadas à marca. O modelo desenvolvido pela McKinsey (COPELAND, 2001) – adotado neste trabalho para o estudo do fenômeno –, está fundamentado em duas premissas centrais: promessas feitas ao mercado-alvo versus desempenho do produto, buscando construir uma ponte que conduza o consumidor dos valores percebidos no momento presente para os novos atributos que devam ser despertados no futuro. Essa transposição de valores é realizada tendo por perspectiva quatro variáveis resultantes do cruzamento dos benefícios e da identidade projetados pela marca, com as associações tangíveis e intangíveis proporcionadas pela identidade da marca. Desse cruzamento resultam: benefícios emocionais e benefícios racionais (no âmbito dos benefícios da marca); associações intangíveis e presença (no campo da identidade da marca) – vide figura 1. Figura 1 – Modelo de Reposicionamento McKinsey Fonte: COPELAND (2001, p. 7) Os benefícios emocionais podem proporcionar as fontes mais poderosas de associações com a marca e são representados pelos sentimentos internos (grau de satisfação e recompensa com a marca), sentimentos externos (avaliação do nível do status social e afetivo conferido pelo uso da marca) e os valores percebidos (crenças e opiniões desenvolvidas sobre os atributos da marca). Os benefícios racionais, por sua vez, são representados pelas variáveis ligadas aos contatos físicos da marca realizados por meio do produto com o mercado-alvo: funcional (relacionado ao desempenho do produto), processo (meios e formas pelas quais o produto é entregue) e relacionamento (grau de interatividade dos contatos estabelecidos com o público alvo). As associações intangíveis são, por outro lado, reforçadores altamente positivos dos benefícios emocionais e se constituem da identificação da origem, reputação, personalidade e Benefícios Da Marca Identidade Da Marca Associações Intangíveis Pre sen ça Benefícios Racionais Be ne fíc ios Em oc ion ais Origens Reputação Personalidade Evolução Atividades Apresentação Internos Externos Valores Percebidos Funcionais Processos Relacionamentos Tangíveis Intangíveis O que a marca oferece O que a marca é 9 evolução da marca (atributos normalmente relacionados à tradição, segurança, confiabilidade, grau de desenvolvimento tecnológico, entre outros fatores). A presença caracteriza-se pelas variáveis que vão endossar os atributos físicos da marca, sendo representada pelas atividades da marca (presença da marca nos meios de comunicação e eventos patrocinados pela marca, representando os reforçadores visíveis da imagem) e a apresentação da marca (conjunto de variáveis que possam distinguir a marca no mercado). O conjunto das variáveis do plano intangível (benefícios emocionais e associações intangíveis) é o responsável pelo desenvolvimento das promessas da marca (valores almejados pelo novo posicionamento), ao passo que, o conjunto das variáveis tangíveis (benefícios racionais e presença) deve ser a garantia (resultante do desempenho do produto) de que as promessas serão efetivamente cumpridas. Finalmente, no processo de reposicionamento deve-se ter em mente que será o consumidor, em última instância, que vai determinar o nível de apropriação das promessas realizadas e o grau de relacionamento desejado com a marca. Desta forma, neste artigo optou- se pelo modelo McKinsey. ESTUDO DE CASO – HAVAIANAS A empresa São Paulo Alpargatas S.A. foi fundada com o nome de Fábrica Brasileira de Alpargatas e Calçados em 3 de abril de 1907 no bairro da Mooca em São Paulo. O objetivo inicial da empresa era produzir no Brasil um calçado de origem espanhol chamado alpargata constituído de uma estrutura de lona grossa e solado de cânhamo. Este foi considerado na época um dos calçados mais baratos do país. A empresa, de início, teve um bom crescimento, mas passou por momentos difíceis durante as décadas de 30 e 40. Nos anos 50, a empresa diversificou suas linhas de produtos aproveitamento as oportunidades do momento e em 1962, foram lançadas as sandálias Havaianas, alvo do estudo deste artigo, com muito sucesso. Os concorrentes tentavam copiar as sandálias, mas não conseguiam obter uma boa imitação. Entretanto, a partir do final dos anos 80 e início dos anos 90, as sandálias estavam associadas à falta de elegância e muitas vezes, era vista com um posicionamento popular. Este assunto será detalhado a seguir. Hoje, a empresa que passou por várias transformações ao longo do tempo possui no seu portfolio além da marca Havaianas, as marcas: Bamba, Botas Sete Léguas, Conga, Lonas Alpargatas, Mizuno, Rainha, Topper e Timberland. PROBLEMA Para contextualizar os motivos que levaram a empresa a reposicionar a marca Havaianas e melhorar a compreensão sobre o fenômeno, vale traçar um histórico desde o seu lançamento até o seu declínio no que se refere ao ciclo de vida de um produto. As sandálias Havaianas foram lançadas em 14 de junho de 1962 com um design inspirado no modelo de uma sandália japonesa, conhecida como Zori, em que era composta por um fino solado de palha e tiras de tecido. Para adaptação do modelo japonês ao mercado brasileiro, a São Paulo Alpargatas utilizou como matéria-prima a borracha natural e sintética e isto garantia calçados duráveis e confortáveis. Embora o design das sandálias Havaianas fosse de origem oriental, seu nome foi inspirado no Havaí, o paraíso do sol e do mar, onde os ricos e famosos norte- americanos na década de 60 passavam suas férias. Esse nome era considerado ideal, já que o calçado era adequado para o uso em países de clima quente, pois deixava os pés descobertos, evitando o excesso de transpiração. Em relação à denominação do produto, as Havaianas foram comercializadas como uma marca de sandália e não um chinelo. Isto porque, segundo o Dicionário de Língua Portuguesa, os significados atribuídos a estas palavras são: “Sandália - Calçado feito de uma sola com tiras que a prendem ao pé. Chinelo – sapato velho. Calçado macio e confortável, com ou sem salto, destinado a ser usado em casa (HOUAISS, 2005)”. A palavra chinelo,por 10 possuir um significado que depreciava o produto e restringia seu uso, estava muito distante do posicionamento desejado pela marca. No entanto, embora houvesse uma preocupação em divulgar a Havaianas como marca de sandália, percebe-se que a maioria das pessoas a identifica como um chinelo de dedos. O lançamento das sandálias em 1962 foi um sucesso, uma vez que elas eram simples, mas inovadora para a época e tinham como público-alvo o foco na classe média. O sucesso do produto e a facilidade de produção fizeram com que os concorrentes copiassem as sandálias, mas estes não conseguiam obter uma boa imitação. Para combater as cópias, a agência de publicidade JW Thompson, que detinha a conta da marca na época, criou os slogans “As únicas que não deformam, não têm cheiro e não soltam as tiras” e “Legítimas, só Havaianas” anunciadas por muitos anos na televisão pelo humorista Chico Anysio. Entretanto em 1988, com o avanço dos concorrentes, a empresa teve uma forte queda nas vendas de 88 milhões de pares para 65 milhões de pares com uma margem cada vez menor ao longo do tempo. Além disso, vale ressaltar que a empresa manteve por 32 anos o mesmo produto sem nenhuma inovação como também a classe média foi impactada pelo lançamento de produtos diferenciados como os chinelos Rider, da empresa Grendene. Em vista disso, o volume e a rentabilidade das sandálias Havaianas iniciaram um processo cíclico de declínio: o foco em redução de custos para aumento da rentabilidade fez com que o preço do produto fosse seu único diferencial no mercado, tendo como fim, seu uso restrito as classes de menor poder aquisitivo. As pesquisas indicavam que a imagem das sandálias Havaianas era de um produto bom, confiável, porém o produto estava associado a um atestado de pobreza sem apelo de charme e glamour. REPOSICIONANDO A HAVAIANAS Em 1994, a Alpargatas definiu uma estratégia para reposicionar as sandálias Havaianas. Em decorrência da queda das vendas e de uma imagem negativa sobre o produto, percebeu-se que além das classes D e E, alguns formadores de opinião pertencentes à classe A usavam as sandálias. Em vista disso, a empresa tinha como objetivo passar a vender o produto para as classes mais privilegiadas como um todo e aumentar a sua margem. A estratégia da Alpargatas de reposicionar a marca Havaianas exigiu um investimento em um novo produto, nova embalagem, distribuição, comunicação e alteração no preço. De acordo com o Diretor de Comunicação e Mídia, Rui La Laina Porto “foi fundamental que todas essas mudanças ocorressem simultaneamente. A Alpargatas não alterou o produto e depois a embalagem, e meses depois criou uma nova estratégia de comunicação. Tudo aconteceu ao mesmo tempo”. Essa estratégia de revitalização da marca teve o seu início com o lançamento do produto chamado Havaianas Top. Esse modelo era monocromático e foi criado por alguns consumidores de Havaianas que em geral viravam a sola do produto para ficar com uma única cor. Este modelo teve tamanha aceitação pelos consumidores, que a empresa não economizou esforços para criar novas linhas como as Havaianas Fashion, Surf, Kids, Brasil entre outras. Hoje, a marca Havaianas possui cerca de 40 modelos. As mudanças no produto não foram apenas na diversificação do modelo tradicional de Havaianas. Foi criado, de fato, um novo produto que se diferenciava daquelas sandálias que estavam há anos no mercado. Com tiras e solados monocromáticos, houve um aumento de 30% na espessura da sola, tornando o novo produto mais confortável além de ter o nome Havaianas gravado na tira. Essa estratégia de revitalização fez com que a marca Havaianas lançasse novas sandálias seguindo as cores ditadas pela moda. Nesse caso, há um foco no próprio consumidor e nas tendências internacionais. A embalagem do produto também sofreu alteração. Antigamente, as sandálias eram vendidas em sacos plásticos amarrados com barbante e com o reposicionamento, estas passaram a ser comercializadas em cartuchos. 11 Outra importante mudança aconteceu nos canais de distribuição. De acordo com Rui Porto, “mudamos o ponto-de-venda. Tivemos a coragem de dizer para os grandes atacadistas que esse novo produto não era para eles ainda. Talvez um dia fosse como hoje é. [...]. Isso foi acontecendo aos poucos. Passamos para sapatarias, lojas de esporte, shoppings”. Deixando de utilizar atacadistas como canal, as Havaianas Top passaram a ser distribuídas em lojas especializadas em calçados e grandes redes de varejo. A exposição do produto no ponto-de-venda também foi uma importante transformação. Foram projetados displays personalizados para mostrá-las de forma destacada. Foram desenvolvidos “Havaianeiros”, que deixava a marca exposta, por cores e por tamanhos. “Mostrar o produto é importante. O produto não basta ser bom, tem que parecer bom. Antes disso, as Havaianas eram vendidas em sacos misturados com produtos de limpeza que ficavam jogados no chão ”, destaca Rui Porto. Paralelamente, era necessário rever o preço. As sandálias Havaianas eram consideradas um bom produto, com preço justo, ou seja, os consumidores avaliavam o investimento da compra como “vale o que custa”, uma vez que o produto passou a ser desejado pelos consumidores. No entanto, com a melhora na qualidade do produto e com o objetivo de aumentar a percepção de valor do cliente, a mudança no preço foi fundamental. Dessa forma, o produto passou a ter um preço mais alto, hoje varia de R$ 5,00 a R$ 35,00 dependendo do modelo. Com uma nova agência de publicidade, a Almap BBDO, e com o objetivo de um novo posicionamento para a marca, a estratégia de comunicação foi alterada. Segundo Rui Porto, “resumidamente, deixou-se de falar das qualidades do produto e resolveu-se mostrar quem usa o produto”, sendo direcionada para um público consumidor de classe mais alta. O foco saiu da qualidade do produto para o usuário, trazendo mensagens mais lúdicas e menos funcionais, tornando a compra mais impulsiva. As propagandas eram feitas em forma de testemunhal por celebridades de diversas áreas. A característica principal da comunicação era que todos os testemunhais fossem verdadeiros. As pessoas que apareciam usando Havaianas realmente usavam no seu dia-a-dia na vida real. Além disso, a comunicação era feita com humor, com doses de irreverência e com certa sensualidade. Sempre houve uma preocupação de valorizar as coisas do Brasil e mostrar a brasilidade, utilizando praias como cenário e cores vivas por meio da comunicação da marca. Diversas pessoas conhecidas foram garotos-propaganda da marca, como Malu Mader, Vera Fisher, Carolina Ferraz, Deborah Secco, Luana Piovani, Priscila Fantin, Rodrigo Santoro, Marcos Palmeira, Raí, Reinaldo Gianechini, Fábio Assunção entre outros. Essa estratégia confere credibilidade à mensagem e à marca, tendo em vista que estes avalizavam a marca e o produto. Dessa forma, conseguiu-se mudar a imagem da marca de envelhecida e desgastada que ameaçava o crescimento no mercado brasileiro para moderna e charmosa. Ainda em relação à comunicação, outro passo importante foi a volta à mídia impressa, o que não era feito desde a década de 60. No entanto, o retorno à revista teve um foco no produto. Houve um cuidado em não mostrar o produto em situação de uso, evitando assim um pré-conceito. “Porque se você coloca uma mulher de Havaianas na praia, você já está com um pré-conceito, ou seja, é para mulher e é para usar na praia. [...] Assim, você limita o uso do produto”, destaca Rui Porto. Na revista, o foco era mostrar a linha de produtos, destacando as sandálias como objeto de desejo, enquanto na televisão o foco eram as pessoas que utilizavam o produto em diversas situações. A empresa, hoje, recebe bastante retorno de suas propagandas. Muitas pessoas manifestam suas opiniões em relação às propagandas que estão no ar. “A Havaianas é uma marca que desperta o público. Um carinho e uma relação de afetividade enorme”,afirma Rui Porto. A estratégia de comunicação inclui ainda uma 12 presença forte da utilização de assessoria de imprensa por meio dos formadores de opinião e mídia espontânea. Os eventos patrocinados pela marca também são importantes para o seu novo posicionamento. Existe um foco em patrocinar eventos da moda, que sempre contribuem com a imagem da marca de ser algo desejado, moderno e fashion. O São Paulo Fashion Week, o Fashion Rio e a Semana de Moda de Buenos Aires, além da premiação do Oscar em Hollywood, são alguns dos principais eventos dos quais a Havaianas faz parte. INTERNACIONALIZAÇÃO A entrada da Havaianas no mercado internacional foi iniciada com a abertura da economia brasileira há 10 anos. No entanto, foi somente nos últimos anos que a marca também conseguiu ter uma posição de destaque em esfera mundial. Para tal, uma nova profissional foi contratada pela Alpargatas, Angela Hirata, que assumiu o cargo de Diretora de Comércio Exterior. O sucesso dessa estratégia foi conseqüência de algumas decisões importantes que foram fundamentais para que a marca atingisse a posição que ocupa atualmente. O processo foi exatamente o oposto em relação aos acontecimentos no Brasil. Aqui, as sandálias Havaianas tinham como consumidores as classes mais baixas e depois foram subindo na pirâmide. Em contrapartida, no mercado internacional, principalmente o europeu e americano, a marca já entrou com um posicionamento superior, de qualidade e status. O público-alvo escolhido foi o que eles chamam de High End ou topo da pirâmide. Os países selecionados primeiramente foram França e Itália, por serem importantes referências de moda. Angela Hirata, atual Consultora Executiva de Comércio Exterior, destaca que o grande acontecimento para a marca Havaianas no exterior foi a participação em um Festival da América Latina, que aconteceu na Galerie Lafayette, em Paris, em fevereiro e março de 2002. A própria Angela Hirata esteve presente em Paris para negociar com a Galeria Lafayette. Nesse festival participaram empresas de diversos países com o intuito de promoverem seus produtos e marcas. Foi sugerido pela organização do festival que as sandálias fossem distribuídas como brindes, pois outras empresas participantes ofereceriam brindes aos visitantes. No entanto, Angela Hirata negou o pedido, alegando que se tal fato ocorresse o produto não seria valorizado, não teria valor agregado. Para a marca se diferenciar das outras marcas expostas na feira, foi construída uma “mini-fábrica” onde as pessoas poderiam montar suas próprias Havaianas escolhendo as cores do solado e as tiras, e pagariam um preço pelo produto. O resultado alcançado foi muito positivo e como conseqüência, após março, o produto passou a ser oferecido na Galerie Lafayette. A loja sugeriu o preço de 25 euros, mas Angela Hirata conseguiu negociar a 30, sempre com o foco de posicionar o produto no topo da pirâmide. O sucesso desse evento facilitou a entrada em outros países europeus, além de Estados Unidos e Japão. Angela Hirata afirma que o posicionamento da marca, a escolha dos canais de distribuição e a participação e suporte constante dos traders são os fatores imprescindíveis para o sucesso alcançado para a marca. A preocupação com o posicionamento da marca é grande, visto que as Havaianas não foram comercializadas no exterior nas lojas de varejo Wal-Mart. Com um foco no posicionamento superior ao produto, a escolha desse canal de distribuição poderia ser fatal para sua imagem, e ocorreria uma repetição da experiência brasileira. A comunicação desenvolvida com o mercado externo também recebeu muita atenção da empresa. Há o cuidado em associar a marca a eventos que sempre agreguem valor, evitando mídia de massa, fazendo, assim, parcerias e patrocínios selecionados. No entanto, está no planejamento de 2006, iniciar uma veiculação em televisão em alguns países do exterior. 13 Um fato importante é que a ascensão e o sucesso da marca Havaianas no exterior ao enfatizar a sua origem brasileira realimentam o posicionamento da marca no Brasil. Foram observados não só uma ampliação do uso do produto, mas também um aumento no orgulho das pessoas que utilizam as Havaianas, enfatizando o status e o “ser fashion” ao usar as sandálias. ANÁLISE DOS RESULTADOS A marca Havaianas lançada em 1962 com um posicionamento de uma sandália inovadora e simples perdeu valor, pois, por 32 anos, permaneceu sem fazer nenhuma alteração no produto, ou seja, sempre foi vista pelos consumidores como uma sandália de palmilha branca com as tiras em preto ou azul ou amarelo, deixando para as pessoas uma imagem associada a usos mais tradicionais e ao cotidiano operacional. A recompra era racional e planejada, por quebra das tiras, solado gasto ou perda do produto e para a empresa, o produto durante a década de 90 já não era mais competitivo, apresentando uma margem decrescente durante o tempo (MARCONDES, 2003). Observou-se que a classe média se afastou do produto, pois novas opções surgiam no mercado. Então, em 1994 começou o processo de reposicionamento da marca, que será apresentado a seguir conforme o modelo da McKinsey, uma vez que era necessário para a marca Havaianas uma renovação no produto para que ele obtivesse novamente prestígio. O objetivo inicial do processo de reposicionamento era aumentar o volume e a margem do produto e para isso, fizeram uma mudança no mix de marketing com a inclusão de valor agregado e também de uma ambiciosa estratégia de internacionalização da marca. Houve o desenvolvimento de um novo produto, a diversificação da oferta, mudanças na embalagem, no preço, no ponto-de-venda, nos canais de distribuição e na comunicação. Um fato marcante é que as sandálias passaram a ser comercializadas na Daslu, na França, na Itália, na Austrália, na Colômbia, nos Estados Unidos entre outros países, ou seja, a marca passou a ser vendida em lugares sofisticados elevando o status da marca. Vale destacar que a marca Havaianas detém 85% do mercado de chinelos de borracha em que há destaque para alguns concorrentes como a empresa Rider com a marca Ipanema, a marca pernambucana Dupé no Nordeste pertencente ao Grupo Tavares de Melo, a pirataria internacional e o contrabando. Em relação ao processo de reposicionamento sobre o modelo McKinsey, tem-se: que os benefícios emocionais da marca Havaianas a partir de 1994 estão representados pelos sentimentos internos, que são traduzidos pelo prazer e pela sensualidade de se usar o produto, pelos sentimentos externos, observa-se o status e o prestígio que a marca traz ao usuário, e os valores percebidos que podem ser traduzidos pelo próprio slogan da marca “todo mundo usa” desde um simples trabalhador, passando por estudantes, jornalistas, aposentados, coronéis até atores que ganharam o Oscar nos Estados Unidos. No que se refere aos benefícios racionais, representados pelas variáveis ligadas aos contatos físicos da marca realizados por meio do produto com o mercado-alvo: têm-se as questões ligadas à funcionalidade do produto, que são traduzidas pela sua qualidade, durabilidade e conforto, pois “não tem cheiro, não deforma e não solta as tiras”, o processo se dá pela facilidade de encontrar o produto e pela acessibilidade. A marca se relaciona muito bem com todos os seus públicos de todas as classes sociais e de todos os sexos e idade, desde criança a idosos tendo como alvo mulheres, homens e homossexuais, isto é, não há preconceitos, a marca é democrática. Já a identidade da marca é composta pelas associações intangíveis que são reforçadores altamente positivos dos benefícios emocionais e se constituem da identificação da origem, reputação, personalidade e evolução da marca, e estes podem ser traduzidos pelo humor, pela descontração, pela simpatia, pelo envolvimento, pela irreverência e pela brasilidade que a marca traz. Ao utilizar campanhas com personalidades, a marca Havaianas 14 passoua transmitir mais rapidamente credibilidade e veracidade nas propagandas estreitando a relação do produto com o consumidor gerando assim, um processo de identificação. Este aval contribuiu para quebrar as barreiras de classe social e tornar o produto mais democrático. A presença caracteriza-se pelas variáveis que vão endossar os atributos físicos da marca, sendo representada pelas atividades da marca ao participar do São Paulo Fashion Week e de outros eventos relacionados à moda e pela apresentação da marca que possui como variáveis de diferenciação a simplicidade, a qualidade e o estilo. Um ano após o reposicionamento, as mudanças já eram perceptíveis. Desde o número de unidades vendidas, a margem de lucro, à imagem do produto no mercado. Rui Porto afirma que “foi uma revolução que começou em 94 e em 96, a percepção da marca já era totalmente outra”. A previsão de vendas da primeira coleção da Havaianas Top em 1993 era de300 mil pares em um ano. O resultado alcançado foi de 2 milhões de pares vendidos. Destacando-se que todo o faturamento de Havaianas Top era revertido para sua comunicação. Um fato importante é que a ascensão e o sucesso da marca Havaianas no exterior ao enfatizar a sua origem brasileira realimenta o posicionamento da marca no Brasil. Foram observados não só uma ampliação do uso do produto em que as pessoas começaram a usar as Havaianas em lugares públicos como também as classes menos privilegiadas passaram a usar as Havaianas sem ter vergonha nas ruas, visto que as empregadas domésticas trocavam seus calçados quando iam a padaria, por exemplo. Desde o início dessa nova estratégia, as vendas do produto mais que duplicaram. Em 1993, foram vendidos 70 milhões de pares contando todos os modelos de Havaianas, em contraste com 150 milhões em 2005. Para 2006, há a previsão de aumento de 10 milhões, ou seja, 160 milhões. Hoje, no Brasil, a Alpargatas oferece quase 40 modelos diferentes, além de 30 somente para exportação, isto é, ela possui 70 modelos em linha, fora aqueles que são criados para customização. Destaca-se que a empresa trabalha constantemente com desenvolvimento e lançamento de novos produtos. Existem alguns produtos, no entanto, que são exclusivos para o mercado exterior. A fábrica das Havaianas, localizada em Campina Grande, no estado da Paraíba, está trabalhando atualmente com 100% de sua capacidade produtiva, afirma Andrea Koschnitski, Diretora de Planejamento Estratégico. A fábrica funciona em três turnos de oito horas, todos os dias da semana, ou seja, está sempre em funcionamento, para atender à demanda do mercado. CONSIDERAÇÕES FINAIS O esgotamento das possibilidades na gestão do composto de marketing refletido na estagnação do produto no mercado foi um dos principais fatores que levou a Alpargatas a buscar no reposicionamento da marca Havaianas uma nova possibilidade de ampliar o seu potencial competitivo. A empresa não vislumbrava novos horizontes para a expansão dos seus negócios, a não ser fazer um reposicionamento a fim de mudar os referenciais existentes para novos referenciais. Não havia mais como disputar o segmento em que sua marca estava posicionada com um apelo muito negativo em relação ao produto O reposicionamento foi, portanto, o caminho natural para a resolução do problema. Os resultados do estudo de caso apontam para uma convergência das ações implementadas pela Alpargatas com a marca Havaianas e as que o modelo da McKinsey preconiza. Assim, ao se observar o caminho trilhado pela empresa no processo de reposicionamento da marca, verificou-se que o slogan “Todo mundo usa” constituiu-se na grande promessa e garantia que todas as pessoas realmente usariam a “nova” Havaianas, 15 conferindo, assim, credibilidade à mensagem, alterando então a imagem do produto aos consumidores novos e atuais. Este foi o ponto de partida para a nova fase do produto em que agora as sandálias podiam ser usadas não só em casa mas também em lugares públicos sem que o usuário tivesse vergonha de usar, trazendo, dessa forma, para os consumidores um novo charme e glamour ao se usar o produto. Percebeu-se, então, que as sandálias Havaianas passaram a ser apresentadas ao público em geral como um acessório de moda. Fica subjacente no esforço de comunicação da marca Havaianas, a busca de transmitir os novos valores da marca: no plano dos benefícios emocionais, a satisfação interna foi tratada pelos fatores de ter prazer e sensualidade em usar o produto (independentemente da idade), a satisfação externa é refletida pelos fortes apelos da socialização em torno da nova marca, resultando em uma percepção de valores relacionados ao novo, ao moderno e ao diferente. As associações intangíveis, envolvendo as variáveis de origem, reputação, personalidade e evolução, foram realçadas pelas campanhas promocionais da marca onde os conceitos de brasilidade, humor, irreverência estavam presentes. Na esfera das ações tangíveis, os benefícios racionais (funcionalidade, processo e relacionamento) resultaram de uma boa aceitação ao novo produto em relação ao conforto, a durabilidade, fruto da reformulação no produto, sendo reforçado pelo preço mais elevado. As ações desenvolvidas no plano da presença da marca reforçaram significativamente os benefícios racionais, destacando-se as atividades da marca na participação de eventos de moda (São Paulo Fashion Week) e a apresentação resultante de todo o processo da nova comunicação visual da marca. É possível afirmar, portanto, que o reposicionamento, sob determinadas condições, pode contribuir efetivamente para a revitalização das marcas. As premissas de que as mudanças intrínsecas (no produto) e extrínsecas (na comunicação) são fatores determinantes para se consolidar o processo de reposicionamento da marca. Cabe salientar, no entanto, a importância e a necessidade de se traçar um planejamento bem estruturado que delimite claramente o problema e estabeleça a ponte para a mudança desejada. No ambiente dos negócios, o acaso tem pouca possibilidade de sucesso. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS AAKER, D. Building strong brands. New York: Free Press, 1996. BENNETT, P. D. (Ed.). Dictionary of marketing terms. 2nd ed. Chicago: AMA, 1995. BOONE, L. E.; KURTZ, D. L. Marketing contemporâneo. 8ª. ed. Rio de Janeiro: LTC, 1998. CHURCHILL JR., G. A.; PETER, J. P. Marketing criando valor para os clientes. São Paulo: Saraiva, 2000. COPELAND, J. T. Successful brand repositioning. McKinsey & Company. Marketing Practice Q4, 2001. Disponível em: <http://marketing.mckinsey.com> Acesso em: 10 de março de 2004. DUNCAN, T.; MORIARTY, S. 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