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Maria Clara Cavalcante 1 Coma Redução da vigília Estado vegetativo – Estado de espectro acordado, porém irresponsivo, comum em quem saiu do coma. As pálpebras podem estar abertas e a respiração é preservada. Há sinais que indicam lesão extensa dos hemisférios cerebrais e sem resposta a estímulos visuais Estado minimamente consciente - relacionado, porém menos grave, o paciente tem comportamentos vocais ou motores rudimentares, mas alguns em resposta ao toque, ao estímulo visual ou ao comando. Causas mais comuns de ambos: parada cardíaca com hipoperfusão cerebral e o traumatismo craniano. Mutismo acinético - estado parcial ou totalmente vígil no qual o paciente é capaz de formar impressões e pensar, mas permanece quase imóvel e mudo. Resulta de lesão nas regiões dos núcleos talâmicos mediais ou nos lobos frontais ou de hidrocefalia extrema. Abulia – forma mais leve de mutisco acético, caracterizado por lentidão física e mental. Vem de lesão dos lobos frontais mediais e das suas conexões Atatonia - síndrome de hipomobilidade e mutismo que ocorre como parte de uma psicose grave, em geral esquizofrenia ou depressão maior. Catatonia – semelhante ao mutismo acético, mas evidencias clínicas de lesão cerebral, como hiper- reflexia e hipertonia dos membros estão ausentes. Os pacientes fazem poucos movimentos voluntários ou responsivos, mas piscam, deglutem Estado de encarceramento (locked-in) – pseudocoma – paciente acordado não tem maior de falar ou fazer movimentos, mas tem movimentos oculares verticais e elevação da pálpebra, o que permite emitir sinais de que está consciente. Pupilas reagem normalmente e a causa comum é infarto ou hemorragia da ponte ventral Anatomia e fisiologia do coma Quase todos os casos de coma podem ser correlacionados com • Anormalidades difusas dos hemisférios cerebrais • Atividade reduzida de um sistema de alerta talamocortical especial (sistema reticular ativador (SRA)) - localizado difusamente no tronco encefálico. O funcionamento apropriado desse sistema, suas projeções ascendentes para o córtex e o próprio córtex são essenciais para manter a vigília e a coerência do pensamento. Além da lesão estrutural a esses dois sistemas, a supressão da função reticulocerebral pode ocorrer por fármacos, toxinas ou desarranjos metabólicos como hipoglicemia, anoxia, uremia e falência hepática, esses tipos de causas metabólicas de coma são muito mais comuns do que as lesões estruturais. Coma devido a lesões expansivas cerebrais e síndromes de herniação Os dois hemisférios cerebrais são separados pela foice As fossas anterior e posterior são separadas pelo tentório. Herniação é o deslocamento do tecido cerebral por uma massa sobrejacente ou adjacente para dentro de um compartimento que normalmente ele não ocupa. São sinais de “falsa localização” Tipos de herniação: • Uncal (A) • Central (B) • Transfalcial (C) • Foraminal (D) Maria Clara Cavalcante 2 Na forma mais comum, o tecido cerebral é deslocado do compartimento supratentorial para o infratentorial pela abertura tentorial - herniação transtentorial. Herniação transtentorial uncal - impactação do giro temporal medial anterior (unco) para dentro da abertura tentorial adjacente e imediatamente anterior ao mesencéfalo • Dilatação da pupila ipsilateral – causada quando o unco comprime o 3º nervo em seu percuso no espaço subaracnóideo • Babinski + e hemiparesia contralateral (sinal de Kernohan-Woltman) - causado quando há o deslocamento lateral do mesencéfalo comprimindo o pedúnculo cerebral oposto contra a borda tentorial Herniação transtentorial central - movimento descendente simétrico das estruturas talâmicas pela abertura tentorial com compressão do mesencéfalo superior. • Pupilas mióticas e sonolência - sinais prenunciadores, em contrapartida à pupila aumentada unilateralmente da síndrome uncal. As herniações transtentoriais uncais e centrais causam compressão progressiva do tronco encefálico e do SRA, com lesão inicial ao mesencéfalo, depois à ponte e, por fim, ao bulbo. Herniação transfalcial - deslocamento do giro do cíngulo sob a foice e pela linha média Herniação foraminal - descida forçada das tonsilas do cerebelo para dentro do forame magno, causando compressão precoce do bulbo, parada respiratória e morte. Coma por distúrbios metabólicos e toxinas (incluindo induzido por fármacos e drogas) Os neurônios cerebrais dependem completamente do fluxo sanguíneo cerebral (FSC) e do transporte de oxigênio e glicose. As reservas cerebrais de glicose são capazes de garantir a energia por cerca de 2 minutos após a interrupção do fluxo sanguíneo, e as reservas de oxigênio duram 8 a 10 segundos após a cessação do fluxo sanguíneo. Hipoxia e isquemia simultâneas exaurem a glicose mais rapidamente. A ausência dos movimentos oculares reflexos (olhos de boneca), geralmente indica lesão dentro do tronco encefálico ou superdosagem de determinados fármacos. Quando há ausência do reflexo de olhos de boneca, o tamanho pupilar e a fotorreação normais distinguem a maioria dos comas induzidos por fármacos da lesão estrutural do tronco encefálico Podem ser reversíveis e não deixam lesão residual, desde que não sobrevenha à insuficiência cardiorrespiratória. Algumas intoxicações medicamentosas, como por barbituratos, podem simular todos os sinais de morte cerebral, assim, as etiologias tóxicas devem sempre ser excluídas antes de se fazer um diagnóstico de morte cerebral. Coma epilético Considerar EEG na avaliação de coma para a exclusão dessa etiologia tratável. O coma autolimitado que sucede uma convulsão, o estado pós-ictal, pode advir da exaustão das reservas de energia ou dos efeitos de moléculas localmente tóxicas que são subproduto das convulsões. O estado pós-ictal produz lentidão contínua e generalizada da atividade de base do EEG, à semelhança de outras encefalopatias metabólicas. Ele normalmente dura alguns minutos, mas em alguns casos pode ser prolongado por horas ou mesmo (raramente) dias. Coma devido à lesão difusa dos hemisférios cerebrais Resulta de lesão cerebral estrutural extensa bilateral, simulando, assim, uma desordem metabólica. Hipoxia-isquemia talvez seja o exemplo mais bem caracterizado, no qual inicialmente não é possível distinguir entre os efeitos agudos reversíveis da Maria Clara Cavalcante 3 privação de oxigênio do cérebro e os efeitos subsequentes da lesão neuronal. Lesão cerebral semelhante pode ser produzida por distúrbios que ocluem os pequenos vasos sanguíneos espalhados em todo o cérebro; os exemplos incluem malária cerebral, púrpura trombocitopênica trombótica e hiperviscosidade. A lesão difusa de substância branca decorrente de traumatismo craniano ou doenças inflamatórias desmielinizantes pode causar uma síndrome comatosa semelhante. Abordagem do paciente Os problemas respiratórios e cardiovasculares agudos devem ser abordados antes da avaliação neurológica A causa do coma pode ser imediatamente evidente em casos de trauma, parada cardíaca ou ingestão de fármaco testemunhada. Febre sugere: • Infecção sistêmica Febre sugere infecção sistêmica, meningite bacteriana, encefalite, intermação, síndrome neuroléptica maligna, hipertermia maligna devido a anestésicos ou intoxicação por fármacos anticolinérgicos. • Apenas raramente a febre é atribuível a uma lesão que tenha alterado o centro hipotalâmico de regulação da temperatura (“febre central”) Elevação discreta da temperatura pode suceder a convulsões vigorosas. Hipotermia: • Comum nas intoxicações por álcool, barbitúricos, sedativos ou fenotiazinas, na hipoglicemia, na insuficiência circulatória periférica; ou no hipotireoidismo extremo. • A própria hipotermia causacoma quando a temperatura estiver < 31°C independentemente da etiologia subjacente. Taquipneia pode indicar acidose sistêmica ou pneumonia. A hipotensão é típica do coma por intoxicação por álcool ou barbitúricos; hemorragia interna; infarto agudo do miocárdio causando baixo fluxo sanguíneo no cérebro; sepse; hipotireoidismo profundo; ou crise de Addison Petéquias cutâneas sugerem: púrpura trombocitopênica trombótica, meningococemia ou diátese hemorrágica associada a uma hemorragia intracerebral. Cianose e pele anêmica ou de coloração avermelhada são outras indicações de doença sistêmica subjacente ou monóxido de carbono como responsável pelo coma. Movimentos sutis e intermitentes tipo fasciculação de um pé, dedo ou músculo facial podem ser o único sinal de convulsões. Mioclonias multifocais quase sempre indicam um distúrbio metabólico, A flexão dos cotovelos - lesão bilateral rostral ao mesencéfalo Extensão dos cotovelos e dos pulsos com pronação (postura de descerebração) - lesão dos tratos motores caudais ao mesencéfalo. A ausência de movimentos inquietos em um lado ou um membro inferior em rotação lateral sugere hemiplegia. Reflexos do tronco encefálico preservados - localização bi-hemisférica, incluindo causa tóxica ou farmacológica Reflexos anormais do tronco encefálico - localização do coma no SRA ou estão sofrendo de uma síndrome de herniação com impacto remoto no tronco encefálico por uma lesão expansiva cerebral. Os reflexos mais importantes do tronco encefálico que são examinados incluem tamanho pupilar e reação à luz, movimentos oculares espontâneos e provocados, respostas corneanas e padrão respiratório. Sinais pupilares Reações pupilares são examinadas com uma luz difusa brilhante. Pupilas reativas e redondas de tamanho médio - excluem lesão do mesencéfalo superior, primária ou secundária à compressão. Uma pupila aumentada e lentamente reativa - compressão ou estiramento do terceiro nervo pelos efeitos de uma massa cerebral sobre ele. Dilatação da pupila contralateral a uma massa hemisférica pode ocorrer, mas é infrequente. Maria Clara Cavalcante 4 Pupila oval e ligeiramente excêntrica - sinal transitório que acompanha a compressão incipiente do mesencéfalo-terceiro nervo. O sinal pupilar mais extremo, pupilas dilatadas e não reativas bilateralmente - lesão grave do mesencéfalo, em geral compressão por uma massa supratentorial. Midríase enganosa - Ingestão de fármacos com atividade anticolinérgica, uso de gotas oftálmicas midriáticas, tratamentos com nebulização e traumatismo ocular Pupilas reativas e bilateralmente pequenas não puntiformes - encefalopatias metabólicas ou nas lesões hemisféricas bilaterais profundas, como hidrocefalia ou hemorragia talâmica. Pupilas ainda menores (< 1 mm), porém reativas - superdosagem de narcóticos ou barbitúricos, mas também ocorrem na hemorragia pontina extensa. A miose unilateral no coma é atribuída à disfunção de eferentes simpáticos que se originam no hipotálamo posterior e descem no tegmento do tronco encefálico até a medula espinal cervical. É um achado eventual em pacientes com hemorragia cerebral volumosa que acomete o tálamo. Movimentos oculares Isenta a lesão extensa no mesencéfalo e na ponte O desvio ocular horizontal conjugado para um lado indica lesão do lobo frontal ipsilateral Olhos em uma direção - lesão hemisférica e Olhos olham para longe - lesão no tronco encefálico. As convulsões envolvendo o lobo frontal desviam os olhos para o lado oposto - lesão destrutiva da ponte. Os olhos para baixo e para dentro – lesões no tálamo e no mesencéfalo superior, em geral hemorragia talâmica. Bobbing ocular – movimentos oculares rápidos para baixo e lentos para cima – lesão pontinha bilateral, por trombose da artéria basilar. Dipping ocular – movimento mais lento para baixo e mais rápido para cima - lesão anóxica cortical difusa. “Olhos de boneca” - suprimidos no paciente acordado com lobos frontais intactos - redução da influência cortical sobre o tronco encefálico e as vias intactas do tronco encefálico. Ausência dos movimentos oculares reflexos - lesão dentro do tronco encefálico, pode advir de superdosagem de determinados fármacos. Os reflexos oculocefálicos nunca devem ser obtidos em pacientes com possível trauma craniano ou cervical, pois os movimentos vigorosos da cabeça podem precipitar ou piorar uma lesão de medula espinal. Padrões respiratórios Respiração superficial e lenta e regular - depressão metabólica ou medicamentosa. Cheyne-Stokes (breve período apneico) - lesão bi- hemisférica ou supressão metabólica e acompanha o coma leve. Kussmaul (rápida e profunda) - acidose metabólica e lesões pontomesencefálicas. Suspiros agônicos - lesão do tronco encefálico caudal (bulbo) e são o padrão respiratório terminal de lesão cerebral grave. Diagnóstico diferencial de coma Causas de coma são divididas em 3 categorias: • Casos sem sinais neurológicos focais (p. ex., encefalopatias metabólicas e tóxicas) • Casos com sinais focais proeminentes (p. ex., AVC, hemorragia cerebral) • Síndromes de meningite, caracterizadas por febre ou rigidez da nuca e excesso de células no LCS (p. ex., meningite bacteriana, hemorragia subaracnóidea, encefalite). Coma súbito - medicamentos, traumatismo, parada cardíaca, epilepsia e oclusão de artéria basilar. Coma de início subagudo - problema clínico ou neurológico preexistente, tumor ou infarto cerebral. Maria Clara Cavalcante 5 O AVC mais comum – infarto no território da artéria cerebral média – não costuma causar coma, mas o edema em volta do grande infarto pode expandir-se durante vários dias e provocar coma devido a um efeito de massa Hidrocefalia - hemorragia subaracnóidea, com cefaleia, vômitos, postura extensora dos membros, sinal de Babinski bilateral, pupilas mióticas não reativas e déficit dos movimentos oculocefálicos na direção vertical Morte cerebral Único tipo de lesão cerebral que é moral, ética e legalmente reconhecido como equivalente à morte. Critérios estabelecidos: dois elementos essenciais, após confirmação que não há fatores de confusão presentes (hipotermia, medicamentos) • Destruição cortical difusa - coma profundo e irresponsividade a todas as formas de estímulo • Lesão global do tronco encefálico - ausência de fotorreação pupilar e de reflexos corneanos, perda dos reflexos oculovestibulares, e destruição do bulbo, manifestada por apneia total e irreversível. O diabetes insípido costuma estar presente, surgindo após apenas horas ou dias depois do aparecimento dos demais sinais clínicos de morte cerebral. Pupilas - tamanho médio, mas podem estar alargadas. A perda de reflexos tendíneos profundos não é imprescindível, porque a medula espinal continua funcionante. EEG isoelétrico - teste opcional de confirmação de lesão cerebral total. A cintilografia cerebral com radionuclídeo, angiografia cerebral ou Doppler transcraniano também podem ser incluídos para demonstrar a ausência de FSC quando se deseja um exame confirmatório. Período de observação (6 a 24 horas), é recomendado, durante o qual os sinais clínicos de morte cerebral são sustentados. É aconselhável retardar o teste clínico por pelo menos 24 horas caso uma parada cardíaca tenha causado a morte cerebral ou não se saiba a doença causadora. Prognóstico Na tentativa de coletar informações prognósticas de muitos pacientes com traumatismo craniano, criou-se a escala de coma de Glasgow. Coma anóxico - sinais clínicos como as respostas pupilares e motoras após 1 dia, 3 dias e 1 semana têm valor Ausência das respostas corticais de potenciais evocados somatossensitivos - desfecho ruim após a lesão hipóxica. REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:Medicina interna de Harrison [recurso eletrônico] / J. Larry Jameson... [et al.] ; tradução: André Garcia Islabão...[et al.] ; [revisão técnica: Ana Maria Pandolfo Feoli... [et al]. – 20. ed. – Porto Alegre : AMGH, 2020. e-PUB. Cap 300