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UNIVERSIDADE DO MINHO Escola de Direito Licenciaturas em Direito (regimes diurno e póslaboral) DIREITO CONSTITUCIONAL Prova escrita de avaliação de conhecimento (2.º teste) Duração da prova: 2 horas Maio de 2021 I (10 valores) Ao fim da tarde de ontem, a Presidência da República (PR) publicou na sua página web a receção dos seguintes diplomas: i) Um decreto da Assembleia da República (AR) para ser promulgado como lei, contendo alterações às regras de rotulagem dos iogurtes e sobremesas lácteas embaladas; ii) Um decreto do governo para ser promulgado como decretolei [ao abrigo da alínea b) do n.º 1 do art.º 198.º da CRP], contendo preceitos atinentes a deveres em matéria de defesa nacional, bem assim como as bases gerais do funcionamento das Forças Armadas. No discurso final do congresso do Par�do da Juventude Digital (PJD), o respe�vo líder — licenciado em Direito e candidato nas próximas eleições a deputado na AR — entende que o PR deveria requerer a fiscalização concreta da cons�tucionalidade dos diplomas, com fundamento em violação das reservas competenciais cons�tucionalmente previstas. Além disso — entende —, rela�vamente ao segundo conjunto de medidas, nunca o Governo poderia "u�lizar um decreto regulamentar" para disciplinar a matéria respeitante a defesa nacional, sem autorização da Assembleia da República. 1. Emita a sua opinião juridicamente fundamentada sobre o entendimento do líder do PJD, não deixando, na sua resposta, de atender aos seguintes pontos: a. Poderia o PR desencadear o �po de fiscalização referido? b. Terão a AR ou o Governo violado as reservas de competência previstas na Cons�tuição? c. Pode considerar-se que decreto-lei e decreto regulamentar são conceitos sinónimos? d. Necessitaria o Governo de autorização para disciplinar a matéria em causa? 2. Abstraindo dos dados referidos no texto, diga quais os modos cons�tucionalmente admi�dos de cessação de vigência de uma lei de autorização legisla�va. II (6 valores) Desde há um ano que é crescente a tensão existente entre o Presidente da República (PR) e o Ministro da Cultura. A fonte da tensão residirá na forma como este Ministro, no entender do PR, tem vindo a desconsiderar a classe dos escritores, que não contam com sistema que especialmente os proteja em caso de crise financeira, no contexto da qual os seus rendimentos são diminutos, “já que ninguém está para ler nessas alturas” (palavras suas). No dia de hoje, o PR envia uma mensagem ao Primeiro-Ministro, exigindo-lhe que apresente um pedido de demissão do Ministro da Cultura. Comente, de forma jurídico-cons�tucionalmente fundamentada, a atuação do PR. No seu comentário, não deixe de se pronunciar quanto à (im)possibilidade de o Ministro da Cultura poder ou não avançar com uma medida legisla�va no sen�do pretendido pelo PR. III (4 valores) Relacione, de modo juridicamente fundamentado, os seguintes conceitos: a) Órgãos de soberania, competências e Conselho de Estado; b) Referendo, referenda e Diário da República. CRITÉRIOS MÉDIOS DE CORREÇÃO: I 1. a. Não. ⎯ O PR não tem legi�midade processual a�va em sede de controlo (fiscalização) concreto(a) da cons�tucionalidade e da legalidade; apenas as partes vencidas no processo ou o Ministério Público (art.º 280.º da CRP) o poderiam fazer (mas apenas mais tarde, aquando da eventual suscitação de um li�gio em Tribunal); ⎯ O PR apenas poderia desencadear o controlo preven�vo da cons�tucionalidade (art.º 278.º da CRP). Mesmo o controlo abstrato sucessivo não seria possível, pois os diplomas ainda não estavam em vigor; ⎯ O PR poderia ainda, caso o entendesse e fundamentasse, vetar poli�camente o diploma, nos termos do art.º 136.º da CRP; → Fator de valorização: relacionamento entre os diferentes �pos de veto e sua superação. b. ⎯ Dis�nção entre as várias reservas cons�tucionalmente previstas: reservas da AR (art.os 164.º e 165.º da CRP) e reserva do Governo (art.º 198.º, n.º 2 da CRP); ⎯ A matéria do primeiro decreto é uma matéria concorrente; a não existência de incons�tucionalidade orgânica; a paridade entre lei e decreto-lei; ⎯ A matéria do segundo decreto é uma matéria de reserva absoluta de competência legisla�va da AR [art.º 164.º, alínea d)]; ■ A incons�tucionalidade orgânica decorrente de o Governo não poder disciplinar estes domínios; ■ A incons�tucionalidade formal decorrente de estas matérias não poderem ser disciplinadas por decreto-lei, mas apenas por lei orgânica (art.º 166.º, n.º 2, da CRP); → Fator de valorização: o regime das leis orgânicas. c. Não são sinónimos. ⎯ Ambos são atos norma�vos emanados pelo Governo, mas enquanto o DL é um ato legisla�vo [art.os 112.º, n.º 1, da CRP e 198.º], o Dec.Reg é um ato não legisla�vo, emanado ao abrigo de competências administra�vas [art.os 112.º, n.º 6, da CRP e 199.º, alínea c)]; ⎯ Princípio da precedência de lei (art.º 112.º, n.º 7, da CRP) e da prevalência da lei (art.º 166.º, n.º 2, da CRP); → Fator de valorização: �pos de DL´s. d. O Governo não só não necessitaria, como não poderia ter autorização legisla�va para disciplinar a matéria em causa. ⎯ Como se referiu em b. estava em causa uma matéria de reserva absoluta de competência legisla�va da AR [art.º 164.º, alínea d)]; ⎯ Uma eventual LAL seria formalmente incons�tucional. 2. A LAL pode cessar por: ⎯ Decurso do respe�vo prazo; ⎯ U�lização pelo Governo (regra da irrepe�bilidade); ⎯ Revogação pela AR; ⎯ Quebra da relação fiduciária (dissolução da AR, demissão do Governo, etc.). → Fator de valorização: explicação do regime das LAL e dos DLA. II ⎯ A competência do PR para nomear e exonerar os membros do Governo, sob proposta do PM (art. 133.º/h e 187.º/2) – a existência de um poder par�lhado; ⎯ Os Ministros são os membros do Governo (art. 183.º/1) a quem cabe a direção polí�ca de um determinado departamento governamental – no caso, a pasta ministerial da cultura; ⚪ Porém, o Governo é autónomo no desenvolvimento da sua polí�ca perante o PR, que não lhe pode dar ordens nem ditar orientações (art. 191.º/2); ⎯ A competência legisla�va do Governo (art. 165.º/1 [o enunciado não concre�za por que via seria conferida a proteção aos escritores, mas poder-se-á equacionar a recondução da matéria às al. b), f e/ou i)]; 198.º/1/b); a competência do Conselho de Ministros para aprovação das propostas de lei (art. 167.º/1, 200.º/1/c) e para aprovação dos decretos-leis (art. 200.º/1/d); ⎯ A eventual incons�tucionalidade material de uma solução assim determinada, por violação do princípio da igualdade (art. 13.º). III a) ⎯ Dis�nção entre órgãos cons�tucionais e órgãos de soberania; exemplificação; ⎯ A �pologia cons�tucionalmente consagrada de órgão de soberania (art.º 110.º da CRP); ⎯ Definição de competência enquanto parcela de poder decisório; ⎯ Tipos de competência: cons�tucional, legal, regulamentar; normadora, não normadora; expressa, implícita; concorrente, exclusiva, etc. ⎯ O Conselho de Estado enquanto órgão cons�tucional com competência consul�va b) ⎯ O referendo enquanto consulta popular sobre uma questão de RIN (art.º 115.º); a referenda enquanto fase do procedimento legisla�vo após a promulgação dos diplomas (art.º 140.º da CRP) e antes da publicação dos mesmos; ⎯ A necessidade de publicação dos resultados dos referendos e dos diplomas sujeitos a referenda (art.º 119.º da CRP).
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