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CRIMES CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO: CONCEITOS BÁSICOS MÓDULO 1 2020 © Secretaria Nacional do Consumidor Todos os direitos reservados. É proibida a reprodução total ou parcial, de qualquer forma ou por qualquer meio, salvo com autorização por escrito da Secretaria Nacional do Consumidor. Esplanada dos Ministérios, Bloco “T”, Palácio da Justiça Raymundo Faoro, Edifício Sede, 5º andar, Sala 542 – Brasília, DF, CEP 70.964-900. Curso Crimes contra as relações de consumo Edição Ministério da Justiça e Segurança Pública Secretaria Nacional do Consumidor Escola Nacional de Defesa do Consumidor Autoria Este curso tem como subsídio a obra “Crimes contra as relações de Consumo”, de Marco Antonio Zanellato e Edgar Moreira da Silva.O texto foi revisado por José Augusto Peres. Dado a relevância do tema, os autores cederam o texto da obra para este curso. O texto foi adaptado para a educação a distância. EQUIPE TÉCNICA DO MINISTÉRIO DA JUSTIÇA - MJ Ministro de Estado da Justiça André Luiz de Almeida Mendonça Secretária Nacional do Consumidor Juliana Oliveira Domingues Escola Nacional de Defesa do Consumidor - ENDC Coordenação Andiara Maria Braga Maranhão Supervisão Ana Cláudia Sant’Ana Menezes Marcus Iahn de Souza Coordenação Prof. Dr. Ugo Silva Dias Pesquisadores Sêniores Daniel Benevides da Costa Daniel Guerreiro e Silva Coordenação Pedagógica Janaína Angelina Teixeira Gestão Pedagógica do Curso Janaína Angelina Teixeira Designer Instrucional Janaína Angelina Teixeira Angélica Magalhães Neves Ilustração e Animação Cristiano Silva Gomes Cristiano Alves de Oliveira Diagramação Israel Silvino Batista Neto Patrícia Fernandes Faria Sanny Caroline Saraiva de Sousa Gestão Moodle José Wilson da Costa Moisés Silva de Sousa Apoio ao Núcleo Pedagógico Danielle Xabregas Pamplona Nogueira Laryssa Rosa da Silva Slavov Natália Rodrigues Faria Nayara Gomes Lima Simone Lucas de Oliveira Aguiar Núcleo de Pesquisas Danielle Xabregas Pamplona Nogueira Janaína Angelina Teixeira Gabriel Tormin Alves Revisão Angélica Magalhães Neves EQUIPE TÉCNICA DA FUNDAÇÃO UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA - FUB 3 CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - MÓDULO 1 Descrição do curso No Brasil é recente a proteção legal do consumidor. Ela teve início com o advento da Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1990, editada em atendimento ao mandamento constitucional. Essa lei ficou conhecida como Código de Defesa do Consumidor e conta com normas que protegem o consumidor nos planos civil e administrativo. O instrumento normativo também traz normas tipificadoras de crimes contra as relações de consumo, que configuram, junto com as normas incriminadoras (na parte referente aos crimes de consumo) da Lei n. 8.137, de 27 de dezembro de 1990, um verdadeiro Direito penal do consumidor. Em virtude da importância das normas incriminadoras que estabelecem a tutela dos bens jurídicos, que podem ser lesados no âmbito das relações de consumo, o curso irá apresentar dois diplomas legais que tratam dos crimes contra as relações de consumo: a Lei n. 8.078, de 11 de setembro de 1990, conhecida como Código de Defesa do Consumidor (CDC), e ; a Lei n. 8.137, de 27 de dezembro de 1990, que também disciplina crimes contra a ordem tributária e contra a ordem econômica. O curso apresentará também algumas das principais jurisprudências aplicadas a casos práticos de crimes contra as relações de consumo. Contextualização Prezado(a) aluno(a), seja bem-vindo(a) ao curso “Crimes contra as Relações de Consumo”. Esse curso tem como subsídio a obra “Crimes contra as relações de Consumo” dos autores Marco Antonio Zanellato e Edgar Moreira da Silva. Nossos agradecimentos aos autores e ao especialista José Augusto Peres Filho que gentilmente revisou o material. O objetivo do curso é apresentar os principais conceitos dos crimes contra as relações de consumo, bem como sua legislação pertinente. 4 CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - MÓDULO 1 Objetivos de aprendizagem Esperamos que, ao final do curso, você seja capaz de: Identificar os crimes contra as relações de consumo no CDC. Citar as normas específicas sobre crimes contra as relações de consumo. Identificar as jurisprudências aplicáveis aos casos concretos de crimes contra as relações de consumo. Exemplificar casos de crimes contra as relações de consumo. Desejamos a todos uma ótima experiência de aprendizagem! MÓDULO 1 CRIMES CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO: CONCEITOS BÁSICOS 6 CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - MÓDULO 1 Neste módulo você conhecerá os conceitos basilares para a compreensão dos crimes contra as relações de consumo, bem como sua legislação pertinente. Os assuntos que serão tratados no módulo 1 são: A proteção legal do consumidor e a tipificação dos crimes contra as relações de consumo. Tipos de ilícito previstos no Código de Defesa do Consumidor. Natureza jurídica dos crimes contra as relações de consumo. O bem jurídico objeto da proteção jurídica. CDC: garantia do consumidor à informação eficiente. Apresentação do Módulo 1 Olá, eu sou a Maria! Vamos iniciar nosso percurso de aprendizagem? Antes de adentrar, de fato, ao conteúdo do curso, que são os crimes contra as relações de consumo, é importante tratar de alguns conceitos básicos que irão acompanhá-lo ao longo de toda a trajetória desse estudo. E eu sou o Francisco. Nós estaremos com você durante todo seu percurso no curso. Seja bem- vindo(a)! Um ótimo curso! 7 CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - MÓDULO 1 Objetivos de aprendizagem do Módulo 1 Ao final deste módulo espera-se que você seja capaz de: Não se esqueça de realizar a atividade de estudo proposta ao final do módulo. Ela não irá compor sua nota, mas irá ajudá-lo muito na retenção do conteúdo do módulo. Vamos juntos? dizer os conceitos básicos que perpassam os crimes contra as relações de consumo; descrever a importância do conhecimento dos crimes contra as relações de consumo; identificar a legislação pertinente aos crimes contra as relações de consumo. Para começar, é importante perguntar... Você sabe o que é Direito do Consumidor? Para refletir Conheça um pouco mais sobre a história do Direito do Consumidor na linha do tempo a seguir: 8 CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - MÓDULO 1 1. O Direito do Consumidor surgiu na segunda metade do século XX, nos Estados Unidos. Seu nascimento coincidiu com o crescimento da indústria, que passou a produzir bens e produtos em larga escala. 2. Assim, a aquisição em massa de produtos permitiu uma grande expansão nas relações de consumo e também uma crescente manipulação do consumidor pelas empresas nas esferas de produção, distribuição e publicidade em virtude do desenvolvimento das técnicas de marketing para vendas e da ampliação dos meios de comunicação de massa. 3. Isso acabou gerando uma certa “superioridade” dos fornecedores em relação aos consumidores e despertou a necessidade da proteção aos consumidores. Nesse contexto, os fornecedores eram entendidos como “sujeitos que sujeitam”, enquanto os consumidores eram vistos como “sujeitos que se sujeitam”. 4. Daí a necessidade de uma legislação protetiva das relações de consumo para se estabelecer um efetivo equilíbrio nas relações entre fornecedores e consumidores. 5. No Brasil, a Constituição Federal estabeleceu que Defesa do Consumidor será promovida pela Estado na forma da lei: TÍTULO II Dos Direitos e Garantias Fundamentais CAPÍTULO I DOS DIREITOS E DEVERES INDIVIDUAIS E COLETIVOS XXXII - o Estado promoverá, na forma da lei, a defesa do consumidor; ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS Art. 48. O Congresso Nacional, dentro de cento e vinte dias da promulgação da Constituição, elaborará código de defesa do consumidor. 6. Surge, então, o Código de Defesa do Consumidor que compreende “normas de proteção e defesa do consumidor, de ordem pública e interesse social”, conforme preceitua o art. 1º da Lei nº 8.078, de 11 de setembro de 1990. Linkda legislação: http://www.planalto. gov.br/ccivil_03/leis/l8078.htm 1 5 3 2 4 6 http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078.htm A PROTEÇÃO LEGAL DO CONSUMIDOR E A TIPIFICAÇÃO DOS CRIMES CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO 1. 10 CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - MÓDULO 1 O “Código de Defesa do Consumidor”, além de contar com normas que protegem o consumidor nos planos civil e administrativo, também apresenta normas tipificadoras de crimes contra as relações de consumo que configuram, junto com as normas incriminadoras (na parte referente aos crimes de consumo) da Lei n. 8.137, de 27 de dezembro de 1990, um verdadeiro Direito Penal do Consumidor. As normas penais, ao conferirem proteção ao consumidor, podem formar um corpo especial (relativamente autônomo) de normas, ao qual se poderá chamar Direito Penal do Consumo, cuja autonomia se justifica quer pela peculiaridade da relação de consumo, quer pelo fato de encontrar na Constituição a referência axiológico-normativa para esse efeito. Fonte: MONTES, MÁRIO FERREIRA MONTES. Da proteção penal do Consumo. Lisboa: Almedina, p. 309. Em Portugal, não se pode falar de um direito penal consumerista, pois que “não existe no ordenamento jurídico português um segmento autonomizado do direito penal que enquadre as normas incriminadoras que estabelecem a tutela dos bens jurídicos que podem ser lesados no âmbito das relações de consumo”. Assim, a tutela desses bens jurídicos, é “obtida por via indireta, a partir de normas incriminadoras que protegem outros bens jurídicos”. Essas normas se encontram dispersas pelo Código Penal, pelo Regime Jurídico das Infrações Antieconômicas e contra a Saúde Pública e pelo Código da Propriedade Industrial. Fonte: DANTAS, ANTÓNIO LEONES. Tutela penal de consumo. Intervenção proferida em 21 de junho de 1996, no C.E.J., nas Primeiras Jornadas Luso-Brasileiras sobre Proteção Judiciária do Ambiente e do Consumidor. Fique atento! Saiba mais No Brasil, é recente a proteção legal do consumidor. Como você já aprendeu, ela teve início com o advento da Lei n. 8.078/90, editada em atendimento ao mandamento constitucional. A previsão constitucional da proteção ao consumidor encontra-se nos arts. 5°, inciso XXXII, 170, inciso V, da Constituição Federal e art. 48 de suas Disposições Transitórias. Fonte: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ Constituicao/Constituicao.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/Constituicao/Constituicao.htm 11 CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - MÓDULO 1 É o Código de Defesa do Consumidor (CDC) que dispõe sobre a proteção do consumidor e dá outras providências. A Lei n. 8.137, de 27 de dezembro de 1990, define crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo. Saiba mais No ordenamento jurídico brasileiro dois são os diplomas legais que tratam dos crimes contra as relações de consumo. Vamos conhecê-los: As infrações penais contra as relações de consumo e sua proteção legal Na Lei n. 8.078/90 (CDC), as infrações penais contra as relações de consumo estão tipificadas nos artigos de 63 a 74. Para essa definição, o legislador adotou o critério residual: procurou excluir aquelas infrações que, embora relacionadas com o conteúdo do Código de Defesa do Consumidor, já estavam definidas em outros diplomas legais. A intenção, com isso, era evitar a criação de dispositivos suscetíveis de, em um possível confronto com os de outros diplomas, gerarem o chamado “conflito aparente de normas penais”. Para conhecer a legislação acesse o link: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/l8078.htm O conflito aparente de normas penais ocorre quando há duas ou mais normas incriminadoras descrevendo o mesmo fato. Sendo assim, existe o conflito, pois mais de uma norma pretende regular o fato, mas é aparente, porque, apenas uma norma é aplicada ao fato concreto. 12 CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - MÓDULO 1 Dessa forma, foi possível dar maoir garantia de obediêcia aos preceitos disciplinadores do CDC, criando-se um instrumento efetivo de proteção ao consumidor no mercado. Lei n. 8.137/1990 Agora, você irá conhecer a Lei n. 8.137/90, que define os crimes contra a ordem tributária, econômica e contra as relações de consumo. Essa normativa apresenta a tipificação dos crimes contra as relações de consumo no seu art. 7º, incisos I a IX. Para conhecer a legislação acesse o link: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L8137.htm Algumas condutas, descritas no próprio Código, que são capazes de afetar a integridade das relações de consumo foram criminalizadas, como a publicidade enganosa ou abusiva e a cobrança irregular de dívida de consumo. Conheça exemplos: 13 CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - MÓDULO 1 Vídeo Para assistir ao vídeo, acesse as telas interativas do curso. Além das Leis n. 8.078/90 e n. 8.137/90, há outras que tipificam infrações que afetam os interesses do consumidor, ainda que não apresentem o nome jurídico “crimes contra as relações de consumo”. Veja quais são: Decreto - Lei n. 2.848, de 7.12.1940 (Código Penal): art. 171 - estelionato. Decreto - Lei n. 2.848, de 7.12.1940 (Código Penal): art. 274 - emprego de processo proibido ou de substância não permitida. Decreto - Lei n. 2.848, de 7.12.1940 (Código Penal): art. 175 - fraude no comércio. Decreto - Lei n. 2.848, de 7.12.1940 (Código Penal): art. 275 - invólucro ou recipiente com falsa indicação. Decreto - Lei n. 2.848, de 7.12.1940 (Código Penal): art. 272 - corrupção, adulteração ou falsificação de substância alimentícia ou medicinal. Decreto - Lei n. 2.848, de 7.12.1940 (Código Penal): art. 280 - medicamento em desacordo com receita médica. Decreto - Lei n. 2.848, de 7.12.1940 (Código Penal): art. 273 - alteração de substância alimentícia ou medicinal. Lei n. 4.591, de 16.12.64 (Crimes e contravenções relativas à economia popular nas incorporações imobiliárias): art. 65 - promover incorporação, fazendo afirmação falsa sobre a construção do condomínio. art. 66 - omissão de informações. Lei n. 1.521, de 26.12.51 (Crimes contra a economia popular): artigos 2º, incisos I a IX, 3º, incisos I e IV e 4º, alínea a - usura pecuniária; e b - usura real. https://ead.defesadoconsumidor.gov.br/mod/hvp/view.php?id=4816# 14 TIPOS DE ILÍCITOS PREVISTOS NO CÓDIGO DE DEFESA DO CONSUMIDOR 2. 15 CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - MÓDULO 1 Os crimes de consumo próprio têm a tipificação de salvaguardar os interesses dos consumidores, amparando, exclusiva e diretamente, o consumidor, atuando sempre sobre a relação jurídica de consumo. Fonte: BENJAMIN, Antonio Herman V. O Direito do Consumidor: Capítulo do Direito Penal Econômico, p. 21. Disponível em https://www.amprs.com.br/public/arquivos/revista_artigo/ arquivo_1285251475.pdf Os crimes contra as relações de consumo definidos nos artigos 63 e 74 do Código de Defesa do Consumidor são crimes de consumo próprio, porque possuem sujeitos e objeto material próprios. Dica Veja o infográfico sobre os agentes do crime contra as relações de consumo, de acordo com o CDC. https://www.amprs.com.br/public/arquivos/revista_artigo/arquivo_1285251475.pdf https://www.amprs.com.br/public/arquivos/revista_artigo/arquivo_1285251475.pdf 16 CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - MÓDULO 1 Há dois outros conceitos de consumidor por equiparação. Vamos conhecê-los: O art. 17 equipara a consumidores “todas as vítimas do evento”, ou seja, as vítimas de acidentes causados por produtos ou serviços defeituosos. O art. 29 estabelece que são equiparados aos consumidores todas as pessoas, determináveis ou não, expostas às práticas previstas nos Capítulos V e VI. O CDC conceitua o consumidor como “toda pessoa física ou jurídica que adquire e utiliza produto ou serviço como destinatário final” (art. 2º, “caput”), estando ele equiparado, pelo mesmo diploma legal,“à coletividade de pessoas, ainda que indetermináveis, que haja intervindo nas relações de consumo” (art. 2º, parágrafo único). CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - MÓDULO 1 O BEM JURÍDICO OBJETO DA PROTEÇÃO JURÍDICA 3. 18 CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - MÓDULO 1 O bem ou interesse jurídico é, assim, denominado relações de consumo, conforme preceitua o art. 61 do CDC. O objeto material dos crimes contra as relações de consumo é o produto ou o serviço. O Código de Defesa do Consumidor define o que são produtos e serviços, objetos da relação de consumo, respectivamente nos §§ 1º e 2º do art. 3º. A esse respeito, veja o que o penalista Damásio de Jesus ensina: “Esses delitos têm as relações de consumo como objeto jurídico principal. O direito à vida, à saúde, etc. são tutelados de forma indireta. Isso não significa que se dá maior relevância às relações de consumo, conduzindo os direitos pessoais a plano secundário. Esses bens individuais se sobrepõem aos princípios que regem o sistema. Ocorre que, protegendo-se o interesse coletivo, automaticamente está sendo conferida tutela aos bens particulares . ” Fonte: DAMÁSIO, E. DE JESUS. A natureza dos crimes contra o consumidor, in Tribuna do Direito, São Paulo, maio de 1993, p. 13 Nos crimes contra as relações de consumo, a tutela recai diretamente sobre um bem (ou interesse) jurídico: Nos crimes contra as relações de consumo a coletividade aparece como sujeito passivo principal, imediato e constante (é a chamada vitimização coletiva ou difusa), enquanto o consumidor é entendido como sujeito passivo secundário e mediato, que nem sempre sofre ofensa (resultado de dano efetivo) em um de seus bens jurídicos primordiais. Esse é um termo muito utilizado no mundo jurídico que significa “além do individual”, ou seja, algo que não pode ser considerado individualmente. 19 NATUREZA JURÍDICA DOS CRIMES CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO 4. 20 CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - MÓDULO 1 Ao reverso, nos crimes de perigo concreto, o perigo é uma elementar do tipo (é um resultado típico de perigo), precisando, portanto, ser demonstrado, sob pena de atipicidade da conduta. É o caso, por exemplo, do ilícito-típico do art. 132 do Código Penal, consistente em “expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente”, em que a situação de perigo é uma elementar do tipo. Trata- se de crime de perigo concreto, exigindo-se a demonstração de ter a vida ou a saúde da vítima sofrido um risco direto e eminente. São exemplos dessa figura penal, à luz da jurisprudência: dirigir em alta velocidade, fazendo “cavalo de pau”, e embriagado (RT 427/425); “fechar” deliberadamente um veículo, fazendo-lhe subir sobre a calçada e causando a colisão contra poste e outro veículo (JTACrSP 43/196); disparo de arma de fogo em direção a policiais ou a outras pessoas para amedrontá-los (JTACrSP 47/43). Fonte: JULIO FABBRINI MIRABETE. Manual de direito penal. 14ª ed. São Paulo: Atlas, 1998, p. 128. É caso em que a situação de perigo é uma elementar do tipo o ilícito-típico do art. 132 do Código Penal, que consiste em “expor a vida ou a saúde de outrem a perigo direto e iminente”. Trata-se de crime de perigo concreto, exigindo-se a demonstração de ter a vida ou a saúde da vítima sofrido um risco direto e eminente. Veja três exemplos: Nesses crimes, geralmente, não é necessário que se produza um resultado de dano efetivo ou sequer um perigo concreto. Dessa forma, em razão do perigo que ela mesma traz para o bem jurídico, basta a simples realização da conduta proibida pela lei. Ou seja, o risco de dano não precisa ser comprovado: é suficiente a demonstração da conduta descrita no tipo penal (daí a denominação de crimes de mera conduta). O perigo abstrato também chamado perigo hipotético ou presumido é uma presunção juris et de jure, porque a lei presume, de forma absoluta, o perigo. Os crimes contra as relações de consumo são de perigo abstrato ou de mera conduta. Vamos explicar de forma mais simplificada o que isso significa. Veja! Saiba mais 21 CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - MÓDULO 1 Dirigir em alta velocidade, fazendo “cavalo de pau”, e embriagado (RT 427/425). “Fechar” deliberadamente um veículo, fazendo-lhe subir sobre a calçada e causando a colisão contra poste e outro veículo (JTACrSP 43/196). Disparo de arma de fogo em direção a policiais ou a outras pessoas para amedrontá-los (JTACrSP 47/43). A não exigência, pelo legislador, de lesão ou perigo concreto a bens individuais do consumidor revela que o Direito Penal do Consumidor tem uma função primordialmente PREVENTIVA e REPRESSIVA, ou seja, busca se antecipar ao dano. Dessa forma, a ingerência do Estado é basicamente preventiva nas relações de consumo. Por isso, os tipos penais previstos no CDC podem ser visualizados com a simples realização da conduta que atinge diretamente o bem jurídico coletivo tutelado pela lei (relações de consumo). Não é necessário, portanto, o resultado de dano ou perigo efetivo a bens ou a interesses primordiais do consumidor. NÃO ESQUEÇA! O objeto jurídico desses delitos é a proteção de um bem jurídico-penal coletivo ou difuso, como se dá, por exemplo, com os crimes contra a saúde pública e com os delitos contra a ordem econômica. Segundo JOÃO MARCELO DE ARAÚJO JUNIOR, o bem jurídico protegido pelas normas penais econômicas é a ordem econômica, bem de caráter supraindividual que se destina a garantir um justo equilíbrio na produção, circulação e distribuição da riqueza entre os grupos sociais (Dos crimes contra a ordem econômica. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1995, p. 36.). 22 CDC: GARANTIA DO CONSUMIDOR À INFORMAÇÃO EFICIENTE 5. 23 CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - MÓDULO 1 O Código de Defesa do Consumidor apresenta em seu texto uma garantia ao consumidor à informação eficiente. O direito à informação sobre produtos e serviços decorre do Princípio da Vulnerabilidade do Consumidor, previsto no artigo 4º, I, do CDC, que reconhece a existência de uma parte vulnerável nas relações de consumo. Vulnerável é a parte mais fraca da relação. Nas relações de consumo, o consumidor é a parte vulnerável, pois o fornecedor - se comparado ao consumidor - é quem detém com superioridade os poderes econômico, técnico e jurídico ou científico. Art. 4º A Política Nacional das Relações de Consumo tem por objetivo o atendimento das necessidades dos consumidores, o respeito à sua dignidade, saúde e segurança, a proteção de seus interesses econômicos, a melhoria da sua qualidade de vida, bem como a transparência e harmonia das relações de consumo, atendidos os seguintes princípios: I - reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor no mercado de consumo; [...] O consumidor é protegido civil e administrativamente, seja pela ação ou omissão do fornecedor, a quem foi imposto o dever de sempre apresentar as informações de forma clara aos consumidores, na oferta de seus produtos ou serviços. O que significa parte vulnerável? Vamos conhecer o conceito a seguir. 24 CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - MÓDULO 1 Por isso, é muito importante que saibamos sobre os direitos à informação. Art. 6º: São direitos básicos do consumidor: (...) III - a informação adequada e clara sobre os diferentes produtos e serviços, com especificação correta de quantidade, características, composição, qualidade, tributos incidentes e preço, bem como sobre os riscos que apresentem; Art. 31: A oferta e apresentação de produtos ou serviços devem assegurar informações corretas, claras, precisas, ostensivas e em língua portuguesa sobre suas características, qualidades, quantidade, composição, preço, garantia, prazos de validade e origem, entre outros dados, bem como sobre os riscos que apresentam à saúde e segurança dos consumidores. Parágrafo único. As informações de que trata este artigo, nos produtos refrigerados oferecidos ao consumidor, serão gravadas de forma indelével. Art. 36: A publicidade deveser veiculada de tal forma que o consumidor, fácil e imediatamente, a identifique como tal. Parágrafo único. O fornecedor, na publicidade de seus produtos ou serviços, manterá, em seu poder, para informação dos legítimos interessados, os dados fáticos, técnicos e científicos que dão sustentação à mensagem. Art. 37: É proibida toda publicidade enganosa ou abusiva. § 1° É enganosa qualquer modalidade de informação ou comunicação de caráter publicitário, inteira ou parcialmente falsa, ou, por qualquer outro modo, mesmo por omissão, capaz de induzir em erro o consumidor a respeito da natureza, características, qualidade, quantidade, propriedades, origem, preço e quaisquer outros dados sobre produtos e serviços. § 2° É abusiva, dentre outras a publicidade discriminatória de qualquer natureza, a que incite à violência, explore o medo ou a superstição, se aproveite da deficiência de julgamento e experiência da criança, desrespeita valores ambientais, ou que seja capaz de induzir o consumidor a se comportar de forma prejudicial ou perigosa à sua saúde ou segurança. Art. 6 Art. 31 Art. 36 Art. 37 25 CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - MÓDULO 1 Para relembrar Para relembrar Nesse primeiro módulo de estudo você aprendeu os fundamentos basilares para a compreensão dos crimes contra as relações de consumo, bem como sua legislação pertinente. Também compreendeu a importância do conhecimento dos crimes contra as relações de consumo e conheceu a legislação pertinente. Encerramos aqui o nosso primeiro módulo de aprendizagem e esperamos que você tenha compreendido os conceitos básicos que irão acompanhá-lo ao longo de toda a trajetória desse estudo. No próximo módulo você poderá ver como se constitui mais da metade do número de infrações penais previstas no CDC. São os crimes capitulados nos artigos 63, caput e parágrafos 1º e 2º, 64, caput, 66, caput e parágrafos 1º e 2º, 67, 68 e 70. A seguir vamos analisar os tipos penais do CDC. Mas, antes acesse as telas interativas do curso para realizar a avaliação de aprendizagem! Acesse as telas interativas do curso para realizar a atividade de estudo. 26 CRIME CONTRA AS RELAÇÕES DE CONSUMO - MÓDULO 1 Bibliografia ANDRADE, Manoel da Costa. A nova lei dos crimes contra a economia à luz do conceito de bem jurídico, in Ciclo de Estudos e Direito Penal Econômico. Coimbra: Garcia e Carvalho Ltda., 1985. ARAÚJO JR., João Marcelo de. Dos crimes contra a ordem econômica. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1995. AULOY, Jean Calais. Droit de la consommation. 2ª ed. – Paris: Dalloz, 1986. BENJAMIN, Antonio Herman V. Crimes de consumo no código de defesa do consumidor, in Revista de Direito do Consumidor, nº 3. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, set./dez. – 1992, pp. 88-126. ––––––––– A repressão penal aos desvios de “marketing, in Revista de Direito do Consumidor, nº 4 (número especial – O Controle da Publicidade). São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 1992, pp. 91- 125. ––––––––– Código brasileiro de defesa do consumidor: comentado pelos autores do anteprojeto. 6ª ed. – Rio de Janeiro: Forense Universitária, 1999, pp. 224-306. BRUNO, Aníbal. Direito penal. Rio de Janeiro: Forense, 1967, tomo 2, pp. 73-74. BUSTOS RAMÍREZ, Juan. Manual de derecho penal, Parte general. Madrid: Ariel, 1989. CÁNOVES, Antonio Moreno e MARCO, Francisco Ruiz. Delito socioeconómicos. Comentários a los arts. 262, 270 a 310 del nuevo Código penal, concordados y com jurisprudencia. Zaragoza: Editorial EDIJUS, 1996. CERVINI, Raúl. Los processos de descriminalización. Montevideo: Editorial Universidad, 1992. COSTA JR., Paulo José da. Comentários ao código de proteção do consumidor. Coordenador Juarez de Oliveira. São Paulo: Saraiva, 1991. DANTAS, António Leones. Tutela penal de consumo. Intervenção proferida em 21 de junho de 1996, no C.E.J. nas Primeiras Jornadas Luso-Brasileiras sobre Protecção Judiciária do Ambiente e do Consumidor. 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