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Antropologia da Alimentação

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Autoras: Profa. Sirlei Pires Terra
 Profa. Vânia Cristina Lamônica
Colaboradores: Profa. Mônica Teixeira
 Prof. Welliton Donizeti Popolim
Antropologia 
da Alimentação
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Professoras conteudistas: Sirlei Pires Terra / Vânia Cristina Lamônica
Sirlei Pires Terra
É graduada em Ciências Políticas e Sociais, pelo Instituto Municipal de Ensino Superior (Imes), de São Caetano do 
Sul, atual Universidade São Caetano do Sul (USCS). É licenciada em Sociologia, pela Pontifícia Universidade Católica 
de São Paulo (PUC‑SP), universidade pela qual também é graduada e licenciada em Geografia. É especialista em 
Didática do Ensino Superior e em Educação e Saúde, pelo Instituto Presbiteriano Mackenzie; em Formação em EaD, 
pela Universidade Paulista (UNIP); e em Saúde Coletiva pela Universidade Católica Dom Bosco/Portal Educação. 
Tem título de mestrado em Educação, Arte e História da Cultura pela Universidade Presbiteriana Mackenzie e de 
doutorado em Sociologia do Trabalho, pela PUC‑SP. Em 1990, ingressou na UNIP, na qual leciona disciplinas de graduação 
e licenciatura, bem como atua em educação a distância, desde 2014, como orientadora de estágio na Coordenadoria de 
Estágio em Educação, no curso de Licenciatura em Sociologia, além de ser responsável, na EaD, pelas disciplinas Sociologia 
do Trabalho, Antropologia da Alimentação e, em andamento, Antropologia Brasileira.
Vânia Cristina Lamônica
Nutricionista pela Universidade do Sagrado Coração (USC) de Bauru em 1985; mestrado concluído em 2006 e 
doutorado em 2013, ambos pelo Programa de Bases Gerais da Cirurgia da Faculdade de Medicina de Botucatu – Unesp, 
Botucatu (SP). Possui os cursos de especialização em Administração de Serviços de Alimentação e Nutrição (USC‑1985) 
e especialização em Cuidados Nutricionais do Paciente Hospitalizado (FMB‑Unesp‑2003). Com ampla atuação na 
área de Nutrição Clínica e Docência. É coordenadora do curso de graduação em Nutrição e de pós‑graduação (lato 
sensu) em Nutrição Esportiva da Universidade Paulista – UNIP, campus Bauru (SP) e atua como docente dos cursos 
de graduação em Nutrição, Enfermagem, Biomedicina e Fisioterapia na mesma Universidade. Atualmente cursa 
graduação em Filosofia pela Universidade Paulista Interativa (EaD). Na EaD, é responsável pela disciplina Antropologia 
da Alimentação.
© Todos os direitos reservados. Nenhuma parte desta obra pode ser reproduzida ou transmitida por qualquer forma e/ou 
quaisquer meios (eletrônico, incluindo fotocópia e gravação) ou arquivada em qualquer sistema ou banco de dados sem 
permissão escrita da Universidade Paulista.
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
T323a Terra, Sirlei Pires.
Antropologia da Alimentação / Sirlei Pires Terra ‑ São Paulo: 
Editora Sol, 2019.
88 p., il.
Nota: este volume está publicado nos Cadernos de Estudos e 
Pesquisas da UNIP, Série Didática, ano XXV, n. 2‑093/19, ISSN 1517‑9230.
1. Práticas alimentares. 2. Significado dos alimentos. 3. Sistemas 
alimentares. I. Título.
CDU 641
U501.75 – 19
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Prof. Dr. João Carlos Di Genio
Reitor
Prof. Fábio Romeu de Carvalho
Vice-Reitor de Planejamento, Administração e Finanças
Profa. Melânia Dalla Torre
Vice-Reitora de Unidades Universitárias
Prof. Dr. Yugo Okida
Vice-Reitor de Pós-Graduação e Pesquisa
Profa. Dra. Marília Ancona‑Lopez
Vice-Reitora de Graduação
Unip Interativa – EaD
Profa. Elisabete Brihy 
Prof. Marcelo Souza
Prof. Dr. Luiz Felipe Scabar
Prof. Ivan Daliberto Frugoli
 Material Didático – EaD
 Comissão editorial: 
 Dra. Angélica L. Carlini (UNIP)
 Dra. Divane Alves da Silva (UNIP)
 Dr. Ivan Dias da Motta (CESUMAR)
 Dra. Kátia Mosorov Alonso (UFMT)
 Dra. Valéria de Carvalho (UNIP)
 Apoio:
 Profa. Cláudia Regina Baptista – EaD
 Profa. Betisa Malaman – Comissão de Qualificação e Avaliação de Cursos
 Projeto gráfico:
 Prof. Alexandre Ponzetto
 Revisão:
 Vera Saad
 Vitor Andrade
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Sumário
Antropologia da Alimentação
APRESENTAÇÃO ......................................................................................................................................................7
INTRODUÇÃO ...........................................................................................................................................................8
Unidade I
1 CONCEITO SOBRE ANTROPOLOGIA DA ALIMENTAÇÃO .......................................................................9
1.1 Paladar e fome....................................................................................................................................... 10
1.2 Alimento e comida ............................................................................................................................... 10
1.3 Refeição .................................................................................................................................................... 10
1.4 Sistema culinário .................................................................................................................................. 11
1.5 Alimentação no Brasil ........................................................................................................................ 11
1.6 Comida e alimento .............................................................................................................................. 12
1.7 Hábito alimentar ................................................................................................................................... 12
1.8 Gosto ......................................................................................................................................................... 13
1.9 Diferença conceitual entre alimento e comida ........................................................................ 14
1.10 Hábito alimentar brasileiro ............................................................................................................ 15
1.11 Gosto e sabor ....................................................................................................................................... 16
1.12 A gastronomia ..................................................................................................................................... 16
2 FUNÇÕES SOCIOCULTURAIS DA ALIMENTAÇÃO ................................................................................. 17
2.1 O quanto se come ................................................................................................................................ 18
2.2 O que se come ....................................................................................................................................... 21
2.3 Comer junto – comensalidade ........................................................................................................ 22
3 AS DIFERENTES PRÁTICAS ALIMENTARES E O ATO DE COMER .................................................... 23
3.1 As diferentes práticas alimentares ................................................................................................ 23
3.2 Alguns aspectos sobre o processo de mudanças das práticas alimentares .................. 28
3.3 Algumas considerações sobre as práticas contemporâneas em relação 
às camadas sociais, gênero e etnia ....................................................................................................... 30
3.4 A respeito dos gêneros alimentícios ............................................................................................. 31
3.5 Café da manhã ...................................................................................................................................... 31
3.6 O almoço: a refeição do meio‑dia .................................................................................................33
3.7 O jantar: refeição noturna ................................................................................................................ 34
3.8 As frutas e as verduras ....................................................................................................................... 35
3.9 O papel dos líquidos ............................................................................................................................ 36
3.10 Os alimentos industrializados e os alimentos naturais ...................................................... 36
3.11 Os alimentos light .............................................................................................................................. 37
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3.12 O consumo de açúcares, doces e chocolates ......................................................................... 37
4 RELAÇÃO ENTRE CORPO, SAÚDE E ALIMENTAÇÃO ........................................................................... 37
4.1 A contribuição das ciências sociais ............................................................................................... 37
4.2 Algumas considerações sobre o corpo na contemporaneidade ........................................ 38
4.3 O mundo moderno e o corpo .......................................................................................................... 39
4.4 A saúde perfeita .................................................................................................................................... 39
4.5 O autocuidado ....................................................................................................................................... 39
4.6 As formas do corpo ............................................................................................................................. 39
4.7 Emagrecimento ..................................................................................................................................... 40
4.8 A questão do prazer e a questão da saúde ................................................................................ 42
Unidade II
5 O SIGNIFICADO DOS ALIMENTOS ............................................................................................................. 48
5.1 Significado político‑social ................................................................................................................ 53
5.2 Significado emocional ........................................................................................................................ 54
5.3 Significado biológico‑científico ..................................................................................................... 55
6 O DESENVOLVIMENTO HISTÓRICO DA ALIMENTAÇÃO ..................................................................... 57
7 ALIMENTAÇÃO NA ATUALIDADE ............................................................................................................... 63
7.1 Tradições culinárias convencionais ............................................................................................... 65
7.2 Gastronomia moderna ....................................................................................................................... 66
8 OS DIVERSOS FATORES QUE INTERFEREM NOS SISTEMAS ALIMENTARES .............................. 68
8.1 Fatores biológicos e naturais ........................................................................................................... 68
8.2 Fatores familiares, culturais e religiosos ..................................................................................... 69
8.3 Fatores socioeconômicos .................................................................................................................. 72
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APRESENTAÇÃO
A disciplina Antropologia da Alimentação oferece ao graduando estudos sobre a simbologia que 
permeia a alimentação humana, com seus rituais próprios de cada cultura, em especial da cultura 
alimentar brasileira.
Trata‑se de desvelar como a alimentação humana foi construindo, ao longo do tempo, preferências 
diversas, transformando o alimento em comida e, ao mesmo tempo, interiorizando gostos e hábitos 
alimentares, revelando a identidade cultural alimentar de indivíduos e de povos.
Também aborda como as distinções de classe se configuram nas escolhas, nos preparos, nos serviços à 
mesa, na forma de partilhar o alimento e de comê‑lo e na geografia da mesa, que ainda tem importância 
simbólica e é meio de distinção de valores sociais.
O objetivo da disciplina é contribuir para a formação de profissionais, capazes de elaborar análises 
que permitam a apreensão da realidade social e simbólica no tocante à alimentação. Para tanto, a 
disciplina pretende:
• Capacitar o aluno a entender a complexidade do fator alimentar na espécie humana e em 
particular na sociedade brasileira, levando em consideração a diversidade biológica, ecológica, 
tecnológica, econômica, social, política e ideológica. Entender o que leva o humano a eleger 
determinado tipo de alimento, condicionando‑se a ele as interferências das crenças que 
o permeiam, a adaptação a sabores, odores, entre outras características, considerando o 
desenvolvimento histórico de cada sociedade, com o objetivo de ter uma atuação capaz de 
contribuir para a qualidade de vida da sociedade.
• Entender e discutir o significado dos alimentos, seus condicionantes culturais, ecológicos, 
tecnológicos e econômicos.
• Entender e discutir a importância das crenças religiosas e dietéticas, bem como as funções 
socioculturais da alimentação, o comportamento alimentício e as tradições culinárias das 
diferentes sociedades humanas, instrumentalizando‑se para a atuação profissional.
• Refletir sobre as construções culturais e simbólicas que demarcam o campo da saúde‑doença.
A Antropologia da Alimentação permite a reflexão sobre como a capacidade de simbolização 
impactou o processo alimentar, de forma a permitir o surgimento de uma diversidade alimentar que 
permeia o mundo globalizado, bem como a diversidade encontrada em nosso próprio país, em suas 
regiões, apresentando preferências alimentares distintas, além da distinção existente nos diferentes 
extratos sociais.
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INTRODUÇÃO
Este livro‑texto tem a intenção de contribuir para que o graduando de Nutrição tenha acesso a um 
conteúdo que o torne capaz de desenvolver uma reflexão acerca da alimentação humana e de sua carga 
simbólica, fato que permitirá a construção de um diálogo que tenha significado para si e para aqueles 
que orientará em sua prática profissional, além de contribuir para a eficácia dessa relação.
A discussão se inicia em torno dos conceitos que embasam a disciplina, tais como: alimento, comida, 
refeição, hábito, gosto, sabor, entre outros.
Serão abordadas as funções socioculturais da alimentação, abrangendo aspectos vinculados a toda 
simbologia voltada para o quanto se come, o que se come, com quem se come e para a comensalidade.
Essa importante temática será contemplada no que diz respeito às diferentes práticas alimentares e 
ao ato de comer as refeições diariamente, enfatizando o café da manhã, almoço e jantar, sem deixar de 
mencionar a importância das refeições intermediárias, entendendo que estas também seguem padrões 
alimentares próprios de suas culturas. Serão abordados os aspectos das práticas alimentares antigas e 
contemporâneas relacionadas às camadas sociais, ao gênero e à etnia, bem como o processo de mudança 
dessas práticas alimentares.
Desenvolveremos conhecimentos sobre a relação entre corpo e saúde, idade e alimentação, assim 
como a contribuição das Ciências Sociais na compreensão da importância do processo alimentar 
humano. Apresentaremos considerações sobre o corpo na contemporaneidade,a saúde, o autocuidado, 
o emagrecimento e a questão do prazer e da saúde, como formas de escolhas que podem ser feitas 
visando a construção do corpo perfeito na contemporaneidade.
Posteriormente discutiremos os diversos símbolos dos alimentos e suas representações na vida de 
um indivíduo ou comunidade, desde o início da história da alimentação até a gastronomia atual e os 
diversos fatores que interferem na relação entre o homem e os alimentos.
A leitura permitirá a compreensão das relações simbólicas de cada alimento, por exemplo, carnes, 
verduras, legumes, frutas, grãos, cereais, líquidos, óleos etc., e de como os alimentos representam mais 
do que apenas um conjunto de nutrientes capazes de manter a vida biológica.
Serão abordados os primeiros comportamentos alimentares na espécie humana e suas transformações 
no tempo, bem como seus aspectos simbólicos em cada fase, da caça e coleta à agricultura e pecuária, 
contemplando as mudanças históricas e simbólicas da mundialização até a industrialização dos alimentos.
Discutiremos a miscigenação, do período colonial, como fator determinante para nossa tradição culinária 
e o desenvolvimento de nossos gostos e costumes e quais os rumos para o futuro de nossa alimentação.
Ao fim abordaremos as diversas influências que contribuem para a individualização dos hábitos 
alimentares e como estas podem interferir no estado nutricional.
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ANTROPOLOGIA DA ALIMENTAÇÃO
Unidade I
1 CONCEITO SOBRE ANTROPOLOGIA DA ALIMENTAÇÃO
Ao discorrer sobre o tema alimentação, é importante citar Cascudo (2015), cuja publicação História 
da Alimentação no Brasil fez dele um dos primeiros estudiosos da cultura brasileira enfocando a 
alimentação. Ele realizou estudos etnográficos importantes sobre vários temas, como comidas, bebidas, 
entre outros, em meados do século XX.
Os trabalhos de Cascudo embasaram a produção antropológica de Gonçalves (2004), que afirmou: 
“Nem tudo que alimenta é bom ou socialmente aceitável, do mesmo modo, nem tudo que é alimento é 
comida”. O antropólogo destaca o fato de Cascudo considerar que a preparação e o consumo de comidas e 
bebidas estão sempre carregados de valores simbólicos contidos no sistema de relações sociais estabelecidas 
nas festas, religiões e medicinas populares, provérbios, narrativas e nas relações mágico‑religiosas, o que 
levou Cascudo a criar, em suas etnografias, categorias como: nutrição, alimentação, comida e refeição, 
fome e paladar, cru e cozidos, cujos conceitos apresentaremos na sequência.
 Saiba mais
Você encontrará mais informações sobre essas categorias nos capítulos 
“A Nutrição e a Fome” do livro Comida e Sociedade, de Henrique Carneiro, e 
“Sobre Comidas e Mulheres”, do livro O que faz o brasil, Brasil?, de Roberto 
DaMatta, além do livro de Cascudo:
CARNEIRO, H. Comida e sociedade: uma história da alimentação. 
Rio de Janeiro: Campus Elsevier, 2003. p. 23‑43.
CASCUDO, L. da C. História da alimentação no Brasil. 3. ed. São Paulo: 
Global, 2015.
DaMATTA, R. O que faz o brasil, Brasil?. Rio de Janeiro: Rocco, 1986. 
Disponível em: <hugoribeiro.com.br/biblioteca‑digital/Da_Matta‑O_que_
faz_Brasil_Brasil.pdf>. Acesso em: 13 jan. 2019.
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Unidade I
1.1 Paladar e fome
Cascudo (2015) trabalha a alimentação focando o “paladar”, que é determinado por comportamentos 
culturais influenciados por regras, padrões e proibições, por isso a alimentação é poderosa na delimitação 
das preferências alimentares humanas. A escolha de nossos alimentos diários se dá em relação aos 
valores de nossa cultura e de acordo como nosso menu foi construído ao longo de milênios, qualquer 
mudança no paladar deve demorar praticamente o mesmo tempo que se levou para tê‑lo.
Fome e sede podem ser satisfeitas por qualquer alimento ou bebida, porém o paladar é construído 
e está vinculado a formas específicas e particulares de apresentação, preparação e consumo. Por meio 
do paladar tem‑se a distinção e oposição entre diferentes indivíduos e grupos, sendo que por essa 
razão, para Cascudo (2015), o paladar faz parte do processo de construção das identidades individuais e 
coletivas. Nesse aspecto, as regras culturais e as trocas sociais definem a natureza do ser humano, e não 
suas necessidades biológicas, que podem ser satisfeitas por qualquer alimento.
Gonçalves (2004) traz uma importante contribuição sobre os estudos etnográficos de Cascudo, indicando 
que para Cascudo a categoria “paladar” é oposta à categoria “fome”, como necessidade natural, e está presente 
em todos os seus estudos antropológicos sobre comidas e bebidas, expressando uma visão sobre o cotidiano 
da sociedade brasileira. Portanto, os alimentos carregam em si a expressão da celebração de diferentes tipos 
de relações sociais e culturais, desempenhando assim diversas funções, além das de alimentar ou satisfazer a 
fome como se fosse apenas uma necessidade somente natural.
Verificaremos a seguir alguns conceitos fundamentais que conformam a disciplina Antropologia 
da Alimentação.
1.2 Alimento e comida
Cascudo (2015) faz a distinção entre alimento e comida, associando alimento às experiências 
fisiológicas da subsistência e da fome. A comida transcende o ato de se alimentar, pois tem significado 
social e cultural, diferenciando‑se do simples ato de se alimentar. Comida tem a ver com apetite e 
paladar e está associada ao corpo culturalmente formado.
1.3 Refeição
Existe oposição entre o ato social e cultural de comer e o ato social e cultural de participar 
de uma “refeição”. A comida pode estar presente em diversas situações sociais e culturais, porém 
a refeição carrega em si situações sociais e culturais particulares e ritualizadas, por exemplo, 
a ceia de Natal ou de ano‑novo, com suas formas específicas de comprar, preparar, servir e 
consumir. Dessa forma, para Cascudo (2015), participar de uma refeição não é o mesmo que 
simplesmente comer, sendo que a diferença entre ambas está na transformação de uma situação 
informal e casual em uma situação mais estruturada em termos sociais e culturais. As refeições 
seguem ritmos de tradição, são coletivas, estabelecem conexões entre os seres humanos, no 
contexto doméstico e em situações ritualizadas, que podem ser com parceiros distantes, como 
santos, mortos e divindades, divindades e os humanos, mortos e vivos. O ato de comer é casual e 
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ANTROPOLOGIA DA ALIMENTAÇÃO
individual, solitário e conectado com necessidades passageiras, individuais e eventuais, podendo 
ser rapidamente modificado pela moda.
Para Cascudo (2015), as sequências antigas ou tradicionais diárias das refeições consistiam em almoçar 
às 7 horas da manhã, jantar cerca das 12 horas, merenda às 15 horas, e a ceia por volta das 18 horas. 
Na contemporaneidade tem‑se a seguinte sequência: café da manhã, normalmente vinculado ao horário 
de sair de casa para trabalhar, almoço, cerca das 12 horas, lanche e jantar cerca das 19 horas, quando volta 
para casa, do trabalho. São possibilidades que formam um sistema culinário.
1.4 Sistema culinário
É considerado um sistema culinário um conjunto de ingredientes, condimentos e procedimentos 
compartilhados num determinado momento histórico e num determinado território. São conjuntos de 
práticas e representações que unem a pessoa, a sociedade e o universo.
Fazem parte de um sistema culinário o modo de cozinhar, a estética, o sabor, as maneiras à mesa, 
tudo dentro de um determinado código cultural mediado social e simbolicamente pelos diferentes 
grupos sociais em diferentes tempos e espaços e em diferentes estratos sociais, que são transformados 
simbolicamente da natureza à cultura, da fome ao paladar, do alimento à comida e da comida às 
refeições (GONÇALVES, 2004).
Para estudar o sistema culinário popular brasileiro, Cascudo(2015) baseou‑se em pesquisas 
bibliográficas, arquivos e memórias referentes ao Brasil tradicional do século XVI ao Brasil contemporâneo 
do século XX, incluindo as preferências brasileiras tradicionais por determinadas comidas e bebidas, suas 
formas, estética de preparo, de apresentação e de consumo, bem como seus gostos. A cozinha nacional 
brasileira se cristaliza no fim do século XVIII, constituindo‑se da cultura portuguesa e dos reflexos dos 
sistemas indígenas e africanos de alimentação.
Os sistemas culinários são culturalmente organizados, sendo que o sistema culinário tradicional 
é dominado pela categoria “paladar” e o sistema culinário moderno é dominado pela fome, satisfeita 
de forma ocasional e irregular pela alimentação cotidiana, que pode ser realizada em fast‑food, 
o qual nos priva de saborear a comida caseira, causando a substituição das relações sociais pelas 
relações imediatistas, não levando em conta o apetite e o paladar, e sim a necessidade de saciar a 
fome. Fome e paladar nos contextos tradicionais são categorias perceptíveis, na modernidade são 
individualizadas e autônomas, tornando‑se bom gosto (CASCUDO, 2015).
1.5 Alimentação no Brasil
O interesse sobre a alimentação no Brasil está mais voltado para o prazer da comida, e menos voltado para os 
nutrientes nela contidos. No Brasil, normalmente a comida do povo tem muita composição de massas, gorduras, 
açúcares e carne, cujo prazer alimentar está centrado na mistura desses alimentos. Não há muito interesse em 
frutas, legumes e hortaliças, indicando a necessidade de trabalhar mudanças nesses hábitos alimentares, visando 
a valorização e o prazer da ingestão desses alimentos.
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Unidade I
1.6 Comida e alimento
Para DaMatta (1986), nossa expressão cultural alimentar indica que nem todo alimento é bom ou 
socialmente aceitável, assim como nem tudo que alimenta pode ser considerado comida ou ter aceitação 
social. Dessa forma, alimento é tudo que pode ser ingerido para a manutenção da vida da pessoa, é como 
uma moldura que contém a possibilidade da comida, sendo universal, pois interessa a todos os seres 
humanos, tanto aos amigos quanto aos inimigos, pessoas de perto ou de longe etc. Comida é o quadro, 
isto é, o que foi valorizado e escolhido entre os alimentos disponíveis, e deve ser visto e saboreado 
com os olhos e posteriormente com a boca, o nariz, a barriga, em companhia de alguém, é tudo que se 
come com prazer, de acordo com regras sagradas de comunhão e comensalidade. Comer vai além da 
ingestão de um alimento, pois inclui relações pessoais, sociais e culturais. Assim, a cultura alimentar está 
diretamente ligada com a forma como a pessoa se comporta na sociedade, na qual a comida refere‑se 
a algo costumeiro, e contribui para o estabelecimento da identidade de uma pessoa, de um grupo, de 
uma classe social, ao constituir‑se em um modo, um estilo de se alimentar.
DaMatta (1986) faz uma relação simbólica entre o cru e o cozido, entendidos como modalidades 
de transformações sociais. Relaciona o cru com o masculino, selvageria, coisas difíceis, opostas ao 
mundo da casa, e o cozido com o feminino, tempero e coisas elaboradas, algo social, a boa mesa, 
sendo que a oposição entre o cru e o cozido permite pensar o mundo integrado, o intelectual e o 
sensível. Ele considera a comida uma mediação entre a cabeça e a barriga, o corpo e a alma, numa 
operação conjunta de vários códigos culturais como a casa, a intimidade, além dos órgãos do sentido 
gustativo, olfativo, visual e digestivo.
1.7 Hábito alimentar
O hábito alimentar tem a ver com as escolhas e consumos alimentares de um indivíduo ou grupo, 
sendo influenciado por fatores fisiológicos, psicológicos, culturais e sociais. O hábito alimentar do 
brasileiro é formado pelas culturas alimentares dos índios, dos negros e dos portugueses:
• Os índios viviam da caça, pesca e raízes, como mandioca, inhame, milho verde, batata‑doce, 
banana‑da‑terra, brotos preparados em fogo de chão. Basicamente amidos e raízes, ricos em 
energia e calorias.
• Os africanos misturavam comidas em uma só panela cozinhando alimentos, por exemplo, o 
arroz com algum outro alimento, fato esse que melhorou o cozimento do que o índio comia. 
Daí a origem do cozido. Eles utilizavam fubá, farinha, rapadura, goma e polvilho. Herança 
composta de carboidratos, cozidos, massas e caldos.
• Os portugueses tinham como base cultural o azeite de oliva, que o brasileiro substituiu por outros 
óleos. Sua herança constitui‑se de requintes à mesa e manuseio de melhores pratos. Alimentos 
como oliva, gordura, pastéis, massas e doces contribuíram para a criação de pratos como frango com 
quiabo, doce de leite e doces de compotas, que têm alto teor de gordura e açúcar.
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ANTROPOLOGIA DA ALIMENTAÇÃO
Curiosamente, a alimentação do europeu e do americano é focada no que conhecemos como 
caráter analítico, por ser uma alimentação bem definida e bem separada no prato, que não mistura os 
alimentos. Há uma distinção na ordem das refeições e nos pratos, pois a cozinha deve respeitar os limites 
do natural, os pratos são autônomos, então sopa de couve deve ter o gosto da couve (MONTANARI, 
2008). Ingleses e franceses têm molhos específicos para cada prato, mantendo uma separação entre o 
sólido e o líquido, já o brasileiro prefere a mistura do sólido com o líquido, preferência emblemática na 
nossa cultura representada pelo cozido, indicando que temos uma culinária relacional numa sociedade 
igualmente relacional, marcada pela ligação.
A comida brasileira contempla a mistura dos alimentos num mesmo prato, pois gostamos do 
terceiro sabor que se forma pela mistura que fazemos na boca, por exemplo o arroz com feijão, o 
cozido, a feijoada... Trata‑se do caráter sintético romano, renascentista e medieval que existe ainda 
hoje na cozinha conservadora europeia. A culinária alemã, em que há carne com fruta, comida típica 
da Idade Média, é um bom exemplo. Nesse tipo de cozinha, mistura‑se o sabor, mantendo os alimentos 
juntos, considerando ser equilibrada a comida que contém todas as qualidades nutricionais. O prato 
perfeito tem todos os sabores, isto é, todas as virtudes. Há alteração das características do produto. 
Essas preferências marcam nossa noção de gosto ou paladar, que afirma nossa identidade culinária 
no gosto, na aparência, nos gestos e ritos alimentares (MONTANARI, 2008).
1.8 Gosto
Em relação ao gosto, nossa identidade cultural é bem marcada nas nossas escolhas alimentares. 
Assim uma comida pode ser boa ou ruim, dependendo da cultura na qual é consumida. Por exemplo, 
comer gafanhotos na cultura ocidental é quase impossível, no entanto é uma iguaria para outros 
povos. Esse fato acontece porque o órgão do gosto não é a língua, e sim o cérebro, que é um órgão 
culturalmente determinado e obedece a critérios variáveis no tempo e no espaço, permitindo que os 
gostos mudem no decorrer do tempo. O gosto como sabor, como sensação da língua e do palato, é 
subjetivo e incomunicável, embora condicionável pelo gosto saber, e pode se perder no tempo, mas 
o gosto saber, ao avaliar se o alimento é bom ou ruim, é determinado também e principalmente pelo 
cérebro, e não somente pela língua, sendo uma realidade coletiva, portanto comunicável. É possível 
saber o gosto que imperava no passado por meio de documentos que relatam as formas de consumo de 
uma determinada época (MONTANARI, 2008).
Interessante também é como os talheres foram introduzidos na alimentação. A utilização da colher 
é antiga, para a ingestão dos líquidos e das sopas, por exemplo, já o garfo começa a ser usado no fim da 
Idade Média, em especial na Itália, por consequência da cultura da massa, embora não fosse bem visto 
por significar extremo refinamento e ser visto como antinatural, pois o natural era comer com as mãos.
Durante muito tempo, principalmentena Idade Média, a mistura dos alimentos sempre esteve presente 
e as técnicas de cozimento se sobrepunham e mais amalgamavam os sabores do que os separavam. 
Entretanto, essa cozinha, assim como a relação com a comida, foram sendo alteradas a partir de meados 
do século XIX com o uso do “serviço à russa”, que significa servir um mesmo prato a todos, em detrimento 
das formas anteriores e atuais em alguns países, que colocam todos os pratos à mesa e cada um escolhe 
e monta seu prato.
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Unidade I
Mesmo considerando o gosto sintético ou o analítico, escolhas, formas de preparo, apresentação 
e consumo estão vinculados ao alimento que a cultura considera comida. Pontuando novamente os 
conceitos de alimento e de comida, estes serão representados, a seguir, por algumas figuras ilustrativas.
1.9 Diferença conceitual entre alimento e comida
Alimento é tudo que pode ser ingerido para manter a pessoa viva; uma grande moldura que contém 
as possibilidades de comida; algo universal e geral, que diz respeito a todos os seres humanos.
Comida é tudo que se come com prazer de acordo com as regras de comunhão e comensalidade; 
um quadro, a parte valorizada e escolhida entre os alimentos disponíveis; aquilo que é visto e 
saboreado com os olhos, o nariz, a boca, a barriga; em companhia de alguém; algo costumeiro e sadio 
que estabelece uma identidade, seja de um grupo, seja de uma pessoa ou classe; um modo, um estilo, 
um jeito de alimentar‑se.
Conforme a figura subsequente, estão disponíveis vários grupos alimentares, como os alimentos 
de origem animal, vegetal, mineral e industrial. Temos também os subgrupos, por exemplo, os de 
origem animal, que compreendem carne branca, carne vermelha, frutos do mar, leites, ovos etc. Ainda 
nesses subgrupos, temos outras formas de classificação, como carne de vaca, carne de porco, peixes, 
moluscos, além dos alimentos de origem vegetal, tais como legumes, verduras, frutas, ervas, cereais, 
sementes, e os alimentos minerais, como o sal, lembrando que a água é um elemento da natureza que 
faz parte dos alimentos.
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40%
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Vegetal Animal Mineral Industrial
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30%
10%
5%
Figura 1 – Ilustra aleatória e proporcionalmente a disponibilidade dos diversos grupos alimentares
Entretanto, a escolha dos grupos e de seus subgrupos será própria de cada cultura e se constituirá 
no que será reconhecido como comida. No entanto, cada cultura escolherá apenas alguns dos grupos 
de alimentos para ser considerado como comida. Podemos visualizar diferentes escolhas de alguns 
alimentos como comida, conforme figura a seguir. Preste atenção no primeiro grupo e verifique que 
não possui a opção por alimentos de origem animal, configurando uma cultura alimentar vegetariana.
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ANTROPOLOGIA DA ALIMENTAÇÃO
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Vegetal Animal Mineral Industrial
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15%
55%
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10%
5%
70%
60%
50%
40%
30%
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10%
0%
Figura 2 – Ilustra aleatória e proporcionalmente as preferências em três supostas culturas
Sendo assim, comida só pode ser definida como tal dentro de determinada cultura. Por exemplo, a 
carne de vaca é considerada comida para os brasileiros, mas não para aqueles que são vegetarianos. 
A mesma carne de vaca na Índia não é comida, da mesma forma que para os brasileiros carne 
de cachorro não é comida, no entanto, na China, ela o é. Podemos então concluir que a comida 
depende da cultura, seja ela local, seja regional ou nacional, ou até mesmo de determinada classe 
econômica ou faixa etária. Se pensarmos no leite, que é também um alimento para o ser humano, 
para um bebê, é mais que um alimento, é uma comida, comida de bebê, que marca a identidade 
dessa faixa etária, é o alimento valorizado, saboreado, costumeiro. E assim podemos dizer que o osso 
é comida de cachorro; o milho, de galinha; o macarrão, de italianos; o churrasco, comida de gaúcho 
etc. A comida do brasileiro é arroz e feijão, combinação que comemos com muita frequência, em 
todas as regiões do País. É um prato saudável e valorizado, que se partilha com parentes e amigos. 
São dois alimentos cozidos que se unem, misturando o preto e o branco, construindo uma comida 
única, a síntese da sociedade brasileira. Os exemplos de alimento são as classificações como carne, 
verduras, legumes, frutas, cereais etc. Dentro dessas classificações gerais e universais, escolhemos 
um conjunto que consideramos como comida, por exemplo, a carne de vaca ou de porco, porém 
não consideramos como tal a carne de cachorro ou de rato, que é comida para a cultura chinesa.
1.10 Hábito alimentar brasileiro
Refletindo sobre o hábito alimentar brasileiro, percebemos que esse povo dá sempre preferência 
ao cozido, seja a peixada, seja a feijoada, o pirão, os molhos, as dobradinhas e papas. Já o assado não é 
um prato típico de celebração em família, pois não permite a mistura. A farinha de mandioca é outra 
comida típica, pois serve de cimento para as comidas líquidas e sólidas, ligando todos os pratos. Entre 
o sólido e o líquido, preferimos uma forma intermediária, o cozido. Entre a carne e a verdura, que nos 
pratos europeus estão separadas, optamos por um prato que ligue os dois, como a feijoada, a moqueca 
e a peixada. São essas escolhas e preferências que formam o hábito alimentar de uma cultura e que 
diferenciam uma da outra.
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Unidade I
Grande parte da nossa herança culinária tem influência portuguesa, mas temos também influências 
africana e indígena, que fazem parte da combinação de nossos pratos. Nós não privilegiamos o prato 
separado, como na China e no Japão, nem a combinação de pratos separados, como na França e na 
Inglaterra. Para nós existe uma comida que é a central e todas as outras periféricas, que permitem a 
mistura ou a união de todas elas.
1.11 Gosto e sabor
Para Carneiro (2003), historiador brasileiro, essas preferências do brasileiro marcariam a noção de 
gosto ou de paladar, que afirma a nossa identidade culinária, parte integrante do universo da estética 
alimentar, composta de gosto, aparência, gestos e ritos alimentares. “Os sabores são mais que o desfrute 
de um sentido que indica a comestibilidade das coisas” (CARNEIRO, 2003, p. 124).
Os gostos diferenciados caracterizam os vários povos e as diferentes épocas de uma mesma cultura, 
que amadurecem com suas conquistas espirituais, realizações materiais, elaboração de técnicas e criação 
de alimentos.
Assim, o gosto depende da cultura alimentar na qual o indivíduo está inserido. Gostamos daquilo que 
temos o hábito de comer, ou seja, de determinadas comidas. Ninguém vai gostar de um alimento que nunca 
provou ou que não sabe como fazer, o gosto é predeterminado pela comida local. Para se construir o gosto, é 
necessário habituar‑se à comida, considerar tal alimento como comida e, posteriormente, após criar o hábito 
de comê‑lo, considerá‑lo como algo gostoso.
1.12 A gastronomia
O termo gastronomia se refere ao uso requintado e delicado dos alimentos e da boa mesa. 
A alimentação, após o século XIX, libertou‑se das imposições dietéticas e medicinais, das restrições 
morais e religiosas, e passou a ser associada aos prazeres da mesa e da gula, ao prazer carnal como 
o ato sexual. Podemos compreender que a alimentação humana é uma característica cultural mais 
que biológica. A antropologia da alimentação foca seus estudos nesse aspecto do gosto, deixando os 
aspectos da fome e do alimento para outras ciências. Sendo assim, para a antropologia, o que separa o 
homem dos animais é o gosto, a comida, uma vez que os animais comem por fome qualquer alimento 
que seja assim considerado em sua espécie.
 Observação
A alimentação na época romana renascentista era baseada na 
mistura dos sabores. A ciência dietética considerava equilibrado o pratoque contivesse todas as qualidades nutricionais, o que significava a 
combinação de diversos sabores (todas as virtudes) simultaneamente, por 
isso, o cozinheiro precisava intervir no produto. São misturas como doce e 
salgado, agridoce, mistura de mel e vinagre, pratos que resistem até hoje. 
As peras ou maçãs que acompanham a carne são características da cozinha 
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ANTROPOLOGIA DA ALIMENTAÇÃO
medieval (pouco presente no Brasil por sermos um país de colonização 
pós‑renascentista). As técnicas de cozimento também eram uma forma de 
transformar o sabor: escaldar, assar, fritar, aquecer, grelhar, representavam, 
além de modos de cozinhar, momentos diversos do preparo do alimento, 
que poderiam sobrepor mais de uma técnica para alcançar a textura e o 
sabor ideal, conservando o alimento (MONTANARI, 2008).
Entre os séculos XVII e XVIII, os franceses começaram uma revolução culinária, na qual cada alimento 
tinha de possuir seu próprio sabor, o natural. Outra característica da gastronomia pré‑moderna é a 
cozinha fundamentalmente magra: os molhos eram à base de ingredientes ácidos e não gordurosos, 
tais como vinho, vinagre, sucos cítricos. Os molhos à base de laticínios e óleos, muito comuns na 
nossa mesa, são essencialmente modernos e industriais (MONTANARI, 2008). Com esse levantamento 
histórico, começamos a observar quais eram os hábitos alimentares de diferentes povos e o que 
consideravam como comida e conheciam como gosto e predileção.
Neste capítulo, tivemos a intenção de discorrer sobre os conceitos necessários à compreensão da 
disciplina Antropologia da Alimentação. Conceitos esses elaborados por pesquisadores que dominam o 
conhecimento sobre a alimentação em nosso país.
A seguir, vamos trabalhar a produção do conhecimento, a respeito da importância da compreensão 
de como a alimentação carrega consigo valores simbólicos e socialmente partilhados.
2 FUNÇÕES SOCIOCULTURAIS DA ALIMENTAÇÃO
Neste capítulo temos o objetivo de ajudar o aluno a compreender os ritmos da comensalidade e a 
refletir sobre o quanto, com quem, o que, quando e como se come, uma vez que os comportamentos 
sociais trazem em si momentos de escolha, sendo que cada cultura tem suas próprias preferências, por 
exemplo, em relação ao gosto dos alimentos; entretanto, estes se formam e se modificam ao longo 
da história. Também é importante destacar que fome e abundância geram escolhas diferenciadas, isso 
quando falamos de gosto, e não de fome, pois muitas pessoas se alimentam por fome, e não por 
prazer da escolha, a assinalar que o gosto existe principalmente nas classes sociais mais abastadas, que 
possuem a possibilidade de opção, sendo então o gosto de poucos (MONTANARI, 2008).
Dessa forma, as escolhas dos alimentos por um grupo ou uma pessoa decorrem basicamente de sua 
condição financeira para adquiri‑los, e, à medida que os alimentos escolhidos são frequentes no dia a dia, 
formam os hábitos alimentares, bem como a distinção do alimento entre bom e ruim, tornando a escolha 
um valor cultural positivo. Formar um hábito alimentar, nessas condições, é próprio de classes menos 
favorecidas, que optam por cereais, legumes, pães, bolos, massas e batatas (HARRIS, 1990).
Entretanto, Montanari (2008) faz algumas objeções às colocações de Harris, por entender que não 
necessariamente os hábitos alimentares têm relação com o gosto dos indivíduos. Citando Flandrin, Montanari 
(1998) diz que se pode comer algo esporadicamente ou mesmo por hábito, o que difere de apreciar o alimento. 
Por exemplo, o pão preto elaborado com grãos inferiores como o centeio, trigo espelta ou cevada foi apreciado 
pela população mais pobre e posteriormente pela elite, talvez não por gostar, mas sim pela possibilidade de 
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Unidade I
se sentirem condescendentes com os mais pobres. Nesse contexto de riqueza, o mecanismo de formação do 
gosto pode se inverter, sendo que dessa forma o objeto do desejo deixa de ser o abundante e passa a ser o 
raro, que estimula a vontade e nos faz querer mais. Como exemplo podemos citar as especiarias, objeto de 
desejo da elite antigamente que, ao se tornar popular, deixou de sê‑lo, porque não era mais indicativo de 
distinção. A distinção passou a pertencer à manteiga, na confeitaria e nas verduras frescas da horta, num 
movimento de reabilitação dos modelos camponeses, fato esse parecido com as atuais dietas pobres.
Harris (1990) analisa que o percurso vai do hábito ao gosto e do comer ao pensar. Montanari (2008) discorda. 
Ele considera que o objeto de desejo para o pobre e para o rico não são os alimentos abundantes, mas aqueles 
raros ou ocasionais, restritos. Consumir esses produtos alimentares raros é símbolo de status, de distinção social, 
e isso formará o gosto social, aquele que distingue as classes socioeconômicas nas escolhas alimentares. Assim, a 
fruta, que é muito perecível, torna‑se um alimento do rico, que não se interessa pelo alimento abundante.
 Saiba mais
Para conhecer mais sobre o gosto e as classes socioeconômicas, leia 
os capitolos 3 e 4 “O Gosto é um Produto Social” e “Comida, Linguagem, 
Identidade” do livro:
MONTANARI, M. Comida como cultura. São Paulo: Senac, 2008. 
p. 109‑130; p. 157‑164.
Você também encontrará mais informações no artigo:
FERNANDES, A. T. Ritualização da comensalidade. Revista da Faculdade 
de Letras da Universidade do Porto, v. 7, 1997. Disponível em: <http://ojs.
letras.up.pt/index.php/Sociologia/article/view/2579/2364>. Acesso em: 
17 fev. 2019.
2.1 O quanto se come
Le Goff (1981) escreveu que, na Idade Média, a melhor forma de as camadas dominantes se 
definirem enquanto tais era pelo luxo e pela ostentação alimentar, pois a quantidade de comida era 
uma das principais características de distinção de classe. O luxo e a ostentação alimentar mostram um 
comportamento de classe que não podia ser imitado pelas camadas populares. A abundância alimentar 
é um privilégio social e mostra o poderio do homem. Assim, na Idade Média o luxo e a ostentação 
alimentar produziam um recorte de classe na qual a abundância da comida significava situação de 
privilégio e de poder; desejava‑se, portanto, quantidade, o que demonstra que a proximidade com 
a localização dos recursos alimentares era uma das primeiras grandes preocupações da humanidade. 
O poderoso era aquele que comia muito, pois o que comia pouco era considerado fraco, sem condições 
de reinar. Era preciso ser forte e guerreiro, portanto uma boa caçada afirmava essa possibilidade, como 
fruto da coragem, do comando e da força, qualidades necessárias a um nobre, ao mesmo tempo que 
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ANTROPOLOGIA DA ALIMENTAÇÃO
comia carne, pois esta lhe proporcionava a força para um combate. Na época, os tratados médicos 
indicavam que comer carne era um excelente alimento para crescer com vigor (MONTANARI, 2008).
A ilustração a seguir demonstra como nos séculos XIV e XV, época do Renascimento, a saúde associava‑se 
ao corpo gordo, pois nesse período a peste negra dizimou um terço da população medieval. Na poesia e 
literatura associava‑se a mulher amada com a comida, considerando‑as delicadas, suculentas etc.
Figura 3 – Beleza feminina
As sociedades e culturas da época eram marcadas pelo temor à fome decorrente de epidemias, guerras 
ou escassez, fatalidades contra as quais ainda hoje pede‑se a proteção divina (MONTANARI, 2008). 
Entretanto, em séculos passados, além do medo, existia a necessidade de se compartilhar para a sobrevivência 
diária – compartilhamento que hoje, na nossa sociedade da abundância, tende a ficar para segundo plano. 
Para sobreviver no Renascimento era preciso manter a barriga e a dispensa cheias, mesmo em momentos 
de abundância alimentar, em detrimento da qualidade e do gosto, que ficavam no segundo plano.
A históriaretrata reis, monarcas e aristocratas sempre como pessoas gordas, grandes comedoras, que 
de certa forma assim o eram por obrigação social, um comportamento de classe, necessário. Homens 
magros e com pouca capacidade de comer eram sinônimo de fraqueza e inferioridade, portanto não 
serviam para governar. O chefe tinha que ter a figura de um valoroso guerreiro capaz de comer muito, 
cuja força estava principalmente associada à ingestão da carne vermelha, por isso muitos escudos que 
eram os emblemas de distinção familiar tinham animais carnívoros como símbolo: leões, ursos, lobos, 
leopardos. Simbolicamente, ao nutrir o corpo, consolidar os músculos, o consumo da carne dava ao 
guerreiro a legitimidade do comando, juntamente com a força. Comer carne significava matar animais, 
ou seja, caçar, o que exigia habilidades inerentes à prática da guerra, como o manuseio com as armas, 
além de fornecer o alimento necessário para tal prática.
Na Modernidade, a ciência dietética reforça a importância da carne para o homem, sendo considerada 
o alimento perfeito para se crescer com vigor. Essa valorização é encontrada nos tratados médicos 
medievais e difere das civilizações grega e romana, ambas agrícolas, em que o pão era o centro da 
refeição, necessário aos soldados, e sinônimo de civilidade.
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Unidade I
Ao longo do século, a abundância alimentar deixa de ser o símbolo central de poder e de prestígio 
social, e a demonstração e conquista da força física no campo de batalha deixam de ser necessárias, 
pois o poder passa a ser adquirido por hereditariedade. Ocorre a passagem de uma nobreza de fato para 
uma nobreza de direito, ambas, porém, têm relação com modelos alimentares. Já não se trata de comer 
muito, e sim de ter muitos alimentos à mesa, imprimindo a ostentação na linguagem alimentar, como 
comportamento de classe, tendo como ideal estético o corpo robusto; ser gordo significa riqueza, beleza.
O excesso alimentar e o corpo gordo passaram a ser uma escolha, e não um dever do soberano. 
O importante era a quantidade e variedade de comida à disposição, para depois ser distribuída entre 
companheiros, hóspedes, servos e cães. A quantidade continuava a corresponder a uma distinção de 
classe, mas o exagero alimentar diminuiu. O comportamento trouxe consequências aos comilões, que 
começaram a ter doenças relacionadas ao exagero da carne, como a gota. Posteriormente, com o 
estabelecimento da relação entre gordura e doença, a imagem do corpo gordo torna‑se imagem de 
falta de saúde e descontrole alimentar.
A valorização da magreza, da ligeireza, da produtividade e da eficiência representou o novo modelo 
cultural e estético no decorrer do século XVIII, em decorrência dos novos burgueses intelectuais, com 
novas ideologias e hipóteses políticas, que se opunham à velha ordem.
Outro alimento que passou a ser distintivo de classe por estar vinculado à inteligência e à 
eficiência foi o café, consumido pela burguesia em ascensão, opondo‑se ao vinho e à cerveja 
da aristocracia ociosa. Juntamente com a nova simbologia do café, o corpo magro e esbelto 
significa sacrifício produtivo, que gera riquezas e bens. Assim, ao longo dos séculos XIX e XX, ser 
gordo não significava mais poder ou privilégio e novas classe sociais passaram a fazer parte da 
comilança. A indústria democratizou o consumo e a comilança, invertendo então a distinção das 
classes em relação à ostentação alimentar, e comer muito se redefine como uma prática popular. 
Novos comportamentos começaram a marcar o modo nobre de alimentar‑se, por exemplo, ter boas 
maneiras à mesa, como forma de educar e controlar o corpo da nobreza e classe média, para se 
distinguirem das demais classes sociais, adotando a prática de comer pouco e de comer vegetais, 
e tendo como modelo alimentar de estética e de magreza o corpo magro, que passa a significar 
saúde. Esse novo modelo, por um tempo em meados do século XX, acaba substituído pela retomada 
da apreciação do corpo gordo, por causa das guerras, que trouxeram muita fome, fazendo com 
que o medo do excesso substituísse o medo da fome, isso até as décadas de 1970‑1980, quando a 
ideologia do corpo magro se reafirma (MONTANARI, 2008).
Nas sociedades industriais pós‑modernas, surgem novas ambiguidades diferentes das históricas, 
marcadas pelo medo da fome e pelo desejo de comer muito, com atitudes e comportamentos 
condicionados a esses medos, bem como o desejo do excesso, que, por sua vez, traz novas situações: 
temos países ricos com crescimento de doenças por excesso alimentar, como fenômeno de massa, que 
substitui as doenças decorrentes das carências alimentares, como o raquitismo. Um medo novo se 
instala, o medo da obesidade, em substituição ao medo da fome, levando pessoas a acharem que estão 
obesas mesmo quando não o estão.
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ANTROPOLOGIA DA ALIMENTAÇÃO
2.2 O que se come
Também o modo de comer carrega em si uma distinção de classe capaz de revelar um comportamento 
social, portanto coletivo, e o que se come pode revelar essa distinção. A qualidade da comida também 
é um indicativo de pertencimento social determinante e revelador, pois revela a identidade social dos 
grupos e indivíduos.
 Lembrete
Como já vimos, na Idade Média a comida do camponês é diferente da 
de um soberano na medida em que o camponês se alimentava de frutos 
da terra, cereais, hortaliças, sopas e o soberano se alimentava de carne 
de caça, sobrando para o camponês a carne de porco. Com o passar do 
tempo, o nobre já não é mais um guerreiro forte e seu novo atributo é a 
cortesia e, com isso, a capacidade de se controlar diante da comida e de 
saber distinguir o bom do ruim passa a ser marca da nobreza, bem como 
recusar um alimento que não esteja à sua altura, distinguindo, pelo olhar, 
o que fosse mais conveniente.
Carregando uma identidade social mediada pela comida, religiosos também demarcaram diferenças por 
meio de suas regras, por exemplo, os monges e religiosos que tinham como a principal delas a restrição parcial 
ou total de algumas carnes, especialmente de quadrúpedes. Simbolicamente, negar a carne significava afastar 
de si a sedução do poder e curvar‑se à humildade dos alimentos pobres vindos da dieta do camponês, como 
hortaliças, legumes e cereais, demonstrando humildade espiritual, como uma escolha deliberada, e não por 
restrição ou por falta de condições econômicas para a obtenção de alimentos. Faziam associações de carnes 
com corpos, algo terreno, e quem quisesse se dedicar ao espírito deveria comer coisas leves. Por isso as aves 
eram liberadas, pois voavam aos céus com leveza e eram animais tidos como mais elevados. As aves podiam 
ser consideradas, portanto, comidas de monge. Para esses religiosos, o alimento que nutre a carne e fortalece 
o corpo não serve para a manutenção da espiritualidade. Com o passar do tempo, as aves, que simbolicamente 
voavam por serem mais elevadas e leves, passaram a ser mais frequentes nas mesas europeias, como o faisão 
ou a perdiz, e as carnes de grandes animais, cada vez mais raras, o que demostra uma nova mudança de 
pensar e de se comportar (MONTANARI, 2008).
Como as guerras diminuíram, a preocupação se volta para a necessidade de dedicação maior à 
administração e às políticas, portanto são imperativas nem tanto as atividades físicas, e sim as intelectuais. 
Nesse sentido, as aves são a comida ideal para quem se dedica às artes e ao intelecto.
O tipo e a qualidade dos alimentos, além das quantidades menores, continuam como fatores de 
distinção social. O café mantém a mente aberta para produzir, já o chocolate quente é ideal para um 
momento de relaxamento. Com o passar do tempo, o café e os chás se tornam populares. As batatas, 
antes restritas aos camponeses e animais, passam a fazer parte das grandes cozinhas europeias. 
De forma similar, a sociedade da fome e a sociedadeda abundância invertem valores e sinais de qualidade: 
alimentos antes tradicionalmente pobres, como painço, centeio, cevada e espelta, hoje são símbolos de 
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Unidade I
dietas saudáveis, e o trigo dos ricos passa a ser esnobado. Assim, a sociedade contemporânea recupera o 
passado, atribuindo‑lhe novos significados, e se constrói uma nova cultura alimentar. É possível verificar 
que os símbolos são construídos histórica e culturalmente e são mutáveis.
2.3 Comer junto – comensalidade
O ser humano desenvolveu o hábito cultural de comer junto. Outros animais também o fazem, mas 
nós partilhamos culturalmente. Comportamentos e gestos específicos comunicam, permitindo que as 
substâncias e as circunstâncias se liguem de forma que algumas substâncias sejam próprias para algumas 
circunstâncias, por exemplo, durante o expediente de trabalho, tomar café significa dar uma pausa, uma 
substância própria para essa circunstância. A circunstância pode conflitar com a substância, conforme pode 
ser observado usando, ainda, o exemplo do café, que é uma bebida excitante, mas pode ser considerada 
relaxante durante a pausa no ambiente de trabalho. A carga simbólica da comida é ainda mais forte 
quando percebida como instrumento de sobrevivência diária. A fome leva à busca imediata de algo para 
comer, podendo delimitar, nesses momentos, um rico universo simbólico, que configure a mesa como 
metáfora da vida, traduzido no comer junto. Na Era Medieval dividir a comida era quase o mesmo que 
dizer que se pertencia a uma família, e ainda hoje é possível identificar a comida com a casa, como sinal de 
pertencimento a um grupo, a uma família com quem nos identificamos (MONTANARI, 2008).
A divisão da mesa também tem lugares marcados simbólica e distintivamente. Nas grandes indústrias 
o refeitório para o trabalhador no chão de fábrica é composto de uma mesa igual para todos, entretanto 
os patrões e funcionários com cargos elevados comem em outro ambiente. Comer junto é um sinal 
de pertencimento a uma família ou a uma comunidade, como uma confraria, corporação, associação, 
reafirmando uma identidade coletiva. Comer sozinho é a atividade do eremita, que está negando a 
cozinha (come o cru), a comida e a cultura, fugindo do convívio (MONTANARI, 2008).
A mesa como metáfora da vida representa também o pertencimento e as relações que se estabelecem 
no grupo, cujos posicionamentos mostram as igualdades e as diferenças existentes; por exemplo, se está 
sentado ou se servindo, se está na cabeceira ou nas laterais, à direita ou à esquerda do anfitrião ou do 
chefe, tudo demarca a posição social dos participantes, assim os lugares à mesa marcam o prestígio de 
cada integrante, demonstrando que o lugar não é indicado por acaso e, de acordo com cada época, o 
contexto social e político marca a importância e o prestígio dos indivíduos. Antigamente, o chefe estava 
no centro, e a distância de cada um em relação a ele era diretamente proporcional à sua importância, 
esse ritual ainda existe em situações formais. Quando não se queria demarcar hierarquias, utilizava‑se 
a mesa redonda, que contribuía para a democratização do posicionamento das pessoas, mas esta já era 
uma mobília moderna, já que antes as mesas eram retangulares, feitas assim para demarcar diferenças e 
hierarquias. A mesa redonda do rei Artur foi algo excepcional para a época (MONTANARI, 2008).
Também os gestos podem marcar as distinções de relevância, pois excluem da comunicação 
aqueles que não conhecem as regras. Com regras viviam as comunidades monásticas e compreendiam 
o silêncio, a concentração, a sobriedade e a moderação. Os primeiros manuais de regras à mesa, 
datados dos séculos XII e XIII, distinguem quem participa e quem não participa de uma refeição, 
fazendo do comportamento alimentar também uma barreira social, com impossibilidade de infringi‑la 
(MONTANARI, 2008).
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Uma outra questão de comer junto é a questão da partilha da comida, pois as atribuições dos pedações 
não são casuais e também podem exprimir relações de poder e hierarquia no grupo. Via de regra, em 
diferentes épocas, o melhor pedaço sempre é ofertado ao hóspede, sendo o corte um momento de ritualismo 
convival com grandes implicações simbólicas, daí a importância técnica e política de quem faz a partilha. 
Por esses motivos é importante decodificar a gramática da comida. Hoje, ainda possuímos algumas regras 
já naturalizadas, mesmo nas refeições mais simples em ambiente doméstico, pois há alguém que prepara, 
que se serve, quem começa a se servir, é identificado qual alimento vem antes ou depois, qual o tamanho 
destinado a cada um etc. Como é possível verificar, há comportamento simbólico em tudo que fazemos ou 
deixamos de fazer (MONTANARI, 2008).
No próximo capítulo, temos como objetivo discorrer sobre diferentes formas de comprar, preparar e 
servir, bem como o simbolismo contido no ato de comer.
3 AS DIFERENTES PRÁTICAS ALIMENTARES E O ATO DE COMER
Neste capítulo procuramos contribuir para a compreensão do ritmo alimentar nas três principais 
refeições humanas.
3.1 As diferentes práticas alimentares
Historicamente, a partir do século XX, temos cerca de quatro momentos de refeição: café da 
manhã, almoço, lanche da tarde e jantar, que prevalecem ainda hoje, sendo o lanche um momento 
mais casual. Cada um desses momentos possui um código específico de técnicas culinárias, tipos 
de cozinha, apresentação e consumo, que formam o “sistema culinário brasileiro”, no qual se pode 
observar desde as formas de aquisição até o consumo de nossa cultura alimentar, incluindo nossas 
preferências e paladar, formas de escolha, técnicas e tecnologias culinárias e maneiras à mesa.
As refeições, cada vez mais raras, foram substituídas por práticas de alimentações rápidas e 
irregulares, marmita feita em casa ou pelos restaurantes e fast‑foods. As relações sociais ao redor da 
comida mudaram e, o mais importante, passaram a ser necessidades imediatas: comer para voltar ao 
trabalho, matar a fome, enganar a fome em vez de satisfazer o apetite e o paladar. A mídia dita o que 
comer nos intervalos roubados. Comidas já vêm enlatadas ou empacotadas, prontas para o consumo. 
No mundo moderno, o trabalho para ganhar dinheiro é mais importante que a comida para garantir 
forças para o trabalho, ou seja, mantém‑se vivo para trabalhar.
O padrão das refeições principais do dia e os horários estabelecidos são influenciados pelos ritmos 
corporais associados especialmente aos ritmos do trabalho, ou seja, ao ritmo social.
Para tanto, ilustra perfeitamente a temática, de modo geral, no Brasil, um estudo realizado na cidade 
de Salvador (BA), quando Santos (2008) procurou verificar como homens e mulheres vivenciavam 
suas práticas corporais e práticas alimentares e se dispunham a realizar mudanças nessas práticas. 
Constatou‑se que é a atividade física a primeira opção para tanto e que as necessidades de mudanças 
nos hábitos alimentares surgiam quando a nova prática corporal já estava em andamento. Podemos 
generalizar, ressalvando algumas particularidades regionais, seus achados para o Brasil, inclusos nos 
grupos delineados em sua pesquisa, que consideramos emblemáticos.
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O primeiro grupo foi chamado de “eu como de tudo”. Era composto de sujeitos que praticavam atividade 
física, mas que não estavam dispostos a mudar a alimentação, mesmo sabendo de sua importância. 
Eles entendiam que a atividade física era suficiente para a aquisição e manutenção da boa forma. 
Consideravam que estavam no peso ideal e que tinham muito prazer em comer, eram afeitos aos hábitos 
alimentares tradicionais, mas com perspectivas de mudanças de hábitos alimentares, identificando o princípio 
da qualidade emprol da quantidade, mas procurando não ter o contraponto do que gostavam de comer. 
Dessa forma, o prazer, as referências e gostos alimentares constituem a conduta dos sujeitos desse grupo, 
embora não descartem totalmente as orientações alimentares atuais, o que pode significar a possibilidade de 
mudança futura.
O segundo grupo foi chamado de “sempre cuidei de minha alimentação”, grupo este que havia 
tempo cuidava da alimentação, optando por uma alimentação natural, em consonância com uma 
alimentação saudável. Na alimentação natural incluíam alimentos orgânicos, não químicos, puros, reais 
e não preservativos. Tinham uma boa relação com a comida, que consideravam uma fonte de prazer, isto 
é, comiam coisas prazerosas e saudáveis, demonstrando ter cuidados sanitários com o alimento, fato 
que consideravam tão importante quanto a qualidade nutricional.
O terceiro grupo foi chamado de “não consigo me controlar”, composto de sujeitos que não conseguiam 
controlar suas práticas alimentares e que não estavam satisfeitos com seus corpos, vivenciando épocas 
de controle, com dietas radicais, podendo até utilizar inibidores de apetite, alternando com épocas de 
descontrole, que os levavam a comer tudo que viam pela frente. Nesse grupo existia, aliás, um caso de bulimia. 
O padrão alimentar era o tradicional e havia relatos de conflitos decorrentes dessa postura alimentar. Alguns 
entrevistados afirmaram terem dificuldade de se controlar nos fins de semana, levando‑os a desenvolver 
sentimento de culpa, a ser resolvido no decorrer da semana. Eles procuravam se esquecer da vontade de 
comer dormindo ou ficando muito tempo com o estômago vazio. De certa forma, eles tentavam um controle 
alimentar com o consumo de leite desnatado, adoçante, sucos naturais, refrigerante diet, arroz sem óleo, 
feijão com carne e sem toucinho, frango sem pele e evitando farinhas, macarrão e lasanha. Resumindo, o 
comer no seu cotidiano é repleto de conflito, oscilando entre o controle e o descontrole a todo instante.
Nesse grupo, o controle alimentar vem com dietas curtas e restritivas “dietas da moda”, condenadas 
pela ciência e pelos profissionais da saúde. Essas dietas são bastante variadas, readaptadas a todo momento. 
Seus componentes optam, no almoço, pelo frango grelhado, salada e arroz, de preferência arroz integral. 
Consomem iogurte light, pão integral e soja. Há uma predileção ainda maior pela ingestão somente de frango 
com salada, visando a perda de peso rápida. Eles sempre tencionam começar a dieta na segunda, em virtude 
dos exageros nos fins de semana, ou ainda quando se sentem com gorduras a mais. Para fazer tais dietas, 
torna‑se necessária a compra de gêneros alimentícios apropriados, tomada de decisões sobre o que comer, 
como deve ser composta a dieta, descobrimento de formas adequadas de preparação, desenvolvimento de 
estratégias e táticas capazes de contornar a monotonia alimentar e a fome. Esses descontroles podem levar 
a algumas patologias do comer verificadas em anorexias, bulimias, transtornos de compulsão alimentar 
episódica, síndrome do comer noturno, entre outros (SANTOS, 2008).
A bulimia é um problema recorrente no universo feminino de jovens entre 14 e 18 anos, e atualmente 
até em meninas com 12 anos de idade, sendo a maioria pertencente às classes alta e média, embora 
tal comportamento já possa ser identificado nas demais classes socais. Sua discussão, pela sociologia, 
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apresenta novas considerações acerca das tentativas de compreender esse fenômeno ao reconhecer o 
processo de ocidentalização e modernização, bem como o impacto das mudanças sociais na identidade 
feminina e na relação das mulheres com seus corpos (MORGAN; AZEVEDO, 1998).
A bulimia nervosa caracteriza‑se por compulsão alimentar seguida de comportamento purgativo. 
Diferencia‑se da anorexia nervosa, que é caracterizada pela perda de peso voluntária e pelo grande 
temor à obesidade. Para Bordo (1993), esses fenômenos estão atualmente ligados à construção da 
feminilidade; a autora considera, ainda, a anorexia uma caricatura do ideal contemporâneo de esbelteza 
exagerada pelas mulheres.
A anorexia constitui‑se num fenômeno do século XX, socioculturalmente situado, assim como a 
histeria o foi no século XIX. Essas patologias são similares e incidem majoritariamente nas mulheres, 
nas classes mais elevadas e nas sociedades mais avançadas industrialmente falando. Bordo (1993) 
considera que essas patologias surgiram da condição feminina do século XIX, por necessitarem manter 
as concepções domésticas de feminilidade, localizando a mulher numa determinada divisão do trabalho 
e como chefe emocional responsável pela nutrição da família, e não de si mesma. Por outro lado, sua 
entrada no mundo profissional dos homens faz com que as mulheres necessitem incorporar linguagem 
e valores masculinos, como autocontrole, determinação, disciplina emocional e domínio. Dessa forma, 
a magreza passa a ser vista como triunfo da determinação do corpo, numa associação do corpo magro 
com a pureza absoluta, hiperintelectualidade e transcendência da matéria.
Nesse grupo, Santos (2008) encontrou relatos que indicavam sentimentos de transgressão, impotência 
e angústia, o que assinala que os transtornos alimentares representam desordens no metabolismo e nas 
relações sociais. Essas desordens repercutem no próprio corpo, e a comida acaba sendo um grande canal 
de expressão.
O quarto grupo foi chamado de “encontrei a verdade dentro de mim”, composto de sujeitos que 
estão mudando ou já mudaram suas práticas alimentares, visando uma reeducação alimentar. Noção que 
ganha aliados a partir do fim de século XX e início do século XXI e que se contrapõe às dietas rígidas. 
Tal noção atualmente representa a possibilidade de construção da disciplina alimentar, visando perder 
peso progressivamente e não sendo, assim, uma postura imediatista. Eles tinham múltiplas estratégias 
para alcançar o corpo, a saúde ideal e o emagrecimento de forma saudável e definitiva, por meio de 
novos hábitos alimentares, compostos de dietas balanceadas, equilibradas e naturais, comendo de tudo 
sem grandes privações e sacrifícios, mantendo, assim, o prazer de comer, sem deixar de lado a vida social. 
Desejos, ansiedades e compulsões para comer eram educados. Ao obter êxito, o sujeito melhora sua 
autoestima, mantendo‑se em harmonia com o próprio corpo.
Segundo Santos (2008), a reeducação alimentar indica que é preciso aprender a se alimentar. 
A autora introduz o conceito de “emagrecimento sustentável”, que se contrapõe ao efeito 
experimentado pelos que vivenciam dietas rígidas ciclicamente. Essa aprendizagem diz respeito ao 
próprio indivíduo em suas escolhas do que, quanto, como e quando comer, assim como a aprender 
a ter autocontrole. A reeducação alimentar propõe também a flexibilidade em contraponto à rigidez 
de algumas dietas alimentares.
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Ainda, neste capítulo, discutiremos sobre as práticas alimentares tradicionais e sobre as práticas 
alimentares modernas, bem como sobre as mudanças das práticas alimentares atualmente relacionadas 
a aspectos como: noção de refletividade alimentar, cacofonia alimentar, processo de aprendizagem; 
controle da fome e dos desejos; reconstrução do gosto e as novas sensibilidades alimentares. E também 
a discussão sobre as mudanças no plano coletivo relativos a classes sociais, etnia e gênero.
Sobre o quarto grupo, em relação às práticas alimentares tradicionais, Santos (2008) verificou nas 
entrevistas de sua pesquisa informações que lhe possibilitaram verificar as práticas alimentares existentes 
antes do processo de mudança, cujas estruturas foram marcadas pelas seguintes características:
• O modelo de três refeições diárias se manteve (café da manhã, almoço e jantar), embora houvesse 
quem saltasse asrefeições ou que comesse fora dessa estrutura, caracterizando uma alimentação 
de certa forma desordenada.
• A composição das refeições presentes na alimentação foi considerada pesada e a culpa recaiu 
principalmente na farinha e no feijão.
• Os lanches, geralmente consumidos na rua e sem horário fixado, compostos de frituras de 
coxinhas, quibes, pastéis, salgadinhos, sanduíches, batata frita, cachorro‑quente, entre outros, 
acompanhados de refrigerantes, também foram considerados pesados.
• A alimentação em fins de semana regadas com bebidas alcoólicas, como churrasco, feijoada, 
rabada, sarapatel, dobradinha, acarajés, moquecas, cozido, e comidas de praia, como peixe e 
frutos do mar fritos, acarajés, arrumadinhos, entre outras, refeições essas que estão presentes nos 
almoços familiares, foram consideradas pesadas.
No geral, o padrão alimentar tradicional foi relatado pela maioria e se referia às três refeições diárias, 
que incluíam o café da manhã traduzido no café com leite, pão com manteiga e um pouco de inhame, 
aipim, banana‑da‑terra cozida, cuja tradição diz respeito a práticas afro‑indígenas, principalmente nas 
classes populares. No almoço, estavam presentes arroz, feijão, farinha de mandioca, carne bovina, ou 
frango, ou peixe, este em menor proporção. O jantar poderia ser similar ao almoço, embora mais leve, 
por se retirar o feijão ou a farinha, ou ainda poderia ser a repetição do café da manhã com leite e 
pão, uma raiz ou ainda o cuscuz. Ultimamente, a lasanha pode se impor às feijoadas no domingo, e o 
consumo de macarrão passa a compor o prato junto com o arroz e feijão, nas classes mais populares. 
Frutas e saladas não têm grandes aceitabilidades.
Santos (2008) identificou nas entrevistas uma alimentação desordenada, em consonância com a 
desestruturação das práticas alimentares e com o ato de comer sem pensar.
 Observação
Nos Estados Unidos, a desestruturação alimentar, segundo Fischler (2001), 
caminharia para algo mais flexível em relação aos horários, simplificação 
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das refeições, individualização do comer, mudanças essas associadas 
principalmente ao trabalho feminino, à urbanização e à industrialização 
da cadeia alimentar, reduzindo o peso das tarefas domésticas, entre 
outros fatores. A tese de Fischler foi criticada por não apresentar dados 
comprobatórios e por não considerar as diversidades sociais.
Para Santos (2008), o padrão de três refeições diárias corresponde a uma visão etnocêntrica e 
historiocêntrica. Ele teve início na França no século XIX e foi imposto para todas as classes sociais no 
século XX, período de configuração do trabalho industrial assalariado.
Em contraposição ao alimento saudável, comer fora de hora recebeu várias denominações pelos 
entrevistados, tais como: comer besteiras, comer muita “porcalhada”, entendidas como formas de se 
alimentar que precisam ser alteradas por causa da preocupação com a saúde futura. Já o comer sem 
pensar demonstrou a falta de atenção ao que se come.
Em relação às práticas alimentares modernas referidas pelos entrevistados, Santos (2008) destacou 
dois pontos centrais, compreendidos como a ordem das refeições ao longo do dia e a recomposição 
das refeições incluindo e excluindo, reduzindo ou aumentando o consumo de determinados alimentos, 
como segue:
• Inclusão de duas refeições entre as refeições principais, no intento de comer mais vezes e em 
menor quantidade, com lanches mais leves.
• Reeducação da quantidade nas principais refeições e melhoria da qualidade, com alimentos 
menos calóricos e com menos lipídios, ampliando o consumo de frutas e verduras. Incluindo 
frutas e cereais no café da manhã, saladas no almoço e reduzindo alimentos mais calóricos com 
novas combinações, por exemplo, não comendo macarrão com arroz, entre outras recombinações 
menos calóricas.
• Supressão do jantar, ou sua substituição por frutas, sopas, café com leite, sanduíche ou por 
alguma raiz.
• Substituição de outros itens como adoçante no lugar de açúcar, margarina no lugar de manteiga, 
peixes e frangos, em vez de carne vermelha, alimentos integrais em detrimento dos processados, 
sucos em vez de refrigerantes, obedecendo a uma hierarquia do que é mais ou menos saudável.
• Ampliação do consumo de frutas como a maçã e o abacaxi, combinação de peixe com verduras, 
e inclusão de grelhados, saladas, iogurte, queijo branco, pão integral, leite de soja, cereais e 
barras de cereais.
• Consumo de guaraná em pó, suplementos nutricionais, açaí, sanduíche natural, produtos 
desnatados e os light e diet entre os praticantes de atividade física. Reinclusão de raízes, como 
inhame, banana‑da‑terra, batata‑doce, fruta‑pão, granola, aveia e mel, água de coco, que estão 
passando por reinterpretações.
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Unidade I
• Mudanças na forma de preparo das refeições, como frango sem pele, substituição de frituras por 
assados e grelhados, alimentos cozidos sem gordura, como o arroz sem gordura e exclusão ou 
diminuição de alguns itens, como a feijoada. A salada‑grelhado‑fruta passa a se contrapor ao 
doce‑fritura‑refrigerante/frituras‑gordura‑sal.
• Liberação sutil do consumo nos fins de semana.
• Corte no consumo de bebidas alcoólicas e liberação do consumo sem limites de água.
Houve uma reformulação na distribuição das refeições ao longo do dia, pregando a necessidade 
de comer mais vezes e em menor quantidade, o que pressupõe a disponibilidade, a qualquer 
momento, de algum alimento saudável. Toda essa prática pode ter orientação científica, mas Santos 
(2008) entende que pode ser uma prática adaptada à necessidade de comer fora de hora e a todo 
momento, flexibilizando as condutas alimentares. Além dessa distribuição das refeições durante o dia, 
ela destaca o equilíbrio alimentar, a relação quantidade e qualidade, a moderação e os cortes, como 
novos elementos nas práticas alimentares atuais. A autora entende que o equilíbrio nas dietas reflete, 
também, a necessidade do reequilíbrio das relações entre o homem e o seu meio natural. Em relação à 
qualidade, esta passa a ser importante para a saúde e resulta da forma como pensamos o ato de comer 
atualmente, na qual o termo qualidade vincula‑se ao conceito de saudável, assim como à moderação e 
ao corte‑restrição, contrapondo‑se à noção de exagero alimentar, levando à ideia de flexibilidade, que 
vai contra a polarização entre o que é proibido e o que é permitido.
No grupo quatro há a satisfação com as mudanças alimentares e existem algumas incertezas sobre 
o retorno às práticas anteriores, permanecendo o desafio de ter essas práticas de forma definitiva e sem 
grandes conflitos, num jogo que contém negociações de restrições, inclusões, exclusões, (re)inclusões, 
permitindo múltiplas variações que contemplam pequenas restrições e mudanças radicais nos hábitos 
alimentares. Também há uma busca por novos prazeres em vez de abdicá‑los. Dessa forma é preciso 
construir um novo gosto e nova sensibilidade alimentar.
3.2 Alguns aspectos sobre o processo de mudanças das práticas alimentares
As falas registradas durante a pesquisa desenvolvida por Santos (2008) levaram ao entendimento de 
que era consolidada uma nova ordem alimentar, baseada na noção de redução alimentar.
Para Santos (2008), sempre foi projeto da ciência a construção de uma dieta universal capaz de 
prevenir as doenças e prolongar a vida; dessa forma, é possível constatar a existência da dieta ideal e 
da dieta possível, além da existência do descompasso entre aqueles que preferem ter uma alimentação 
ideal, mesmo não sendo o que acontece por vários motivos, o que os obriga a se equilibrar entre o prazer 
e a tolerância, muitas vezes buscando um novo gosto, o gosto light, e recusando o gosto tradicional.
Para a adaptação a esse novo gosto é preciso dar início a uma aprendizagem de alta complexidade, 
que

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