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FUNDAMENTOS DA LÍNGUA PORTUGUESA Debbie Mello Noble Aspectos estéticos, gramaticais, estilísticos e estruturais na produção de textos Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Conceituar os tipos de estilística (fônica, morfológica, sintática e se- mântica) e seu uso na produção textual. � Selecionar os recursos estilísticos coerentes com o objetivo do texto (informar, persuadir, emocionar e etc.) e as funções da linguagem. � Aplicar os conceitos de concordância e regência (verbais e nominais) na produção de textos. Introdução Você já parou para pensar que existem muitos aspectos envolvidos na produção de textos escritos? Produzir um texto não é apenas redigir, mas sim planejar, refletir sobre o seu conteúdo e, além disso, contar com alguns recursos estilísticos. Neste capítulo, você vai aprender a conceituar os tipos de estilística e a entender como são utilizados em um texto. Além disso, você vai aprender a selecionar os recursos estilísticos coerentes com o objetivo do texto que se quer produzir, bem como aplicar os conceitos de concordância e regência nos seus textos. Tipos de estilística e seu uso na produção textual A estilística é o estudo da expressividade de uma língua e a possibilidade de utilizar determinados recursos para conferir estilo a um texto. Mas o que é estilo no que diz respeito à língua? Muitos são os estudos sobre essa questão, e neste capítulo você conhecerá algumas visões sobre esta. Estilo, no ponto de vista de Martins (1989), pode ser considerado tanto como uma escolha entre alternativas de expressão individual quanto estar ligado a uma época/gênero literário. Assim, é possível agrupar um conjunto de textos literários pelo estilo da época, auxiliando no agrupamento por escolas literárias, por exemplo. Para Guiraud (1970, p. 9), “Estilo é uma maneira de escrever e, por outro lado, é a maneira de escrever própria de um escritor, de um gênero, de uma época [...]”. A estilística, por sua vez, seria a ciência da expressão, ao mesmo tempo em que opera uma crítica aos estilos individuais. O autor explica que expressar o pensamento é utilizar o léxico e as estruturas gramaticais de cada língua. Da mesma forma, o estilo pode estar ligado à estética na literatura, tratando-se então de uma linguagem diferente da popular, cotidiana. A obra Quarto de despejo: diário de uma favelada de Carolina Maria de Jesus é um exemplo em que o estilo da autora foi respeitado pelos editores. O livro foi originado dos diários da autora, uma catadora de papel, moradora de uma favela em São Paulo. A linguagem é simples, comovente e envolve o leitor na difícil realidade vivida por Carolina e seus filhos. Os editores optaram por manter a escrita original de Carolina, por esse motivo muitos “erros ortográficos” podem ser encontrados no livro, porém são considerados marcas de estilo e autenticidade da obra. O caso da obra Quarto de Despejo: diário de uma favelada é um típico exemplo do que se convencionou chamar licença poética. No Brasil, um dos mais relevantes estudos sobre o tema é o de Mattoso Câmara (1978), o qual se baseia nas funções da linguagem para desenvolver a estilística. A estilística foi dividida em três diferentes tipos por Matoso Câmara, sendo elas a estilística fônica, a sintática e a léxico-semântica. Aspectos estéticos, gramaticais, estilísticos e estruturais na produção de textos2 Estilística fônica A estilística fônica, também denominada fonoestilística, é o tipo de estilística responsável pelo estudo da expressividade dos sons na língua. Em outras palavras, isso significa que é possível valer-se de figuras de linguagem que provocam um efeito sonoro no texto escrito. Uma das marcas mais comuns da estilística fônica está presente na alitera- ção e na assonância, que são figuras de linguagem frequentemente utilizadas em poemas. Para Mattoso Câmara (1978) esses casos de estilística fônica são encontrados pelo acúmulo de palavras com um determinado som expressivo, atingindo “efeitos imitativos”. Como exemplo, o autor apresenta um poema de Cruz e Souza, poeta simbolista: Vozes veladas, veludosas vozes, Volúpias dos violões, vozes veladas, Vagam nos velhos vórtices velozes Dos ventos, vivas, vãs, vulcanizadas. O acúmulo de palavras com o mesmo som fica por conta da repetição do V, que confere musicalidade ao poema, cujo título é Violões que choram. No entanto, Mattoso Câmara (1978) faz uma crítica contundente ao uso repetitivo do V como único recurso estilístico nesta estrofe, uma vez que essa insistência poderia levar ao desaparecimento do som de violão pretendido pelo poeta. A partir dessa análise realizada por Mattoso Câmara (1978), podemos entender que a estilística fônica não pode ficar apenas no uso de fonemas para contar com a sonoridade desejada pelo escritor. É preciso aliar os sons à imagem que se quer dar ao poema. Veja um exemplo do funcionamento do som em um poema de Manuel Bandeira: Trem de ferro Café com pão Café com pão Café com pão Virge Maria que foi isto maquinista? 3Aspectos estéticos, gramaticais, estilísticos e estruturais na produção de textos Agora sim Café com pão Agora sim Voa, fumaça Corre, cerca Aí seu foguista Bota fogo Na fornalha Que eu preciso Muita força Muita força Muita força Oô... Foge, bicho Foge, povo Passa ponte Passa poste Passa pasto Passa boi Passa boiada Passa galho De ingazeira Debruçada No riacho Que vontade de cantar! Oô... Quando me prendero no canaviá Cada pé de cana Era um oficiá Oô Menina bonita Do vestido verde Me dá tua boca Pra matá minha sede Aspectos estéticos, gramaticais, estilísticos e estruturais na produção de textos4 Ôo... Vou mimbora vou mimbora Não gosto daqui Nasci no sertão Sou de Ouricuri Oô... Vou depressa Vou correndo Vou na toda Que só levo Pouca gente Pouca gente Pouca gente. Fonte: Bandeira (1976). Para Mattoso Câmara (1978), a motivação sonora, por vezes, justifica toda a rima. Em alguns casos, a motivação sonora dá sentido ao poema inteiro. No caso deste poema de Manuel Bandeira, a repetição do verso “Café com pão” sugere o som de um trem em movimento, assim como a repetição do verso “muita força/muita força” mais adiante. O poeta foca nos sons que quer con- ceder ao seu poema, para criar a atmosfera desejada para o leitor ou ouvinte. Estilística léxico-semântica A estilística léxico-semântica pensa nas variadas maneiras de significação das palavras. Isso porque uma palavra não tem apenas um significado fixo colado a ela em uma língua. Assim, alguns fenômenos relacionados a isso fazem parte da estilística léxico-semântica, como a sinonímia, a polissemia e variadas figuras de linguagem. Nesse sentido, Mattoso Câmara (1978) aponta a tonalidade afetiva como um desses fenômenos estilísticos, já que não se pode dizer que há uma única forma de compreensão de uma língua. Se a língua varia, há margem para uma “certa liberdade” no seu entendimento. Dessa forma, assim como há alguns significados relativamente gerais para as palavras, há também uma tonalidade afetiva que funciona coletivamente em relação às palavras. 5Aspectos estéticos, gramaticais, estilísticos e estruturais na produção de textos Como exemplo, o autor apresenta algumas palavras que geram sensações agradáveis ou desagradáveis, como céu e mar – no primeiro caso – e abismo e medo – no segundo (MATTOSO CÂMARA, 1978). Essas sensações são, para o autor, de certa forma convencionais. Por esse motivo, podem ser empre- gadas em determinados textos com a garantia de entendimento, podendo ser exploradas estilisticamente por quem os escreve. Ao mesmo tempo, podem ser utilizadas para gerar um efeito no leitor, como é o caso de adjetivos carregados de significado afetivo, como em A menina triste me comoveu (MARTINS, 1989), ou outras palavras que já estão carregadas de julgamento pessoal, como, por exemplo, feio/belo; delicado/grosseiro; inteligente/estúpido. A gíria também ofereceinúmeras possibilidades expressivas com intensos traços afetivos, segundo Martins (1989). A gíria está ligada à linguagem oral e popular; porém, é muito utilizada na literatura justamente por possibilitar o aspecto afetivo. Em alguns casos da literatura, a gíria aparece como uma maneira de ca- racterizar personagens de classes menos favorecidas, por exemplo nas obras que retratam a favela. Em outros casos, a gíria retrata o modo de falar dos personagens adolescentes. Dentre os recursos léxicos de estilística, as figuras de linguagem são as mais comumente utilizadas. Nesse sentido, a linguagem figurada é a ressigni- ficação de uma palavra ou expressão, ou seja, a utilização de maneira diferente de seu significado literal. Em geral, nas letras de música é possível perceber claramente diversos tipos de figura de linguagem. Veja esta letra de música do Luan Santana: 1 “Um beijo fala mais que mil palavras 2 Um toque é bem mais que poesia 3 No seu olhar enxergo a sua alma 4 Sua fala é uma linda melodia” Fonte: Santana (2010?). No verso 1 temos um exemplo de personificação, pois o “beijo” é perso- nificado ao se dizer que ele fala mais que mil palavras. No verso 3 vemos uma metáfora, pois enxergar a alma é utilizado em um sentido figurado, ou seja, não literal, pois não é possível enxergar a alma de alguém. Outro importante recurso estilístico de léxico é a sinonímia. Apesar de podermos considerar que não há palavras que sejam sinônimos perfeitos de Aspectos estéticos, gramaticais, estilísticos e estruturais na produção de textos6 outras, a substituição de uma palavra por outra é muito comum na escrita. Isso porque é possível evitar repetições das mesmas palavras, bem como poder escolher aquela que melhor se ajusta ao texto e àquilo que o autor busca transmitir. Martins (1989) apresenta alguns casos em que se utiliza frequentemente um termo no lugar de outro: � quando tem a necessidade de um termo mais profissional que outro: barriga/abdômen; operação/cirurgia; beberrão/alcoólatra; � quando um termo é menos vulgar/coloquial que outro: grana/dinheiro; bate-boca/discussão; pão-duro/avarento; gringo/estrangeiro; � quando um termo é mais literário que outro: corcel/cavalo; pomo/fruto; pusilânime/covarde. Estilística sintática A estilística sintática, também chamada estilística da frase, é aquela que estuda os fenômenos estilísticos relativos à ordem da frase, tal como ruptura da ordem sintática. Para compreender os recursos que podem ser utilizados estilisticamente no âmbito da frase, é preciso compreender um pouco melhor a sintaxe. A sintaxe é o modo como se relacionam, se combinam os elementos em uma frase, em uma determinada ordem. Segundo Martins (1989), o falante ou aquele que escreve um texto tem a possibilidade de escolher entre os tipos de frase possíveis, desde que obedeça a um determinado número de regras. A criatividade de uma frase, assim, está relacionada às possiblidades de escolha tanto dessa ordem dos elementos, quanto do léxico utilizado em uma frase. Dessa maneira, diz-se que o falante tem capacidade de produzir um número infinito de frases. Nesse sentido, a estilística ligada à sintaxe observa os tipos de frase que se pode formar com a utilização de determinados recursos. A frase sempre exprime um sentido, pois as palavras e expressões sozinhas não o possuem, são dependentes do contexto frasal e textual. Martins (1989, p. 136) apresenta exemplos simples do funcionamento da estilística sintática. A autora traz um pequeno trecho do conto Entre a neve, de Eça de Queiroz, para demonstrar como se dão as possiblidades estilísticas em uma frase simples: 7Aspectos estéticos, gramaticais, estilísticos e estruturais na produção de textos Highlight A neve caía, levemente. A neve caía triste. A neve caía, contínua, silenciosa. No conto, afirma Martins (1989), o autor descreve em múltiplas construções o cair da neve, na qual morre um pobre lenhador. Ela observa que a existência ou não de pausa na frase acarreta diferenças nas construções, podendo se desdobrar em outras duas construções: A neve caía levemente. / A neve caía, levemente. A neve caía leve. / A neve caía, leve. Por essa análise, podemos verificar que em uma frase simples há muitas possibilidades de construções diferentes. Por outro lado, ainda há as constru- ções de frases complexas, que envolvem orações coordenadas e subordinadas. Nesse caso, o leque de possibilidades é ainda maior. Nesse sentido, Mattoso Câmara (1978) ressalta a necessidade de, além de possuir o conhecimento das normas de construção de uma frase, saber desmontar essa lógica, dando elasticidade às construções sintáticas, visto que só assim se atinge a uma expressão ampla de formulação verbal. O discurso indireto livre é aquele em que a voz do narrador se mistura com outras vozes através das quais ele conta a história. Para entender a diferença do discurso indireto livre para o indireto, observe este exemplo de discurso indireto: Minha mãe perguntou-lhe que maluquice era aquela de parecer que ia ficar desgraçado. Disse-lhe que deveria ser homem, pai de família [...]. (D.I) Observe como o romance foi escrito por Machado de Assis com o discurso indireto livre: Minha mãe foi achá-lo à beira do poço e intimou-lhe que vivesse. Que maluquice era aquela de parecer que ía ficar desgraçado [...]? Não, senhor, devia ser homem, pai de família, imitar a mulher e a filha. (D.I.L.) Para Mattoso Câmara (1978), a construção sintática escolhida por Machado de Assis demonstra como se misturam o elemento individual e o coletivo em um texto. É possível perceber uma nítida alteração na construção da frase que utiliza o discurso indireto para aquele que utiliza o indireto livre. No indireto livre, o nar- rador toma a voz do personagem ao invés de simplesmente contar o que este disse. Aspectos estéticos, gramaticais, estilísticos e estruturais na produção de textos8 Recursos estilísticos e as funções da linguagem A teoria de Roman Jakobson, nos anos de 1960, trouxe à tona o funcionamento da linguagem como uma ferramenta de comunicação. Apesar de muitos es- tudos já combaterem essa corrente de pensamento, ainda hoje é importante entendermos as funções da linguagem, que auxiliam no entendimento do perfil de cada mensagem transmitida de um destinador a um destinatário. A partir da função da linguagem identificada, seria possível, segundo Chalhub (1990), ampliar as possibilidades de interpretação. A autora coloca ainda que em uma mesma mensagem várias funções podem coexistir, porém, há a ênfase em uma delas, que acaba predominando. Antes de ver os tipos de funções da linguagem, é preciso compreender o esquema comunicacional proposto por Jakobson conforme ilustrado na Figura 1. Figura 1. Esquema comunicacional de Jakobson. Fonte: Baseado no Modelo Comunicacional de Jakobson (1991). meio meioMensagem Referente Emissor Receptor Código A partir do esquema básico comunicacional, Jakobson propõe as funções da linguagem, que, conforme a Figura 2, se entrelaçam aos elementos do esquema comunicacional. 9Aspectos estéticos, gramaticais, estilísticos e estruturais na produção de textos Figura 2. As funções da linguagem a partir do esquema comunicacional de Jakobson. Fonte: Baseado no Modelo Comunicacional de Jakobson (1991). Código Destinador Destinatário Referente (função conativa)(função expressiva) (função metalinguística) (função referencial) (função poética) (função fática) Mensagem Contato Veja, a seguir, o detalhamento de algumas dessas funções e de que forma elas se relacionam com os recursos estilísticos. Função referencial A função referencial está ligada ao referente, ou seja, àquilo do que se fala. O objetivo do uso da função referencial é informar. Ela é comumente encontrada nos gêneros jornalísticos, no discurso científico e médico. Assim, quando se escreve um texto para informar, escolhe-se preferencial- mente a 3ª pessoa, buscando uma linguagem mais impessoal,mais objetiva. Estilisticamente, o autor do texto normalmente utiliza-se de recursos le- xicais, na escolha de palavras que contribuam para sua objetividade, bem como preocupa-se com a estruturação direta das frases (recursos sintáticos). Função emotiva A função emotiva está diretamente ligada à figura do emissor. Ela aparece em mensagens emotivas que visam transparecer a emoção sentida por seu emissor. A linguagem é marcada pela 1ª pessoa e a estilística lexical é fundamental na escolha dos recursos que auxiliarão na intenção colocada pelo emissor. Aspectos estéticos, gramaticais, estilísticos e estruturais na produção de textos10 Ao contrário da função referencial, a função emotiva busca a subjetividade, que deve ficar marcada na linguagem. Função apelativa (ou conativa) A função apelativa está ligada ao receptor, ou seja, busca não mais informar ou expressar emoções, como as anteriores, mas sim convencer, dirigir-se a alguém. Os exemplos mais puros de função apelativa em uma mensagem são os textos publicitários, uma vez que estes têm por objetivo fundamental convencer alguém de algo. Na linguagem, temos o uso de frases predominantemente do tipo impe- rativa (faça isso, compre aquilo), que visa levar o leitor a acatar a mensagem da propaganda, por exemplo. Função poética A função poética está ligada à mensagem transmitida, o que a domina é, substancialmente, a palavra. Nessa função, fica mais evidente o uso dos re- cursos estilísticos lexicais, como as metáforas, pois a função poética aparece predominantemente em poemas e letras de música. Ao mesmo tempo, o poeta preocupa-se também com os recursos estilísticos fônicos (que aparecem nas assonâncias e aliterações, por exemplo) e os sintáticos, pois é preciso selecionar e combinar as palavras na construção de seus versos. Muitas vezes, a função poética e a função emotiva se confundem em poe- mas, uma vez que elas estão relacionadas à subjetividade. Da mesma forma, nenhuma das outras funções aparece sozinha, elas sempre coexistem com a predominância de uma delas. Aspectos gramaticais de concordância e regência na produção textual Você já deve ter notado que a língua não pode ser equiparada a um conjunto de regras fixas. Ela não é, portanto, um sistema. A língua é interação, é a ex- pressão da concepção de mundo de uma sociedade. Diante disso, percebemos que o próprio falante e outros fatores podem modificar a língua. 11Aspectos estéticos, gramaticais, estilísticos e estruturais na produção de textos É especialmente na fala que se observam essas variações, mas alguns registros escritos também marcam as inúmeras possibilidades, como visto anteriormente, ao estudar sobre a estilística. No entanto, na produção de um texto, alguns aspectos normativos devem ser observados para garantir a adequação e a padronização da língua. Nesse sentido, os principais aspectos gramaticais que demarcam a escrita culta é a regência e a concordância. Concordância verbal A concordância está ligada à relação entre mais de um termo na frase, podendo eles serem verbos e sujeito (concordância verbal) ou entre nomes (adjetivos, substantivos, pronomes – concordância nominal). Para realizar uma boa produção textual, é preciso aplicar algumas regras essenciais de concordância. Sabemos que há algumas regras simples que dificilmente são esquecidas, pois acabam sendo muito internalizadas pelo uso do cotidiano. Por exemplo: você pode até não se lembrar da regra de que o adjetivo deve concordar em gênero e número com um substantivo, porém, não irá errar a prática escrita da concordância: A casa bonita/ as casas bonitas. No entanto, outras regras são frequentemente esquecidas. A concordância verbal é a relação entre o sujeito e o verbo principal de uma oração. Veja agora algumas regras essenciais para nunca mais ter dúvidas na produção textual: 1. Verbo ser: a) Quando o verbo ser vem acompanhado de um adjetivo sem artigo, esse adjetivo fica sempre no masculino. Tranquilidade é necessário. b) Quando o verbo ser vem acompanhado de um substantivo com artigo ou outra palavra que o modifique, o adjetivo concorda com o artigo. A tranquilidade é necessária. 2. Verbo de ligação + pronomes indefinido e demonstrativo como sujeito: o verbo concorda com o predicativo do sujeito quando o sujeito da oração for um pronome indefinido (tudo, todo, nada) ou um pronome demonstrativo neutro (isto, isso e aquilo). Nem tudo são flores./ Nada são obstáculos para um grande atleta. Aspectos estéticos, gramaticais, estilísticos e estruturais na produção de textos12 3. Verbo e pronome quem: quando o sujeito é o pronome relativo quem, o verbo pode tanto concordar com a palavra que antecede o pronome quanto ficar na 3ª pessoa do singular. Fui eu quem abri a porta. / Fui eu quem abriu a porta. Concordância nominal Denomina-se concordância nominal a relação que se estabelece entre substan- tivos e adjetivos, artigos, pronomes e numerais, sendo obrigatória a concor- dância nesses casos. A concordância nominal diz respeito à flexão em gênero (masculino ou feminino) e em número (singular ou plural). Veja alguns exemplos para não esquecer mais: 1. Um ou mais substantivos: a) Quando há mais de um substantivo, o adjetivo deve concordar com aquele que está mais próximo: Que bonita calça e sapato! Que bonito sapato e calça. b) Quando há mais de um substantivo e o adjetivo está depois dos subs- tantivos, deve concordar com aquele que está mais próximo ou com todos eles. Que calça e sapato bonito! Que sapato e calça bonita! Que calça e sapato bonitos! 2. Substantivo e mais de um adjetivo: quando um substantivo vem acompanhado por mais de um adjetivo, a concordância varia: a) pode-se colocar o substantivo e o artigo que o antecede no plural: Eu adoro as comidas japonesa e havaiana. b) pode-se colocar um artigo antes do último adjetivo: Eu adoro a comida japonesa e a havaiana. 13Aspectos estéticos, gramaticais, estilísticos e estruturais na produção de textos Quando você estiver produzindo seu texto e tiver dúvi- das de concordância, acesse o link a seguir para utilizar a minigramática produzida pela USP. https://goo.gl/zmjwgV Regência verbal A regência está ligada com a relação entre as palavras de um enunciado. Serve para construir o sentido dos enunciados em um texto, selecionar e combinar as palavras, o que depende de um certo número de regras que, conforme você viu com a concordância, são utilizadas pelo falante muitas vezes sem perceber. No entanto, para garantir a excelência da produção textual, é importante conhecer algumas dessas regras, pois a fala acaba aceitando uma variação da norma que não se adequa à escrita culta. Assim, na combinação de palavras para a formação de um enunciado há vocábulos que exercem maior determinação sobre outros, como se fossem comandantes. Daí o nome regência: que é como se algumas palavras regessem as outras. A regência verbal é a relação que se estabelece entre o verbo e os demais termos de uma oração. Nesse caso, o verbo é o regente. Para percebermos a regência é preciso saber se o verbo é transitivo direto (sem preposição) ou indireto (com preposição), pois assim saberemos se há a necessidade ou não de preposição. Aspectos estéticos, gramaticais, estilísticos e estruturais na produção de textos14 Não há como aprender todas as regras de regência, pois são inúmeros os casos e, ainda, cada verbo e cada nome possui uma regência própria. Por isso, caso você possua dúvidas de regência, é interessante sempre consultar um dicionário e pesquisar pelo verbete em que há dúvidas. Por exemplo, se você tem dúvidas sobre a regência de um verbo, pesquise no dicionário se o sentido que está querendo utilizar consta como transitivo direto ou indireto. Um bom dicionário online é o dicionário Caldas Aulete, que tem como endereço eletrônico www.aulete.com.br. O professor Celso Pedro Luft realizou um minucioso trabalho de pesquisa e reuniu vários dos principais verbose nomes nos dicionários: Dicionário prático de regência verbal e Dicionário prático de regência nominal, publicados pela editora Ática. Veja no Quadro 1 alguns dos verbos que mais geram dúvidas na hora da escrita. Verbo Exemplos ASSISTIR � Estar presente, vendo ou ouvindo algo. Transitivo indireto. Exemplo: Fui assistir ao espetáculo. � Presenciar um fato como observador. Transitivo indireto. Exemplo: Os brasileiros assistiam à crise. � Prestar ajuda a; dar assistência; socorrer. Transitivo direto. Exemplo: Organizaram-se para assistir os desabrigados. ESQUECER/ LEMBRAR O verbo esquecer, e seu antônimo lembrar, possuem diferentes transitividades: � Perder da memória, da lembrança (alguém ou algo); não (se) lembrar. Transitivo direto. Ex.: Nunca esqueci o meu primeiro amor. � Intransitivo. Exemplo: Viajou para esquecer. � Transitivo indireto. Exemplo: Não me esqueço da minha primeira boneca. � Distrair-se de; ignorar temporariamente, não atentar para. Transitivo direto. Exemplo: O presidente esqueceu o protocolo e aproximou-se da multidão. Quadro 1. Verbos e seus exemplos de variações na regência verbal. (Continua) 15Aspectos estéticos, gramaticais, estilísticos e estruturais na produção de textos Fonte: Adaptado de Caldas Aulete (2018). Quadro 1. Verbos e seus exemplos de variações na regência verbal. Verbo Exemplos INFORMAR � Deixar alguém ciente de (fatos, notícias, acontecimentos); comunicar. Transitivo direto e indireto. Exemplo: O pai informou a família de suas novas decisões. � Tomar ciência de; inteirar (-se) de algo. Transitivo indireto. Exemplo: Informei-me sobre a história. � Dar conhecimento de algo. Transitivo direto. Exemplo: O papel da imprensa é informar o leitor. PREFERIR Escolher uma opção entre outras possíveis. Transitivo direto e indireto (prefiro isso a isso). Exemplo: Prefiro acordar cedo a pegar um ônibus lotado de manhã. VISAR O verbo visar aceita as duas regências: � Ter algo como finalidade. Transitivo direto. Exemplo: A reunião visa escutar os condôminos. � Ter algo como finalidade. Transitivo indireto. Exemplo: Ela sempre visava a entender os outros. (Continuação) Regência nominal Na regência nominal, os nomes (substantivos, adjetivos) regem os demais termos da oração. Ela é um mecanismo para marcar a relação entre as pa- lavras do enunciado. A regência nominal funciona de forma muito parecida com a regência verbal. Isso porque ambas marcam a presença ou não de uma preposição em um enunciado. Na regência nominal, muitas vezes o uso da preposição ocorre de forma errônea. Veja a seguir alguns casos de regência nominal que geram frequentes dúvidas e entenda qual a preposição correta deve acompanhar cada um dos nomes: 1. Ter certeza de — quem tem certeza, tem certeza de algo. 2. Horror a — Tenho horror a baratas./ Medo de — Tenho medo de baratas. 3. Atenção a/ com/ para com — neste caso, qualquer uma das preposições sugeridas pode ser utilizada. — Tenha muita atenção ao volante/ Tenha muita atenção para com as crianças. Aspectos estéticos, gramaticais, estilísticos e estruturais na produção de textos16 1. Sobre os tipos de estilística, é possível afirmar que: a) A estilística sintática é aquela em que se pode escolher qualquer tipo de frase para utilizar em um texto. b) O tipo de estilística responsável pelo estudo da expressividade dos sons na língua é a estilística lexical. c) Ao usar a estilística fônica em um poema, o poeta pode fixar-se somente nos sons. d) A estilística sintática pensa nas variadas maneiras de significação das palavras. e) A tonalidade afetiva é um dos fenômenos pertencentes à estilística léxico-semântica. 2. Analise o poema abaixo, que possui muitos exemplos de recursos estilísticos, e assinale a alternativa correta: Trem de Ferro Café com pão Café com pão Café com pão Virge Maria que foi isto maquinista? Agora sim Café com pão Agora sim Voa, fumaça Corre, cerca Aí seu foguista Bota fogo Na fornalha Que eu preciso Muita força Muita força Muita força Oô... Foge, bicho Foge, povo Passa ponte Passa poste Passa pasto Passa boi Passa boiada [...] Oô Menina bonita Do vestido verde Me dá tua boca Pra matá minha sede Ôo... Vou mimbora vou mimbora Não gosto daqui Nasci no sertão Sou de Ouricuri. [...] a) Um bom exemplo de recurso estilístico lexical é a repetição de sons em uma frase. b) “Vou mimbora vou mimbora” é um exemplo de estilística sintática, pois há a escolha de um léxico próprio do sertão. c) Nos versos abaixo, encontra-se um exemplo de recurso estilístico semântico: Menina bonita Do vestido verde Me dá tua boca Pra matá minha sede. d) Em “Me dá tua boca / Pra matá minha sede” “me dá” é um exemplo de recurso estilístico fônico. e) Um bom exemplo de recurso lexical são os versos abaixo: Passa ponte Passa poste 17Aspectos estéticos, gramaticais, estilísticos e estruturais na produção de textos Passa pasto Passa boi Passa boiada. 3. Assinale a alternativa correta em relação às funções da linguagem: a) A função poética está ligada àquilo do que se fala. b) A função poética e a emotiva são consideradas a mesma função, pois ambas estão ligadas à mensagem transmitida. c) A função conativa é aquela que visa informar alguém sobre algo. d) A função apelativa está ligada ao receptor, ou seja, dirige-se a alguém. e) A função referencial usa frases predominantemente imperativas. 4. Assinale a alternativa que possui a correta correspondência entre os elementos comunicacionais de Jakobson e as funções da linguagem: a) Mensagem — Função referencial. b) Receptor — Função apelativa. c) Emissor — Função conativa. d) Mensagem — Função emotiva. e) Receptor — Função poética. 5. Assinale a única alternativa correta em relação à regência dos verbos: a) Assisti um espetáculo muito bom. b) O povo assistiu calado o voto dos deputados. c) A imprensa deve informar ao leitor. d) Assistiram os menos favorecidos. e) Não lembro do dia da consulta. BANDEIRA, M. Antologia poética. 8. ed. Rio de Janeiro: J. Olympo, 1976. Disponível em: <http://www.mac.usp.br/mac/templates/projetos/jogo/tremdeferro.asp>. Acesso em: 10 mar. 2018. CALDAS AULETE. Dicionário on-line. [S.l.]: Lexikon Editora Digital, 2018. Disponível em: <http://www.aulete.com.br/index.php>. Acesso em: 10 mar. 2018. CHALHUB, S. Funções da linguagem. São Paulo: Ática, 1990. GUIRAUD, P. A estilística. São Paulo: Mestre Jou, 1970. JAKOBSON, R. Linguística e comunicação. São Paulo: Cultrix, 1991. MARTINS, N. S. Introdução à estilística. São Paulo: EDUSP, 1989. MATTOSO CÂMARA, J. Contribuição à estilística portuguesa. Rio de Janeiro: Ao Livro Técnico, 1978. SANTANA, L. Um beijo. [2010?]. Disponível em: <https://www.letras.mus.br/luan- -santana/1780219/>. Acesso em: 10 mar. 2018. Aspectos estéticos, gramaticais, estilísticos e estruturais na produção de textos18 Leituras recomendadas EMPRESA BRASILEIRA DE PESQUISA AGROPECUÁRIA. Manual de editoração. Brasília: EMBRAPA, 2018. Disponível em: <https://www.embrapa.br/manual-de-editoracao/ gramatica-e-ortografia/normas-gramaticais/concordancia-nominal>. Acesso em: 10 mar. 2018. UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO. Mini gramática. São Paulo: USP, 2018. Disponível em: <http://www.nilc.icmc.usp.br/nilc/minigramatica/mini/sejabemvindo.htm>. Acesso em: 10 mar. 2018. 19Aspectos estéticos, gramaticais, estilísticos e estruturais na produção de textos Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual da Instituição, você encontra a obra na íntegra.
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