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Resenha do filme Apocalypse now: um olhar sobre a Guerra do Vietnã A Guerra do Vietnã teve início quando o Vietnã do Norte, comunista, invadiu o Vietnã do Sul na tentativa de unificar os dois países, tal como previa um referendo aprovado após a queda do imperador sul-vietnamita Bao Daí. Mas os Estados Unidos estavam sob controle do Vietnã do Sul e interpretaram a invasão como uma tentativa de expansão comunista por parte da União Soviética. Assim, em 1961 os Estados Unidos começam a fazer do conflito uma guerra por procuração e, posteriormente, em 1964, começam a intervir maciçamente e diretamente. O filme Apocalypse now se passa em meio à Guerra do Vietnã e retrata a história de um grupo de militares americanos para os quais foi designada uma missão na Indochina. A missão do grupo de militares é a de encontrar e matar o Coronel Kurtz, um renomado militar que, supostamente, teria enlouquecido em meio aos conflitos dos quais participava. O filme retrata, tanto em sua trama principal quanto em cenas complementares, os efeitos físicos e psicológicos causados pela Guerra do Vietnã. No início do filme é contada a história do Coronel Kurtz sob o ponto de vista do comandante estadunidense: Kurtz estava em ordens de ser preso por assassinato após ter ordenado a morte de agentes vietnamitas que ele acreditava serem agentes duplos; Após isso, Kurtz teria entrado para as forças especiais americanas e partiu para o Camboja , onde1 encontrou um grupo de nativos que veneram o homem como um Deus; Assim, o Coronel passa a comandar um exército formado pois tais nativos, que seguiam todas as suas ordens e parte para missões sem nenhum comedimento. A Guerra ocorre simultaneamente ao período da Guerra Fria que ficou conhecido como Detenté, no qual houve uma certa aproximação entre as duas grandes potências. Apesar de, nesse período, as zonas de influência já estivessem delimitadas, o suposto expansionismo norte-vietnamita foi considerado uma ameaça para a influência americana no continente asiático. Os Estados Unidos agiram sob a perspectiva da Teoria do dominó, a qual previa que se um país asiático se tornasse comunista, no caso o Vietnã, expandiria tal sistema para todo o continente, mas não consideraram os reais interesses dos vietnamitas acerca do conflito. Tal como disserta Maurice Vaisse em As Relações Internacionais depois de 1945, o principal interesse dos países do terceiro mundo que acabavam de passar por um processo de descolonização era o não-alinhamento, a fim de estarem finalmente livres do colonialismo de qualquer potência. Os interesses vietnamitas não poderiam ser diferentes, visto que acabavam de se tornar independentes do imperialismo francês e, posteriormente, se viram subordinados ao imperialismo estadunidense. Assim como confessa Robert McNamara em The fog of war, os líderes2 estadunidenses não tinham total certeza de que o Vietnã estava em vias de se tornar 2 Secretário de defesa dos Estados Unidos durante os governos de John Kennedy e Lyndon Johnson. 1 País que, segundo Maurice Vaisse em As Relações Internacionais depois de 1945, procurava se manter relativamente neutro em relação ao conflito que ocorria em seus países vizinhos e, apesar disso, teve um golpe de estado apoiado pelos Estados Unidos e foi invadido pelos mesmos durante o governo de Richard Nixon frente à luta que se iniciara entre comunistas, liderados por Norodom Sihanuk, e capitalistas, liderados por Lon Nol (aliado americano). comunista, mas os atacaram e escalaram altamente o conflito e enviaram milhares de soldados do mesmo modo por conta da doutrina da contenção. Essa incerteza estadunidense causou a morte de milhares de americanos e vietnamitas, tal como é ilustrado em diversas cenas de batalha em Apocalypse now. O filme se passa seis anos antes do final da Guerra do Vietnã, momento no qual já eram evidentes quem seriam os vencedores do conflito: os comunistas; mas isso não impediu a intervenção estadunidense. O filme retrata tanto a normalidade quanto a violência dos soldados americanos. Em diversos diálogos, os personagens falam sobre como era sua vida anteriormente à Guerra e sobre como esperariam que ela fosse quando voltassem aos Estados Unidos. Ao mesmo tempo, falam sobre como o Vietnã os mudou e como a violência das batalhas passou a ser algo comum, como quando o comandante retrata seu dilema acerca da missão que os foi designada de matar o Coronel Kurtz, pois diz que essa tarefa era algo comum em meio à guerra mas era diferente quando se tratava de um oficial americano. A obsessão do capitão com o surf, mesmo em locais que estavam sendo bombardeados, e sua admiração pelas bombas napalm também retratam essa dualidade psicológica causada pela guerra. Os Estados Unidos sempre foram marcados por um forte nacionalismo, o que impulsionava os cidadãos a se sentirem obrigados a lutarem na Guerra do Vietnã contra a suposta ameaça comunista, esse nacionalismo pode ser percebido em diversos diálogos de Apocalypse now. Apesar disso, a maioria dos estadunidenses era contra a guerra e, tal como Robert McNamara retrata em The fog of war, começaram a organizar manifestações a favor da saída do Estados Unidos da Guerra, principalmente após o assassinato de John Kennedy em 1963. Maurice Vaisse também disserta acerca de tais manifestações e relata acerca da “vietnamização do conflito”, ou seja, a retirada de parte das tropas americanas da Indochina, que se sucede a partir de 1969 , primeiro ano do governo Richard Nixon.3 Michael Lathan, em The Cambridge History of the Cold War, analisa que essa insatisfação americana foi altamente contribuinte para os acontecimentos que levaram à Detenté, na qual foram assinados tratados de limitações nucleares entre as duas potências. Segundo o autor, Richard Nixon e seu chefe de estado Henry Kissinger percebiam a Detenté como uma forma de fazerem com que a União Soviética aceitasse o status quo do terceiro mundo, ao passo que Khrushchov via a evidente superioridade comunista na Guerra do Vietnã como uma afirmação da supremacia de tal regime. Segundo Michael Lathan, o Vietnã se tornou um exemplo de guerrilha para o terceiro mundo pois, tal como disserta Maurice Vaisse “apesar de sua enorme superioridade material, o exército americano atola-se em uma guerra feita simultaneamente de guerrilha e de batalhas de grande amplitude” (VAISSE, 2010, p. 133) e a perde. Michael Lathan também cita um discurso de Che Guevara, no qual o político relata a lição que o Vietnã ensinou para o mundo: a de que os países imperialistas sempre farão uso da ameaça de guerra para dissuadir quem estiver em seu caminho e a solução para o terceiro mundo é não temer a guerra e confrontá-los, assim como os vietnamitas o fizeram e como pode ser percebido em diversas cenas de Apocalypse now. 3 Ano em que o filme Apocalypse now desdobra-se. Por fim, a Guerra do Vietnã ensinou aos estadunidenses acerca dos problemas de intervir militarmente em um país sem analisar todas as possibilidades, independentemente dos poderes político e militar do mesmo, tal como sempre fizeram em diversos outros conflitos, como na Guerra da Coréia. O filme Apocalypse now, lançado apenas quatro anos após o término da pior guerra que os Estados Unidos já participaram, mantém vivos tais horrores da guerra para os cidadãos americanos. Referências: Lathan, Michael. The cold war in the third world, 1963-1975. In: LEFFER e WESTAD. History of Cold War, Vol, 1. Cambridge Press, 2010. Vaisse, Maurice. As Relações Internacionais depois de 1945, Martins Fontes, 2013. O Terceiro Mundo na Era da Distensão. APOCALYPSE now. Direção de Francis Ford Coppola. Cannes: Omni Zoetrope, 1979. (153 min). THE fog of war. Direção de Errol Morris. Estados Unidos: Sony Pictures, 2003. (95 min). TERRA. Vietnã: a guerra que os EUA não esquecem. 30 abr. 2015. Disponível em: https://www.google.com.br/amp/s/www.terra.com.br/amp/noticias/vietna-a-guerra-que-os-eua -nao-esquecem,61ce2068f880d410VgnCLD200000b2bf46d0RCRD.html. Acesso em: 08 out. 2019. SANGUINO, Juan. 40anos de “Apocalypse Now”: assim foi o set mais selvagem da história. El País Brasil. 16 set. 2019. Disponível em: https://www.google.com.br/amp/s/brasil.elpais.com/brasil/2019/09/12/cultura/1568284135_3 70751.amp.html. Acesso em: 08 out. 2019.
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