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DELEGAÇÃO DE NIASSA Av. Samora Machel, Tel.: 27128928, Fax: 27121520, Caixa Postal n. o 4; - Lichinga DEPARTAMENTO DE CIÊNCIAS NATURAIS E MATEMÁTICA CURSO DE LICENCIATURA EM ENSINO De BIOLOGIA E AGRO-PECUARIA MEIC- Métodos de Estudo e Investigação Cientifica Docente: Msc. Ezequiel Alfino O DESAFIO DO ENSINO SUPERIOR De: Davi Roballo Na atualidade em que vivemos, os processos a que somos submetidos exigem um constante aperfeiçoamento, caso contrário, se não acompanharmos e nos adaptarmos a uma nova demanda de conhecimentos, corremos o risco de acordar no dia seguinte em desvantagem diante dos que buscam constantemente aperfeiçoar-se. Todo esse processo e exigências oriundas dos dados gerados pelas avaliações dos sistemas do Ministério da Educação e Cultura, da própria sociedade que no advento do século 21 está imersa nas novas tecnológicas e novos processos culturais, apontam para uma nova postura na formação académica e a docência do Ensino Superior tem a grave responsabilidade de adaptar-se a essa nova realidade. Para Lima (2009, p. 25), a Universidade contemporânea adquiriu mais uma responsabilidade na formação, não mais somente do profissional, mas do homem, do cidadão, ou seja, a função social. A Universidade contemporânea tem um novo papel, inserida nessa nova sociedade do conhecimento, que é a sua função social. A graduação deixa de se limitar a perspectiva de uma profissionalização especializada, para oferecer aos alunos um conhecimento mais abrangente e humanista, que contemple o domínio das conquistas tecnológicas, mas também, as questões da ética que dizem respeito às reações intersociais, à inclusão dos marginalizados a uma vida digna, o combate às diversidades regionais. Segundo Castanho (2000, citado por Orrú: 01), a Universidade, desde seu surgimento até os dias de hoje, assumiu diferentes modelos, dentre os quais destacam-se, no período moderno, o napoleônico, cuja base é o ensino profissional; o idealista alemão, fundado na pesquisa; o elitista inglês, voltado para a formação de elites e o utilitarista norte-americano que tem como objetivo preparar para a ação. (... a educação, em todos os níveis, precisa de uma nova postura. O ensino tradicional paulatinamente vem dando lugar a práticas alternativas que devem levar ao desenvolvimento global dos educandos e acender o entusiasmo para lutar por uma sociedade diferente, reestruturada” (CASTANHO, 2000, p. 76) Fica claro que a Universidade necessita constantemente adequar-se aos processos de desenvolvimento que giram ao seu redor, principalmente o económico e o social. Como vimos, elas foram no passado destinadas a formar uma elite aristocrática, ligadas ao utilitarismos, ao idealismo e posteriormente complementadas por uma elite de mérito, e actualmente buscam acompanhar o processo social e tecnológico da contemporaneidade. No entanto, o avanço exponencial em tecnologias, novas médias e ferramentas de trabalho não estão sendo acompanhadas por sistemas educacionais que realmente preparem os educandos para o mercado de trabalho com mão-de-obra qualificada ao mesmo tempo em que obtenham uma formação ético- social, evitando assim, a consequente exclusão social, ambos reflexos de um despreparo diante de novas oportunidades e desafios do mundo moderno. Não há como negar que o sistema universitário desde há muito vem sofrendo mudanças e adequações diante os novos acontecimentos, novas descobertas e novas tecnologias. Esse processo é contínuo e exige dos protagonistas, no caso os docentes, a formação continua e actualizada. Deve-se buscar novas formas de inteiração, deixando de lado as velhas formas engessadas e maçantes de ensinar e aprender, mas tornar a sala de aula um local de interacção e acima de tudo de integração, onde os atores sociais confundam-se no protagonismo, na interpretação e construção do saber, como deixa claro Lima ao discorrer sobre a segunda dimensão de sustentação do projeto pedagógico: O trabalho de professores e alunos é um espaço prático de produção, de transformação e de mobilização de saberes e, portanto, de teorias, de conhecimentos e de saber-fazer específicos da actividade docente. Urge pensar uma nova forma de ensinar, aprender e pesquisar, que inclua a ousadia de buscar o salto qualitativo do conhecimento científico ao senso comum visando à sua reconfiguração. É importante salientar que a aula não é apenas uma expressão do pensar a ação e do agir. A construção do novo senso comum que surge da própria ação e que transforma essa aula em um ato de solidariedade, de participação e de prazer. (2009, p. 25) Segundo Nietzsche, um exercício crítico “nunca foi ensinado nas universidades: mas sempre a crítica de palavras com palavras” (1974, p. 89). O professor, universitário tem papel importante a desempenhar, não prendendo-se somente nas questões burocráticas e formais. Mas criando mecanismos que desperte nos educandos o espírito crítico, para que raciocinem com lógica e sem influência, isto é, a formação de cidadãos autónomos moral e intelectualmente, permitindo que o aluno se posicione, indague e participe do processo de aprendizagem. O professor, mediador indispensável no processo ensino-aprendizagem, precisa estar consciente de seu papel na formação de seu aluno. Tal consciência não é suficiente se somente se prender aos aspectos formais desse processo. É preciso atentar para detalhes que podem de fato fazer a diferença para a elevação do espírito crítico, pois a prática do educador observada por seu aluno é o espelho para sua formação. (ORRU, p. 03) O docente nesse caso tem a responsabilidade de ser um inovador, um agente capaz de transformar velhos conteúdos e velhas fórmulas em temáticas interessantes e atualizadas. No entanto, isso exige dele a criatividade e a motivação para transformar velhos conceitos em novos desafios, O momento atual revela evidências da necessidade de transformações ocorrerem nos âmbitos sociais, políticos e educacionais. É o homem desejando mais do que aquilo que é considerado como básico e suficiente para se viver ... (Idem, Ibidem). Segundo Castanho “É preciso que não ensinamos apenas as pegadas de caminhos conhecidos, mas que tenhamos a coragem de saltar sobre o desconhecido, de buscar a construção de novos caminhos, criando novas pegadas” (2000, p. 77). Portanto, o docente do Ensino Superior deve buscar ser marcante na vida dos discentes. Tem de ser aquele que encontra sempre uma forma de despertar o interesse pelo conhecimento e a vontade de ir mais além, ir em busca de encontra-se consigo mesmo e com seus potenciais intrínsecos e vivenciá-los. Segundo Castanho (2000), não se pode desenvolver um bom trabalho em sala de aula sem ter em mente um ideal ou modelo de sociedade, um direcção a ser alcançada. A autora refere-se a se ter uma meta a ser alcançada, uma utopia na visão Alves (2006), algo inalcançável, no entanto aponta e orienta a que direção seguir e /ou atingir: Para onde?” Somente um navegador louco ou perdido navegaria sem ter idéia do “para onde”. Em relação à vida da sociedade, ela contém a busca de uma utopia. Utopia, na linguagem comum, é usada como “sonho impossível de ser realizado”. Mas não é isso. Utopia é um ponto inatingível que indica uma direção. Mário Quintana explicou a utopia com um verso de sabor pitanga: “Se as coisas são inatingíveis.., ora! / Não é motivo para não querê-las... / Que tristes os caminhos, se não fora / A mágica presença das estrelas!. (2006, p. 75-76). Isso denota, de acordo com Castanho (2000), que o professor não deve ensinar apenas o que é conhecido, mas despertar a curiosidade e a vontade de desvendar o desconhecido, criando assim novos conhecimentos para servirem de embasamento para construção de outros a serem construídos e descobertos. Ainda de acordo com a autora, há poucacriatividade nos bancos universitários, no entanto a criatividade não parece ser tão fácil, quanto se pensa, pois ...podemos afirmar que nossas faculdades são, no geral, pouco ou nada criativas. Desenvolver a criatividade parece ser um objetivo tão simples – consta até mesmo da maior parte dos planos e planejamentos – e é uma das características mais raras de se encontrar na maioria de nossos jovens, educados para a atitude conformista e homogênea que os sistemas escolares os condenam. (CASTANHO, 2000, p. 77) Conseqüentemente, o trabalho a ser realizado pelo professor universitário sofre também alterações. Torna-se necessário ao professor pensar numa nova forma de ensinar e aprender que inclua a ousadia de ... inovar as práticas de sala de aula, de trilhar caminhos inseguros, expondo-se e correndo riscos, não se apegando ao poder docente, com medo de dividi-lo com os alunos e também de desvencilhar-se da racionalidade única”, pondo em ação outras habilidades que não apenas as cognitivas. Torna-se necessário, ainda, que os professores passem a pensar-se como “participantes do desvelamento do mundo e da construção de regras para viver com mais sabedoria e mais prazer. (CASTANHO, 2000, p. 87). O professor universitário deve de ter em mente uma constante busca pelo aperfeiçoamento, deve almejar conteúdos interessantes e atualizados. No entanto para isso se torna imprescindível, criatividade e motivação para romper barreiras entre o velho e o novo. Para Castanho, a questão da criatividade exige “sensibilidade diante do mundo, fluência e mobilidade do pensamento, originalidade pessoal, atitude para transformar as coisas, espírito de análise e síntese e capacidade de organização coerente são as qualidades da pessoa criadora” (2000, p. 85). Segundo Lima, a procura nos dias atuais pelos bancos acadêmicos dá-se pela necessidade e exigência do mercado de trabalho de mão de obra qualificada e conquista de espaço na sociedade. Sabemos que hoje as pessoas procuram na Universidade o conhecimento, ou seja, a base para uma educação. Mas, por que o procuram? Para seu crescimento pessoal, sua felicidade e deleite interior? Acredita-se que é por isso também, mas principalmente para a conquista de um espaço neste mundo, na sociedade no mercado de trabalho. (2009, p. 26). Daí a importância do projeto pedagógico direcionado a não só formar o profissional, mas o homem enquanto cidadão e agente social crítico e atento aos acontecimentos do mundo a sua volta. O sujeito capaz de produzir um repertório de leitura e interpretação de mundo. Para isso, o projeto pedagógico deve optar por ações perenes. Ações que realmente possam colaborar na transformação da sociedade, principalmente em relação aos direitos civis, políticos e sociais dos indivíduos e suas comunidades. Para atingir esta meta deve ser muito bem elaborado e estar em consonância com a realidade e o contexto onde será desenvolvido, e o mais importante, tem de ser vivenciado, não pode ser algo apenas exibido. Não vamos perder nosso tempo na elaboração de um "guia turístico", mas de um mapa de orientação. De nada adianta construir um belíssimo plano apenas com a finalidade de apresentá-lo quando for solicitado, para atender às exigências de organismos ' burocráticos, ou um bonito folheto para atrair consumidores de "nosso produto". O projeto não é algo que é feito e em seguida "mostrado". Ele é vivenciado desde o primeiro momento como parte da dinâmica da prática dos educadores. Nele, sem dúvida, entra a provisoriedade, porque não temos apenas certezas, e porque devemos contar com eventuais interferências de alguns elementos do próprio contexto. Mas nele entra também a esperança, que conta mesmo com a incerteza (quando tenho certeza "absoluta", não preciso ter esperança), mas que a ela alia a ação, o empenho para a construção do trabalho. Por esta razão, quando nos estamos referindo à esperança, não pensamos numa atitude de espera, de imobilismo como vemos em algumas situações. Não se trata de esperar por uma Escola melhor, mas de, utilizando os recursos de que dispomos e que vamos construindo, planejar e encaminhar desde já o esforço na busca de uma direção competente de nossas escolas. (RIOS, 1992, p. 75) Isso implica ações educativas estendendo-se à formação cidadã. Ações que devem estar em conformidade com a atividade-fim das universidades, formando profissionais-cidadãos, sem descuidar das questões científicas e tecnológicas e que sejam coerentes com o contexto social. Nossos alunos precisarão aprender à iniciação a pesquisa e aos trabalhos científicos, a fazer investigação de caráter básico, a socializar esses conhecimentos, a desenvolver competências e atitudes que lhes permitam analisar e discutir criticamente a ciência e suas soluções para os problemas da humanidade como hoje se apresentam, e a tomar decisões com responsabilidade de profissionais competentes cidadãos. (MASETTO, 2002, citado por LIMA, 2009, p. 29). Segundo Lima, a qualidade dos cursos de graduação estará ligada a capacidade dos professores e alunos em assumir o desenvolvimento de aprendizagem exigido profissionalmente na atualidade. Para isso, a sala de aula deve transformar-se num canteiro de duvidas, perquirições, discussões, cultura e investigações A sala de aula universitária para realizar suas tarefas básicas de pesquisa, de ensino e de extensão, precisa da leitura e da escrita como instrumentos fundamentais de atuação. Lugar de tempo e espaço de aprendizagem dos sujeitos do processo de aprendizagem: professor e alunos - juntos, realizam uma série de interações: Discutir e debater; Consultar e pesquisar; Solucionar dúvidas; Orientar trabalhos de investigação e pesquisa; Oficinas e trabalhos de campo; Projetos; Elaboração científica dos resultados dos projetos; Interferência no meio social, provocando mudanças (2009, p. 29). Percebemos que na Universidade, quando se trata de ciência, o ensino deve perpassar pelo debate científico, pela realidade brasileira e diferenças regionais, compreendendo assim as realidades sociais. Nisso, podemos observar o quanto o currículo e o projeto pedagógico dos cursos devem estar relacionados ao perfil do aluno que a Universidade pretende formar. Conclusão Percebemos também que o maior desafio do docente no Ensino Superior é despertar no aluno o interesse e participação efetiva nas discussões. Percebe-se ainda, que a dificuldade estende-se principalmente pela seara metodológica, principalmente a falta de dinâmica em como repassar conhecimentos. Diante disso, a docência do Ensino Superior no contexto geral necessita de novas posturas e comprometimentos na formação educacional do aluno. 2. A ILUSÃO DO ENSINO SUPERIOR Foi-se o tempo em que as universidades formavam o homem. Na virada do século XIX para o século XX, a nascente perspectiva futurista influenciada pela revolução industrial lançou os ocidentais a uma busca de estabilização profissional, isto é, começava a se ter nos bancos escolares uma maior preocupação em formar o profissional, o especialista em detrimento da formação moral, cívica e verdadeiramente intelectual do homem. O mais importante então, passou a ser o preenchimento das lacunas especializadas exigidas pela cadeia produtiva, isto é, o homem foi transformado em máquina. A universidade há muito deixou de ser estritamente palco de discussões sérias a respeito do viver, da existência, da localização do próprio ser na vida. Hoje, mais imbeciliza e cria ilusão de superioridade intelectual do que prepara o homem para a sua própria existência. Preparar para o mercado de trabalho é prioridade, nem que para isso aja um déficit intelectual, pois o mais importante agora é quantidade e não mais a qualidade, ou seja, a cadeia produtiva dominou também a educação. A universidade está montandoe condicionando homens máquinas que estão deixando de viver o presente por estarem de olhos fixados e perdidos no futuro, que por si só é incerto, inalcançável, pois, sempre vai exigir mais. Jovens quando resolvem entrar na universidade iludem-se com a perspectiva de tornarem-se facilmente intelectuais. No entanto, para isso, é preciso basear-se em teorias e hipóteses e ultrapassá-las, reescrevendo-as, afinal, segundo a concepção nietzschiana “não existe verdade absoluta”, mas recortes de realidade e fragmentos de verdade, que, com o tempo e as descobertas podem se agrupar como as peças de um grande quebra cabeça. Ideias que nascem condenadas a serem superadas mais adiante. A universidade limita as possibilidades de o aluno superar-se, pois, o ensino superior está engessado de uma forma tão sistemática, que é normal os académicos discutirem as teorias e hipóteses, muitas vezes, confundindo os sentidos propostos. Somente as discutem. Não tentam ultrapassá-las e modificá-las, pois para isso é preciso ter um método dizem os mestres, “tens que provar que se trata de ciência, deves especificar qual teórico e qual método vais usar...” para não dizer: “qual teórico e qual método vais usar para bloquear-te a vertente de teus pensares”. A universidade raramente forma “criadores”, pois é mais comum construir “copiadores”. Além do mais, se tem ainda, a deficiência advinda dos ensinos fundamental e médio, como a dificuldade em abstrair e principalmente a de interpretar um texto, isto é, mesmo na universidade existe o analfabeto funcional. A defasagem intelectual acarreta a ilusão de que um diploma resolve tudo, que é a panaceia para todos os problemas. Formandos em sua grande maioria passam a conhecer o mínimo do mínimo de uma determinada área e se convencem de ter chegado ao ápice do conhecimento, isto é, adquirem um grão de areia e ostentam seus títulos de bacharéis, licenciados, tecnólogos etc., na ilusão e prepotência de se ter o deserto do Saara no bolso. Quando na verdade, se precisaria de uma eternidade para encher o cavado da mão com grãos de areia como é uma formação académica em relação à sabedoria. Poucos são os que ultrapassam das barreiras construídas para reter os processos de criação e dessalinação e mais poucos ainda, são os que rompem com os diques de inchação intelectual. São aqueles alunos que se dedicam a ir além do proposto, os que têm sede de conhecimento, como também os professores que se esforçam paulatinamente para serem marcantes na vida de seus alunos como os professores: Keating (Sociedade dos Poetas Mortos), William Hundert (Clube do Imperador). A universidade não deve formar apenas o profissional, mas também criar mecanismos que desperte nos alunos o espírito crítico, para que raciocinem com lógica e sem influência, isto é, a formação de cidadãos autônomos moral e intelectualmente. Assim, creio, estaríamos a caminho da formação do homem, tanto como profissional quanto como cidadão. Referencias Bibliográficas ALVES, Rubem. Entre a ciência e a sapiência: o dilema da educação. São Paulo; Loyola, 2006. CASTANHO, Maria Eugênia. A criatividade na sala de aula universitária. In: VEIGA, Ilma Passos, CASTANHO, Maria Eugênia. (org.) Pedagogia Universitária: a aula em foco. Campinas, SP: Papirus, 2000. LIMA. Terezinha Bazé de. Metodologia do Ensino Superior: Teoria e Prática do Fazer Docente.Projeto Pedagógico de curso e suas articulações com a sala de aula universitária. Nota de Aula 03. Unigran, 2009. NIETZSCHE, F. Obras Incompletas.Tradução: Rubens RodriguesTorres Filho. Coleção Os Pensadores, 1ª ed. São Paulo:Abril Cultural. 1974 NIETZSCHE, Friedrich. Schopenhauer como educador In: Coleção Os Pensadores. São Paulo: Abril Cultural, 1983. 2º PARTE DESAFIOS E PERSPECTIVAS De um lado, buscando criticar o modelo vigente e superar seus problemas, alguns tendem a transformar a Universidade numa instituição que só privilegiaria a pesquisa, que priorizaria excessivamente a pesquisa, desprestigiando seu papel educativo frente à juventude considerando menor a tarefa do ensino de graduação, passando a investir pesado no ensino de pós-graduação, identificado fundamentalmente com a realização sistemática da pesquisa. Se é verdade que esta tendência, que se manifesta mais nas universidades públicas, é uma força importante na história do ensino superior no Brasil, representando assim uma intenção positiva, já que a dimensão da pesquisa era quase que inexistente na nossa tradição universitária, não se pode desconsiderar o risco de elitização que ela traz em seu bojo, o risco de uma postura altaneira e arrogante que acabará impedindo a Universidade de dar à sociedade o retorno que ela espera e merece, com toda legitimidade. Processo que, independentemente de sua qualidade intrínseca, desvirtua a própria razão de ser da Universidade. De outro lado, outros vêem a superação dos problemas entendendo como único papel da Universidade a preparação de técnicos a serviço do mercado de trabalho, numa postura meramente profissionalizante, desconhecendo a necessidade não só da formação científica mas também de uma densa e consistente formação política. São forças centrípetas que tendem a fazer com que o ensino superior se feche sobre si mesmo, como um redemoinho. Nunca é demais insistir: cabe à universidade como instituição como lugar específico do ensino superior dedicar-se à formação do cidadão autêntico, pois seu papel mais substantivo vai muito além da formação do profissional, do técnico e do especialista. Por mais que os resultados históricos não tenham correspondido a essa expectativa, isso não compromete sua finalidade intrínseca, formadora que precisa ser da consciência social que é a única sustentação de um projeto político minimamente equitativo, justo e emancipador. Mas a universidade brasileira está acossada também por forças externas, forças do contexto que questionam sua autonomia, pressionando-a a se desviar de seus compromissos mais substantivos. Vive uma dura orfandade, sitiada por todos os lados. É pressionada de fora pelas injunções de uma dinâmica social escrava do mercado, onde só conta o valor de troca, onde tudo se transforma em mercadoria para um consumo desvairado. Essa dinâmica mercantil induz, por sua vez, uma política atrelada a interesses menores, descompromissados com a construção do bem comum. A humanidade parece caminhar, cada dia mais para uma condição na qual o econômico prevalece sobre o político e sobre o cultural. E um econômico que tende a reduzir-se ao financeiro. É que o bem se desenha, ao vivo e a cores, a atual crise mundial. Na verdade, uma crise anunciada, preparada e manipulada. Um terremoto análogo àquele provocado pelo ajuste das placas tectônicas que constituem a crosta terrestre: trata-se de um ajustar-se das partes. O que está em jogo aqui é um ajuste das próprias condições do mundo humano para que se solidifique uma nova configuração do social, subalternizando-o, de vez, ao mercado. Uma crise para acabar com resistências que ainda impediam essa reconfiguração. Não deixa de ser sintomático que esta seja uma crise provocada, alimentada e sustentada pelo mercado financeiro, fina flor do capitalismo vigente na atualidade. O econômico prevalecendo sobre o político e se delineando como mero jogo financeiro do capital. A partir desta crise, o Estado, outrora representante legitimado do poder político, passa a ser mero agente executivo do econômico financeirizado. Esta nova configuração do mundo, que se apresenta como se fosse uma ordem nova, vai impondo a lógica do mercado a todas as dimensões da vida humana. A educação, em geral, e a educação universitária, em particular, não passam incólumes sob os efeitos de sua intervenção. Mas as conseqüências são drásticas. Vendendo seus encantos como as sereias vendiam suas melodiosasmúsicas, promessas que não podem ser cumpridas, o novo poder hipnotiza a juventude, constrange os educadores e chantageia os gestores. Seus intelectuais orgânicos desmontam todas as críticas, desqualificam todos aqueles que ousam se opor a suas propostas. A lógica do mercado que impõe uma funcionalidade econômica, utilitarista. Induz à competitividade desenfreada. Propõe a aquisição de competências não para saber fazer, mas para competir, conhecimento utilitarista, instrumental, performance competitiva. Acaba ocorrendo uma colonização da política educacional pelos imperativos da economia. Centrada no desempenho dos indivíduos, visto como um agregado de competidores pelos postos do mercado de trabalho e não parceiros na condução de um projeto. Cada um deve construir seu port-folio de competências individuais. Aqui o impacto não só aquele decorrente da mercantilização dos serviços educacionais, mas pior ainda, a defesa, a impregnação de uma ideologia individualista, consumista e idealista. Os jovens não saem formados do ensino superior, mas deformados, com uma visão medíocre e egoísta da vida social e de sua participação nela. Mas, além disso, internamente, a vida acadêmica é marcada por muitas contradições que, por assim dizer, comprometem a própria razão de ser da UNIversidade, a mesquinhez, a miopia, o corporativismo, o mandonismo, o autoritarismo, o dogmatismo prevalecem e contaminam todo o organismo universitário. É neste contexto de um modelo societário marcado pela lógica do mercado, com suas pesadas conseqüências para a educação universitária que se pode fazer uma leitura do chamado Processo de Bolonha, iniciativa política da União Européia para uma significativa reorganização de seu sistema universitária. Trata-se a criação do Espaço Europeu de Ensino Superior. Na verdade, é a adoção do modelo inglês para formar uma educação européia. A Europa continuaria querendo construir um império integrado, hoje usando o conhecimento como a nova arma. Estaria ocorrendo uma transição do paradigma do ensino para a aprendizagem. O indivíduo, como aprendiz, é que é responsável pela sua formação, não é o processo em si do ensino. Também não mais se pensam por políticas públicas, mas por estratégias governamentais. Está em processo a desregulação da educação pública, o Estado passa a ser apenas um avaliador, um supervisor, uma agência de controle e avaliação. Tudo passa por uma estratégia econômica de gestão. Trago à baila a referência ao processo de Bolonha pela reconhecida importância que a experiência européia tem para nós. Sem dúvida, exercerá uma grande influência, nem sempre recebida e incorporada com o devido distanciamento crítico. Estamos aqui e agora diante de um novo emblema. A universidade ocidental nasceu em Bolonha e corre o risco de lá também perecer. Por tudo isso, muitos desafios permanecem e algumas possibilidades se apresentam. Sem dúvida, é equívoca a tendência de privilegiar a pesquisa, a reduzir o papel da universidade àquele de fazer pesquisa, como se fosse a única atividade a ser prestigiada. Desconsiderar a necessidade da pesquisa como postura investigativa é condenar o ensino superior à mediocridade, comprometendo sua competência e responsabilidade em lidar com o conhecimento novo, obstruindo sua criatividade para inovar e sua criticidade para avaliar a história. Transforma-se numa instituição puramente certificadora. Quanto à prática da pesquisa nos processos de ensino e aprendizagem na Universidade, defendo a posição de que, na Universidade, esses processos só serão significativos se forem sustentados por uma permanente atividade de construção do conhecimento. O professor universitário precisa da prática da pesquisa para ensinar eficazmente; o aluno precisa dela para aprender eficaz e significativamente; a comunidade precisa da pesquisa para poder dispor de produtos do conhecimento; e a Universidade precisa da pesquisa para ser mediadora da educação. O aluno só consegue aprender significativamente se sua aprendizagem se der como construção do conhecimento. Mas estamos aqui falando de mediações, a postura investigativa é um meio, uma mediação, em vista de uma finalidade, no caso, um bom ensino, uma boa extensão. Por isso mesmo, ao mesmo tempo que se trata de valorizar a perspectiva daquela formação que tradicionalmente encarnamos no bacharelado, não se pode perder de vista que não estamos querendo formar cientistas no sentido estrito e restrito da expressão. Na Universidade, ensino, pesquisa e extensão efetivamente se articulam, mas a partir da pesquisa, ou seja, só se aprende, só se ensina, pesquisando, construindo conhecimento; só se presta serviços à comunidade, se tais serviços nascerem e se nutrirem da pesquisa. Impõe-se partir de uma equação de acordo com a qual educar (ensinar e aprender) significa conhecer; e conhecer, por sua vez, significa construir o objeto; mas construir o objeto significa pesquisar. Por isso mesmo, também na Universidade, a aprendizagem, a docência, a ensinagem, só serão significativas se forem sustentadas por uma permanente atividade de construção do conhecimento. Ambos, professor e aluno, precisam da pesquisa para bem conduzir um ensino eficaz e para ter um aprendizado significativo. Por outro lado, e agora me referindo à perspectiva da Licenciatura, não se pode desconsiderar quando está em pauta a natureza e a finalidade do ensino superior a questão do ensino e da formação do educador. Primeiramente em decorrência do envolvimento intrínseco do ensino superior com a educação em geral. O compromisso da Universidade com o ensino básico não é só aquele decorrente de sua atribuição institucional, daquela tarefa técnica de formar os professores, como profissionais do ensino. Ele é muito mais profundo e radical. Trata-se de um compromisso ético-político com a educação, mola propulsora do processo civilizatório. Não se trata de uma opção da Universidade se vai se preocupar com isso ou não. Deixar de assumir responsabilidades diretas e incisivas em relação a essa problemática é uma traição a seu próprio destino. Ela precisa ser lugar prioritário de se pensar modelos e caminhos da educação básica do país. Como não se abalar com os dados trazidos pelo Censo de 2007 ao revelarem a grave crise pela qual está passando a formação de professores? Como conviver com a precariedade de nossos cursos de Licenciatura e Pedagogia, como se nada tivessem a ver conosco? Todos sabemos muito bem que o fator predominante dessa crise vem da ausência de uma política pública mais consistente por parte do Estado mas quem vive dentro dos muros da Universidades bem sabe o quanto a Licenciatura é desprestigiada, conforme depoimento recente do próprio Ministro da Educação, ao justificar a criação da Bolsa de Iniciação à Docência.(TAKAHASHI; PINHO, 2009, p. C8) A universidade, cuja atribuição, ao preparar os profissionais nos diversos campos da cultura, não é repassar uma instrução técnica, mas assegurar a formação integral dos estudantes, cabe uma responsabilidade social da qual decorrem exigências específicas: Uma lida rigorosa com o conhecimento, donde a necessidade do investimento na prática da pesquisa, no domínio de metodologias especializadas de investigação, na consolidação da pós-graduação como escola de construção do saber, no compromisso com a competência técnica. Um compromisso ético-político: o profissional a ser formado é antes de tudo um ser humano, que precisa tornar-se sensível à dignidade humana bem como um cidadão que precisa se comprometer com a democratização das relações sociais, dotando-se de uma nova consciência social. E pouco importa qual seja sua área de profissionalização. Reencontramos aqui a dimensão igualmente imprescindível da extensão no processo integral da formação universitária. Com efeito, é graças àextensão que o pedagógico ganha sua dimensão política, porque a formação do universitário pressupõe também uma inserção no social, despertando-o para o entendimento do papel de todo saber na instauração do social. E isso não se dá apenas pela mediação do conceito, em que pese a imprescindibilidade do saber teórico sobre a dinâmica do processo e das relações políticas. É que se espera do ensino superior não apenas o conhecimento técnico-científico, mas também uma nova consciência social por parte dos profissionais formados pela Universidade. A formação universitária, com efeito, é o locus mais apropriado, especificamente destinado para esta tomada de consciência, só a pedagogia universitária, em razão de suas características especiais, pode interpelar o jovem quanto ao necessário compromisso político. Esta interpelação se dá pelo saber, eis que cabe agora ao saber equacionar o poder Deste modo, a extensão tem grande alcance pedagógico, levando o jovem estudante a vivenciar sua realidade social. É por meio dela que o sujeito/aprendiz irá formando sua nova consciência social. A extensão cria então um espaço de formação pedagógica, numa dimensão própria e insubstituível. Quando a formação universitária se limita ao ensino como mero repasse de informações ou conhecimentos está colocando o saber a serviço apenas do fazer. Eis aí a idéia implícita quando se vê seu objetivo apenas como profissionalização. Por melhor que seja o domínio que se repassará ao universitário dos conhecimentos científicos e das habilidades técnicas, qualificando-o para ser um competente profissional, isto não é suficiente. Ele nunca sairá da Universidade apenas como um profissional, como um puro agente técnico. ORRÚ. Silvia Éster. O Compromisso Institucional daUniversidade com a formação de professores. Disponível em http://www.campus-oei.org/revista/deloslectores/872Orru.PDF Acesso em 18 de setembro de 2009.
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