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MÓDULO DISTÚRBIOS SENSORIAIS, MOTORES E DA CONSCIÊNCIA – P3 | Luíza Moura e Vitória Neves NÍVEIS DE CONSCIÊNCIA CONCEITOS CLASSIFICAÇÃO DOS NÍVEIS DE CONSCIÊNCIA A consciência representa um estado de perfeito conhecimento de si próprio e do ambiente. Existem 2 componentes da consciência que devem ser analisados: l. Nível de consciência: grau de alerta comportamental apresentado pelo indivíduo. 2. Conteúdo da consciência: soma de todas as funções cognitivas e afetivas (memória, crítica, linguagem, atenção, humor etc.). Avalia a qualidade e a coerência de todas as funções e respostas em relação aos estímulos do ambiente. O nível e o conteúdo da consciência podem apresentar-se clinicamente de diversas maneiras, do indivíduo normal até aquele que está em coma. As diferenças entre sonolência e coma são: 1. Sonolência: paciente com abertura ocular ao chamado, mas adormece quando não estimulado. Permanece com percepção dos sentidos e dos acontecimentos a sua volta e obedece aos comandos. 2. Coma: paciente sem interação com o ambiente, sem ativação da consciência, com ausência de respostas aos estímulos e sem obedecer aos comandos. Há ausência de movimentos voluntários e não há ciclo sono-vigília. Termos como torpor e obnubilação designando estágios intermediários entre a sonolência e o coma devem ser evitados, pela variável interpretação desses termos pelos médicos examinadores. A descrição detalhada dos achados no exame físico é mais fidedigna, mais dinâmica e mais reprodutível do que o uso dessa nomenclatura. COMA É um estado de redução do nível de consciência e de irresponsividade aos estímulos externos. Está associado a alterações neurológicas importantes, como: Ausência ou diminuição significativa da resposta motora; Alterações no ritmo respiratório; Reações pupilares; e Movimentos oculares anormais. Pode ser causado por: Lesões estruturais do SNC ou transtornos metabólicos, desencadeando disfunção da formação reticular no tronco encefálico, dos hemisférios cerebrais ou de ambos. ESTADOS PRÉ-COMATOSOS 1. Torpor ou estupor: sono profundo, com pouca resposta aos estímulos, sons ininteligíveis; 2. Sonolência: sono persistente, mas facilmente acordável, com breves períodos de lucidez; 3. Letargia: não resposta aos estímulos auditivos, com breves períodos de lucidez; 4. Estado confusional: perda total da atenção, mantendo um quadro de fala inapropriada e incoerente. Pode vir associado à agitação psicomotora, quando é chamado de delirium. ESTADO VEGETATIVO PERSISTENTE Os pacientes estão despertos, porém, não lúcidos. Apesar de atitude aparentemente alerta, os pacientes: Não exibem fala, compreensão ou movimentos dirigidos a uma finalidade. Tem ciclo sono-vigília. MÓDULO DISTÚRBIOS SENSORIAIS, MOTORES E DA CONSCIÊNCIA – P3 | Luíza Moura e Vitória Neves Algumas funções do tronco cerebral podem persistir, como: Movimentos oculares reflexos; Bocejos; Espirro; e Ocasionalmente, sorrisos sem significado. A!! Essa condição pode persistir durante anos. Podem ocorrer função motora comprometida com espasticidade e posturas anormais. Estímulos dolorosos evocam reações inespecíficas e erráticas. Os pacientes têm incontinência urinária e fecal. Para que seja “estado vegetativo persistente”, o paciente deve se ter as condições acima por pelo menos 1 mês. As causas mais comuns são: Lesões agudas dos hemisférios cerebrais, após coma prolongado; ou Estágio terminal de doença neurológica progressiva: doença de Alzheimer. A recuperação da consciência em causas não traumáticas é rara após 3 meses, e a recuperação em causas traumáticas é rara após 12 meses. O diagnóstico diferencial deve ser feito com: Catatonia e síndrome do encarceramento. ESTADO MÍNIMO DE CONSCIÊNCIA O paciente não preenche critérios para estado de coma ou estado vegetativo persistente. Há alteração importante da consciência, mas demonstra certo grau de interação com o ambiente, apresentando ciclo sono-vigília. O paciente pode obedecer a alguns comandos, como dizer "sim" ou "não". O estado mínimo de consciência em geral é uma evolução dos pacientes com estado vegetativo de consciência ou coma para um melhor nível de consciência e com melhor prognóstico. Mas a recuperação total não possa ser predita. Assim como no estado vegetativo persistente, as disfunções associadas ao estado mínimo de consciência envolvem: Hemisférios cerebrais, possivelmente em razão das lesões de fibras provenientes do córtex cerebral ou fibras de associação entre o córtex e o tálamo. MUTISMO ACINÉTICO É caracterizada por: Estado de lucidez, pois o paciente se mantém com olhos abertos, mas não tem preservação total do conteúdo da consciência. Os pacientes são: Incapazes de se movimentar ou falar, embora estejam despertos. Alguns autores descrevem tentativas de expressão da linguagem, mas sem sucesso. Há preservação de reflexos e não há espasticidade, sugerindo: Preservação do trato corticoespinal, ao contrário do estado vegetativo persistente. O mutismo acinético está relacionado a: Lesões isquêmicas, hemorrágicas ou neoplásicas; ou Disfunções envolvendo o lobo frontal medial bilateralmente (giro do cíngulo), cursando com deficiência importante na motivação e na capacidade de planejar e iniciar as tarefas (comprometimento da função executiva). SÍNDROME DO ENCARCERAMENTO – LOCKED-IN Consiste em tetraplegia e anartria, com nível de consciência preservado. A síndrome está relacionada à: Injúria aguda da região ventral da ponte, logo abaixo do núcleo do nervo oculomotor, geralmente preservando os movimentos do olhar, principalmente verticais. MÓDULO DISTÚRBIOS SENSORIAIS, MOTORES E DA CONSCIÊNCIA – P3 | Luíza Moura e Vitória Neves As etiologias mais comuns são: Infarto da ponte por oclusão da artéria basilar, hemorragias e traumas. Podem simular a síndrome do encarceramento por acometimento dos nervos periféricos: SGB, botulismo, neuromiopatia do paciente crítico e pacientes recebendo bloqueadores neuromusculares sem sedação adequada. OUTRA REFERÊNCIA Como a porção da formação reticular responsável pela consciência situa-se acima do nível da ponte média, uma transecção funcional do tronco cerebral abaixo desse nível – por infarto pontino (figura abaixo), hemorragia, mielinólise pontina central, tumor ou encefalite – pode interromper vias neurais descendentes para produzir um estado acinético e mudo, com preservação da consciência. Legenda: TC (contrastada) de um homem com oclusão de artéria basilar e que apresenta a síndrome “locked-in”. O infarto pontino (setas) situa-se abaixo do nível do sistema reticular ativador, permitindo a consciência, mas os tratos motores descendentes bilaterais foram seccionados. Os pacientes parecem comatosos, mas estão vigilantes e alertas, embora mudos e quadriplégicos. Pode ter uma postura descerebrada ou espasmos flexores. O diagnóstico é feito quando há preservação: Abertura voluntária dos olhos; Movimentos oculares verticais; Convergência ocular; ou Alguma combinação desses movimentos volitivos mediados pelo mesencéfalo. Durante o exame de qualquer paciente aparentemente comatoso, o paciente deve ser solicitado a: “abrir os olhos”, “olhar para cima”, “olhar para baixo” e “olhar para a ponta do nariz” para provocar os movimentos. O EEG é normal. O resultado é variável e está relacionado com a causa subjacente e a extensão da lesão do tronco cerebral. A mortalidade, geralmente, decorrente de pneumonia, é de cerca de 70%, quando a causa é um distúrbio vascular, sendo de cerca de 40% em casos não vasculares. Os sobreviventes podem serecuperar parcial ou completamente em um período de semanas a meses. CATATONIA É o estado de consciência caracterizado por ser: Complicação de transtornos psiquiátricos: depressão grave, distúrbio afetivo bipolar ou esquizofrenia; ou Complicação de transtornos neurológicos: encefalites autoimunes do tipo NDMA. Os pacientes encontram-se com: Olhos abertos, mas são incapazes de falar ou se movimentar espontaneamente, e não obedecem aos comandos. Mais raramente, pode se apresentar como movimentos sem propósitos. Os demais aspectos do exame neurológico são normais. MORTE ENCEFÁLICA O CFM, pela Resolução 1.480/1997, definiu os critérios brasileiros de determinação de morte encefálica. Esses critérios seguem, em linhas gerais, os critérios internacionais (Academia Americana de Neurologia). MÓDULO DISTÚRBIOS SENSORIAIS, MOTORES E DA CONSCIÊNCIA – P3 | Luíza Moura e Vitória Neves Na morte encefálica, não há qualquer atividade do cérebro ou do tronco cerebral. A única atividade espontânea é a cardiovascular. Os únicos reflexos presentes são aqueles mediados pela: Medula espinal. Em adultos, a morte encefálica dura poucos dias, pois o organismo logo entra em colapso circulatório. Para a determinação de morte encefálica, devem ser seguidas as recomendações do CFM. CESSAMENTO DA FUNÇÃO CEREBRAL IRRESPONSIVIDADE O paciente deve ser irresponsivo a estímulos sensoriais, incluindo dor e fala. AUSÊNCIA DE REFLEXOS DO TRONCO CEREBRAL As respostas pupilares, corneanas e orofaríngeas estão ausentes; Não são bem-sucedidas as tentativas de provocar movimentos oculares com a manobra dos olhos de boneca e com o exame calórico com água fria. As respostas respiratórias também estão ausentes, não havendo esforço ventilatório depois que a PCO2 do paciente tiver aumentado até 60 mmHg para estimulação ventilatória máxima, enquanto a oxigenação é mantida com 100% de O2 através de uma cânula inserida no tubo endotraqueal (teste de apneia). IRREVERSIBILIDADE DA DISFUNÇÃO CEREBRAL A causa do coma deve ser conhecida, deve ser adequada para explicar o quadro clínico e deve ser irreversível. Algumas condições podem produzir um quadro clínico que lembra a morte cerebral, mas a recuperação neurológica pode ser possível; elas devem ser excluídas: Intoxicação por sedativos; Hipotermia (<32,2ºC); Bloqueio neuromuscular; e Choque. PERSISTÊNCIA DA DISFUNÇÃO CEREBRAL Os critérios de morte cerebral descritos devem persistir por um período adequado: 1. 6 horas com um EEG isoelétrico (plano) confirmatório, realizado de acordo com as técnicas- padrão da American Electroencephalographic Society. 2. 12h sem um EEG isoelétrico confirmatório. 3. 24h para lesão cerebral anóxica, sem um EEG isoelétrico confirmatório. EXAMES CONFIRMATÓRIOS ADICIONAIS A demonstração de ausência de fluxo sanguíneo cerebral confirma a morte cerebral, sem um período de espera. A angiografia cerebral fornece a avaliação mais inequívoca, embora técnicas de Doppler e imagens com tecnécio sejam usadas em alguns centros. IRRESPONSIVIDADE É um diagnóstico de exclusão que só deve ser feito quando apresentar como base provas convincentes. Essa condição pode ser: Manifestação de esquizofrenia tipo catatônico; Distúrbio somatoforme de conversão ou de somatização; ou Simulação. O exame físico geral não revela anormalidades. O exame neurológico mostra: Diminuição simétrica do tônus muscular; Reflexos normais; e Resposta flexora normal à estimulação plantar. As pupilas têm 2-3 mm de diâmetro ou ocasionalmente são maiores, respondendo rapidamente à luz. MÓDULO DISTÚRBIOS SENSORIAIS, MOTORES E DA CONSCIÊNCIA – P3 | Luíza Moura e Vitória Neves Os movimentos oculares laterais com a manobra dos olhos de boneca podem ou não estar presentes, pois uma fixação visual pode suprimir esse reflexo. No entanto, os movimentos de busca lentos e conjugados do coma metabólico não podem ser imitados e, se presentes, são incompatíveis com irresponsividade psicogênica. Da mesma forma, o fechamento lento, assimétrico e incompleto dos olhos, comumente observado, após a abertura passiva dos olhos de um paciente comatoso, é impossível de ser reproduzido. O paciente com irresponsividade psicogênica costuma exibir algum tônus muscular nas pálpebras durante a abertura passiva dos olhos. Um teste diagnóstico útil é a irrigação da membrana timpânica com água fria. No paciente consciente, a resposta normal é um nistagmo rápido; No coma, não ocorre nistagmo. O EEG na irresponsividade psicogênica é igual ao EEG de uma pessoa normal acordada. Legenda: comparação entre os achados clínicos das alterações de consciência
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