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CIRURGIA Carolina Ferreira -Paracentese abdominal é um procedimento diagnóstico e terapêutico seguro e eficaz usado na avaliação de vários problemas abdominais, incluindo ascite, lesão abdominal, abdome agudo e peritonite -A ascite é uma manifestação frequente, sendo definida como o acúmulo patológico de líquido na cavidade peritoneal. Em cerca de 80% dos casos, decorre de cirrose hepática -A paracentese terapêutica é utilizada p/ aliviar a dificuldade respiratória por conta do da pressão intra-abdominal causado pela ascite. -Abordagens na linha média ou lateral podem ser usadas p/ a paracentese, sendo a técnica lateral-esquerda + comumente empregada. Essa técnica evita estruturas intestinais preenchidas c/ gás que normalmente flutuam no líquido ascítico. O paciente é colocado em posição supina e ligeiramente virado p/ o lado do procedimento como forma de reduzir + ainda o risco de perfuração durante a paracentese. Pelo fato de o ceco estar relativamente fixo no lado direito, a abordagem lateral-esquerda é a + comumente usada. A maioria dos líquidos ascíticos se reacumula rapidamente Alguns especialistas recomendam que ñ se remova + de 1,5 L de líquido em um único procedimento. -Os pacientes c/ hipoproteinemia grave podem ter perda adicional da albumina p/ o líquido ascítico que se reacumula e desenvolver hipotensão aguda e insuficiência cardíaca. Os pacientes portadores de CA c/ derrames malignos também podem precisar de paracentese terapêutica de repetição. -Após a paracentese diagnóstica, o líquido deve ser enviado ao laboratório p/: coloração de Gram; cultura; citologia, níveis de proteína, glicose e desidrogenase láctica; e contagem de células sanguíneas c/ contagem diferencial de células → Contagens de células polimorfonucleares de >500 células/mm3 são altamente sugestivas de peritonite bacteriana → Níveis de amilase no líquido peritoneal ou superiores ao nível de amilase sérica são encontrados na pancreatite → A presença de líquido macroscopicamente sanguinolento no abdome (>100.000 eritrócitos/mm3 ) indica trauma + grave ou perfuração de órgãos abdominais → O teste positivo clássico p/ hemoperitônio é a incapacidade de ler a escrita de jornal através do lavado da paracentese MATERIAIS • Assepsia: máscara; luvas estéreis; campos estéreis; solução antisséptica; gaze • Demarcação do local de punção: caneta marcadora • Anestesia local: agulha (22 e 25 G); seringa de 5 ml; lidocaína a 1% sem vasoconstritor; • Coleta de líquido: cateter venoso (nº 14) c/ agulha; seringa de 20 ml; frasco a vácuo ou frasco coletor; equipo de soro; tubos específicos p/ a coleta de amostra p/ exames • Curativo/fixação: esparadrapo/adesivo oclusivo p/ curativo INDICAÇÕES • Pcts internados ou ambulatoriais c/ ascite ao exame físico, de início recente ou causa indeterminada • Pcts portadores de doença hepática crônica c/ ascite preexistente e deterioração do quadro clínico (febre, dor abdominal, encefalopatia hepática, disfunção renal, leucocitose, acidose, sepse ou choque), que possam indicar suspeita de peritonite bacteriana espontânea • Avaliação de peritonite aguda ou espontânea; pancreatite aguda e abdome agudo • Indicações de paracentese terapêutica: → pacientes portadores de ascite crônica, refratária ao uso de diuréticos ou que apresentem contraindicações ao uso deles → pacientes portadores de ascite volumosa, c/ sintomas clinicamente significativos como desconforto respiratório. CONTRAINDICAÇÕES • Abdome agudo que exige cirurgia imediata (contraindicação absoluta) • Trombocitopenia grave (contagem de plaquetas < 20 × 103 /μL) • Coagulopatia (razão normalizada internacional [RNI] >2,0) • Grande distensão intestinal (proceder com extrema cautela) • Múltiplas operações abdominais prévias • Aderências intra-abdominais • Contraindicações relativas ao procedimento: gestação, visceromegalias, obstrução intestinal, sinais de adesões abdominais, bexiga distendida que ñ pode ser esvaziada c/ cateter de Foley, infecção evidente no local proposto p/ punção e Hipoproteinemia grave CIRURGIA Carolina Ferreira PROCEDIMENTO 1. Realizar anamnese e exame clínico do pct, identificando riscos de sangramento, infecção e lesão intra-abdominal (cirurgias prévias, massas abdominais, distensão abdominal e hepatoesplenomegalia) 2. Explicar ao paciente as etapas do procedimento e os riscos de hipotensão/complicações após o exame e solicitar autorização para sua realização 3. Realizar o procedimento à beira do leito, c/ o paciente em jejum, após esvaziamento vesical (se necessário, passar sonda de alívio) 4. O pct deve permanecer em decúbito dorsal, possivelmente com a cabeça pouco elevada 5. Determinar o ponto de punção, feito no QIE do abdome, no terço distal de uma linha imaginária que passa pela espinha ilíaca anterossuperior e a cicatriz umbilical, longe dos vasos epigástricos. É também descrita a técnica c/ ponto de referência na linha média, 2 cm abaixo da cicatriz umbilical. Os locais de inserção podem ser na linha média ou através do músculo oblíquo transverso, que se encontra lateralmente aos músculos retos abdominais, os quais são + espessos 6. Utilizar USG como guia de punção, principalmente em pacientes c/ risco de lesão intra-abdominal, como obesos e indivíduos com múltiplas cicatrizes cirúrgicas. 7. Preparar a pele c/ solução de iodopovidona ou clorexidina, deixando-a secar enquanto são vestidas luvas e máscara estéreis. Deve-se preparar uma área ampla p/ que a área descoberta ñ inadvertidamente exposta caso o campo deslize um pouco 8. Centralizar os campos estéreis a cerca de um terço da distância do umbigo à crista ilíaca anterior 9. Infiltrar a pele e o tecido subcutâneo c/ solução de lidocaína a 1% com epinefrina. Uma agulha de 5 cm é então inserida perpendicularmente à pele p/ infiltrar os tecidos + profundos e o peritônio c/ anestésico 10. Introduzir a agulha perpendicularmente à pele, anestesiando os tecidos profundos, sempre aspirando a cada 2 mm, até a saída do líquido peritoneal. Pode-se, ainda, injetar um pouco de solução anestésica adicional ao atingir a cavidade, anestesiando o peritônio parietal 11. Introduzir o cateter ligado à seringa de 20 mL em ângulo agudo na pele e subcutâneo, de forma que o ponto de inserção ñ fique perpendicular ao ponto de entrada na cavidade peritoneal. Pode-se, também, alternativamente, pela técnica Z-tract, tracionar a pele e o subcutâneo 2 cm p/ baixo do ponto de inserção, inserindo o cateter perpendicularmente; dessa forma, quando o cateter for retirado ao fim do procedimento, a pele retrairá para sua posição normal. Ambas as técnicas garantem que os pontos de inserção cutâneo e peritoneal ñ entrem em contato, minimizando risco de vazamento do líquido ascético 12. Ao introduzir o cateter progressivamente aos planos profundos, sente-se uma da resistência ao se atingir a cavidade abdominal. Nesse momento, deve-se parar a aspiração contínua, evitando, assim, que o intestino ou o epíplon obstruam a agulha 13. Encaminhar amostra coletada de cerca de 60 mL do líquido ascítico p/ exames de bioquímica, citometria, pesquisa de células neoplásicas e culturas. 14. Se a paracentese for terapêutica, ligar o cateter ao equipo e o coletor/frasco a vácuo, p/ facilitar a saída de > volumes; se houver retirada > a 5 L, realizar a infusão endovenosa de albumina concomitantemente ou logo após o procedimento, de 6 a 8 g/L removido, c/ velocidade 1 mL/minuto. 15. Realizar a monitorização de FC e PA evitando as possíveis complicações. 16. Fazer curativo compressivo no local ao terminar. COMPLICAÇÕES• Sistêmicas: hipotensão pós-paracentese, alterações eletrolíticas (hiponatremia), falência renal e sepse • Locais: vazamento pelo local de punção, hematoma na parede abdominal, infecção local • Intraperitoneais: perfuração de vasos ou vísceras, peritonite, abscesso, hemorragia, lesão da artéria epigástrica inferior • Perfuração da bexiga e do estômago (são esvaziados antes do procedimento p/ reduzir o risco) e intestinal • Pneumoperitônio • Síndrome hepatorrenal CONSIDERAÇÕES PEDIÁTRICAS CIRURGIA Carolina Ferreira -Pacientes pediátricos podem ñ cooperar c/ a colocação do cateter. Devido aos riscos de dano a vasos, nervos e demais estruturas, considerar sedação consciente c/ injeções IM ou administração oral de medicações sedativas como midazolam e cetamina. INSTRUÇÕES PÓS-PROCEDIMENTO -O paciente deve ser orientado a monitorar o sangramento da área e retornar caso qualquer sangramento anormal seja notado. Também deve ser instruído acerca de dor, dormência ou desconforto na área. O paciente deve ainda estar atento a sinais de infecção. E deve ser aconselhado a limpar a área c/ sabão e água morna, secando-a sem utilizar fricção INTERPRETAÇÃO DOS RESULTADOS -Após a coleta de amostra de líquido ascítico, deve-se transferi-la p/ tubos específicos, que serão destinados à análise bioquímica (albumina, proteínas etc.), de celularidade (total e diferencial) e de cultura (no último caso, utilizar técnica asséptica). O aspecto macroscópico do líquido ascítico pode indicar algumas doenças associadas No líquido ascítico de aspecto sanguinolento, a diferenciação de ascite hemorrágica c/ acidente de punção pode ser feita a partir de 2 maneiras: → normalmente no acidente de punção o líquido ascítico vai clareando durante a drenagem → o sangue presente na ascite hemorrágica ñ coagula, ao contrário do sangue do acidente de punção. -Albumina e proteína total: há ascites consideradas transudativas e exsudativas. O nível de proteínas do líquido ascítico em conjunto c/ o GASA (gradiente de albumina soro-ascite) deve ser avaliado para tal classificação. Geralmente, o valor do nível de proteínas do líquido ascítico considerado limite entre transudato e exsudato é de 2,5 a 3,0 g/dL. Valores inferiores a 1,0 g/dL relacionam-se a alto risco de peritonite bacteriana espontânea -O GASA é definido como a diferença entre a [ ] de albumina do soro e da ascite, em amostras colhidas simultaneamente. Como o gradiente de pressão oncótica está relacionado c/ a pressão portal e a albumina é a principal determinante da pressão oncótica, o gradiente de albumina determina a ausência ou a presença de hipertensão portal na gênese da ascite de etiologia variada → Valores > que 1,1 g/dL indicam hipertensão portal, enquanto os < que 1,1 g/dL excluem essa causa → Valores elevados de GASA c/ proteínas baixas sugerem doenças que levam à hipertensão portal sinusoidal (cirrose) → Já os casos em que tanto o GASA quanto os níveis de proteínas estão elevados poderiam estar associados a patologias nas quais há hipertensão portal pós-sinusoidal (ICC) → GASA baixo c/ níveis de proteínas elevados é compatível c/ comprometimento da membrana peritoneal (carcinomatose e tuberculose peritoneal) → Já os casos c/ GASA e nível de proteínas baixos poderiam sugerir doenças que levam à hipoproteinemia, como a síndrome nefrótica -Celularidade: o líquido ascítico tem, habitualmente, menos que 500 leucócitos e menos que 250 polimorfonucleares (PMN) → Valores > a 250 PMN em pacientes cirróticos sugerem peritonite bacteriana espontânea → Valores > que 10.000 são sugestivos de peritonite bacteriana secundária. O de leucócitos c/ predomínio linfocitário é sugestivo de peritonite tuberculosa CIRURGIA Carolina Ferreira -Bacterioscópico e cultura: na peritonite bacteriana espontânea são + frequentes os germes Gram-negativos, como Escherichia coli e Klebsiella pneumoniae (flora única). Já quando há flora mista, a causa da peritonite é geralmente secundária. -Outros exames: podem ser solicitados, considerando cada caso individual, como amilase, glicose, desidrogenase lática, adenosina deaminase, citologia oncótica, entre outros. Além disso, alguns exames laboratoriais séricos devem ser sempre solicitados, como hemograma, testes de função hepática e renal, glicemia, ionograma, amilase e hemoculturas (no caso de peritonites bacterianas ou outras infecções).