Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
A anemia da doença crônica é a anemia que ocorre nos estados patológicos crônicos (como infecções e doenças reumatológicas) ou neoplásicas, sempre quando estas se fazem presentes por um período superior a 20-60 dias. Geralmente nos estados crônicos associados a níveis elevados de citocinas inflamatórias. Por causa dessa relação, a condição também é denominada como anemia da inflamação. Embora a anemia da inflamação crônica se manifeste em geral como um processo normocrômico e normocítico, em 20% a 50% dos casos os índices hematimétricos revelam microcitose. A anemia é geralmente de grau leve a moderado e pode ser assintomática. A anemia da inflamação crônica acredita-se ser a segunda causa mais comum de anemia, superada apenas pela anemia ferropriva. É o tipo mais comum de anemia encontrado entre os pacientes hospitalizados. No amplo espectro de doenças subjacentes estão as infecções agudas e crônicas, as doenças autoimunes e inflamatórias, os cânceres e as doenças renais crônicas. No entanto, nem todas as "doenças crônicas" justificam o desenvolvimento de ADC. Em geral são aquelas doenças que, de alguma forma, aumentam as citocinas pró-inflamatórias! Assim, anemias causadas por insuf. hepática, insuf. renal, hemólise e sangramento não estão incluídas no conceito de ADC, ainda que tais doenças também sejam "crônicas" e comumente provoquem anemia (outros mecanismos). Homeostase desregulada do ferro, manifestada por baixos níveis séricos de ferro (hipoferremia) na presença de níveis séricos normais ou elevados de ferritina e de reservas abundantes de ferro no interior dos macrófagos do sistema mononuclear fagocitário. Os estados inflamatórios e neoplásicos promovem liberação de várias citocinas que, em conjunto, acabam levando às seguintes consequências: 1. Redução da vida média das hemácias para cerca de 80 dias (N: 120 dias); 2. Redução da produção renal de eritropoetina; 3. Menor resposta dos precursores eritroides à eritropoetina; 4. “Aprisionamento” do ferro em seus locais de depósito (principal). As principais citocinas envolvidas nestas alterações são a Interleucina 1 (IL-1), a Interleucina 6 (IL-6), o Fator de Necrose Tumoral alfa (TNF-alfa) e o gama- Interferon (gama-IFN). Em condições normais a transferrina transporta o ferro dos seus locais de depósito (macrófagos do baço/ferritina) para a medula óssea. Na anemia de doença crônica esta etapa encontra- se “bloqueada”. IL-6 A IL-6 tem um papel essencial neste bloqueio, já que, após o aparecimento de uma doença inflamatória crônica, os macrófagos começam a liberar esta citocina, que estimula o fígado a produzir hepcidina (que se comporta como um reagente de fase aguda). Esta última, por sua vez, determina uma redução na absorção intestinal de ferro ao inibir a síntese de ferroportina (o “canal de ferro” responsável pela entrada deste elemento nos enterócitos). Ocorre também um “aprisionamento” do ferro no interior dos macrófagos e demais locais de depósito, A N E M I A P O R D O E N C A C R O N I C A comprometendo o abastecimento da produção eritrocitária – um fenômeno chamado de eritropoiese restrita em ferro. IL-1 A IL-1 estimula a síntese, pelos polimorfonucleares, de lactoferrina, uma proteína semelhante à transferrina, que compete pelo ferro. A lactoferrina é mais ávida por ferro do que a transferrina, e não libera o ferro para a medula de forma adequada. INTERFERON-GAMA O interferon-gama também tem papel importante na anemia de doença crônica, ao promover apoptose e fazer down-regulation dos receptores de eritropoetina nas células precursoras da medula óssea. Além disso, também parece antagonizar outros fatores pró-hematopoiéticos. Como na maioria das vezes a ADC não é grave, o quadro clínico é marcado basicamente pelos sinais e sintomas da doença de base. Eventualmente, pacientes assintomáticos com anemia leve acabam descobrindo, no processo de investigação diagnóstica, uma doença oculta. Um paciente que apresenta perda ponderal significativa, e cujos exames revelam anemia + aumento do VHS, deve ser extensivamente investigado para uma doença sistêmica. A “anemia de doença crônica” em geral se instala progressivamente ao longo dos primeiros 1-2 meses do quadro, estabilizando-se a partir daí. O hematócrito se mantém acima de 25% em 80% dos casos, e o quadro anêmico costuma acompanhar a atividade da doença. Na maioria dos casos, a ADC não cursa com hematócrito abaixo de 25%. Se isso ocorrer, somos obrigados a investigar fatores contribuintes para a anemia (ex.: ferropenia)!! O diagnóstico clínico da anemia da doença crônica que se manifesta na forma de microcitose e hipocromia é de exclusão, e se baseia no encontro de nível sérico baixo de ferro na presença de reservas normais ou aumentadas de ferro total do organismo. Quando existe microcitose, esta é discreta e quase nunca o VCM fica < 72 fL. Sem dúvida a hipocromia é mais comum e mais acentuada do que a microcitose, diferenciando esta anemia da ferropriva, na qual a microcitose é mais proeminente e se instala antes da hipocromia. EXAMES O índice de produção reticulocitária encontra-se normal. Os exames do metabolismo do ferro encontram-se da seguinte forma: o Ferro sérico baixo (< 50 mg/dl) e ferritina sérica normal ou alta (situando-se entre 50- 500 ng/ml) – essa combinação caracteriza a doença; o TIBC normal ou baixo (< 300 mg/dl); o Saturação de transferrina levemente baixa (10-20%). A Protoporfirina Livre Eritrocitária (FEP) encontra- se elevada, mas em menor grau quando comparada à anemia ferropriva. A Proteína Receptora de Transferrina (TRP), ao contrário da ferropriva está baixa. O TIBC está normal ou até baixo porque, na anemia de doença crônica, há uma redução da transferrina sérica (lembrar que o TIBC não é influenciado pela quantidade de ferro no sangue ou mesmo pela porcentagem de sítios livres da transferrina – ele é útil porque traduz, em última análise, a concentração sérica de transferrina. Em pacientes com ADC ou doença inflamatória/infecciosa/neoplásica, o diagnóstico de anemia ferropriva sobreposta deve ser cogitado quando a ferritina sérica for inferior a 30 ng/ml. Como geralmente a ADC é leve ou no máximo moderada, o tratamento deve enfocar apenas a doença de base. Nos casos incomuns de anemia grave (hematócrito < 25%), afastando-se a ferropenia e outras causas de anemia, o tratamento deve ser realizado com eritropoietina recombinante, de modo a evitar as hemotransfusões repetidas. A resposta costuma ser muito boa. O tratamento com eritropoietina deve ser acompanhado de reposição de ferro parenteral, pois aumenta significativamente o consumo deste elemento. TERAPIA EV COM FERRO E ERITROPOETINA Se necessário, a reposição de ferro é realizada por via parenteral, já que o metal tem a absorção intestinal bloqueada, impedindo a reposição via oral. Além disso, pacientes que fazem hemodiálise e recebem eritropoietina, a reposição intravenosa de ferro melhora a anemia, até uma taxa de saturação de 20% da transferrina, que quando ultrapassada, oferece um maior risco de bacteremia. TRANSFUSÃO DE SANGUE A transfusão leva a uma resolução imediata da anemia, porém só é indicada quando a anemia é uma ameaça a vida ou limita seriamente o funcionamento do paciente. Essa indicação ocorre porque em situações de tratamento a longo prazo da anemia de grau leve ou moderada, sem sintomatologia grave, feita com transfusão pode ocorrer riscos secundários, como a sobrecarga transfusional de ferro, sensibilização dos antígenos leucocitários humanos (HLA) no caso de possível receptor de transplante renal.
Compartilhar