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Thaís Silva Batista | 6º Semestre Medicina - UniFtc A puberdade, caracterizada pela maturação sexual e pelo desenvolvimento da capacidade reprodutiva, é o período de transição entre a infância e a idade adulta. Ocorre geralmente entre os 8 e os 13 anos de idade nas meninas, e entre os 9 e os 14 anos nos meninos. ❖ Menina O primeiro sinal visível da puberdade em meninas é a telarca (8 – 13 anos), seguido da pubarca e menarca. O estirão puberal ocorre após telarca. ❖ Menino O primeiro sinal visível da puberdade em meninos é o aumento do volume testicular (> 3ml de volume), nesse momento o menino começa a ter aumento da produção de progesterona que leva ao seguido da pubarca, engrossamento da voz. Estirão puberal ocorre cerca de 2 anos após início da puberdade nos meninos. Fisiologia A puberdade está relacionada com o eixo hipotálamo-hipófise- gônadal (HHG). O núcleo arqueado do hipotálamo e seus neurônios liberam o GnRH, que é transportado para a hipófise anterior e estimula a liberação do hormônio luteinizante (LH) e do folículo-estimulante (FSH). Estes últimos influenciam as gônadas para a produção dos hormônios sexuais: nos meninos, o LH estimula a síntese de testosterona, enquanto o FSH, a espermatogênese; já nas meninas, o LH e o FSH estimulam a síntese de esteroides e a ovulação, respectivamente. Definição: - puberdade precoce Aparecimento dos caracteres sexuais secundários antes dos 8 anos para o sexo feminino e antes dos 9 anos para o sexo masculino. Classificação Puberdade precoce central (PPC) Na puberdade precoce central ou verdadeira o aparecimento das características sexuais secundárias é dependente da ativação prematura do eixo gonadotrófico, ou seja, GnRH dependente. A puberdade precoce verdadeira é sempre isossexual, pois é secundária à ativação hipotalâmico- hipofisária. ❖ Sem anormalidades no SNC (causas não orgânicas) → Idiopática (muito frequente nas meninas) ▪ Na ausência de um fator causal na ativação do eixo gonadotrófico; ▪ Cerca de 9x mais frequente no sexo feminino, ocorre habitualmente nas meninas com idade entre 6 e 7 anos (50%dos casos (2 a 6 anos (25% dos casos) e menos de 2 anos (18% dos casos). → Secundária ▪ PPC secundária resulta em aceleração do crescimento linear, avanço da idade óssea e maturação hipotalâmica. ▪ Exposição crônica prévia a esteroides sexuais (tratamento tardio de formas virilizantes de hiperplasia adrenal congênita, testotoxicose ou síndrome de McCuneAlbright; ressecção de tumores secretores de esteroides sexuais); ▪ Exposição a desreguladores endócrinos; ▪ Adoção internacional. → Causas genéticas ▪ Mutações e Síndromes genéticas (síndrome de Temple, síndrome de WilliamsBeuren, síndrome de SilverRussell, síndrome de PraderWilli, síndrome de Rett, casos raros de deleções e duplicações cromossômicas) ❖ Com anormalidades no SNC (causas orgânicas) → Malformações congênitas ▪ Hamartoma hipotalâmico Mal formação congênita, não neoplásica, formado por massa ectópica de tecido hipotalâmico. Alguns harmatomas são constituídos por neurônios secretores de GhRh, funcionando como foco ectópico dasecreção de GhRh ▪ Cistos aracnoides suprasselares; ▪ Hidrocefalia; ▪ Glioma ou neurofibromatose tipo 1; Endocrinologia Pediátrica PUBERDADE PRECOCE ▪ Outras: esclerose tuberosa, displasia septoóptica, malformações vasculares (Chiari tipo 2), mielomeningocele, espinha bífida. → Lesões adquiridas ▪ Tumores: astrocitoma, craniofaringioma, ependimoma, glioma hipotalâmico ou óptico, adenoma hipofisário secretor de LH, pinealoma, neurofibroma, disgerminoma (não secretor de hCG), meningioma; ▪ Pósinsultos: asfixia perinatal, traumatismo craniano, radioterapia, quimioterapia; ▪ Processos inflamatórios e infecciosos do SNC: encefalite e meningite, tuberculose, sarcoidose, abscessos; ▪ Paralisia cerebral. Puberdade precoce periférica (PPP) Resulta da produção autônoma dos esteroides sexuais. Não há ativação do eixo, GnRH independente. A puberdade precoce periférica pode ser: 1. Isossexual: características sexuais concordantes com o sexo; 2. Heterossexual: não há concordância entre as características puberais e o sexo dos pacientes. Puberdade precoce periférica no sexo feminino: ❖ Isossexual ▪ Cistos ovarianos autônomos; ▪ Tumor ovariano ou adrenal feminizante; ▪ Iatrogênica; ▪ Síndrome de McCuneAlbright (mutações ativadoras no gene GNAS1); ▪ Síndrome do excesso de aromatase (mutações ativadoras no gene CYP19, aumento do estradiol); ▪ Hipotireoidismo primário (associado à síndrome de van wyk-grumback). Síndrome de McCune-Albright SMA é uma condição clínica esporádica e heterogênea caracterizada principalmente por uma tríade clássica: manchas café com leite com bordas irregulares (85%), displasia óssea fibrosa poliostótica (97%) e puberdade precoce periférica (52%). Ela é mais frequente no sexo feminino. A base molecular da SMA consiste em mutações somáticas ativadoras pószigóticas do gene GNAS1 que codifica a subunidade alfa da proteína Gs, resultando no incremento da atividade da adenilciclase e produção elevada de monofosfato de adenosina (AMP) cíclico intracelular, conferindo secreção autônoma a glândula em particular (tecidos endócrinos, gônadas, tireoide e adrenal) ou seja, aumenta a produção dos hormônios periféricos, de melanina conferindo a puberdade precoce e as manchas no corpo. Esta mutação também é demonstrada nas lesões cutâneas café com leite e nas lesões ósseas da displasia fibrosa. Síndrome de McCuneAlbright. A. Menina de 4 anos com telarca precoce, mancha café com leite em abdome e membro inferior esquerdo. B. Radiografia de úmero e fêmur esquerdo revelando lesões líticas. Síndrome de Van Wyk-Grumbach Se caracteriza por de hipotiroidismo primário longa duração grave e não tratado, associado à puberdade precoce. Nessa síndrome o TSH está elevado, podendo atuar sobre os receptores do FSH, provocando efeitos gonadotróficos. É caracterizada também por retardo na idade óssea e crescimento deficiente. ❖ Heterossexual (aumento dos andrógenos) ▪ Hiperplasia adrenal congênita (mutações inativadoras nos genes CYP21A2, CYP11 e HSDB2); ▪ Tumor ovariano ou adrenal virilizante; ▪ Síndrome de resistência ao cortisol (mutações inativadoras no gene do receptor do glicocorticoide); ▪ Iatrogênica Hiperplasia adrenal congênita (deficiência de 21 OHP) * Enzimas estimuladas pelo hormônio adrenocorticotrófico (ACTH). Na hiperplasia adrenal congênita (HAC), há comprometimento da produção de cortisol, por deficiência enzimática (21hidroxilase ou CYP21A2), então ocorre hipersecreção secundária de hormônio adrenocorticotrófico (ACTH), resultante da ativação do feedback positivo. Esse excesso de ACTH estimula continuamente o córtex adrenal, promovendo tanto sua hiperplasia, como a hiperfunção das vias de síntese não comprometidas pela deficiência enzimática. Dessa forma pode haver combinação da deficiência de glicocorticoide associado a excesso de andrógenos. Puberdade precoce periférica no sexo masculino: ❖ Isossexual → Causas adquiridas - Tumores adrenais; -Tumores secretores de hCG (hepatomas, corioepiteliomagonádico, teratomas extragonádicos); - Tumores testiculares; - Hipotireoidismo primário; → Causas genéticas - Hiperplasia adrenal congênita; - Testotoxicose (mutações ativadoras no gene do receptor do LH); - Síndrome de McCuneAlbright (mutações ativadoras no gene GNAS1); - Hipoplasia adrenal congênita (mutações no gene NR0B1, antigo DAX1); - Síndrome de resistência ao cortisol (mutações inativadoras no gene do receptor do glicocorticoide) ❖ Heterossexual → Causas adquiridas - Tumor feminizante testicular ou adrenal → Causas genéticas -Síndrome do excesso de aromatase (mutações ativadoras no gene do receptor da aromatase aumentando o estradiol – comum em indivíduos obesos, quem tem muito tecido adiposo pode ter aumento da conversão de testosterona para estradiol); - Iatrogênica. Diagnóstico A distinção entre PPC e PPP tem implicação direta na opção terapêutica, devendo constituir o primeiro passo frente ao quadro clínico de puberdade precoce progressiva. História Clínica ▪ Idade de aparecimento e ritmo de evolução dos caracteres sexuais secundários (mamas e pelos pubianos nas meninas e aumento de testículos e pelos pubianos nos meninos); ▪ Ocorrência de sangramento vaginal esporádico ou cíclico; ▪ Uso de medicamentos que contenham esteroides; ▪ Relatos de traumatismos, infecções do SNC e sintomas neurooftalmológicos; ▪ Antecedentes pessoais (condições de parto, período neonatal, doenças crônicas); ▪ Avaliação do crescimento linear; ▪ História familiar de precocidade sexual. Exame físico Para avaliar a puberdade é preciso analisar: 1. Curva de crescimento; 2. Volume testicular; 3. Caracteres sexuais secundários (Mashall e Tanner: estágios 1 a 5): Desenvolvimento em meninas, segundo os estágios de Tanner. Desenvolvimento em meninos, segundo os estágios de Tanner. Avaliação complementar → Exames hormonais ▪ FSH, LH, testosterona (meninos), estradiol (meninas) ▪ Pelo método imunofluorimétrico (IFMS), nível basal de LH >0,6 UI/L é considerado elevado. ▪ A presença de níveis baixos de LH não exclui a possibilidade de ser PCC, sendo necessário o teste de estimulo de GnRH (solicitado em casos de dúvida). Se quando o LH for estimulado o resultado vier aumentados é PPC, se o resultado não aumentar é porque o problema é periférico; ▪ Teste de GnRH: 100mcg de GnRH EV com dosagens de LH e FSH (0, 30, 60, 90 e 120 min). Um pico de LH> 9,6 U/I (meninas) e 6,9 UI (meninos) por IFMA indica PPC. ▪ Idade óssea, na PPC há avanço da IO de forma desproporcional à velocidade de crescimento; ▪ USG pélvica: permite avaliar diâmetro do útero e ovários e presença de cistos ou imagens neoplásicas (USG abdominal está indicado na avaliação de tumores adrenais); ▪ RM de sela turca PPC. Variantes do desenvolvimento puberal normal Telarca precoce isolada (TPI) Representa o aumento unilateral ou bilateral das mamas nas meninas antes dos 8 anos de idade sem outros sinais de maturação sexual. Laboratorialmente, as pacientes com TPI apresentam valores de gonadotrofinas e esteroides sexuais dentro da faixa prépuberal normal. A idade óssea, diferentemente das formas completas de precocidade sexual, não se encontra avançada. A ultrassonografia (US) pélvica pode ser útil na distinção entre TPI e estágios iniciais da puberdade precoce. Pubarca precoce isolada (PPI) Consiste no aparecimento isolado dos pelos pubianos antes dos 8 anos de idade nas meninas e dos 9 anos de idade nos meninos, sem outros sinais de virilização ou maturação sexual. A etiologia da adrenarca não é conhecida e tem sido atribuída à maturação prematura da zona reticular do córtex adrenal, levando ao aumento dos andrógenos adrenais, o que, por sua vez, leva ao aparecimento prematuro da pubarca. O aparecimento de odor e pelos axilares, acne, aumento da velocidade de crescimento e discreto avanço da idade óssea podem ser também observados, porém sem comprometimento da estatura final e da progressão da puberdade. Sangramento vaginal precoce isolado O sangramento vaginal isolado, acíclico, pode ocorrer na fase prépuberal, sem outros sinais puberais e sem anormalidades dos genitais. Nos casos não relacionados ao estímulo hormonal, não há avanço de idade óssea nem evidência de reativação do eixo gonadotrófico, estando os valores de gonadotrofinas e estradiol na faixa prépuberal. Recomenda-se investigação clínica, incluindo história detalhada para afastar possíveis traumatismos ou manipulações, bem como exame da genitália externa. Hemangiomas e verrugas intravaginais, incisões vaginais, vaginites, doença inflamatória pélvica, corpo estranho intravaginal, prolapso e carúncula de uretra, líquen escleroso e abuso sexual também podem ser causa de sangramento vaginal não hormonal em meninas prépúberes. As causas hormonais incluem ingestão de estrógenos exógenos, puberdade precoce, síndrome de McCuneAlbright e tumores ovarianos. Tratamento Puberdade precoce central: O tratamento tem como principais objetivos: ▪ Detectar e tratar as lesões expansivas intracranianas; ▪ Interromper a maturação sexual até a idade normal para o desenvolvimento puberal; ▪ Promover a regressão ou a estabilização dos caracteres sexuais secundários; ▪ Desacelerar a maturação esquelética; ▪ Preservar o potencial de estatura normal (dentro do intervalo da estaturaalvo); ▪ Evitar desproporções corporais; ▪ Prevenir os problemas emocionais da criança e aliviar a ansiedade dos pais; ▪ Reduzir o risco de abuso sexual e o início precoce da atividade sexual; ▪ Prevenir a ocorrência de gestação em idade precoce; Puberdade precoce periférica O tratamento clínico da PPP é constituído pela administração de medicamentos que bloqueiem a síntese ou a ação dos esteroides sexuais. As opções terapêuticas incluem: agentes progestacionais, antiandrogênicos (espironolactona e acetato de ciproterona), derivados imidazólicos (cetoconazol), moduladores seletivos do receptor de estrógeno (tamoxifeno) e inibidores da aromatase (anastrozol e letrozol). Caso clinico 1 Virginia, sexo feminino, 7 anos, natural e procedente de Feira de Santana, comparece a consulta acompanhada pela mãe com história de ter apresentado nos últimos 8 meses, aumento do volume mamário e aparecimento de pelos em região pubiana. Nega sangramento vaginal. AP: nega patologias; AG: gestação sem intercorrências. Nascida de parto cesariano e a termo, com peso 3kg e 51cm de comprimento. AF: genitor com história de HAS e obesidade, genitora com história de puberdade precoce. DNPM: sem alterações. Exame físico: ao exame paciente hidratada, normocorada, ativa. TA 90x60 mmHg e PR 80bpm. ACV: Bulhas em 2t sem sopros. AR: MVBD sem RA. Abdome: sem alterações. Desenvolvimento puberal: tanner M3P2. Avaliação complementar: - Idade óssea: 10 anos (IC 07 anos) - USG pélvica: útero e ovários com volumes aumentados para a idade. - RM de sela turca: normal - Exames hormonais: estradiol elevado e LH > 0,6UI/I método imunofluorimétrico (IFMA). A paciente possui uma puberdade precoce do tipo central e isosexual uma vez que os caracteres sexuais da paciente são femininos. Caso clinico 2 Mariana, sexo feminino, 5 anos, natural e procedente de Amargosa, comparece a consulta acompanhada pela mãe com história de ter apresentado nos últimos três meses, aumento do volume mamário e aparecimento de pelos em região pubiana. Informa que apresentou um episódio de sangramento vaginal no ultimo mês. AP: nega alterações. AG: gestação sem intercorrências. Nascida de parto cesariano e a termo, com peso de 3100kg e 50 cm de comprimento AF: genitor com história de DM tipo e genitora Com HAS. Nega história de puberdade precoce na família. DNPM: sem alterações. Exame físico: ao exame paciente hidratada, normocorada e ativa. TA 90X60mmHg e PR 80 bpm. ACV: bulhas taquicardicas em 2t. AR: MVDB sem RA. Abdome: massa no quadrante inferior direito abdominal, móvel, endurecida, irregular, indolor. Desenvolvimento puberal: Tunner M3P2. Exames complementares e evolução: - USG abdome total: massa em ovário direito com 12cm de diâmetro. - Estradiol e progesterona elevados séricos. - Foi ressecado tumor ovariano sólido-cístico à direita. Não foram evidenciadas ascite ou metástases intra-abdominais. - Exame histopatológico: tumor de células da granulosa. -Evoluiu satisfatoriamente com normalização dos níveis de estradiol e progesterona após 30 dias de ressecção A paciente possui uma puberdade precoce do tipo periférica (tumor) e classificação isosexual, uma vez que os caracteres sexuais são femininos. Resumão do Villar Classicamente, a puberdade é considerada precoce quando o aparecimento dos caracteres sexuais secundários ocorre antes dos 8 anos de idade no sexo feminino e antes dos 9 anos no sexo masculino. A puberdade precoce pode ser central (PPC) ou periférica (PPP). A PPC é mais frequente no sexo feminino (3 a 23:1), sobretudo a forma idiopática, caracterizada por ausência de lesões orgânicas no sistema nervoso central (SNC). A PPC orgânica é mais comum em meninos (33 a 90% dos casos de PPC) do que em meninas (8 a 30%) e resulta de lesões congênitas ou adquiridas do SNC (p. ex., hamartoma hipotalâmico, cistos aracnoides, hidrocefalia, tumores etc.). Análogos do hormônio liberador de gonadotrofina (GnRH) de ação prolongada são o tratamento de escolha da PPC. A PPP, também denominada pseudopuberdade precoce ou independente de gonadotrofinas, é decorrente da secreção autônoma de esteroides sexuais de origem principalmente gonadal, adrenal ou exógena, independentemente da ativação do eixo gonadotrófico. A PPP é muito mais rara do que a PPC e pode decorrer de distúrbios genéticos (p. ex., hiperplasia adrenal congênita, síndrome de McCuneAlbright, testotoxicose etc.) ou doenças adquiridas (p. ex., hipotireoidismo primário; tumores ovarianos, testiculares ou adrenais; tumores extragonadais produtores de gonadotrofina coriônica humana [hCG] etc.). Literatura recomendada/fontes: ✓ Livro: Endocrinologia clínica: Lucio Villar ✓ Diretriz de diabetes mellitus: SBD
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