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07HerançaQuantitativa

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DBM/CCEN/UFPb –Princípios de Análise Genética (Genética II) 
07 – Estudo Dirigido: Herança Quantitativa 
 Mendel assentou os fundamentos da Genética através do estudo das diferenças que dividiam suas 
ervilhas em classes ou categorias claramente distintas - VARIAÇÃO DESCONTÍNUA, e foi assim capaz de 
inferir os genes, de cujo comportamento depende a transmissão hereditária. 
 No entanto, nos seres vivos, várias características de natureza quantitativa ou métrica variam de 
maneira contínua, e essa variação é determinada por vários genes, mas cujos efeitos não podem ser 
prontamente discernidos a não ser através de métodos biométricos que medem a variação e a interpreta em 
termos mendelianos. 
 Na segunda metade do século XIX, Galton, usando parâmetros estatísticos, propôs que deveria existir 
um componente hereditário na variação contínua e Johannsen, no início do século XX, e através de 
experimentos cuidadosamente delineados, evidenciou que a variação fenotípica de caracteres quantitativos 
inclui um considerável componente não genético, ambiental. Apesar de Bateson em 1902 e de Yule em 1906 
terem sugerido que a segregação de um grande número de genes poderia explicar a variação descontínua, 
foram os trabalhos de Nilsson-Ehle, na Suécia, e de East, nos Estados Unidos, desenvolvidos de 1908 a 1916, 
que criaram a base biológica da herança quantitativa fundamentada nos princípios mendelianos. Embora 
Fisher, num clássico trabalho de 1918, tenha dado as bases daquilo que presentemente entendemos por 
genética biométrica, foi Mather e colaboradores que desenvolveram, a partir da década de 40, técnicas 
biométricas apropriadas para a análise dos poligenes, evidenciando seus atributos de ligação, recombinação e 
segregação. 
 Importante aqui ressaltar que os sistemas poligênicos tem propriedades específicas, uma das quais é 
o armazenamento de variabilidade pela ação de um número maior ou menor de alelos de diferentes genes, 
que se contrabalançam no genótipo. A recombinação libera a variabilidade latente por perturbar o equilíbrio de 
tal forma que os poligenes que operam no mesmo sentido são aproximados e a ação da seleção é, deste 
modo, facilitada. A liberação de variabilidade genética pode também ser explicada como devida a um acúmulo 
de mutações específicas. 
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 No início da Genética, pensava-se que havia uma diferença fundamental na essência das 
características qualitativas e quantitativas. Um dos exemplos clássicos que auxiliaram a compreensão e a 
solução dessas dúvidas entre os dois tipos de características, foi o modelo de gene múltiplo desenvolvido por 
Nilsson-Ehle, para explicar a cor do grão de trigo. 
 Quando ele cruzou uma variedade de grãos vermelho muito escuro com outra de grãos branco, 
observou que na F1 apareciam apenas plantas com grãos vermelho intermediário e que na F2, apenas 2/16 
se apresentavam com os fenótipos parentais, ou seja, 1/16 eram de grãos vermelho muito escuro e 1/16 de 
grãos brancos. Ele interpretou os resultados em termos de dois locos gênicos, cada um com dois alelos e 
exibindo efeito cumulativo. 
 Algumas outras variedades de trigo de grãos vermelho muito escuros, quando cruzadas com 
variedades de grãos brancos, também exibiam na F1 apenas fenótipo intermediário, mas na F2 somente 1/64 
eram de grãos brancos e 1/64 de grão vermelho muito escuros. Aqui os resultados podem ser interpretados 
em termos de três locos gênicos. 
É evidente que com 3 locos gênicos, na F2, a gradação de matizes de vermelho é muito maior do que 
no caso anterior, e maior será se imaginarmos 4 ou 5 genes segregando (seria mesmo muito difícil distinguir 
as diferenças tão sutis de matizes). 
 Portanto, esses modelos múltiplos de genes, que são adequados para explicar certos exemplos nos 
quais a variação descontínua é ainda evidente, são úteis (por expansão do conceito, incluindo um número 
maior de genes e também as influências ambientais) para a compreensão da origem das variações contínuas 
caracterizando traços verdadeiramente quantitativos 
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 Os primeiros trabalhos sobre Genética Quantitativa em microrganismos, particularmente aquele sobre 
tamanho e esporos em Coprinus esterquilinus, ainda na década de 20, não foram muito além, em suas 
conclusões, dos conceitos emitidos por Johannsen. Mesmo na década de 40, trabalhos sobre fermentação de 
açúcares por leveduras, revelaram uma situação similar àquela que o foi pelo clássico trabalho de Nilsson-
Ehle em trigo, ou seja, a ocorrência de genes duplicados com efeitos aditivos - genes poliméricos. No final da 
década de 50, trabalhos sobre tamanho de ascósporos em Neurospora crassa, forneceram evidências diretas 
de vários atributos dos poligenes, como dominância, ligação, segregação, recombinação e interação gênica, 
contribuindo para fixar o conceito de que os poligenes e os "genes maiores" (major genes) são 
fundamentalmente similares. Na década seguinte, vários trabalhos que fizeram uso da metodologia biométrica 
de Mather foram reportados, enfocando aspectos tais como estimativa da herdabilidade, número e localização 
de fatores efetivos (blocos gênicos), ligação entre poligenes e genes maiores e modo de ação dos genes. 
(para referências vide: Pateman e Lee, 1960; Burnett, 1975; Catem e Jinks, 1976). 
 Em microrganismos, particularmente fungos filamentosos e leveduras, várias características de 
importância econômica apresentam variação contínua, e a genética quantitativa tem contribuído para a 
microbiologia industrial, não só para o adequado delineamento de programas de seleção, como também 
tornando familiar um abordagem biométrica - delineamento experimentais, testes de significância, estimativas 
de parâmetros - adequada para um melhor entendimento da variação quantitativa. Assim, nos últimos 25 anos, 
vários trabalhos que utilizam metodologias de análise biométrica e de genética quantitativa foram relatados 
(para referências vide: Andrade et al., 1995). 
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 HERANÇA QUALITATIVA HERANÇA QUANTITATIVA 
1 Caracteres de tipo Caracteres de grau (métricas) 
2 Variação descontínua; classes fenotípicas 
distintas. 
Variação contínua; medidas fenotípicas formam 
uma gradação. 
3 Efeito discernível de um único gene (ou de 
alguns poucos genes) 
Controle poligênico; os efeitos de um único 
gene são por demais reduzidos para serem 
identificados. 
4 Concernente a acasalamentos individuais e 
suas progênies. 
Concernente às populações de organismos, 
representando todas as possibilidades de 
acasalamentos. 
5 Analisados por contagem e por razões 
proporcionais. (3:1, 1:2:1, 9:3:3:1, 9:7, etc) 
Análises estatísticas fornecem estimativas de 
parâmetros, tais como, média, desvio padrão, 
variância, regressão, correlação. 
6 Variabilidade fenotípica com um componente 
ambiental relativamente grande 
 
MÉTODOS USADOS NO ESTUDO DE CARACTERES QUANTITATIVOS 
 
 Os métodos usuais da Genética Qualitativa não podem ser usados nas investigações envolvendo 
caracteres quantitativos, não só pelo grande número de genes envolvidos, mas também por serem eles mais 
sujeitos às variações ambientais. Enfim, as diferenças de metodologias são devidas ao fato das características 
qualitativas exibirem variação descontínua e os quantitativos exibirem variação contínua. 
 Os métodos aplicados são dos mais diversos tipos, dependendo das condições, das finalidades da 
pesquisa, dos genótipos disponíveis, etc. Como em geral os fenótipos observados (produção, peso, altura, 
volume,...), são obtidos por mensurações, calculam-se médias, desvios padrão, variâncias, coeficientes de 
regressão, coeficientes de correlação, etc. Com isso, conclusões genéticas são tiradas, as quais podem ser 
úteis tanto para o geneticista como para o melhorista ou por pesquisadores interessados em evolução. 
 
I. análise genética de caracteres quantitativosempregando-se médias 
(tipos de ação/interação dos genes/alelos)Exercício 1: Na AÇÃO ADITIVA, cada alelo contribui para a expressão fenotípica do caráter com uma 
determinada parcela, independente dos demais locos. É como se os efeitos de todos os alelos se somassem 
para produzir o fenótipo final. Vamos supor então, que um dado caráter seja determinado por dois pares de 
alelos (loco A e loco B) e que cada alelo contribua para o fenótipo com os seguintes valores (poderiam ser 
unidade altura ou comprimento, intensidades de cor, unidade de peso): A1 = 2; A0 = 1; B1 = 6; B0 = 3 
A partir do cruzamento A1A1B1B1 x A0A0B0B0 
a) indicar os genótipos e os respectivos valores fenotípicos em P e em F1 
b) indicar os genótipos e os respectivos valores fenotípicos em F2, bem como suas frequências (construir um 
histograma) 
d) caracterizar esse tipo de herança com base na comparação das médias e na forma de distribuição dos 
valores da F2 
 
Exercício 2: Na AÇÃO DOMINANTE, cada loco exibe o fenômeno da dominância. Consideremos dois locos, A 
e B, de modo que: A1A1 ou A1A0 = 2, A0A0 = 1; B1B1 ou B1B0 = 6, B0B0 =3 
A partir do cruzamento A1A1B1B1 x A0A0B0B0 
a) indicar os genótipos e os respectivos valores fenotípicos em P e em F1 
b) indicar os genótipos e os respectivos valores fenotípicos em F2, bem como suas frequências (construir um 
histograma) 
d) caracterizar esse tipo de herança com base na comparação das médias e na forma de distribuição dos 
valores da F2 
 
Exercício 3: A AÇÃO HETERÓTICA é um tipo especial de interação alélica onde o heterozogoto apresenta 
valor superior a qualquer um dos homozogotos. Consideremos dois locos gênicos, A e B, de modo que: 
A1A1 = 2, A0A0 = 1, A1A0 = 5; B1B1 = 6, B0B0 = 3, B1B0 = 8 
A partir do cruzamento A1A1B1B1 x A0A0B0B0 
a) indicar os genótipos e os respectivos valores fenotípicos em P e em F1 
b) indicar os genótipos e os respectivos valores fenotípicos em F2, bem como suas frequências (construir um 
histograma) 
d) caracterizar esse tipo de herança com base na comparação das médias e na forma de distribuição dos 
valores da F2 
 
Os tipos de ação/interação vistos são considerados os mais importantes relacionados com a herança 
dos caracteres quantitativos. Entretanto, podem existir outros tipos, especialmente interações gênicas (não 
alélicas) conhecidas como EPISTASIA. Tal ação é muito difícil de ser analisada na prática. 
 É importante ficar bem claro que os genes que condicionam uma característica quantitativa podem não 
ter todos o mesmo tipo de ação; parte deles pode exibir ação aditiva, outros ação dominante e ainda outros 
podem apresentar ação heterótica ou mesmo epistasia. A preponderância de um ou outro desses tipos de 
interação na herança de um determinado caráter, tem marcante influência no efeito da seleção sobre o 
mesmo. 
Pergunta: Qual apresentaria melhor resposta a seleção num programa de melhoramento? 
Resposta: a ação aditiva 
Justificativa:............. 
Exemplo 1: comprimento médio de espigas de milho (cm) 
 
Raça A (PA) 6,6 
Raça A (PB) 16,8 
A x B (F1) 12,9 
 Observe que a média de F1 não é muito diferente da média aritmética dos dois tipos paternais; isso 
indica que 
a) os alelos envolvidos................ dominância 
b) mas, é possível que................. 
 
 
 
 
Exemplo 2: produção média de leite em gado bovino (l/ano) 
 
Raça Zebu (PA) 1716 
Raça Holandesa (PB) 2258 
Mestiça (F1) 2595 
 Observe que a média de produção das mestiças, nas condições do experimento, foi até superior a das 
holandesas, ou seja, parecer estar havendo......................................................É possível porém que o que 
esteja ocorrendo seja........................... e mesmo assim as mestiças produzam mais. Para que isso ocorra, 
basta que uma das raças tenha alguns...............para alta produção nos locos em que a outra raça tenha os 
..............para baixa produção. 
 
 
 
 
II. análise genética de caracteres quantitativos empregando-se variância 
(cálculo da herdabilidade) 
 
 O emprego só de médias na análise genética de caracteres quantitativos, muitas vezes não é 
suficiente. As médias dão uma idéia da variabilidade e, como se sabe, a variabilidade é fundamental na 
seleção. Para medir a variabilidade emprega-se a variância (s
2
). 
 No experimento com as raças de milho de espigas curtas e longas (exemplo 1), a variabilidade para o 
comprimento da espiga pode ser observada abaixo: 
 
 média variância 
Raça A (PA) 6,6 0,67 
Raça A (PB) 16,8 3,57 
A x B (F1) 12,9 2,31 
F1 xF1 (F2) 12,9 5,06 
 
Com esses dados, podemos calcular e conceituar HERDABILIDADE 
CARACTERÍSTICAS COM LIMIAR (DE UMBRAL) 
 
 Características com limiar são aquelas que apresentam variação descontínua, mas cuja herança é 
poligênica. Entre os melhores exemplos conhecidos, citam-se aqueles relativos a resistência a doenças, na 
qual pos indivíduos podem ser classificados em duas classes - resistentes ou susceptíveis. Vários ou muitos 
genes podem contribuir para a distinção entre resistentes ou susceptíveis. A resistência, requerendo um certo 
número de ou proporção de alelos ativos, representaria o limiar ou umbral da ação gênica. As características 
com limiar são, muitas vezes, fortemente influenciadas pelo ambiente (como é realmente de se esperar). 
 Wright (1934), cruzando uma linhagem de cobaia normal com outra polidáctila obteve, na F1, na F2 e 
nos retrocruzamentos, resultados que não se ajustavam a qualquer hipótese monogênica. Ele propôs, então, 
que essas linhagens diferiam em 4 pares de genes: a linhagem I, normal, sem alelos para polidactilia 
(A1A1B1B1C1C1D1D1) e a linhagem II, afetada, com 8 alelos para polidactilia (A2A2B2B2C2C2D2D2). Os indivíduos 
de F1 possuiriam 4 alelos para polidactilia e quatro para normalidade (A1A2B1B2C1C2D1D2). A probabilidade de 
um animal de qualquer geração ter dedos extras, dependeria do número de alelos para polidactilia nele 
presente. Somente expressaria o caráter, todavia, aqueles animais que ultrapassassem certo limiar. No caso 
presente, que possuíssem cinco ou mais alelos para polidactilia. Os animais da F1 eram normais, pois 
possuiam apenas 4 alelos para polidactilia. Os indivíduos da F2 distribuir-se-iam em 9 classes genotípicas (de 
com zero a com oito alelos para polidactilia). 
 Estudos subsequentes ao de Wright, e agora envolvendo tumores hereditários, tamanho de caudas e 
número de dentes em ratos, etc, foram também interpretados de maneira semelhante. 
 Caracteres com limiar que segregam em duas classes fenotípicas, são chamados alternativos. Um 
outro caráter alternativo e conhecido em ratos é a ataxia. Os atáxicos andam sem direção, muitas vezes em 
círculos com a cabeça inclinada e com a cauda usualmente balançando para frente e para traz. Cruzamentos 
feitos entre atáxicos e normais, de uma mesma linhagem consanguínea, bem como cruzamentos de atáxicos 
com normais não relacionados (e retrocruzamentos subsequentes), produziram proporções fenotípicas que 
não puderam ser interpretadas com base em um ou poucos locos gênicos. Concluiu-se que há muitos genes 
influenciando o centro de locomoção em ratos e que a ataxia representa a ação cumulativa de alelos mutantes 
em um certo número de locos. 
 Características com limiar podem, entretanto, segregar em muitas classes fenotípicas descontínuas. O 
número de dedos, dentes ou vértebras em um animal são exemplos. Da mesma forma temos em milho o 
número de fileiras de grãos nas espigas, que pode ser 8, 10, 12, 14 e assim por diante. Quando variedades de 
8 e de 16 fileiras são cruzadas, a média dos híbridos F1 é de 12 fileiras, mas uma variação de 8 a 16 é 
observada na F2. Para uma planta qualquer, o número de fileiras é uma função do limiar de genes atuando 
sob um certo conjunto de condições ambientais 
 
 A maioria das manifestações em plantas e animais pluricelulares resulta da ação e interação de muitos 
locos. A variação descontínua é observada quando um ou poucos genes estão segregando, mas pode 
também ser observada quando muitos genes estãosegregando e ocorre efeito de limiar. A variação contínua 
usualmente ocorre quando muitos genes estão segregando, particularmente quando a variação ambiental 
obscurece a capacidade de distinguir fenótipos individuais.

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