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A APLICAÇÃO DA TEORIA DA LEGÍTIMA DEFESA ANTECIPADA NOS CASOS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR THE APPLICATION OF THE THEORY OF LEGITIMATE DEFENSE IN CASES OF DOMESTIC AND FAMILY VIOLENCE Geicy da Silva Lopes1 Vicente Celeste de Oliveira Junior2 Resumo: Sendo classificada como uma das causas de exclusão da ilicitude, a legítima defesa significa repelir uma agressão injusta, atual ou iminente, utilizando os meios necessários de forma moderada. A grande questão e problemática com a aplicação dessa exclusão é o fato de se exigir uma situação de violência atual ou iminente, o que não ocorre em casos específicos de violência doméstica e familiar. Porque a violência doméstica geralmente persiste por meses e anos de forma usual, sendo necessário então aguardar a iminência da agressão para a vítima agir. Os altos números nas estatísticas de violência doméstica merecem uma análise mais detalhada, considerando que qualquer ação para mitigar esses altos índices deve ser verificada. Palavras-chave: Agressão doméstica. Legítima defesa preordenada. Exclusão de ilicitude. Abstract: Being classified as one of the causes of exclusion of illegality, the legitimate defense means to repel an unjust aggression, current or imminent, using the necessary means in a moderate way. The big issue and problem with the application of this exclusion is the fact that a situation of current or imminent violence is required, which does not occur in specific cases of domestic and family violence. Because domestic violence usually persists for months and years in the usual way, it is then necessary to wait for the imminence of aggression for the victim to act. The high numbers in domestic violence statistics deserve a more detailed analysis, considering that any action to mitigate these high rates must be verified. Keywords: Domestic aggression. Legitimate preordained defense. Exclusion of illegality. 1 Acadêmica do curso de Direito da Instituição de Ensino Superior (IES) da rede Ânima Educação. Email: geicylopessilva24@gmail.com 2 Orientador: Prof. Vicente Celeste de Oliveira Júnior. Curso de Extensão Universitária (UnB/UERN/UnP). Graduado em Direito (UnB/UnP). Especialista em Direito Civil e Processo Civil (UFRN). Especialista em Educação (UERN). Mestrado em Ambiente Tecnologia e Sociedade (Meio Ambiente - UFERSA - dissertação: Direito e Inclusão). Mestrado em Educação (dissertação: Sistema Prisional Federal - UERN). Cursa o Doutorado em Arquitetura e Urbanismo (tese: História da Arquitetura e o Poder - UFRN). Autor de livro (Brasília/DF) e autor de capítulo de livro pelo Doutorado em Educação (UERJ). É citado em 452 artigos científicos no Brasil e exterior, segundo o site: ACADEMIA (trabalhos acadêmicos e pesquisas). Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/8755911560333981 2 1. INTRODUÇÃO A violência doméstica é uma problemática que expõe os padrões tanto da sociedade como do ordenamento jurídico. Nessa situação, perante uma sociedade que prefere se calar e de um Estado carente de proteção, muitas vezes as vítimas são obrigadas a agir para evitar males maiores, essas atitudes com o objetivo de proteção nem sempre ocorrem diante de agressões iminentes ou atuais (requisito da legítima defesa clássica). Vale destacar que essas mulheres vêm de uma sequência de violências, não apenas de uma única agressão, sendo assim, essas situações devem ser analisadas detalhadamente, pois existem institutos raramente mencionados que podem ser solicitados nesses casos. A inexigibilidade de conduta diversa, segundo a doutrina hodierna, é conceituada como uma condição geral de culpa, somente se aplica aqueles que agiram quando poderiam agir diferente ou então não agir. Parte dos ensinamentos entende a defesa antecipada como um pressuposto para aplicação da inexigibilidade de conduta diversa, que poderia ser também usada para despenalização desses casos que a vítima atua contra aquele que a agride. O trabalho vai analisar o comportamento dessas mulheres que sofrem violência doméstica e familiar, que usam dos meios cabíveis para defender sua vida, principalmente quando essas atuações não são respaldadas pelo instituto da defesa comum, analisando a viabilidade da aplicação da legítima defesa antecipada, aos casos em que se suprime a iminência da agressão, que é indispensável ao acatamento da legítima defesa comum. Temos como objetivos específicos explicar o histórico de violência contra a mulher no Brasil e sua posterior proteção através da Lei Maria da Penha, e os fatores que impulsionaram sua implementação. Em seguida, será verificado os dados estatísticos relativos ao feminicídio e homicídio de mulheres no Ceará, os dados foram coletados por meio de pesquisas no Fórum Brasileiro de Segurança Pública. Por fim, verificaremos, nas doutrinas e nas jurisprudências, as possíveis aplicações da chamada legítima defesa antecipada e de causas supralegais da inexigibilidade de conduta diversa, averiguando a viabilidade de aumentar as disposições legais que garantem que as mulheres que se encaixam nos requisitos não serão penalizadas pelos comportamentos típicos analisados. Será feita uma pesquisa qualitativa e a problemática será respondida utilizando-se da pesquisa bibliográfica e análise 3 documental, tendo em vista que será analisado a possibilidade do acatamento de teses doutrinária partindo de casos concretos. Nesse trabalho adotaremos como referência a tese de legítima defesa antecipada do juiz federal e professor da universidade federal fluminense, William Douglas publicada pela revista dos tribunais nº 715, e a análise das possibilidades de aplicação desse instituto com base na teoria da responsabilidade, de Claus Roxin, que afirma que não é necessário aplicar uma sanção penal, quando o agente mesmo praticando um ato ilícito, não necessita ser ressocializado. Também serão abordados a teoria da conduta finalista do jurista e filósofo Hans Wenzel, a normalidade concorrente das circunstâncias do advogado Frank e a concepção bipartidária do crime também serão discutidas. A aplicação da inexigibilidade de conduta diversa ou então da tese da legítima defesa antecipada aos casos em que mulheres praticam crimes no ambiente violento das relações, fora dos casos que já suportados pela legítima defesa clássica, é algo pouco discutido pela doutrina. Nesse sentido, é imprescindível analisar se é necessário ou não uma legislação que insira uma causa exculpante que exclua a exigência de um comportamento diferente em casos que mulheres, nesse contexto, venham a praticar crimes em razão da violência doméstica que, pelo cenário, seria inaplicável um comportamento diferente. Seguindo os estudos de Fernando Capez (2017) e Damásio de Jesus (2014), segundo a concepção dicotomia, a culpabilidade é condição para a aplicação da pena. É nessa condição que este artigo se debruçará, analisando a possibilidade e afastar a culpabilidade, pois não sendo requisito de crime, haverá crime, mas seu autor não será punido. A exigibilidade da conduta diversa é uma das temáticas deste trabalho, e segundo a teoria da normalidade das circunstâncias de Frank (1930, p. 23), para ser considerada culpada, a conduta deve ser praticada em circunstâncias normais, caso contrário, não será possível pedir comportamentos diferentes daqueles efetivamente praticados. Essa definição se encaixa perfeitamente no caso de mulheres vítimas de violência doméstica que em razão disso praticaram algum comportamento típico, também seria incoerente exigir que a vítima abalada emocionalmente e psicologicamente pela agressão, aja conforme o direito. 4 2. A LUTA CONTRA VIOLÊNCIA DA MULHERE A SUA EFICÁCIA NO BRASIL APÓS A LEI MARIA DA PENHA 2.1 ORIGENS E CLASSIFICAÇÃO DA VIOLÊNCIA DOMÉSTICA A violência doméstica é uma espécie de discriminação que incide principalmente, sobre as mulheres, nenhum outro setor da sociedade é tão atingido por esse tipo de violência. Segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública junto ao Instituto Datafolha, em cada 4 mulheres brasileiras (24,4%) com mais de 16 anos afirma que sofreu alguma violência ou agressão nos últimos 12 meses, durante a pandemia de covid-19. Isso significa dizer que existe uma estimativa de que 17 milhões de mulheres sofreram algum tipo de violência no último ano. Perante a grave realidade, é primordial compreender as causas específicas dessa mazela e porque elas se perpetuam. Considerando a análise dos cinco componentes da violência doméstica por Bonita Meyersfeld (2010), que são: seriedade, continuidade do dano, intimidade, vulnerabilidade do grupo afetado e falência do Estado, parte da dificuldade é que esse tipo de violência se resume a uma continuidade de eventos, onde a gravidade da violência não deve ser medida pelo nível de dano físico deixado, mas sim pelo nível de vulnerabilidade que a vítima se encontra. As formas mais brandas de agressão também são graves quando ocorrem no contexto do ambiente doméstico e do nível de subordinação que a mulher está, como explica Meyersfeld (2010, p. 16): “os atos de violência que não são severos por eles mesmos, podem se tornar severos se eles induzem um contínuo ambiente de medo e controle do qual a vítima é incapaz de escapar”. A violência doméstica é como uma doença invisível, seja porque ainda é considerada natural pela sociedade, ou porque, de tão extremas, fazem com que a vítima fique desacreditada que tal situação possa ter mudança. Nesse sentido, ter uma vida íntima com o agressor dificulta que ela entenda que está em um relacionamento abusivo e, assim, saia dele. Em muitos casos, as vítimas são financeiramente dependentes do agressor e sentem-se compelidas a manter os laços familiares. “A intimidade ainda deixa a sensação que a violência doméstica é uma questão privada que a sociedade e o Estado não devem intervir”. (Bernardes; Costa; Oliveira, 2016). As mulheres muitas vezes relutam em procurar 5 ajuda de órgãos oficiais porque acreditam que são responsáveis pela violência e que o agressor tem todo o direito de fazê-lo, principalmente porque desacreditam do sistema de proteção estatal, por isso criam medo da violência que ocorrerá se elas fizerem uma reclamação. Uma das coisas que torna a violência doméstica uma mazela sistemática é a incompetência do Estado, que deixa de proporcionar às vítimas locais adequados e não capacita seus agentes para lidar com as peculiaridades dessa violência. Outra dificuldade é evidenciar a continuidade e a complexidade da violência, pois na maioria das vezes a agressão ocorre no ambiente do lar, o que resulta no isolamento da mulher e na impossibilidade de buscar apoio nas instituições estatais. A violência doméstica na esfera privada, aliada à incapacidade do Estado de lidar com ela na esfera pública, se traduz em opressão e subordinação do gênero. Então, é possível compreender que essa opressão e subordinação não são atos de pessoas isoladas, mas sim uma manifestação da toda sociedade, como expõe Márcia Nina Bernardes (2016, p. 22 - 23). [...] o poder não é um recurso individual que se pode ou não ter. Ele produz sujeitos e hierarquias sociais, nas quais direitos e privilégios são distribuídos aos indivíduos de acordo com a posição social que ocupam. É verdade que nem todo o membro de um grupo oprimido será uma “vítima passiva”. Há diferentes e sofisticadas formas para se explicar agência e empoderamento de indivíduos pertencentes a grupos sociais estruturalmente oprimidos. No entanto, tais indivíduos, empoderados ou não, terão de navegar através de obstáculos e desafios que não existem para outros indivíduos diferentemente posicionados na sociedade. Violência doméstica, como uma manifestação não rara de opressão, visa justamente a manter as hierarquias sociais, e a confirmar os indivíduos oprimidos ao “lugar ao qual pertencem”. 2.2 ATOS QUE ACARRETARAM O ADVENTO DA LEI MARIA DA PENHA O caso Maria da Penha representa a realidade de várias mulheres não só no Brasil como no mundo todo, a sua luta por justiça durou 19 anos, assim se tornando um símbolo pela luta da vida da mulher sem violência. Embora a letra da lei não mencione a nomenclatura Lei Maria da Penha, ela tem esse nome devido a história que levou a sua implementação. O que nos leva á cidade de Fortaleza, Ceará, no dia 29 de maio de 1983, quando Maria da Penha Maia Fernandes levou um tiro de seu marido, enquanto dormia. Em razão desse tiro, Maria ficou tetraplégica. No entanto, Marco Antônio (na época era seu marido) declarou a polícia de que havia se tratado de uma tentativa de assalto, versão que foi depois desmentida pela perícia. O primeiro 6 julgamento de Marco aconteceu somente em 1991, ou seja, 8 anos após o crime. O agressor foi condenado a 15 anos de prisão, mas foi apresentado recursos pela defesa e ele saiu do fórum em liberdade. O segundo julgamento só foi realizado em 1996, sendo ele condenado a 10 anos e 6 meses de prisão. Foram alegadas irregularidades processuais por parte dos advogados de defesa e mais uma vez a sentença não foi cumprida. Sendo somente em setembro de 2002, o réu ser efetivamente preso, passados mais de 19 anos da ação criminosa. Foi a própria Maria da Penha que buscou ajuda na Comissão Interamericana de Direitos Humanos, que resultou na publicação do Relatório 54/2001. Devido à grande repercussão do documento ressaltou mais ainda a necessidade de uma iniciativa legislativa que fosse mais efetiva na proteção à mulher. No relatório, é possível verificar o descumprimento do Estado brasileiro ao que foi disposto na Convenção Interamericana e na Convenção de Belém do Pará. Em casos específicos, o Comitê recomenda que o Estado realize investigações sérias para responsabilizar criminalmente o autor de Maria da Penha e apurar se existem fatos ou ações de agentes do Estado que impeçam o efetivo julgamento dos responsáveis, recomenda também que a vítima seja efetivamente compensada, como também, tomar medidas para eliminar a violência doméstica contra as mulheres. O relatório foi escrito enquanto o agressor ainda estava solto. Mesmo após a divulgação do relatório, o Brasil não respondeu os questionamentos da Comissão Interamericana de Direitos Humanos, descumprindo as obrigações ratificadas na convenção (Washington, 2001, p. 7). [...]O silêncio processual do Estado com respeito à petição contradiz a obrigação que assumiu ao ratificar a Convenção Americana em relação à faculdade da Comissão para “atuar com respeito às petições e outras comunicações, no exercício de sua autoridade, em conformidade com o disposto nos artigos 44 e 51 da Convenção”. A Comissão analisou o caso com base nos documentos apresentados pelos peticionários e outros elementos obtidos, levando em conta o artigo 42 de seu Regulamento. Com base na indiferença do Estado brasileiro, a comissão concluiu que todo os fatos trazidos na denúncia apresentada por Maria da Penha eram de fato verdadeiras, condenando o Estado ao pagamento de sessenta mil reais em favor da vítima. 7 3. A FALHA DO ESTADO NA FUNÇÃO E OBJETIVO DE PROTEGER 3.1 ANÁLISE SOBRE FEMINICÍDIO E HOMICÍDIO DE MULHERES NO CEARÁ (DADOS ESTATÍSTICOS) O Brasil mudou seu código penal em 2015, quando criou a qualificadora do feminicídio. Conforme a Leiº 13.104/2015, o feminicídio é caracterizado pelo assassinato de mulheres “por razões da condição de sexo feminino”, onde isso acontece em situações que envolve “violência doméstica e familiar” ou "discriminação por ser mulher".Sendo assim, o feminicídio é muito mais do que o assassinato de mulheres no âmbito do lar, provocado por um homem. Mesmo sendo o criador da qualificadora do feminicídio, o País ainda é muito falho na identificação dos casos tipificados na lei. Conforme as estatísticas do 15º Anuário Brasileiro de Segurança Pública o Ceará é o segundo estado brasileiro com a maior taxa de homicídios de mulheres e meninas. De acordo com as pesquisas do Fórum Brasileiro de Segurança Pública são 7 mortes a cada 100 mil mulheres no Estado do Ceará, onde 329 mulheres foram mortas no ano de 2020 e apenas 8,2% das mortes de mulheres foram qualificadas como feminicídio. Segundo a diretora executiva do fórum de segurança pública, Samira Bueno, a taxa de feminicídio do estado pode ser ainda maior do que os registros oficiais apontam. “A gente não sabe exatamente, desses 329 assassinatos de mulheres, quantos foram em decorrências de feminicídio”. (Bueno; Samira,2020, n.p) Gráfico 01- Proporção dos homicídios femininos classificados como feminicídio. 8 Fica evidente que esses números não condizem com a realidade e indicam a subnotificação desse crime no Ceará. Nos anos de 2016 e 2017 o Ceará foi o único estado do país que não notificou nenhum caso de feminicídio. Sendo assim, isso resulta da forma como a morte de mulheres são classificadas pelos órgãos policiais do estado. Nesse sentido, é necessária uma mudança na forma em que é classificado os homicídios de mulheres pela Secretaria de Segurança do Estado. Os operadores do sistema de justiça criminal precisam olhar para o assassinato de mulheres e saber quando os registrar como feminicídio. 3.2 INEFICÁCIA DA PROTEÇÃO ESTATAL ÀS VÍTIMAS DE AGRESSÃO DOMÉSTICA Apesar da existência de leis protetivas, muitas vítimas não buscaram apoio dos órgãos estaduais. Essa afirmação pode ser corroborada por dados de um estudo do Fórum Brasileiro de Segurança Pública de 2019, realizado pelo Instituto Datafolha, que mostrou que cerca de 10% das mulheres foram ameaçadas com violência física e 8% foram agredidas sexualmente. Ainda é possível verificar se a violência é de alguém conhecido, o que aconteceu com 8 em cada 10 mulheres, entre essas pessoas próximas, o namorado ou marido representou 23,9%. De acordo com o Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos (ACNUDH), Brasil é quinto país do mundo com o maior número de casos de feminicídio, apesar da Lei Maria da Penha, então fica claro que se existe uma lei de proteção utilizada pelo judiciário, por que o Brasil ainda é um dos países mais violentos do mundo contra as mulheres? A resposta para tal indagação está na atuação do estado, pois muitas vezes não investe o necessário para efetivar a proteção, sob o argumento de dificuldade orçamentárias. Para aumentar a eficiência, foi aprovada a Lei nº 13.641/2018, que inclui o art. 24A na Lei Maria da Penha. A Lei passou, então, tornar típico o descumprimento de decisões judiciais que concedem medidas protetivas emergenciais. O STJ estabeleceu que o descumprimento das medidas protetivas emergenciais não é crime de desobediência. Mesmo com essa inovação legislativa, o Estado e a Justiça ainda têm problemas quanto a fiscalização das medidas protetivas de urgência, que são de grande valor para mulheres, que vivem constantemente em um ambiente de violência e ameaça. Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), apenas 9 dez municípios dos 184 do Ceará possuíam uma delegacia especializada de atendimento às mulheres vítimas de violência em 2018. O serviço foi ofertado apenas a 5,4% das cidades cearenses. Pesquisa de Informações Básicas Municipais (Munic) do IBGE evidencia ainda que, dos 184 municípios do Ceará, somente 38 têm serviços especializados para amparo a mulheres que sofrem violência. Isto equivale a 20% das cidades. O Ceará conta, dentre outros, com centros de referência, juizados ou varas especializadas de violência doméstica e familiar contra a mulher, promotorias e, pelo menos, uma casa abrigo e uma Casa da Mulher Brasileira. O estudo não detalha em quais municípios cearenses esses equipamentos estão localizados, mas enfatiza a permanência desses serviços em cidades de maior contingente populacional, ou seja, principalmente as localidades rurais não têm um maior amparo estatal, nesses casos as vítimas devem se deslocar para outros municípios o que muitas vezes não se torna viável devido a conjuntura em que vivem. O relatório Conflitos no Campo Brasil 2018 mostra que de 2009 a 2018, 1.409 mulheres notificaram algum tipo de violência no meio rural, mas esse número, segundo a CPT, pode ser bem maior devido à subnotificação. Nesse período, 38 mulheres foram assassinadas, 409 receberam ameaças de morte, 22 morreram em consequência de conflitos e 37 foram estupradas. Destarte, é importante destacar a falta de autonomia financeira das mulheres do campo, fator que aumenta a dependência do agressor, a maioria das políticas e programas que apoiavam as mulheres do campo foram extintas em decorrência da grande pandemia da covid-19, assim evidenciando a vulnerabilidade econômica desse grupo de mulheres. De acordo com a promotora Patrícia Habkouk, coordenadora do CAOVD (Centro de Apoio Operacional das Promotorias de Justiça de Combate à Violência Doméstica e Familiar contra a Mulher), a implementação do boletim de ocorrência digital foi algo positivo, pois permite o registro de ocorrências como lesão corporal e ameaça e outros tipos de agressões que não deixam marcas, como empurrão e puxão de cabelo, mas ainda é pouco. “É um desafio para essas mulheres, porque são muitas vulnerabilidades: são mulheres do campo, mulheres pobres e muitas não sabem quem procurar, o que fazer num caso de violência” (HABKOUK; PATRICIA, 2020, n.p) 10 4. COMPORTAMENTO EXERCIDO POR MULHERES, VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA, CONTRA OS AGRESSORES. 4.1 ANÁLISE GERAL DE CRIME Neste trabalho, usamos como base para definir crime a teoria finalista de Hans Wenzel (1930), que trouxe o dolo e a culpa para a tipicidade penal tirando eles da culpabilidade, essa mudança foi importante para tornar brando o objetivismo da conduta penal, pois a tipicidade precisa da presença desses elementos subjetivos. Sendo assim, determinada situação pode até ser considerada típica, mas se ocorrer sem o dolo e a culpa, em relação ao autor, o fato será atípico. Para entender o que isso quer dizer na prática é necessário um estudo em etapas sobre os elementos do crime. Sobre esse ponto de vista, conforme Fernando Capez (2017) e Damásio de Jesus (2014), crime é todo o fato típico e ilícito assim deve ser pontuada a tipicidade da conduta. Caso seja apurado que a ação é típica é preciso analisar se é licita ou ilícita, sendo verificado isso, usando como base a teoria bipartida, já é possível ver que ocorreu uma infração penal. A partir desse momento é possível observar se o autor é culpado ou não. Nesta sequência, é possível ver que existe crime sem ter em conta a culpa do autor. Após esse breve estudo, vamos recorrer ao raciocínio supramencionado para responder as dúvidas mencionadas acima. Segundo a teoria finalista, a tipicidade é o primeiro ponto que deve ser averiguado, possuindo quatro tópicos: tipicidade formal, dolo ou culpa, resultado e nexo causal. A Tipicidade formal é uma ação praticada no mundo real que se encaixa em uma norma penal incriminadora. Destarte, para uma ação do ser humano ser crime é preciso que se encaixe em um tipo legal, sendo assim, a tipicidade formal consiste na conexão entre uma ação na vida real e o tipo penal que está na lei. Segundo Fernando Capez (2017, p. 38) “conduta é a ação ou omissão humana, consciente e voluntária, dirigida a uma finalidade”. Considera-se então a ação como a materialização da vontade, pois para o sistema jurídicopenal não é possível punir com base em cogitações, avista disso, os resultados que não derivam da vontade humana em plena consciência são irrelevantes para o direito afastando a responsabilidade objetiva. Nessa conjunção, existe ainda o dolo e a culpa, quando é verificado na ação que o ser agiu com vontade e consciência e o resultado corresponde com a finalidade existe a presença do ato doloso, quando o resultado dessa ação humana não corresponde com a vontade do agente, tem a presença de uma ação culposa. 11 Após análise do Art. 13 do CP, é possível ver que qualquer ação que contribui para o resultado deve ser considerada como sua causa, entretanto, para afastar o regresso ad infinitum, é necessário analisar se existe nexo psíquico ou subjetivo, ou seja, dolo e culpa no resultado. Para isso, ainda que contribuindo para a produção do resultado, um fato pode não ser considerado sua causa quando não tiver idoneidade para tanto. Sendo assim, em um caso concreto, sendo possível verificar a atipicidade, a ação penal não deverá iniciar, ou seja, não existe dever de agir se não for configurada a tipicidade. 4.2 LEGÍTIMA DEFESA Existem condutas típicas que em razão de causas extraordinárias são taxadas de licitas pelo ordenamento jurídico, essas causas são consideradas excludentes de ilicitude. Ao discutir sobre a possibilidade de despenalização de condutas de vítimas de violência doméstica que agem contra o seu agressor é preciso analisar os elementos para que a legítima defesa seja acatada, e se é possível sua aplicação nos casos que são tratados aqui. A legítima defesa é um instituto que basicamente todos os sistemas jurídicos aceitam em razão de está intimamente ligado a pessoa humana. O jurista brasileiro Galdino Siqueira (2020) argumenta: Tao visceralmente ligada a pessoa, se manifesta a defesa, isto é, a faculdade de repelir pela força o ataque no momento em que se produz, se considerarmos o substrato fisiológico e psicológico da defesa, como reação do instituto de conservação que brota e se desenvolve independente de qualquer regulamentação. (SIQUEIRA, p. 314) A legítima defesa é uma das mais antigas excludentes de ilicitude, embora não conste expressamente em lei em alguns sistemas jurídicos, seguindo os pensamentos de Aníbal Bruno (1978, p. 370), desde a antiguidade os filósofos já falavam da legítima defesa como algo sagrado, confirmando em seus textos que afastar a violência com violência é permitida por todas as leis. Hodiernamente, a legítima defesa se encontra no sistema jurídico brasileiro como causa de exclusão de ilicitude, se embasando na proteção dos bens jurídicos tutelados com o objetivo de prevenir. Seguindo a seguinte redação: 12 Art. 23 - Não há crime quando o agente pratica o fato: [...] II - em legítima defesa; Art. 25 - Entende-se em legítima defesa quem, usando moderadamente dos meios necessários, repele injusta agressão, atual ou iminente, a direito seu ou de outrem (BRASIL, 1940). Seguindo a análise do artigo acima é possível ver que a legítima defesa está restrita ao cumprimento de alguns elementos: agressão injusta, atual ou iminente, contra direito próprio ou alheio, reação com os meios necessários e moderados. Sendo assim, conforme os ensinamentos de Cleber Masson (2019, p. 336) agressão injusta é toda ação do ser humano que lesa ou coloca em perigo um bem ou direito protegido pelo sistema jurídico. A agressão deve ser atual ou iminente, ou seja, com a iminência é possível a reação imediata da vítima, pois a agressão está prestes a acontecer, atual é a agressão que iniciou e ainda não se encerrou. Sendo assim, tanto a agressão futura quanto a agressão passada não dão direito à legítima defesa, muito menos o medo irá justificar a reação da vítima. É exatamente nesse momento que se encontra a problemática desse presente trabalho, que é aplicar a legítima defesa comum nos casos que a vítima da violência doméstica age contra o agressor, pois como já foi mencionado nos estudos acima, as agressões domesticas tem como característica principal a continuidade e habitualidade. Existem sim casos em que a legítima defesa clássica são aceitados, mas não é sempre possível provar que a mulher se defendeu de uma agressão atual ou iminente, pois a maioria das agressões ocorre no ambiente do lar, no interior das residências, o que dificulta a produção probatória. Sendo assim, apesar da palavra da vítima ser levada em consideração é preciso mais elementos para confirmar a legítima defesa. Acrescentou, que foi ele quem iniciou a discussão, quando o ofendido chegou em casa "chupado", o tendo questionado sobre eventual traição, frisando que ele a agrediu verbal e fisicamente, até que se apoderou de uma faca, que mantinha em cima da cômoda, para sua defesa, e com ela desferiu contra ele um único golpe. Entretanto, a prova oral não fornece a convicção, necessária, nessa fase processual, quanto a presença da excludente de ilicitude invocada. (STJ, 2018). (Grifo nosso). Conforme está disposto no Art. 415, IV, do Código de Processo Penal: “O juiz, fundamentadamente, absolverá desde logo o acusado, quando: IV – demonstrada causa de isenção de pena ou de exclusão do crime”. Porém, a doutrina majoritária adere a aplicação do princípio do in dubio pro societate, pois na dúvida quanto o crime e sua autoria o juiz deve pronunciar o acusado. Segue-se então, que tanto na 13 pronúncia como no recebimento da denúncia a legítima defesa precisa ser comprovada para que não reste duvidas de sua aplicação. Vale destacar, que deve ser usado meios proporcionais para repulsar a agressão, usando de forma moderada os meios necessários, sendo medida de acordo com a gravidade da agressão. A moderação consiste na utilização dos meios na medida suficiente para a afastar a agressão. (MASSON, 2019, p. 338 - 339) 4.3 LEGÍTIMA DEFESA PREORDENADA A legítima defesa antecipada se resume ao agente se antecipar a um ataque certo e futuro do agressor, e por saber que não terá como suportar a agressão, ele acaba atacando antes. Se torna diferente da legítima defesa comum porque não exige que a violência seja atual ou iminente. O Juiz e Professor William Douglas, publicou na Revista dos Tribunais nº 715 a tese da legítima defesa antecipada, que abordava exemplos da vida real que a referida tese poderia ser aplicada. A base para os estudos de William Douglas foi a teoria da responsabilidade, do penalista alemão Claus Roxin (1964), onde não seria preciso a aplicação de uma sanção penal, quando o agente mesmo tendo cometido um ato típico e ilícito, não seria necessário a ressocialização, bem como, quando o ato foi cometido com o objetivo de prevenção, o agende só cometeu o ato porque estava em uma situação específica. Dessa maneira, mesmo o sujeito praticando uma conduta típica e ilícita, ele estaria livre da sanção penal, não sendo responsabilizado, pois a sua falta de punição não trouxe maus exemplos para a sociedade. A legítima defesa preordenada, em contrapartida da legítima defesa clássica, não apaga a ilicitude, mas apenas a culpabilidade, fazendo com que o indivíduo não seja responsável penalmente. Grande parte dos doutrinadores entende esse instituto como uma espécie de inexigibilidade de conduta diversa. Sendo assim, uma das maiores indagações feitas em cima desse assunto diz respeito a se é necessário aplicar uma sanção para a pessoa que não tinha outros meios de se defender e usou da legítima defesa antecipada, e se mesmo perante tudo que foi exposto seria imperial ressocializar. Um ponto muito importante a ser destacado, é que diferente da legítima defesa tradicional, a defesa antecipada conforme os autores fundamentam, somente defende o direito à vida, não incluindo lesão ao patrimônio, por exemplo. 14 Em sua tese, Willian Douglas (1995, p.429-430)ficou atento ao fato de que a pessoa, depois de se defender de uma injusta agressão tendo que agir de forma preordenada, ainda seria obrigada a passar por todo processo criminal, pelo simples fato de o Direito Brasileiro não considerar como legítima defesa a reação que não ocorrer diante de uma agressão atual ou iminente. Douglas denomina isso de ‘’dupla vitimização’’, pois a pessoa séria vítima quando quase perdeu a vida e quando for submetido a um processo criminal que traria consequências insanáveis. O jurista cita alguns casos que poderiam ocorrer na vida real que seriam enquadrados na legítima defesa antecipada: Um traficante, em morro por ele dominado, promete ao morador que se este não entregar sua filha ou esposa para a prática de relações sexuais, toda a sua família será executada. O morador sabe que isso já ocorreu com outro pai de família e que não pode contar com a proteção do Estado, de modo que, aproveitando uma rara oportunidade, mata o autor do constrangimento; (DOUGLAS, RT nº 715, p. 348.) Com o objetivo de limitar sua aplicação, a legítima defesa antecipada também necessita que alguns elementos sejam cumpridos, sendo eles: injusta violência, agressão iminente, defesa de direito próprio ou de terceiros e moderação a repulsa. Existem também elementos específicos que serão analisados de forma detalhada, tudo isso tem o objetivo de não tornar a aplicação da tese em algo banal, devendo ser utilizada apenas em ocasiões excepcionais. São requisitos específicos: agressão futura e certa, falta de proteção do Estado, impossibilidade de fugir da agressão, impossibilidade de suportar certos riscos e proceder preventivamente em casos extremos. Sobre esse ponto Willian Douglas (1995, p. 429-430) afirma: Como requisito para a aceitação da tese, e consequente absolvição, teremos sempre a demonstração do conjunto circunstâncias que justifiquem a conduta do réu, por exemplo, quanto à certeza da agressão (futura e certa). Sempre terá que haver suficiente e robusta prova de que o agente seria atacado, que tinha motivos bastantes para proceder em legítima e antecipada defesa. Sendo alegação do réu, as circunstâncias referidas teriam que ser demonstradas e provadas pela defesa (art.156, CPP). Tudo ainda sujeito à livre convicção judicial (art.157, CPP) ou ao crédito a ser dado pelos pares, no Júri, onde o princípio da convicção íntima revigora a admissão da tese. [...]É preciso, sempre, bom senso. Devemos, pois, interpretar a iminência da agressão não só com o auxílio de cronos mas também de logos. Se a agressão ainda não se iniciou, mas se prenuncia com suficiente certeza, deve ser assegurado à pessoa o direito à autodefesa, que é metajurídico. 15 O Estado não pode proteger todos ao mesmo tempo, principalmente com a alta na criminalidade o Estado não consegue reprimir todas as agressões. Dessa maneira, sempre que for solicitado a proteção é possível que a solicitação não seja atendida de imediato pois os casos criminais são maiores que formas de segurança pública para combater. Em relação a suportar certos riscos e sua impossibilidade, os escritores que defendem a referida tese afirmam que qualquer pessoa pode suportar certos riscos, desde que não prejudique a sua própria integridade física (JÚNIOR; JUNIOR, 2006, p. 364). Ou seja, a agressão futura tem que ser tão agressiva que se torne impossível a vítima se defender, levando em consideração os excessos cometidos. E para finalizar a legítima defesa preordenada só deveria ser utilizada em casos onde nenhum outro meio poderia ser usado. Willian Douglas (1995) usou o nome “legítima defesa antecipada”, mas caso a tese venha a ser acatada no caso concreto, tem o objetivo de tirar a culpabilidade do agente, sendo assim, uma espécie de inexigibilidade de conduta diversa, independente do conceito e nomenclatura a ser usado ambos podem ser capazes de excluir a culpabilidade de mulheres que venham a cometer crimes contra seus agressores nas condições já apresentadas. 4.4 INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA (CAUSAS SUPRALEGAIS) A culpa de uma pessoa que cometeu um ato típico e ilícito deve estar ligada a em que circunstâncias o crime foi cometido, ou seja, se poderia ser exigido do agente uma conduta diferente da que ele tomou. Pois se não fosse possível exigir um outro comportamento, seria excluída a culpa do agente e ele não seria penalizado. Porém, grande parte da doutrina adota a concepção tripartida de crime, que junto com a tipicidade e a ilicitude considera a culpabilidade como elemento do crime. Quem inseriu a inexigibilidade de conduta diversa na culpabilidade foi Reinhart Frank (1930), ele foi responsável por desenvolver a teoria da normalidade das circunstâncias concomitantes. São acrescentados elementos a culpabilidade que são a imputabilidade e a exigibilidade de conduta diversa. Somente com o advento da Teoria normativa de Welzel, que o dolo e a culpa são retirados da culpabilidade e passam a ser elementos da tipicidade. A teoria da normalidade das circunstâncias concomitantes, conforme afirma Fernando Capez (2017, p. 346 - 347), para alguém ser considerado culpado, é necessário que a conduta tenha sido praticada em condições e circunstâncias normais, caso o contrário não será possível exigir do 16 sujeito conduta diferente da que praticou, ou seja, só pode ser punido aquele que sua conduta poderia ser evitada, não podendo ser punível qualquer ação inevitável, mesmo que criminosa. Com relação a possibilidade de aplicar causas supralegais de inexigibilidade de conduta diversa existe grandes discordância na doutrinária e jurisprudências. Sobre esse ponto, é importante falar sobre os pensamentos de Francisco de Assis Toledo (2007, p. 328): A inexigibilidade de outra conduta é, pois, a primeira e mais importante causa de exclusão de culpabilidade. E constitui um verdadeiro princípio do direito penal. Quando aflora em preceitos legislados, é uma causa legal de exclusão. Se não, deve ser reputada causa supralegal, erigindo-se em princípio fundamental que está intimamente ligado com o problema da responsabilidade pessoal e que, portanto, dispensa a existência de normas expressas a respeito. O Superior Tribunal de Justiça também admite causas supralegais de inexigibilidade de conduta diversa. Inexigibilidade de outra conduta. Causa legal e supralegal de exclusão da culpabilidade cuja admissibilidade no Direito brasileiro já não pode ser negada. Júri. Homicídio. Defesa alternativa baseada na alegação de não exigibilidade de conduta diversa. Possibilidade em tese, desde que se apresentem ao Júri quesitos sobre fatos e circunstâncias, não sobre mero conceito jurídico. (STJ, 1990). Os que não admitem têm como justificativa o fato de que é impossível aplicar a analogia em matéria de dirimentes, ou seja, só é admitido os casos que são taxativamente expressos em lei. Diferente do STJ que foi citado acima, o STF, em antigo julgado, não reconheceu a aplicação de causas supralegais. Teoria das causas supralegais de exclusão do crime ou de culpabilidade. Improcedência, também, da alegação de cerceamento de defesa. Em nosso sistema jurídico, não é admissível a teoria das causas supralegais de exclusão de crime ou de culpabilidade. Correta, pois, na formulação dos quesitos, a alusão ao estado de necessidade e não à inexigibilidade de conduta diversa. (STF, 1988). 4.5 A POSSIBILIDADE DE RECONHECER A LEGÍTIMA DEFESA PREORDENADA E A INEXIGIBILIDADE DE CONDUTA DIVERSA AOS CASOS DE VÍTIMAS DE VIOLÊNCIA DOMÉSTICA E FAMILIAR QUE AGEM CONTRA O AGRESSOR Para verificar se é possível a aplicação da teoria da legítima defesa antecipada nesses casos de violência doméstica, usando todos os meios já analisados, é 17 imprescindível o estudo de um caso real, onde a tese da legítima defesa antecipada e da inexigibilidade de condutadiversa foram reconhecidas pelo Tribunal do Júri. O Procurador Geral de Justiça do Estado de Pernambuco, Francisco Dirceu Barros, publicou na revista de prática jurídica (2011, p. 10) um caso real em que ele trabalhou onde foi solicitado a absolvição da ré pois foi verificado que ela agiu em defesa antecipada, bem como, ela não poderia ter agido de maneira diferente perante a realidade me que vivia. O caso será usado como forma de exemplo, mas conforme já foi estudado nos capítulos anteriores, infelizmente situações parecidas são frequentes, principalmente em localidade rurais, onde o estado não se encontra tão presente. A ré do caso citado era Severina, que morava no interior de Pernambuco, onde sempre foi abusada pelo pai. Segue o resumo do processo e depoimento de Severina (BARROS, 2019): Nunca estudei, nunca tive amiga, nunca arrumei namorado na vida, nunca saí para ir a festas. Até os 38 anos, vivi assim e foi assim até quando me desliguei do meu pai, no dia em que ele foi morto. Meu pai não deixava eu e minhas irmãs fazer nada. Comecei a trabalhar na roça com seis anos. Aos nove, fui com meu pai para o roçado. No caminho, ele me levou para o mato, amarrou minha boca com a camisa e tentou ser dono de mim. Eu dei uma “pesada” no nariz dele, e ele puxou uma faca para me sangrar. A faca pegou no meu pescoço e no joelho. Depois, ele tentou de novo, mas não conseguiu ser dono de mim. Em casa, contei para minha mãe e ela me deu uma pisa (surra). Fiquei sem almoço. À noite, minha mãe foi me buscar e me levou para ele, que me abusou. No outro dia, fui andar e não consegui. Falei: ‘Mãe, isso é um pecado’. E ela: ‘Não é pecado. Filha tem que ser mulher do pai’. A partir daquele dia, três dias por semana ele ia abusando de mim. Com 14 anos eu engravidei. Tive o filho e ele morreu. Eu tive 12 filhos com meu pai. Sete morreram. Seis foram feitos na cama da minha mãe. Dormíamos eu, pai e mãe na mesma cama. Um dia, uma irmã minha disse que estava interessada em um namorado. O pai quis pegar ela, disse que já tinha um touro em casa. Eu mandei minha mãe correr com minha irmã. Depois disso, minha mãe não ficou mais com ele. Foram para a casa do meu avô em Caruaru. Ela e as minhas oito irmãs. Só ficamos eu e meu pai na casa. Eu tinha 21 anos, e ele sempre batia em mim. Tentei me matar várias vezes, botei até corda no pescoço. Os filhos nasciam e morriam. Os que vingavam foram se criando. Minha filha estava com 11 anos quando ele quis ser dono dela. Eu disse para ele: ‘Se você ameaçar a minha filha, você morre.’ Meu pai me bateu três dias seguidos. Um dia, ele amolou a faca e foi vender fubá. Antes, disse: ‘Rapariga safada, se você não fizer o acordo, vai ver o começo e não o fim’. Ele foi para a feira e eu para a casa da minha tia. Foi quando paguei para matarem ele. Peguei um dinheiro guardado e paguei ao Edilson R$ 800 na hora. Quando o pai chegou, Edilson e um amigo fizeram o homicídio. A minha filha, a filha dele, eu salvei. Quem é pai, quem é mãe, dói no coração. Antes disso, eu ainda procurei os meus direitos, mas perdi. Há uns 15 anos, fui na delegacia, mas ouvi o delegado falar para eu ir embora com o velhinho (o pai), que era uma boa pessoa. O homicídio foi no dia 15 de novembro de 2005. No cemitério já tinha um carro de polícia me esperando. Na cadeia passei um ano e seis dias. Depois do julgamento, fiquei feliz. Agora, quero viver e ficar com meus filhos. 18 Nesse caso real é possível ver que os elementos específicos, que são indispensáveis para o acatamento da tese da legítima defesa antecipada, são totalmente preenchidos. As violências já perduravam por mais de trinta anos, o que deixa possível verificar que as novas agressões aconteceriam de certeza, dessa forma, o ápice para a decisão tomada pela ré foi uma ameaça de morte caso ela não entregasse sua filha para o agressor, que tinha a intenção de estuprá-la. Perante o que foi exposto ficou evidente que existiu a presença do elemento “certeza da agressão”. É mister destacar que Severina vivia isolada, não tinha formação intelectual nem sabia nada em relação aos seus direitos, sendo assim, para ela seria impossível abandonar o lar e sozinha promover o sustento de seus filhos, assim preenchendo o requisito da impossibilidade de fugir da agressão. O elemento suportar certos riscos fica evidente no momento em que ela sofre ameaças de que se tentasse fugir seria morta. Com relação ao requisito “proceder preventivamente em casos extremos”, foi possível verificar que mesmo após 30 anos de violências, Severina só agiu a partir do momento em que sofreu ameaça do pai visando forçá-la a entregar sua filha, ou seja, um caso de necessidade extrema, foi preenchido também o requisito da falta de proteção do Estado quando Severina fala que foi a delegacia, mas o delegado falou para ela voltar para casa com o pai. Sendo assim, Severina se defendeu de forma preventiva, pagando R$800,00 (oitocentos reais), para que matassem o futuro e certo agressor, pois esse era seu único meio possível para exercer tal defesa. Nesse caso estudado os elementos específicos da legítima defesa antecipada foram cumpridos e assim Severina foi absolvida. Esse caso não é uma situação única, sendo assim a tese de Willian Douglas (1995) se encaixa de forma perfeita aos casos de violência doméstica. Os dados estatísticos que foram trabalhados nesse artigo também confirmam a possibilidade de aplicação da tese, pois foi verificado que boa parte das violências se quer foram classificadas de forma correta, mostrando a precariedade da capacitação e proteção estatal à mulher, e se tivesse existido uma intervenção prévia do Estado, essas mortes teriam a possibilidade de não ter acontecido. Usando como base a inexigibilidade de conduta diversa, a mulher que vive em uma continua conjuntura de violência não está em uma situação de normalidade, sendo assim, poderia ter sua culpabilidade afastada caso viesse agir contra o seu agressor. Entretanto, a aplicação desse instituto aos casos reais mencionados não está expressa em lei, e por isso, muitos juízes não acatam a tese. Pois afirmam que apenas existem duas causas (coação moral irresistível e obediência à ordem de 19 superior hierárquico não manifestamente ilegal), assim tornando inexistente a presença de causas supralegais no ordenamento jurídico do Brasil. Diante disso, é muito necessário o uso da cautela para não tornar banal a aplicação desse instituto, de modo que uma simples agressão ou ameaça sirva de respaldo para uma ação violenta contra o agressor. Observando o caso concreto será feito um controle dos elementos necessários e uma comprovação da possível aplicabilidade, bem como, a verificação de todos os meios probatórios para confirmar que não havia outra conduta a ser tomada. 5. CONSIDERAÇÕES FINAIS De acordo com o que foi estudado, é possível concluir que a violência doméstica não é uma violência comum e merece tratamento diferenciado devido as suas especificidades. Desse modo, sabendo que não existe uma proteção estatal tão eficiente, foi necessário discutir se é possível a aplicação da tese da legitima defesa antecipada nesses casos em que mulheres agem de forma antecipada contra o agressor, quando não protegidas pela legítima defesa clássica. Para isso, analisamos a violência doméstica a partir do ponto de vista de Bonita Meyersfeld (2010) que destaca os cincos pontos da violência: falência do Estado, vulnerabilidade do grupo social afetado, a continuidade do dano sofrido e intimidade com o agressor. Também foi possível chegar à conclusão de que a violência doméstica é uma maneira de discriminação global, que segundo dados a ONU é um dos principais motivos de invalidez das mulheres, sendo considerada como uma forma de violação aos Direitos Humanos. Por esse motivo, foram inseridas ao longo do tempo, por meio de acordos e convençõesinternacionais, medidas para diminuir os índices de violência doméstica. Maria da Penha Maia Fernandes foi responsável por provocar o processo que resultou na elaboração da Lei 11.340 de 2006. Apesar dessa lei ter sido um avanço no combate à violência, foi possível constatar que ainda existe um longo caminho a ser percorrido quando o assunto é proteger de forma efetiva. Isso foi comprovado pelos dados estatísticos que mostram a incapacidade do Estado em lidar com essa mazela. Perante tudo que foi exposto, temos a noção de que as vítimas de violência doméstica não são protegidas de forma eficiente pelo poder público, tendo que agir por conta própria em casos extremos visando proteger a própria vida. É exatamente nesses casos extraordinários que a tese da legítima defesa antecipada poderia ser usada, utilizando dos critérios necessários estabelecidos por Douglas (1995) em sua 20 tese. A tese só deve ser aplicada se existir a certeza da agressão e analisando os pontos desse trabalho, foi possível concluir que a continuidade é umas das principais características da violência doméstica. A falha da proteção do Estado também deve ser constatada no caso real, a defesa precisará demonstrar que a mulher procurou os órgãos oficiais e mesmo assim não foi efetivada sua segurança ou então que tais organizações não eram acessíveis, que é o mais comum para as mulheres do campo. A impossibilidade de fugir da agressão é outro elemento primordial para o acatamento da legítima defesa antecipada, e como foi visto é comum o isolamento da vítima que dependendo do nível de isolamento se torna impossível a fuga de uma futura agressão. Também é necessário a confirmação que a mulher não poderia suportar os riscos da situação, mostrando como é de extrema importância o registro da agressão, pois revela o perigo em que a vítima de violência se encontra. Por fim, a mulher só vai agir em casos extremos, onde fique provado que não existia outra forma de se defender de uma agressão que lhe causaria morte. Comprovados todos os elementos necessários, tanto para o acatamento da legítima defesa antecipada ou a título de inexigibilidade de conduta diversa, foi possível concluir que a tese defensiva deve ser acolhida com base no art. 397, inc. II do CPP, onde a ré não deve ser submetida a júri popular. É de grande importância pontuar que concordamos com o pensamento de Rogério Greco (2012, p.342) que diz que a legítima defesa antecipada é uma espécie de inexigibilidade de conduta diversa melhor delimitada, pois existe a presença de requisitos para ser preenchidos. Entendemos que a tese desenvolvida por Douglas (1955) tem grande importância, porque delimitou requisitos para sua aplicação, isso torna mais fácil a sua aceitação. Por fim, compreendemos que essas teses defensivas podem até não agradar os doutrinadores tradicionais, mas elas existem com a pura finalidade de proteger o cidadão do poder punitivo do Estado. 21 REFERÊNCIAS ANUÁRIO BRASILEIRO DE SEGURANÇA PÚBLICA, Violência contra meninas e mulheres no ano pandemico,2020. BARROS, Francisco Dirceu. Severina: Assassina ou santa? O sertão que não tem o cordel encantado. Revista Prática Jurídica. Ano X – n. 116. 2019. BITENCOURT, Cesar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral 1. 15. ed. São Paulo: Saraiva, 2010. 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