Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Curso: Direito Ano/semestre: 2012/2º Disciplina: Direito Constitucional I Período/Turma: 2º A/B/C Carga Horária Semanal: 04 Carga Horária Semestral: 80 Docente: Hugo Garcez Duarte Títulação: Mestre em Direito; Especialista em Direito Público. Apostila I Prezados, os senhores encontrarão a seguir, algumas ponderações desenvolvidas em aula, acerca dos temas previstos na ementa do curso de Direito Constitucional I. Na medida do possível, este documento contemplará passagens doutrinárias, previsões constitucionais e legais (na íntegra) e julgados. 1 A CONSTITUIÇÃO Constituição é ato de constituir, de estabelecer, de firmar. A Constituição de um país deve ser entendida como norma fundamental e suprema de um Estado. Logo, a Constituição, ainda que em tese, deve prever todas as necessidades de um povo, em dado momento histórico e em dado território. Ou seja, a Constituição é o diploma normativo máximo de um Estado, contendo normas que contemplam direitos, garantias e deveres da pessoa humana, de distribuição de competências e de estruturação do Estado, de formação dos poderes públicos, de forma de governo e de aquisição do poder. 1.1 Princípio da Supremacia da Constituição – Por este princípio entende-se que a Constituição possui posição hierárquica superior às demais normas do sistema jurídico. As leis, atos normativos e atos jurídicos em geral não poderão existir validamente se incompatíveis com alguma norma constitucional. A Constituição regula tanto o modo de produção das demais normas jurídicas como também delimita o conteúdo que possam ter. Em outras palavras, o leitor deve encarar o ordenamento jurídico como uma grande empresa, em que a Constituição é o presidente, donde emanam todas as ordens aos subalternos (empregados), que no ordenamento jurídico seriam as espécies normativas primárias, art. 59 da CF (ex: Código Civil, Código Penal, Código de Processo Civil, Código de Processo Penal, Estatuto da Criança e do Adolescente, Estatuto do Idoso, Código de Defesa do Consumidor, entre muitos outros), e secundárias (ex: Decretos do Poder Executivo – art. 84, IV da CF). Art. 59. O processo legislativo compreende a elaboração de: I - emendas à Constituição; II - leis complementares; III - leis ordinárias; IV - leis delegadas; V - medidas provisórias; VI - decretos legislativos; VII - resoluções. Parágrafo único. Lei complementar disporá sobre a elaboração, redação, alteração e consolidação das leis. Art. 84. Compete privativamente ao Presidente da República: IV - sancionar, promulgar e fazer publicar as leis, bem como expedir decretos e regulamentos para sua fiel execução. Quanto ao princípio em tela, vale apreciar: [...] Significa que a Constituição se coloca no vértice do sistema jurídico do país, a que confere validade, e que todos os poderes estatais são legítimos na medida em que ela os reconheça e na proporção por ela distribuídos. É, enfim, a lei suprema do Estado, pois é nela que se encontram a própria estruturação deste e a organização de seus órgãos; é nela que se acham as normas fundamentais de Estado, e só nisso se notará sua superioridade em relação às demais normas jurídicas (SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo. 32. ed. São Paulo: Malheiros, 2009, p. 45). O conflito de leis com a Constituição encontrará solução na prevalência desta, justamente por ser a Carta Magna produto do poder constituinte originário, ela própria elevando-se à condição de obra suprema, que inicia o ordenamento jurídico, impondo-se, por isso, ao diploma inferior com ela inconciliável. De acordo com a doutrina clássica, por isso mesmo, o ato contrário à Constituição sofre de nulidade absoluta (MENDES, Gilmar Ferreira; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de direito constitucional. 6. ed. São Paulo: Saraiva, 2011, p. 123). A rigor, o princípio da supremacia não disponibiliza nenhum critério interpretativo específico, mas deve ser considerado como premissa para a interpretação quando o ordenamento for encabeçado por uma Constituição rígida. Neste caso, toda interpretação normativa vai ter como pressuposto a superioridade jurídica e axiológica da Constituição. Em razão da supremacia constitucional, nenhum ato jurídico incompatível com a Lei Maior pode ser considerado válido (NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 183). No plano dogmático e positivo, a superioridade constitucional se traduz no estabelecimento da forma (competência, procedimentos...) e do conteúdo dos atos normativos infraconstitucionais, que, na hipótese de inobservância dos critérios constitucionalmente estabelecidos, devem ser submetidos a um controle de constitucionalidade (NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 183). OBS – Principais aspectos do ponto, desenvolvidos em aula: I A Constituição, ainda que em tese, prevê tudo o que o povo de determinado Estado, em dado território e momento histórico necessita; II O Princípio da Supremacia da Constituição impõe que a Constituição é o documento normativo máximo do Estado, devendo as outras normas (normas infraconstitucionais) buscar nela, o seu fundamento de validade; III Se uma norma infraconstitucional contraria a Constituição, esta deve ser retirada do ordenamento jurídico, por ofender a norma suprema do Estado. 2 NORMAS CONSTITUCIONAIS A Constituição é um sistema normativo aberto de princípios e regras. Desse modo, as normas constitucionais se subdividem em princípios e regras, e, enquanto referência para o intérprete (aplicador do direito), não têm hierarquia. A doutrina vem se debruçando sobre a importante e complexa distinção entre regras e princípios, partindo da premissa de que ambos são espécies de normas e que, enquanto referenciais para o intérprete, não guardam em si, hierarquia, especialmente diante da ideia de unidade da Constituição (LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 145). 2.1 Princípios e regras A doutrina pretende diferenciar os princípios e as regras de diversas maneiras, podendo-se destacar as propostas de autores como Ronald Dworkin e Robert Alexy. Antes de enfrentarmos as teorias desses autores, necessário mencionar que o critério mais utilizado para se estabelecer distinções entre princípios e regras refere-se ao grau de abstração (ou generalidade) entre eles, como se vislumbra na obra de Norberto Bobbio, entre outros. Neste contexto, os princípios poderiam ser definidos como mandamentos normativos mais abstratos, genéricos. Já as regras podem ser definidas como mandamentos normativos mais específicos. Ronald Dworkin, abandonando a ideia de grau de abstração (ou generalidade), afirma que as regras devem ser analisadas no plano da validade, sendo aplicáveis na forma de tudo ou nada. Nesse viés, em ocorrendo os fatos previstos por uma regra válida, a resposta por ela dada deve ser aceita (ela deve ser aplicada). [...] As regras são aplicáveis à maneira de tudo-ou-nada. Dados os fatos que uma regra estipula, então ou a regra é válida, e neste caso a resposta que ele fornece deve ser aceita, ou não é válida [...] (DWORKIN, Ronald. Levando os direitosa sério. Trad. de Nelson Boeira. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 39). Apesar do que afirmara, o autor admite que as regras podem conter exceções, sendo apropriado anunciar as regras e enumerar as suas exceções, pois segundo este, em tese, todas as exceções podem ser arroladas, e quanto mais o forem, mais completo será o enunciado da regra. Reforçando essa ideia, Ronald Dworkin assevera que eventual conflito entre regras deverá ser resolvido segundo os critérios tradicionais de hierarquia (norma hierarquicamente superior prevalece sobre norma hierarquicamente inferior), cronologia (norma posterior prevalece sobre norma anterior) e especialidade (norma especial prevalece sobre norma geral), devendo uma delas ser considerada inválida. Se duas regras entram em conflito, uma delas não pode ser válida. A decisão de saber qual delas é válida e qual deve ser abandonada ou reformulada, deve ser tomada recorrendo-se a considerações que estão além das próprias regras. Um sistema jurídico pode regular esses conflitos através de outras regras, que dão precedência à regra promulgada pela autoridade superior, à regra promulgada mais recentemente, à regra mais específica ou outra coisa desse gênero [...] (DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Trad. de Nelson Boeira. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 43). As regras, para Dworkin, desse modo, não possuem uma dimensão de importância, de maneira que, se duas regras entram em conflito, apenas uma delas será aplicada ao caso concreto e a outra deve ser declarada inválida, a não ser que uma seja exceção à outra. OBS – Lembrem-se do exemplo dado em sala de aula, em que duas regras estabelecem, de forma distinta, o horário de funcionamento do comércio. Segundo Dworkin, os princípios possuem, diversamente das regras, uma dimensão de peso ou importância, e que isso, inevitavelmente levará a uma controvérsia acerca do melhor caminho a seguir, devendo o intérprete do direito, no caso concreto, observar qual deles terá uma precedência em relação ao outro, por meio de um ponderação. Ou seja, os princípios são prima facie. [...] Os princípios possuem uma dimensão que as regras não têm – a dimensão de peso ou importância. Quando os princípios se intercruzam (por exemplo, a política de proteção aos compradores de automóveis se opõe aos princípios de liberdade de contrato), aquele que vai resolver o conflito tem de levar em conta a força relativa de cada um. Esta não pode ser, por certo, uma mensuração exata e o julgamento que determina que um princípio ou uma política particular é mais importante que a outra frequentemente será objeto de controvérsia. Não obstante, essa dimensão é uma parte integrante do conceito de um princípio, de modo que faz sentido perguntar que peso ele tem e o quão importante ele é (DWORKIN, Ronald. Levando os direitos a sério. Trad. de Nelson Boeira. 2. ed. São Paulo: Martins Fontes, 2007, p. 42-43). Marcelo Novelino, desenvolvendo as distinções existentes entre os princípios e as regras em Ronald Dworkin, alude que: Segundo DWORKIN, enquanto as regras impõem resultados, os princípios atuam na orientação do sentido de uma decisão. Quando se chega a um resultado contrário ao apontado pela regra é porque ela foi mudada ou abandonada; já os princípios, ainda que não prevaleçam, sobrevivem intactos. Um determinado princípio pode prevalecer em alguns casos e ser preterido em outros, o que não significa sua exclusão. Assim como os aplicadores do Direito devem seguir uma regra considerada obrigatória, também devem decidir conforme os princípios considerados de maior peso, ainda que existam outros, de peso menor, apontado em sentido contrário (NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 127). Desse modo: DWORKIN estabelece que um paralelo entre as duas espécies normativas afirmando que os princípios possuem um caráter prima facie, ao passo que as regras possuem um caráter definitivo. Então, as regras são aplicáveis na forma de juízos disjuntivos: se os fatos estipulados por uma regra válida se dão, a resposta dada deve ser aceita. Por essa razão, distintamente do que ocorre com os princípios, um enunciado preciso de uma regra deve levar em conta todas as exceções que ela contém (NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 127). Robert Alexy estabelece que a diferença entre os princípios e as regras é qualitativa. Note-se o alerta de Alexy no sentido de que os princípios oferecem a possibilidade de o intérprete do direito buscar o melhor para a resolução do caso, ou seja, otimizar a decisão. Mas que essa busca deve levar em consideração todas as características do fato, além das possibilidades jurídicas (princípios e regras constitucionais e infraconstitucionais). Para o autor: [...] princípios são normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível dentro das possibilidades jurídicas e fáticas existentes. Princípios são, por conseguinte, mandamentos de otimização, que são caracterizados por poderem ser satisfeitos em graus variados e pelo fato de que a medida devida de sua satisfação não depende somente das possibilidades fáticas, mas também das possibilidades jurídicas. O âmbito das possibilidades jurídicas é determinado pelos princípios e regras colidentes (ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Trad. de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, p. 90). Sobre a colisão entre princípios, vale analisar as seguintes palavras do autor: [...] Se dois princípios colidem – o que ocorre, por exemplo, quando algo é proibido de acordo com um princípio e, de acordo com o outro, permitido -, um dos princípios terá que ceder. Isso não significa, contudo, nem que o princípio cedente deva ser declarado inválido, nem que nele deverá ser introduzida uma cláusula de exceção. Na verdade, o que ocorre é que um dos princípios tem precedência em face do outro sob determinadas condições. Sob outras condições a questão da precedência pode ser resolvida de forma oposta. Isso é o que se quer dizer quando se afirma que, nos caos concretos, os princípios têm pesos diferentes e que os princípios com o maior peso tem precedência. Conflitos entre regras ocorrem na dimensão da validade, enquanto as colisões entre princípios – visto que só princípios válidos podem colidir – ocorrem, para além da dimensão, na dimensão de peso (ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Trad. de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, p. 93-94). Obs – Recordem-se do exemplo dado em aula em que o Hugo leva seu filho que necessita de um tratamento urgente, para o hospital, e para tal, avança o sinal vermelho, bem devagar, depois de observar que nem pedestres nem veículos automotores atravessavam o local. A definição de regras, em Alexy, aproxima-se da definição de Dworkin, mas com algumas distinções. Já as regras são normas que são sempre ou satisfeitas ou não satisfeitas. Se uma regra vale, então, deve se fazer exatamente aquilo que ela exige; nem mais, nem menos [...] (ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Trad. de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, p. 91). No que tange ao conflito de regras, Alexy determina que: Um conflito de regras somente pode ser solucionado se se introduz, em uma das regras, uma cláusula de exceção que elimine o conflito, ou se pelo menos uma das regras for declarada inválida. Um exemplo para um conflito entre regras que pode ser resolvido por meio da introdução de uma cláusula de exceção é aquele entre a proibiçãode sair de uma sala de aula antes que o sinal toque e o dever de deixar a sala se soar o alarme de incêndio. Se o sinal ainda não tiver sido tocado, mas o alarme de incêndio tiver soado, essas regras conduzem a juízos concretos de dever- ser contraditórios entre si. Esse conflito deve ser solucionado por meio da inclusão, na primeira regra, de uma cláusula de exceção para o caso de alarme de incêndio (ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Trad. de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, p. 92). Ademais: Se esse tipo de solução não for possível, pelos menos uma das regras tem de ser declarada inválida e, com isso, extirpada do ordenamento jurídico. Ao contrário do que ocorre com o conceito de validade social ou de importância de uma norma, o conceito de validade jurídica não é graduável. Ou uma norma jurídica é válida, ou não é. Se uma regra é válida e aplicável a um caso concreto, isso significa que também sua consequência jurídica é válida. Não importa a forma como sejam fundamentados, não é possível que dois juízos concretos de dever-ser contraditórios entre si sejam válidos. Em um determinado caso, se se constata a aplicabilidade de duas regras com consequências jurídicas concretas contraditórias entre si, e essa contradição não pode ser eliminada por meio da introdução de uma cláusula de exceção, então, pelo menos uma das regras deve ser declarada inválida (ALEXY, Robert. Teoria dos direitos fundamentais. Trad. de Virgílio Afonso da Silva. São Paulo: Malheiros, p. 92). Por referidas passagens da obra de Alexy, constata-se que o autor, como Dworkin, concebe as regras no plano da validade, de maneira que, se houver um conflito de regras, uma delas deverá ser considerada válida e aplicável, e, a outra inválida, a não ser que uma seja exceção à outra. Alexy, contudo, alerta que algumas regras também podem ter um caráter prima facie. Para explicar isso, afirma-se existirem regras completas e regras incompletas. As regras completas estão presentes quando a determinação contida no dispositivo é suficiente para a decisão. Ora, como essas regras não detêm qualquer exceção, seriam consideradas razões definitivas. Quanto às regras incompletas em Alexy, Marcelo Novelino assim adverte: As regras incompletas são aquelas que, apesar de extraídas de disposições de direitos fundamentais que fixam determinações em relação às exigências de princípios colidentes, não podem ser aplicadas independentemente de sopesamentos, por ser necessário “um recurso ao nível dos princípios, com todas as incertezas que estão a ele vinculadas” para se chegar à decisão. Entretanto, ao mesmo tempo em que isso não significa que as determinações contidas em uma regra não devam ser levadas a sério na medida em que forem suficientes para a decisão, por outro lado, não se pode ignorar que a exigência de levar a sério as disposições de direitos fundamentais vale também para as determinações fixadas por meio de princípios, e não apenas para aquelas estabelecidas por meio de regras (NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 129). Enfim, Alexy, ao que parece, considera as normas completas como mandamentos definitivos e as normas incompletas como mandamentos prima facie. Ronald Dworkin e Robert Alexy, conforme dissemos anteriormente, são dois ícones, atualmente, no que tange ao estabelecimento da distinção entre os princípios e as regras. Passaremos, a partir de agora, a analisar os fundamentos de tais autores para superar os chamados casos difíceis, citados em aula. Ronald Dworkin, para comprovar sua tese, lançará mão da metáfora do juiz Hércules e, posteriormente, da metáfora do romance em cadeia. No primeiro caso, Dworkin imagina um magistrado com capacidades e paciência sobre-humanas, competente para, de maneira criteriosa e metódica, selecionar as hipóteses de interpretação dos casos concretos a partir do filtro da integridade. Assim, em diálogo com as partes daqueles processos, ele deverá interpretar a história institucional como um movimento constante e partindo de uma análise completa e criteriosa da Constituição, da legislação e dos precedentes, para identificar nestes a leitura feita pela própria sociedade dos princípios jurídicos aplicáveis aos casos. Como consequência, supera-se a chamada “vontade do legislador” (ou dos pais fundadores) como requisito assegurador da objetividade na interpretação do Direito, como bem esboçado pela tradição do positivismo. O fundamento da tese dworkiana para tal postura está na compreensão da interpretação jurídica como uma forma de interpretação construtiva, capaz de tomar as práticas sociais da melhor forma possível. Já no romance em cadeia, o que se propõe consiste num exercício literário em que um grupo de romancistas seja contratado para um determinado projeto e que jogue dados para definir a ordem do jogo. O número mais baixo escreve o capítulo de abertura de um romance, que ele depois manda para o número seguinte, o qual acrescenta um capítulo, com a compreensão de que está acrescendo um capítulo a esse romance, não começando outro, e manda os dois capítulos para o seguinte, e assim por diante. Cada romancista, a não ser o primeiro, tem a dupla responsabilidade de interpretar e criar, pois precisa ler tudo o que foi feito antes para estabelecer, no sentido interpretativista, o que é o romance criado até então. Nessa perspectiva, cada juiz será como um romancista na corrente, de modo que deverá interpretar tudo o que foi escrito no passado por outros juízes e partes nos respectivos processos, buscando descobrir o que disseram, bem como o seu estado de espírito quando o disseram, objetivando chegar a uma opinião do que eles fizeram coletivamente. A cada caso, o juiz incumbido de decidir deverá se considerar como parte de um complexo empreendimento em cadeia no qual as inúmeras decisões, convenções e práticas representam a história, que será o seu limite. O trabalho consistirá, portanto, na continuação dessa história, mas com olhos para o futuro, levando em consideração o que foi feito, por ele e pelos demais, no presente (que também contém o passado). Ele deverá interpretar o que aconteceu no passado e não partir em uma nova direção. Isso porque o dever do juiz consiste, para Dworkin, em interpretar a história jurídica que encontra e não inventar uma história melhor. Dessa forma, não pode o magistrado romper com o passado, porque a escolha entre os vários sentidos que o texto legal apresenta não pode ser remetida à intenção de ninguém in concreto, mas sim deve ser feita à luz de uma teoria política e com base no melhor princípio ou política que possa justificar tal prática. Outro ponto importante é que Dworkin pressupõe a identificação de uma comunidade de princípios, ou seja, uma dada sociedade é compreendida como formada por pessoas que consideram ser sua prática governada por princípios comuns e não somente por regras criadas em conformidade com um acordo político. Assim, o Direito não está restrito ao conjunto de decisões tomadas em âmbito institucional, mas o transborda, devendo ser tido, em termos gerais, como um sistema de princípios construídos a partir da interpretação da história das práticas sociais, ponto que se deve pressupor nas decisões institucionais. Dessa forma, tanto o juiz Hércules quanto os co-autores do romance em cadeia representam os membros dessa comunidade, tendo sua visão moldada por esse mesmo pano de fundo de silêncio compartilhado que rege as práticas sociais. Assim, tais atividades levarão não somente o magistrado,mas também a comunidade, compreendida pela totalidade de seus membros, ao melhor argumento possível do ponto de vista de uma moral política substantiva, bem como a um argumento com pretensões de ser o correto. Já para Alexy, a despeito das teorias positivistas separarem o Direito e a Moral, por meio de um conceito de Direito com validade puramente formal, corroborada pela legalidade em conformidade com o ordenamento e a eficácia social, teorias não-positivistas tendem a vinculá-los (direito e moral), concebendo o autor um conceito de direito carreado de um terceiro aspecto além dos dois primeiros, vale dizer, o da correção material: o direito é um sistema de normas que (1) formula uma pretensão de correção, (2) consistindo na totalidade das normas que pertencem a uma Constituição geralmente eficaz e que não são extremamente injustas, bem como à totalidade das normas promulgadas de acordo com esta Constituição, que possuem um mínimo de eficácia social ou de probabilidade de eficácia e não são extremamente injustas a qual (3) pertencem princípios e outros argumentos normativos nos quais se apoia o procedimento de aplicação do Direito e/ou tem que se apoiar a fim de satisfazer a pretensão da correção (ALEXY, Robert. El concepto y la validez Del derecho. Barcelona: Gedisa, p. 123). Com esses ditames Alexy enfatiza que um sistema desprovido de pretensão à correção não possa ser considerado sistema jurídico, e que na prática os sistemas jurídicos a formulam. Que os elementos outrora descritos (legalidade em conformidade com o ordenamento, eficácia social e a correção material) referem-se além da constituição, às normas postas em conformidade com essa constituição, existindo uma estrutura escalonada, excluindo-se normas extremamente injustas da seara do direito. E por fim, que incorpora-se ao direito o procedimento de sua aplicação, pois tudo aquilo em que se apoia ou que tem que se apoiar alguém que aplica o direito almejando sua correção o direito abarca. Ou seja, que princípios não identificados como jurídicos sobre as bases da validade de uma constituição bem como demais argumentos normativos fundamentadores de decisões pertenceriam ao direito. Em suma, Alexy considera direito e moral como “aliados”. Aliados estes que, por meio de princípios bem como de argumentação jurídica, buscam uma aplicação justa para o direito. Isso se dá, por que segundo Alexy, os princípios equiparam-se a valores, apesar de não tratarem-se destes. Para o autor, princípios dizem respeito a um conceito deontológico (de dever ser), enquanto que os valores atinem a um conceito axiológico (de bom, de melhor), não obstante estarem intimamente ligados, possibilitando-se colisão, bem como sopesamento tanto de princípios como de valores, vez que a realização gradual dos princípios corresponde à dos valores. Alexy delimita que a visão do nível dos princípios mostra que neles estão reunidas coisas extremamente diversas. Mas, mais importante que referir-se a essa diversidade é a constatação de sua indeterminação. Pois no mundo dos princípios há lugar pra muita coisa, podendo-se chamá-lo de mundo do dever-ser ideal. Para ele, as colisões, tensões, conflitos, etc, surgem exatamente no momento em que se tem de passar do espaçoso mundo do dever-ser ideal para o estreito mundo do dever-ser definitivo ou real. Mas os princípios por si só, não têm a possibilidade de determinar a resposta correta para cada caso, necessitando de um “amparo” para que alcance a aplicação racional do Direito. Alexy então, na busca dessa aplicação racional do direito, elabora uma teoria da argumentação jurídica, identificando-a como um caso especial da argumentação prática geral (da argumentação moral), que, conjuntamente às regras e princípios, formam um procedimento apto a estabelecer a melhor decisão para o caso concreto (ALEXY, Robert. Teoria da argumentação jurídica. Trad. de Zilda Hutchinson Schild Silva. São Paulo: Landy, 2001). 2.2 A evolução normativa dos princípios O processo de reconhecimento normativo dos princípios percorre diversas etapas na história jurídica, podendo-se apontar o seguinte. Jusnaturalismo (Direito Natural) – Os princípios são encarados como valores superiores, eternos, uniformes, permanentes e imutáveis. Neste período, os princípios são vistos de uma forma abstrata e metafísica, carecendo de normatividade, servindo, unicamente de um norte valorativo a seguir-se. Positivismo Jurídico (dominou a ciência jurídica no século XX) – O positivismo jurídico tem diversas etapas, dependendo do momento histórico vivido. De uma forma geral, a maioria da doutrina nega a normatividade dos princípios no positivismo jurídico, classificando-os, como fontes subsidiárias, a serem observadas, por este caráter, unicamente, como uma válvula de segurança, caso haja eventual lacuna no ordenamento jurídico, após esgotadas as previsões legais, a analogia e os costumes. Pós-positivismo jurídico – Diversos autores (com ênfase em Luis Roberto Barroso) sustentam que, somente com o advento do pós-positivismo (surgiu nas últimas décadas do século XX), reconheceu- se a normatividade dos princípios, tendo tal corrente filosófica como principais características a ascensão dos valores e o reconhecimento da normatividade dos princípios, fundamentando que a dogmática tradicional (positivismo jurídico) fomentou-se sob o mito da objetividade do Direito e da neutralidade do intérprete, tendo encoberto seu caráter ideológico bem como sua instrumentalidade à dominação econômica e social. Assim, no pós-positivismo jurídico os princípios e as regras são considerados subespécie de normas. OBS – Principais aspectos do ponto, desenvolvidos em aula: I A Constituição é composta de um emaranhado (complexo) de normas, cujas subespécies são os princípios e as regras; II Os princípios e as regras, como referenciais para o intérprete, não detém hierarquia; III Tradicional e basicamente, os princípios eram definidos como mandamentos normativos mais abstratos, genéricos; e as regras como mandamentos normativos mais específicos; IV Para Ronald Dworkin, as regras devem ser analisadas no plano da validade, sendo aplicáveis na forma de tudo ou nada. Assim, em ocorrendo os fatos previstos por uma regra válida, a resposta por ela dada deve ser aceita; V Segundo Ronald Dworkin, havendo um conflito de regras, se uma é considerada válida e aplicada ao caso, logicamente, a outra deve ser declarada inválida, a não ser que uma excetue a outra; VI Conforme Ronald Dworkin, eventual conflito entre regras deverá ser resolvido segundo os critérios tradicionais de hierarquia (norma hierarquicamente superior prevalece sobre norma hierarquicamente inferior), cronologia (norma posterior prevalece sobre norma anterior) e especialidade (norma especial prevalece sobre norma geral), devendo uma delas ser considerada inválida; VII Dworkin sustenta que os princípios são prima facie, possuindo, diversamente das regras, uma dimensão de peso ou importância, e que isso, inevitavelmente, levará a uma controvérsia acerca do melhor caminho a seguir, devendo o intérprete do direito, no caso concreto, observar qual deles terá uma precedência em relação ao outro, por meio de ponderação; VIII Para Robert Alexy a diferença entre os princípios e as regras é qualitativa; IX Segundo Alexy, os princípios são mandamentos de otimização, ou seja, normas que ordenam que algo seja realizado na maior medida possível dentro das possibilidades jurídicas e fáticas existentes; X Alexy, como Dworkin,concebe as regras no plano da validade, de maneira que, se houver um conflito de regras, uma delas deverá ser considerada válida e aplicável, e, a outra inválida, a não ser que uma seja exceção à outra; XI Alexy alerta que algumas regras também podem ter um caráter prima facie. Para explicar isso, afirma-se existirem regras completas e regras incompletas. As regras completas estão presentes quando a determinação contida no dispositivo é suficiente para a decisão. Como essas regras não detêm qualquer exceção, seriam consideradas razão definitivas. Já as regras incompletas são aquelas que, apesar de extraídas de disposições de direitos fundamentais que fixam determinações em relação às exigências de princípios colidentes, não podem ser aplicadas independentemente de sopesamentos, por ser necessário um recurso ao nível dos princípios, com todas as incertezas que estão a ele vinculadas para se chegar à decisão; XII O fundamento da teoria de Dworkin relaciona-se ao juiz Hércules e ao romance em cadeia; XIII O fundamento da teoria de Alexy concentra-se no seu conceito de direito. Para o autor o conceito de direito engloba a Constituição; as leis em conformidade com essa Constituição e a busca da correção material (justiça no caso concreto). A argumentação jurídica ocupa um papel muito importante na teoria do autor, admitindo-se que qualquer argumento utilizado sob o crivo Constitucional e legal constitua direito; XIV No Jusnaturalismo, os princípios são considerados meros valores. Ou seja, somente as regras são consideradas direito; XV No Juspositivismo considera-se os princípios como fontes subsidiárias (princípios gerais do direito), a serem aplicados quando esgotadas as regras, a analogia e os costumes; XVI No Pós-positivismo os princípios, como as regras, são considerados espécies de normas. 3 CLASSIFICAÇÃO DAS NORMAS CONSTITUCIONAIS QUANTO À EFICÁCIA E/OU APLICABILIDADE Muitos autores pretendem classificar as normas constitucionais quanto à eficácia e/ou aplicabilidade. Traremos à baila, contudo, a classificação de José Afonso da Silva, mais famosa e aplicada. 3.1 Normas constitucionais de eficácia plena As normas constitucionais de eficácia plena são aquelas que desde sua entrada em vigor, ou seja, da entrada em vigor da Constituição, produzem ou têm a possibilidade de produzir, todos os efeitos que pretendem produzir. São auto-aplicáveis (aplicação direta e imediata). Em outras palavras, em ocorrendo os fatos nela previstos ela já pode ser aplicada, independentemente de qualquer intermediação legislativa. Ex: Remédios constitucionais (habeas corpus, mandado de segurança, mandado de injunção). Art. 5º, LXVIII, CF - conceder-se-á "habeas-corpus" sempre que alguém sofrer ou se achar ameaçado de sofrer violência ou coação em sua liberdade de locomoção, por ilegalidade ou abuso de poder; Art. 5º, LXIX, CF - conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por "habeas-corpus" ou "habeas-data", quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público; Art. 5º, LXX, CF - o mandado de segurança coletivo pode ser impetrado por: a) partido político com representação no Congresso Nacional; b) organização sindical, entidade de classe ou associação legalmente constituída e em funcionamento há pelo menos um ano, em defesa dos interesses de seus membros ou associados; Art. 5º, LXXI, CF - conceder-se-á mandado de injunção sempre que a falta de norma regulamentadora torne inviável o exercício dos direitos e liberdades constitucionais e das prerrogativas inerentes à nacionalidade, à soberania e à cidadania. Relativamente à espécie normativa: aquelas que, desde a entrada em vigor da Constituição, produzem, ou têm a possibilidade de produzir, todos os efeitos essenciais, relativamente aos interesses, comportamentos e situações, que o legislador constituinte, direta e normativamente, quis regular (por exemplo: os remédios constitucionais) (MORAES, Alexandre. Direito constitucional. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 12). A Constituição Federal de 1988 revela uma acentuada tendência no sentido de deixar ao legislador ordinário a complementação de suas normas. Não obstante a maioria de seus dispositivos, sobretudo os referentes à organização e limitação dos poderes estatais, acolhe normas de eficácia plena. Estas normas possuem aplicabilidade direta e imediata por não dependerem de legislação posterior para sua inteira operatividade, estando aptas a produzir, desde sua entrada em vigor, seus efeitos essenciais (eficácia positiva e negativa). Por terem aplicabilidade integral, estas normas não podem sofrer restrições por parte do legislador infraconstitucional, o que não significa a impossibilidade de regulamentação de certos interesses nela consagrados (NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 107). As normas de eficácia plena possuem todos os elementos e requisitos para a sua incidência direta, isto é, sua regulamentação normativa é precisa a ponto de possibilitar que dela seja extraída a conduta positiva ou negativa a ser seguida. São normas consideradas completas, o que não significa serem necessariamente efetivas. Sua eficácia não depende da intermediação do legislador (NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 108). ARE 672579. AgR/RJ - RIO DE JANEIRO. AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. Relator(a): Min. LUIZ FUX. Julgamento: 29/05/2012. Órgão Julgador: Primeira Turma Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. DIREITO ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. ADICIONAL NOTURNO. REGIME DE PLANTÃO SEMANAL. NECESSÁRIO REEXAME DA LEGISLAÇÃO INFRACONSTITUCIONAL. ANÁLISE DO CONTEXTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. INCIDÊNCIA DA SÚMULA 279 DO STF. AGRAVO REGIMENTAL DESPROVIDO. 1. A repercussão geral pressupõe recurso admissível sob o crivo dos demais requisitos constitucionais e processuais de admissibilidade (art. 323 do RISTF). Consectariamente, se o recurso é inadmissível por outro motivo, não há como se pretender seja reconhecida a repercussão geral das questões constitucionais discutidas no caso (art. 102, III, § 3º, da Constituição Federal). 2. A violação reflexa e oblíqua da Constituição Federal dependente da análise de malferimento de dispositivo infraconstitucional torna inadmissível o recurso extraordinário. 3. A Súmula 279 do STF dispõe: “Para simples reexame de prova não cabe recurso extraordinário”. 4. É que o recurso extraordinário não se presta ao exame de questões que demandam o revolvimento do contexto fático-probatório dos autos, adstringindo-se à análise da violação direta da ordem constitucional. 5. In casu, o acórdão recorrido assentou: “APELAÇÃO CÍVEL. AÇÃO DE COBRANÇA DE ADICIONAL NOTURNO. DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. ADICIONAL NOTURNO. DIREITO FUNDAMENTAL. NORMA DE EFICÁCIA PLENA. REGIME DE PLANTÃO SEMANAL NOTURNO. IMPOSSIBILIDADE DE PERCEPÇÃO DA VERBA. MANUTENÇÃO DA SENTENÇA. Ainda que seja de aplicação imediata e incondicional a norma constitucional que estabeleça direitos fundamentais, não pode o Ente Estatal beneficiar-se de sua inércia em não regulamentar, em sua esfera de competência, a aplicação de direito constitucionalmente garantido. Prestado serviço no sistema de plantão, com extenso período de descanso, não se aplica ao servidor a percepção do adicional noturno, consoante estabelece o art.73 da CLT. Manutenção da sentença. Conhecimento e desprovimento do recurso.” 6. Agravo regimental a que se nega provimento. AI 707810. AgR/RJ - RIO DE JANEIRO. AG.REG. NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. Relator(a): Min. ROSA WEBER. Julgamento: 22/05/2012. Órgão Julgador: Primeira Turma. EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. TRANSPORTE COLETIVO. GRATUIDADE PARA O IDOSO. MANDADO DE SEGURANÇA CONCEDIDO NA ORIGEM. DEVER DE FISCALIZAÇÃO E DE EXPEDIÇÃO DE NORMA PELO ESTADO. OFENSA À CONSTITUIÇÃO FEDERAL NÃO CONFIGURADA. Eficácia plena e aplicabilidade imediata do art. 230, § 2º, da Constituição Federal, que assegurou a gratuidade nos transportes coletivos urbanos aos maiores de 65 anos, reconhecida em precedente desta Corte (ADI 3.768/DF, rel. Min. Cármen Lúcia, Tribunal Pleno, DJe 26.10.2007). Possibilidade de o Poder Judiciário determinar, em casos excepcionais, que o Poder Executivo adote medidas que viabilizem o exercício de direitos constitucionalmente assegurados. Ofensa ao princípio da separação de poderes não configurada. Precedentes. Agravo regimental conhecido e não provido. Processo: AIRR 7802100152003516 7802100-15.2003.5.16.0900. Relator(a): Helena Sobral Albuquerque e Mello. Julgamento: 30/04/2003. Órgão Julgador: 4ª Turma, Publicação: DJ 16/05/2003. Ementa: AGRAVO DE INSTRUMENTO. RITO SUMARÍSSIMO. Assevera o Agravante que o apelo extraordinário versa tão somente sobre a afronta aos artigos 5º, II e 7º, XI da Carta Magna . Sem arranhaduras o princípio constitucional da legalidade, já que por ser norma princípio, somente por via reflexa poderia ser atingido. Quanto ao segundo invocativo, no dizer da própria Agravante, razões do agravo, fl. 104 , -não constitui norma constitucional de eficácia plena- , pelo que pendente de regulamentação. Daí, a decisão regional apenas poderia atingir a esfera infraconstitucional não legislativa, -in casu-, preceito de ordem regulamentar empresarial. Agravo de Instrumento conhecido e desprovido. R E L A T Ó R I O Pelo despacho de fl. 99/100, originário do Eg. Tribunal Regional do Trabalho da 16ª Região, denegou-se seguimento ao recurso de revista interposto pela Reclamada. Inconformada, a Parte Agrava de Instrumento, sustentando, em síntese, que a Revista merece regular processamento (fls. 102/106). Oferecida contraminuta (fls. 110/113). Ausente remessa ao Ministério Público do Trabalho, nos moldes da Resolução Administrativa nº 322/96 do TST. É o relatório. V O T O 1. CONHECIMENTO Tempestivo o apelo (fls. 101/102), regular a representação (fl. 96/97), estão preenchidos os pressupostos genéricos do recurso, dele conheço. 2. MÉRITO De início, frise-se que a presente causa se encontra submetida ao procedimento sumaríssimo, moldes do art. 852-A e seguintes da CLT. Por conseguinte, a matéria agitada tanto nas razões do Recurso de Revista quanto na minuta do agravo há de estar em conformidade com o estatuído no artigo 896, § 6º, da CLT. A Agravante contrapondo-se à conclusão do r. despacho denegatório, enfatiza que o apelo extraordinário versa tão somente sobre a afronta aos artigos 5º, II e 7º, XI da Carta Magna. Afirma que a participação dos trabalhadores nos lucros da empresa deve ficar a critério de livre negociação entre as partes interessadas, seja através de regulamento interno, do qual devem participar empregados e empregadores, seja mediante acordo coletivo de trabalho. Sem merecer censura o r. despacho agravado. O v. acórdão regional consignou “in verbis”, fl. 75: ”(...) A Participação nos Lucros, conforme ensinamento doutrinário, é o pagamento feito pelo empregador ao empregado, referente à distribuição do resultado positivo alcançado pela empresa com a colaboração do empregado, que com sua força de trabalho contribuiu para obtenção do lucro. Sem maiores digressões, entendo que afronta o princípio da igualdade, capitulado como direito individual na Constituição Federal, art. 5º, o programa implementado pela TELEMAR, vez que prejudicou os empregados demitidos sem justa causa durante o exercício de 2000, tanto que um empregado que tenha trabalhado durante 04 (quatro) meses durante ao ano de 2000 e tenha sido demitido antes de dezembro do referido ano, não tenha direito a participar nos lucros deste exercício financeiro, apesar de demitido sem justa causa. Dessa forma, ante os princípios norteadores do Direito do Trabalho e do Direito Constitucional, considero de cunho discriminatório o Programa de Participação nos Resultados implementado pela empresa, não podendo, portanto, se aplicar ao reclamante, a restrição imposta pelo Programa”. A decisão retrata apreciação do conteúdo do Programa de Participação nos Resultados da Empresa, na parte pertinente ao tratamento distributivo dos lucros. Apreciou a pretensão obreira de auferir o ganho participativo, sob o prisma do princípio constitucional da igualdade. Restou sem arranhaduras o princípio constitucional da legalidade, já que por ser norma princípio, somente por via reflexa poderia ser atingido. Quanto a afronta ao artigo 7º, XI da Carta Magna, no dizer da própria Agravante, razões do agravo, fl. 104, “não constitui norma constitucional de eficácia plena”, pelo que pendente de regulamentação. Daí, a decisão regional apenas poderia atingir a esfera infraconstitucional não legislativa, “in casu”, preceito de ordem regulamentar empresarial. Nego provimento ao agravo de instrumento. ISTO POSTO ACORDAM os Ministros da Quarta Turma do Tribunal Superior do Trabalho, por unanimidade, conhecer do Agravo de Instrumento e, no mérito, negar-lhe provimento. Brasília, 30 de abril de 2003. JUÍZA CONVOCADA HELENA E MELLO RELATORA 3.2 Normas constitucionais de eficácia contida As normas constitucionais de eficácia contida podem ser classificadas como aquelas normas constitucionais em que o legislador constituinte originário regulou suficientemente os interesses acerca de determinada matéria, mas deixou uma margem de atuação restritiva por parte da competência discricionária do poder público, nos termos em que a lei estabelecer. Assim, nessa espécie de norma, pode-se efetivar, desde já, o direito nela previsto, contudo, o legislador poderá efetuar uma contenção/ restrição ao seu exercício. Ex: Direito de liberdade de profissão - art. 5º, XIII da CF. Art. 5º, XIII, CF - é livre o exercício de qualquer trabalho, ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer. Quanto às normas constitucionais de eficácia contida: Normas constitucionais de eficácia contida são aquelas em que o legislador constituinte regulou suficientemente os interesses relativos a determinada matéria, mas deixou uma margem à atuação restritiva por parte da competência discricionária do poder público, nos termos que a lei estabelecer ou nos termos de conceitos gerais nela enunciados (por exemplo: art. 5º, XIII – é livre o exercício de qualquer trabalho ofício ou profissão, atendidas as qualificações profissionais que a lei estabelecer) (MORAES, Alexandre. Direito constitucional. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 12). Possuem eficácia positiva e negativa. Enquanto não elaborada a norma regulamentadora restritiva, terão aplicabilidade integral, como se fossem uma “norma de eficácia plena passível de restrição”. A aplicabilidade dessas normas independe da intervenção do legislador ordinário, isto é, não estão condicionadas à existência de uma normação infraconstitucional ulterior, apesar de passíveis de limitadaspor ela (NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 108). STF analisa recurso contra obrigatoriedade do exame da OAB Fonte: (http://ultimainstancia.uol.com.br/conteudo/noticias/53660/stf+analisa+recurso+contra+obrigatoriedade+do+exa me+da+oab.shtml) O Plenário do STF (Supremo Tribunal Federal) iniciou nesta quarta-feira (26/10) o julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 603583, com repercussão geral reconhecida, que discute a constitucionalidade da exigência de aprovação prévia em exame como requisito para a inscrição do bacharel em Direito nos quadros da Ordem dos Advogados do Brasil. O recurso afirma que a submissão dos bacharéis ao exame atenta contra os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da igualdade, do livre exercício das profissões, bem como contra o direito à vida. Conforme o recurso, impedir que os bacharéis exerçam a profissão de advogado após a conclusão do curso universitário também representaria ofensa aos princípios da presunção de inocência, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. Recurso Extraordinário contra decisão do TRF da 4ª Região que rejeitou a alegação de inconstitucionalidade do artigo 8º, parágrafo 1º, da Lei 8.906/1994 (Estatuto da OAB) e dos Provimentos 81/1996 e 109/2005 do Conselho Federal da OAB, que dispõem sobre a exigência de prévia aprovação no exame de ordem como requisito para a inscrição do bacharel em direito nos quadros da OAB, por ofensa aos artigos 1º, incisos II, III e IV, e 3º, incisos IV e V, da Constituição Federal. O Recurso sustenta caber às instituições de ensino superior certificar a aptidão do bacharel para o exercício profissional, e que a sujeição dos bacharéis ao exame viola o direito à vida e aos princípios da dignidade da pessoa humana, da igualdade, do livre exercício das profissões, da presunção de inocência, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa e representa censura prévia ao exercício profissional. A União sustenta que a norma constitucional invocada como violada possui eficácia contida, limitada por lei ordinária constitucional. O procurador-geral da União, Roberto Gurgel sustentou o desprovimento do recurso extraordinário. Gurgel manifestou-se favoravelmente ao Exame da OAB e defendeu que a liberdade de escolha de profissão deve ser interpretada levando em conta o artigo 22, inciso XVI, da Constituição Federal. Dessa forma, frisou o procurador-geral, o efetivo exercício de uma profissão dependerá do atendimento às qualificações e exigências legais. Antes do pronunciamento do procurador-geral, falou na tribuna o advogado Alberto Jorge Junior, representando a AASP (Associação dos Advogados de São Paulo), em defesa do exame. No recurso, o bacharel afirma que a submissão dos bacharéis ao exame como requisito para a inscrição nos quadros da OAB atenta contra os princípios constitucionais da dignidade da pessoa humana, da igualdade, do livre exercício das profissões, bem como contra o direito à vida. Impedir que os bacharéis exerçam a profissão de advogado após a conclusão do curso universitário também representaria ofensa aos princípios da presunção de inocência, do devido processo legal, do contraditório e da ampla defesa. O presidente do Conselho Federal da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil), Ophir Cavalcante, sustenta a incorrência de contrariedade à Constituição. TRT-14 - RECURSO ORDINARIO TRABALHISTA: RO 37820090061400 RO 00378.2009.006.14.00. Relator(a): DESEMBARGADOR VULMAR DE ARAÚJO COÊLHO JUNIOR. Julgamento: 12/08/2009. Órgão Julgador: PRIMEIRA TURMA. Publicação: DETRT14 n.0150, de 14/08/2009 Emanta: MUNICÍPIO DE PORTO VELHO - RONDÔNIA. SERVIDOR CELETISTA. GRATIFICAÇAO DE LOCALIDADE. Art. 5º DA LEI MUNICIPAL Nº 1.151/94. NORMA DE EFICÁCIA CONTIDA. Em estudo analógico da classificação das normas constitucionais adotada pelo nobre doutrinador José Afonso da Silva, percebe-se que o art. 5º da Lei Municipal de Porto Velho nº 1.151/94 trata-se de norma de eficácia contida e não limitada, pois a regra municipal pode ser reduzida ou restringida por regulamento. Assim, enquanto não sobrevier a criação do regulamento que restrinja a norma de eficácia contida, esta terá eficácia plena e total, já que nestes casos as normas de eficácia restringível apenas admitem o regulamento. 3.3 Normas constitucionais de eficácia limitada Normas constitucionais de eficácia limitada são conhecidas por sua aplicabilidade indireta, mediata e reduzida, pois somente incidem totalmente sobre os interesses, após uma normatividade ulterior que lhes desenvolva aplicabilidade. Ex: art. 37, VII da CF. Art. 37, caput, CF - A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) Art. 37, inciso VII, CF - o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998) Quanto a essa espécie de normas: Por fim, normas constitucionais de eficácia limitada são aquelas que apresentam “aplicabilidade indireta, mediata e reduzida, porque somente incidem totalmente sobre esses interesses, após uma normatividade ulterior que lhes desenvolva a aplicabilidade” (por exemplo: CF, art. 37, VII: o direito de greve será exercido nos termos e nos limites definidos em lei específica. Essa previsão condiciona o exercício do direito de greve, no serviço público, à regulamentação legal. Ainda, podemos citar como exemplo o art. 7º, XI, da Constituição Federal, que prevê a participação dos empregados nos lucros, ou resultados da empresa, conforme definido em lei (MORAES, Alexandre. Direito constitucional. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 12). Algumas normas constitucionais só manifestam a plenitude dos efeitos jurídicos pretendidos pelo legislador constituinte após a emissão de atos normativos previstos ou requeridos por ela, possuindo uma eficácia limitada ou reduzida. A aplicabilidade dessas normas é indireta, mediata e reduzida, pois só incidem sobre os interesses objeto de sua regulamentação jurídica após uma normatividade ulterior que lhes desenvolva a eficácia, conquanto tenham uma incidência reduzida e surtam outros efeitos não essenciais (NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 110). Mandado de Injunção 20–4/DF, DJU: 22.11.1996, p. 45.690, Rel. Min. Celso de Mello: MANDADO DE INJUNÇÃO COLETIVO - DIREITO DE GREVE DO SERVIDOR PÚBLICO CIVIL - EVOLUÇÃO DESSE DIREITO NO CONSTITUCIONALISMO BRASILEIRO - MODELOS NORMATIVOS NO DIREITO COMPARADO - PRERROGATIVA JURÍDICA ASSEGURADA PELA CONSTITUIÇÃO (ART. 37, VII) - IMPOSSIBILIDADE DE SEU EXERCÍCIO ANTES DA EDIÇÃO DE LEI COMPLEMENTAR - OMISSÃO LEGISLATIVA - HIPÓTESE DE SUA CONFIGURAÇÃO - RECONHECIMENTO DO ESTADO DE MORA DO CONGRESSO NACIONAL - IMPETRAÇÃO POR ENTIDADE DE CLASSE - ADMISSIBILIDADE - WRIT CONCEDIDO. DIREITO DE GREVE NO SERVIÇO PÚBLICO: O preceito constitucional que reconheceu o direito de greve ao servidor público civil constitui norma de eficácia meramente limitada, desprovida, em conseqüência, de autoaplicabilidade, razão pela qual, para atuar plenamente, depende da edição da lei complementar exigida pelo próprio texto da Constituição. A mera outorga constitucional do direito de greve ao servidor público civil não basta - ante a ausência de auto-aplicabilidadeda normaconstante do art. 37, VII, da Constituição - para justificar o seu imediato exercício. O exercício do direito público subjetivo de greve outorgado aos servidores civis só se revelará possível depois da edição da lei complementar reclamada pela Carta Política. A lei complementar referida - que vai definir os termos e os limites do exercício do direito de greve no serviço público - constitui requisito de aplicabilidade e de operatividade da norma inscrita no art. 37, VII, do texto constitucional. Essa situação de lacuna técnica, precisamente por inviabilizar o exercício do direito de greve, justifica a utilização e o deferimento do mandado de injunção. A inércia estatal configura-se, objetivamente, quando o excessivo e irrazoável retardamento na efetivação da prestação legislativa - não obstante a ausência, na Constituição, de prazo pré-fixado para a edição da necessária norma regulamentadora - vem a comprometer e a nulificar a situação subjetiva de vantagem criada pelo texto constitucional em favor dos seus beneficiários. MANDADO DE INJUNÇÃO COLETIVO: A jurisprudência do Supremo Tribunal Federal firmou-se no sentido de admitir a utilização, pelos organismos sindicais e pelas entidades de classe, do mandado de injunção coletivo, com a finalidade de viabilizar, em favor dos membros ou associados dessas instituições, o exercício de direitos assegurados pela Constituição. Precedentes e doutrina. TJDF - Apelação Cível: APL 475691320098070001 DF 0047569-13.2009.807.0001. Relator(a): VERA ANDRIGHI. Julgamento: 02/05/2012. Órgão Julgador: 6ª Turma Cível. Publicação: 10/05/2012, DJ-e Pág. 197. Ementa: ADMINISTRATIVO. GRATIFICAÇÃO DE TITULAÇÃO. NORMA DE EFICÁCIA LIMITADA. I - O ART. 37 DA LEI DISTRITAL 3.824/06, QUE INSTITUIU A GRATIFICAÇÃO DE TITULAÇÃO, É NORMA DE EFICÁCIA LIMITADA QUE DEPENDE, PARA SUA APLICAÇÃO, DE REGULAMENTAÇÃO PELO PODER EXECUTIVO. II - APELAÇÃO DOS AUTORES DESPROVIDA. STJ - AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO: AgRg no Ag 1332935 DF 2010/0137976-1. Relator(a): Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO. Julgamento: 19/06/2012. Órgão Julgador: T1 - PRIMEIRA TURMA. Publicação: DJe 28/06/2012. Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO. TRIBUTÁRIO. PIS ECOFINS. VIOLAÇÃO AO PRINCÍPIO DO DEVIDO PROCESSO LEGAL (ART. 5º., INCISOS LV E XXXV DA CF). MATÉRIA DE ÍNDOLE CONSTITUCIONAL. INEXISTÊNCIA DE OFENSA AO ART. 535, II DO CPC. EXCLUSÃO DA BASE DECÁLCULO DE RECEITAS TRANSFERIDAS A TERCEIROS (ART. 3º., § 2º., IIIDA LEI 9.718/98). NORMA DE EFICÁCIA LIMITADA. NECESSIDADE DEREGULAMENTAÇÃO. PRECEDENTES DO STJ. AGRAVO REGIMENTAL DE UMBROINDÚSTRIA E COMÉRCIO LTDA E OUTROS DESPROVIDO. As normas constitucionais de eficácia limitada se subdividem em: 3.3.1 Normas constitucionais institutivas As normas institutivas são aquelas normas constitucionais que preveem a necessidade de criação de organização ou esclarecimento (especificação) de competências de instituições, de órgãos, e até de entes políticos. Ex: art. 134, § 1º da CF. Art. 134. A Defensoria Pública é instituição essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a orientação jurídica e a defesa, em todos os graus, dos necessitados, na forma do art. 5º, LXXIV.) § 1º Lei complementar organizará a Defensoria Pública da União e do Distrito Federal e dos Territórios e prescreverá normas gerais para sua organização nos Estados, em cargos de carreira, providos, na classe inicial, mediante concurso público de provas e títulos, assegurada a seus integrantes a garantia da inamovibilidade e vedado o exercício da advocacia fora das atribuições institucionais. (Renumerado pela Emenda Constitucional nº 45, de 2004) No que toca a essa espécie de norma constitucional limitada: São normas de eficácia limitada que dependem de lei para organizar ou dar estrutura a entidades, órgãos ou instituições previstos na Constituição. Seu conteúdo é eminentemente organizatório e regulativo. [...] (NOVELINO, Marcelo. Direito Constitucional. 6. ed. Rio de Janeiro: Forense, 2012, p. 110). As normas constitucionais de eficácia limitada, declaratórias de princípios institutivos ou organizativos (ou orgânicos) contêm esquemas gerais (iniciais) de estruturação de instituições, órgãos ou entidades [...] (LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 221). 3.3.2 Normas programáticas As normas programáticas são espécie no gênero limitada, exigindo ou a atuação legislativa ou uma prestação positiva (fomento de política pública) por parte do poder público que lhes ofereçam plena eficácia. São as chamadas normas de aplicação diferida, ou adiada, pois condicionadas a um evento futuro incerto, qual seja, a criação de uma lei ou o fomento de uma política pública que lhes efetivem. Ex: Direitos sociais; arts. 6º e 196 da CF. Art. 6º, CF - São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 64, de 2010) Art. 196, CF - A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. Nesse viés, interessante observar: São de aplicação diferida, e não de aplicação ou execução imediata; mais do que comando-regras, explicitam comandos-valores, conferem elasticidade ao ordenamento constitucional; têm destinatário primacial – embora não o único – o legislador, a cuja opção fica a ponderação do tempo e dos meios em que vêm a ser revestidas de plena eficácia (e nisso consiste a discricionariedade); não consentem que os cidadãos ou quaisquer cidadãos as invoquem já (ou imediatamente após a entrada em vigor da Constituição), pedindo aos tribunais o seu cumprimento só por si, pelo que pode haver quem afirme que os direitos que nela constam, máxime os direitos sociais, têm mais natureza de expectativas que de verdadeiros direitos subjetivos; aparecem, muitas vezes, acompanhadas de conceitos indeterminados ou parcialmente indeterminados (MORAES, Alexandre. Direito constitucional. 25. ed. São Paulo: Atlas, 2010, p. 14). Já as normas de eficácia limitada, declaratórias de princípios programáticos, veiculam programas a serem implementados pelo Estado, visando a realização de fins sociais (arts. 6º, - direito à alimentação; 196 – direito à saúde; 205 – direito à educação; 215 – cultura; 218, caput – ciência e tecnologia; 227 – proteção da criança ... LENZA, Pedro. Direito constitucional esquematizado. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, p. 221). Art. 6º, CF - São direitos sociais a educação, a saúde, a alimentação, o trabalho, a moradia, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 64, de 2010) Art. 196, CF - A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação. Art. 205, CF - A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao plenodesenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Art. 215, CF - O Estado garantirá a todos o pleno exercício dos direitos culturais e acesso às fontes da cultura nacional, e apoiará e incentivará a valorização e a difusão das manifestações culturais. Art. 218, CF - O Estado promoverá e incentivará o desenvolvimento científico, a pesquisa e a capacitação tecnológicas. Art. 227, CF - É dever da família, da sociedade e do Estado assegurar à criança, ao adolescente e ao jovem, com absoluta prioridade, o direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, ao lazer, à profissionalização, à cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade e à convivência familiar e comunitária, além de colocá-los a salvo de toda forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão. (Redação dada Pela Emenda Constitucional nº 65, de 2010) ARE 639337 AgR / SP - SÃO PAULO. AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO. Relator(a): Min. CELSO DE MELLO. Julgamento: 23/08/2011. Órgão Julgador: Segunda Turma. E M E N T A: CRIANÇA DE ATÉ CINCO ANOS DE IDADE - ATENDIMENTO EM CRECHE E EM PRÉ-ESCOLA - SENTENÇA QUE OBRIGA O MUNICÍPIO DE SÃO PAULO A MATRICULAR CRIANÇAS EM UNIDADES DE ENSINO INFANTIL PRÓXIMAS DE SUA RESIDÊNCIA OU DO ENDEREÇO DE TRABALHO DE SEUS RESPONSÁVEIS LEGAIS, SOB PENA DE MULTA DIÁRIA POR CRIANÇA NÃO ATENDIDA - LEGITIMIDADE JURÍDICA DA UTILIZAÇÃO DAS “ASTREINTES” CONTRA O PODER PÚBLICO - DOUTRINA - JURISPRUDÊNCIA - OBRIGAÇÃO ESTATAL DE RESPEITAR OS DIREITOS DAS CRIANÇAS - EDUCAÇÃO INFANTIL - DIREITO ASSEGURADO PELO PRÓPRIO TEXTO CONSTITUCIONAL (CF, ART. 208, IV, NA REDAÇÃO DADA PELA EC Nº 53/2006) - COMPREENSÃO GLOBAL DO DIREITO CONSTITUCIONAL À EDUCAÇÃO - DEVER JURÍDICO CUJA EXECUÇÃO SE IMPÕE AO PODER PÚBLICO, NOTADAMENTE AO MUNICÍPIO (CF, ART. 211, § 2º) - LEGITIMIDADE CONSTITUCIONAL DA INTERVENÇÃO DO PODER JUDICIÁRIO EM CASO DE OMISSÃO ESTATAL NA IMPLEMENTAÇÃO DE POLÍTICAS PÚBLICAS PREVISTAS NA CONSTITUIÇÃO - INOCORRÊNCIA DE TRANSGRESSÃO AO POSTULADO DA SEPARAÇÃO DE PODERES - PROTEÇÃO JUDICIAL DE DIREITOS SOCIAIS, ESCASSEZ DE RECURSOS E A QUESTÃO DAS “ESCOLHAS TRÁGICAS” - RESERVA DO POSSÍVEL, MÍNIMO EXISTENCIAL, DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E VEDAÇÃO DO RETROCESSO SOCIAL - PRETENDIDA EXONERAÇÃO DO ENCARGO CONSTITUCIONAL POR EFEITO DE SUPERVENIÊNCIA DE NOVA REALIDADE FÁTICA - QUESTÃO QUE SEQUER FOI SUSCITADA NAS RAZÕES DE RECURSO EXTRAORDINÁRIO -PRINCÍPIO “JURA NOVIT CURIA” - INVOCAÇÃO EM SEDE DE APELO EXTREMO - IMPOSSIBILIDADE - RECURSO DE AGRAVO IMPROVIDO. POLÍTICAS PÚBLICAS, OMISSÃO ESTATAL INJUSTIFICÁVEL E INTERVENÇÃO CONCRETIZADORA DO PODER JUDICIÁRIO EM TEMA DE EDUCAÇÃO INFANTIL: POSSIBILIDADE CONSTITUCIONAL. - A educação infantil representa prerrogativa constitucional indisponível, que, deferida às crianças, a estas assegura, para efeito de seu desenvolvimento integral, e como primeira etapa do processo de educação básica, o atendimento em creche e o acesso à pré-escola (CF, art. 208, IV). - Essa prerrogativa jurídica, em conseqüência, impõe, ao Estado, por efeito da alta significação social de que se reveste a educação infantil, a obrigação constitucional de criar condições objetivas que possibilitem, de maneira concreta, em favor das “crianças até 5 (cinco) anos de idade” (CF, art. 208, IV), o efetivo acesso e atendimento em creches e unidades de pré- escola, sob pena de configurar-se inaceitável omissão governamental, apta a frustrar, injustamente, por inércia, o integral adimplemento, pelo Poder Público, de prestação estatal que lhe impôs o próprio texto da Constituição Federal. - A educação infantil, por qualificar-se como direito fundamental de toda criança, não se expõe, em seu processo de concretização, a avaliações meramente discricionárias da Administração Pública nem se subordina a razões de puro pragmatismo governamental. - Os Municípios - que atuarão, prioritariamente, no ensino fundamental e na educação infantil (CF, art. 211, § 2º) - não poderão demitir-se do mandato constitucional, juridicamente vinculante, que lhes foi outorgado pelo art. 208, IV, da Lei Fundamental da República, e que representa fator de limitação da discricionariedade político- administrativa dos entes municipais, cujas opções, tratando-se do atendimento das crianças em creche (CF, art. 208, IV), não podem ser exercidas de modo a comprometer, com apoio em juízo de simples conveniência ou de mera oportunidade, a eficácia desse direito básico de índole social. - Embora inquestionável que resida, primariamente, nos Poderes Legislativo e Executivo, a prerrogativa de formular e executar políticas públicas, revela-se possível, no entanto, ao Poder Judiciário, ainda que em bases excepcionais, determinar, especialmente nas hipóteses de políticas públicas definidas pela própria Constituição, sejam estas implementadas, sempre que os órgãos estatais competentes, por descumprirem os encargos político- -jurídicos que sobre eles incidem em caráter impositivo, vierem a comprometer, com a sua omissão, a eficácia e a integridade de direitos sociais e culturais impregnados de estatura constitucional. DESCUMPRIMENTO DE POLÍTICAS PÚBLICAS DEFINIDAS EM SEDE CONSTITUCIONAL: HIPÓTESE LEGITIMADORA DE INTERVENÇÃO JURISDICIONAL. - O Poder Público - quando se abstém de cumprir, total ou parcialmente, o dever de implementar políticas públicas definidas no próprio texto constitucional - transgride, com esse comportamento negativo, a própria integridade da Lei Fundamental, estimulando, no âmbito do Estado, o preocupante fenômeno da erosão da consciência constitucional. Precedentes: ADI 1.484/DF, Rel. Min. CELSO DE MELLO, v.g.. - A inércia estatal em adimplir as imposições constitucionais traduz inaceitável gesto de desprezo pela autoridade da Constituição e configura, por isso mesmo, comportamento que deve ser evitado. É que nada se revela mais nocivo, perigoso e ilegítimo do que elaborar uma Constituição, sem a vontade de fazê-la cumprir integralmente, ou, então, de apenas executá-la com o propósito subalterno de torná-la aplicável somente nos pontos que se mostrarem ajustados à conveniência e aos desígnios dos governantes, em detrimento dos interesses maiores dos cidadãos. - A intervenção do Poder Judiciário, em tema de implementação de políticas governamentais previstas e determinadas no texto constitucional, notadamente na área da educação infantil (RTJ 199/1219- 1220), objetiva neutralizar os efeitos lesivos e perversos, que, provocados pela omissão estatal, nada mais traduzem senão inaceitável insulto a direitos básicos que a própria Constituição da República assegura à generalidade das pessoas. Precedentes. A CONTROVÉRSIA PERTINENTE À “RESERVA DO POSSÍVEL” E A INTANGIBILIDADE DO MÍNIMO EXISTENCIAL: A QUESTÃO DAS “ESCOLHAS TRÁGICAS”. - A destinação de recursos públicos, sempre tão dramaticamente escassos, faz instaurar situações de conflito, quer com a execução de políticas públicas definidas no texto constitucional, quer, também, com a própria implementação de direitos sociais assegurados pela Constituição da República, daí resultando contextos de antagonismo que impõem, ao Estado, o encargo de superá-los mediante opções por determinados valores, em detrimento de outros igualmente relevantes, compelindo, o Poder Público, em face dessa relação dilemática, causada pela insuficiência de disponibilidade financeira e orçamentária, a proceder a verdadeiras “escolhas trágicas”, em decisão governamental cujo parâmetro, fundado na dignidade da pessoa humana, deverá ter em perspectiva a intangibilidade do mínimo existencial, em ordem a conferir real efetividadeàs normas programáticas positivadas na própria Lei Fundamental. Magistério da doutrina. - A cláusula da reserva do possível - que não pode ser invocada, pelo Poder Público, com o propósito de fraudar, de frustrar e de inviabilizar a implementação de políticas públicas definidas na própria Constituição - encontra insuperável limitação na garantia constitucional do mínimo existencial, que representa, no contexto de nosso ordenamento positivo, emanação direta do postulado da essencial dignidade da pessoa humana. Doutrina. Precedentes. - A noção de “mínimo existencial”, que resulta, por implicitude, de determinados preceitos constitucionais (CF, art. 1º, III, e art. 3º, III), compreende um complexo de prerrogativas cuja concretização revela-se capaz de garantir condições adequadas de existência digna, em ordem a assegurar, à pessoa, acesso efetivo ao direito geral de liberdade e, também, a prestações positivas originárias do Estado, viabilizadoras da plena fruição de direitos sociais básicos, tais como o direito à educação, o direito à proteção integral da criança e do adolescente, o direito à saúde, o direito à assistência social, o direito à moradia, o direito à alimentação e o direito à segurança. Declaração Universal dos Direitos da Pessoa Humana, de 1948 (Artigo XXV). A PROIBIÇÃO DO RETROCESSO SOCIAL COMO OBSTÁCULO CONSTITUCIONAL À FRUSTRAÇÃO E AO INADIMPLEMENTO, PELO PODER PÚBLICO, DE DIREITOS PRESTACIONAIS. - O princípio da proibição do retrocesso impede, em tema de direitos fundamentais de caráter social, que sejam desconstituídas as conquistas já alcançadas pelo cidadão ou pela formação social em que ele vive. - A cláusula que veda o retrocesso em matéria de direitos a prestações positivas do Estado (como o direito à educação, o direito à saúde ou o direito à segurança pública, v.g.) traduz, no processo de efetivação desses direitos fundamentais individuais ou coletivos, obstáculo a que os níveis de concretização de tais prerrogativas, uma vez atingidos, venham a ser ulteriormente reduzidos ou suprimidos pelo Estado. Doutrina. Em conseqüência desse princípio, o Estado, após haver reconhecido os direitos prestacionais, assume o dever não só de torná-los efetivos, mas, também, se obriga, sob pena de transgressão ao texto constitucional, a preservá-los, abstendo-se de frustrar - mediante supressão total ou parcial - os direitos sociais já concretizados. LEGITIMIDADE JURÍDICA DA IMPOSIÇÃO, AO PODER PÚBLICO, DAS “ASTREINTES”. - Inexiste obstáculo jurídico-processual à utilização, contra entidades de direito público, da multa cominatória prevista no § 5º do art. 461 do CPC. A “astreinte” - que se reveste de função coercitiva - tem por finalidade específica compelir, legitimamente, o devedor, mesmo que se cuide do Poder Público, a cumprir o preceito, tal como definido no ato sentencial. Doutrina. Jurisprudência. OBS – Principais aspectos do ponto, desenvolvidos em aula: I As normas constitucionais de eficácia plena são aquelas que desde sua entrada em vigor, ou seja, da entrada em vigor da Constituição, produzem ou têm a possibilidade de produzir, todos os efeitos que pretendem produzir. Têm eficácia imediata, completa, integral. II As normas constitucionais de eficácia contida, como as normas constitucionais de eficácia plena, desde sua entrada em vigor, ou seja, da entrada em vigor da Constituição, produzem ou têm a possibilidade de produzir, todos os efeitos que pretendem produzir. Contudo, o legislador pode promover uma contenção/restrição a esses efeitos. Tem eficácia imediata, completa, integral, mas é passível de contenção/restrição. III As normas constitucionais de eficácia limitada só produzem efeitos após a criação de uma lei por parte do legislador. Ou seja, estão condicionadas à atividade legislativa. Têm eficácia mediata, reduzida; IV As normas constitucionais de eficácia limitada se subdividem em institutivas e programáticas; V As normas constitucionais limitadas institutivas destinam-se a criar, organizar ou dar estrutura a entidades, órgãos ou instituições previstos na Constituição; VI As normas constitucionais programáticas exigindo ou a atuação legislativa ou uma prestação positiva (fomento de política pública) por parte do poder público que lhes ofereçam plena eficácia. São normas de eficácia diferida.
Compartilhar