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1 Louyse Jerônimo de Morais Biomecânica e cinemática do trauma Referência: aula do prof. Felipe Tavares Princípios gerais 1. Colisão É qualquer tipo de acidente ou circunstância em que haja contato. Alguns exemplos são: atropelamento, queda de andaime e ferimento por arma de fogo. Costumamos chamar colisão quando tem acidente de carro apenas, mas na verdade envolve vários tipos de trauma. 2. Pré e pós-colisão O que é interessante racionar são os eventos que acontecem antes da colisão – alguns deles podem ser identificados – e os eventos pós-colisão. Geralmente, antes da colisão, em nosso país, é comum haver ingestão de bebida alcoólica. Como é algo extremamente importante, deve estar nas informações prestadas ao fazer o atendimento do paciente vítima. Além disso, também se insere a importância das doenças e ingestão de outras drogas. Tudo isso vai nos levar ao índice de suspeita, que é algo até difícil de se investigar no acidente. Ademais, algumas lesões têm que ser respeitadas e até priorizadas. A boa avaliação das vítimas é fundamental para conduzir o paciente com segurança até o atendimento hospitalar, bem como evitar possíveis danos recebidos até pelo próprio atendimento. Tudo isso vai se tornando um protocolo. Colisão As colisões começam no impacto entre dois objetos. Na maioria das vezes, vamos perceber que há três impactos, que é onde devemos investigar se houve lesão. Na figura acima, um veículo colidiu lateralmente em uma árvore. Nessa situação, temos dois objetos que colidiram – veículo e árvore. Além disso, houve impacto dos ocupantes com o próprio veículo e, por fim, o terceiro impacto é o dos órgãos [vísceras] contra os próprios ocupantes. Precisamos lembrar como o carro bateu, como os indivíduos se jogaram contra a carenagem dele e o que é que, nesses indivíduos, sofreu impacto contra a carenagem do carro, identificando os órgãos que sofreram impacto contra a parede abdominal, caixa torácica, calota craniana etc. Temos que circundar o carro e procurar o atendimento de quem está encostado na árvore. Esse é o princípio fundamental do atendimento, ou seja, nada de procurar a pessoa do banco traseiro, para não perder o paciente mais grave. Quem está gritando demais está respirando, quem não está, deve ter perdido a consciência, está com trauma de crânio grave e/ou perdeu os sentidos. Esse paciente é mais grave e é ele que deve ser identificado primeiro. Eventos da colisão [automóvel] • Local? Tem que saber se foi perto ou não, porque, se foi longe, já se sabe que a vítima está sofrendo há mais tempo. • Quem atingiu o quê? Com que velocidade? • Tempo de parada? Quando se está presente no local do acidente, é possível identificar. • Cintos? • Air bag? • Crianças contidas? • Ejeção? Na figura acima, muito provavelmente o carro azul bateu nesse “toco” de árvore e percorreu todo um percurso até frear totalmente e a velocidade chegar a zero. Ou seja, provavelmente ele estava em alta velocidade. Assim, espera-se que as vítimas estejam graves. Deve-se remover rapidamente, colocar em cima da maca e levar embora para o hospital mais próximo. 2 Louyse Jerônimo de Morais Leis da energia e do movimento • 1ª Lei do Movimento de Newton: o objeto em repouso conserva o repouso, e o movimento conserva o movimento. A exceção é uma força externa, como é o atropelamento – corpo parado é colocado em movimento. EC = ½ mv² Com base nessa relação da energia cinética de massa vs. velocidade, você acha que qual dessas pessoas abaixo se machucou mais? A. Pessoa 70 kg a 50 km/h B. Pessoa 72 kg a 50 km/h C. Pessoa 68 kg a 60 km/h Vítima C. A velocidade é ao quadrado, então o aumento de 1 km/h já gera um dano muito maior, independentemente da massa do indivíduo. Quanto maior a velocidade, pior é o efeito da lesão causada. É por isso que se recomenda o controle da velocidade nas vias. Transferência de energia entre um corpo sólido e o corpo humano Partículas atingidas pelo impacto determinam a quantidade de transferência de energia. Isso gera o que chamamos de dano. Quanto mais denso é o objeto, mais partículas estão envolvidas. Abaixo, vamos avaliar três áreas de contato com o corpo: • Automóvel • Taco de beisebol • Projétil de arma de fogo Muitas vezes, um projétil de arma de fogo vai causar mais dano do que um atropelamento por automóvel, dependendo de onde ele vai bater. Por exemplo, um projétil de arma de fogo pode quebrar a sua perna, enquanto que um atropelamento não. Nessas situações, ocorre, na verdade, uma diferença na transferência de energia, causando um dano maior de uma estrutura menor, que é o projétil de arma de fogo. O projétil de arma de fogo leva consigo uma energia, que causa uma cavidade temporária. Não se pode imaginar que esse projétil segue uma linha reta e vai sair do outro lado. Ele leva consigo uma transferência de energia, que é o que é visto na imagem anterior. É por isso que apenas um tiro pode matar. Se o tiro passar adjacente a um vaso sanguíneo, estoura e queima o vaso, sangrando tudo e levando à morte. Trauma fechado e penetrante • Ponto de contato Observar o ponto de contato é obrigatório e não pode passar despercebido. Muitas vezes, recebe-se o paciente em uma maca e só se observa a região anterior, sem fazer o rolamento. É claro que o SAMU pode fazer esse trabalho, mas pode acontecer de não ir um médico junto ao paciente para o hospital, mas sim um condutor [que não é médico], então a maneira que ele tem de passar o caso é diferente da de um médico. Por exemplo, pode ocorrer de um paciente chegar com a perna enfaixada e o SAMU dizer que é fratura exposta. Você percebe que está sangrando, acredita que é isso mesmo, mas não é. Deve-se sempre abrir o ferimento e verificar se existe exposição óssea. Muitas vezes, o paciente tem um ferimento no tornozelo e uma fratura do joelho sem ser exposta. Nesse caso, não existe comunicação da fratura do joelho com o meio externo através do ferimento. O sangue, na verdade, vem do corte no tornozelo. Além disso, é válido ressaltar que o corpo vira um objeto na hora em que ele entra em contato com a circunstância que levou ao dano. Na figura acima, o indivíduo está queimado. Admite-se que essa pessoa foi vítima de um incêndio e provavelmente pulou porque quis. O que se vê inicialmente em um trauma fechado? • Compressão • Desaceleração • Aceleração 3 Louyse Jerônimo de Morais O paciente da figura anterior levou uma queda ao solo e colidiu com o tórax no chão. Isto é, houve uma compressão, mas depois foi desacelerado, porque o corpo parou no solo. Por fim, as vísceras sofreram aceleração, porque se chocaram contra a cavidade torácica. Isso é o que cria lacerações e cavidades. Trauma penetrante É muito mais fácil, porque existe um esmagamento, bem como separação, criando cavidades, que podem ser permanentes ou temporárias. Um exemplo é a cavitação gerada pela arma de fogo, uma facada etc. Ambos os acidentes, tanto fechado quanto aberto [penetrante] criam cavidades. Então, mesmo um paciente de trauma fechado pode fazer um pneumotórax, criando cavidade, que é onde o ar vai entrar. Essa cavidade geralmente é acompanhada de uma lesão, tanto no trauma aberto quanto no fechado. Princípios mecânicos 1. Trauma fechado O exemplo acima é de uma colisão de trânsito. • Direção do impacto • Danos externos: observar o que deformou no carro, para identificar os tipos de lesões que se deve procurar na vítima. • Danos internos: saber se a porta amassou muito, machucando a vítima, se o motor caiu, se o capô do carro entrou, se o painel está deslocado, para saber se houve um acidente a mais dentro do carro que possa ter lesionado o indivíduo. • Forças envolvidas o Cisalhamento: existe muita variaçãode velocidade, então o carro roda, bate e, muitas vezes, ainda capota. Não tem como identificar a força principal – figura a seguir. o Compressão: só existe uma direção de força – é a pressão direta. Colisões automobilísticas • Impacto frontal • Impacto posterior • Impacto lateral • Impacto angular • Capotamento: mistura de forças. No carro acima, houve um impacto lateral ou frontal e o carro capotou, porque o teto está ameaçado. Em quem está sem o cinto, pode-se encontrar várias lesões, às vezes pode ser até ejetado do carro. O capotamento é muito grave. 1. Impacto frontal • Estrago no carro: afundamento. O ocupante, muitas vezes, na colisão frontal, passa a cabeça por cima do volante, o que vai dar certo padrão de lesões possíveis. Por outro lado, algumas vezes, ele está dentro do carro e passa cabeça por baixo do volante, por causa da desaceleração do impacto frontal. Nesse caso, já temos outros tipos de lesões envolvidas. Quando se pula por cima do volante, a cabeça bate no para-brisa ou no teto, então tem que estabilizar a coluna cervical do paciente, independente de dor ou não. O tórax ou abdome batem na direção. • Ocupante por cima: cabeça no para-brisa ou teto, coluna cervical, tórax e abdome na direção. • Ocupante por baixo: pé torce, tornozelo quebra, joelho no painel. Quando o joelho bate no painel, pode ocorrer um trauma indireto no quadril, ou seja, ele pode sair do lugar, porque a cabeça do fêmur resvala o acetábulo. Isso faz 4 Louyse Jerônimo de Morais quebrar a cabeça ou colo do fêmur, quebrar acetábulo ou causar as duas lesões e ainda sair do lugar. Se o indivíduo cruzar as pernas, a perna cruzada faz uma força no quadril, tentando luxa-lo. A sorte é que nosso quadril é uma estrutura muito estável, então ele não sai do lugar só cruzando a perna. No entanto, com uma colisão pequena, pode haver uma lesão, por isso que não se recomenda cruzar a perna quando se está andando no banco do carona. Na figura acima, lembre-se de não atender primeiro as vítimas do carro laranja, mas procurar primeiro no carro azul, que é o carro com massa menor. Os dispositivos de segurança evoluíram muito, salvando muitas vidas, como o cinto de três pontos e o air bag. Quando não se usa cinto, o painel do carro bate no joelho e o fêmur sai do acetábulo, luxando, podendo também quebrar acetábulo, cabeça do fêmur, grande trocanter etc. Então, podem ocorrer várias lesões ao nível do quadril. Como pode quebrar o acetábulo, existe lesão ao nível pélvico também. 2. Impacto posterior Dificilmente quem está no carro da frente sofre alguma lesão, porque quem bate atrás consegue identificar que está quase batendo e freia, então reduz bastante a velocidade. Se não perceber, pode causar dano no carro da frente e até a morte dos ocupantes. Existe um veículo projétil e um veículo-alvo. O veículo projétil é o de trás. Temos que verificar instantaneamente ambos os ocupantes, mas prioriza-se o projétil, porque é o mais grave. Em ambas as ocasiões, os objetos são movidos para a frente e depois são movidos para trás. Os encostos de cabeça são importantes porque depois de ir para frente, a cabeça volta para trás, podendo gerar uma lesão cervical. Se o trauma for alto, mata. O encosto deve estar passando na região occipital, isto é, ele deve ficar alto, porque se bater de frente ou alguém bater nas suas costas, você faz o movimento do chicote. Se o encosto ficar alto, quando a cabeça voltar, vai parar na região occipital. Assim, não vai fazer uma hiperextensão da região cervical, sem correr risco de fratura, lesão cervical e/ou lesão medular – no máximo tem torcicolo. Além disso, abaixar muito o encosto das costas do banco faz com que o encosto da cabeça também fique afastado. Ao sentar no carro, preferencialmente, o ângulo da coluna com o fêmur e a coxa tem que ser um pouquinho maior que 90°. Se deitar muito o banco, a cabeça fica muito longe do encosto. Assim, ao fazer aquele movimento de chicote e voltar, ocorre hiperextensão da 5 Louyse Jerônimo de Morais coluna. Dessa forma, quando voltar o movimento para a posição anatômica, se a vertebra explodir, ela vai virar uma faca e vai cortar / contundir / danificar a medula, com alto risco de paraplegia e tetraplegia. 3. Impacto lateral Muito comum em quem não para na placa “Pare”. Existe um deslocamento lateral, então a porta entra, machuca o ocupante no tórax, no abdome, no braço, na bacia, no quadril e na coxa, porque existem contatos do abdome e pelve do lado do motorista e do lado do passageiro. Então, ambos podem apresentar traumas abdominais e pélvicos. • Intrusão da porta: tórax, abdome e pelve, pescoço e cabeça na porta. 4. Impacto rotacional As vítimas mais próximas do ponto de impacto, geralmente têm lesões mais graves. O ponto de impacto é o ponto do carro que bateu primeiro. Quando tem capotamento, é difícil de saber, mas quando é rotacional, é mais fácil de identificar. O carro abaixo bateu a parte traseira com a árvore, então não se procura lesões no motorista, mas sim nos ocupantes mais próximos do ponto de impacto. O ponto de impacto é onde está mais amassado. 5. Capotamento Muitos impactos e vários ângulos, com vítimas ejetadas, sendo difícil identificar quem está grave. A vítima, muitas vezes, está em óbito, principalmente se não estiver usando cinto de segurança. Incompatibilidade de veículos No caso de acidentes de veículos grandes contra veículos pequenos, primeiro deve-se procurar nos veículos pequenos, que são os que sofrem mais e se deformam mais. Primeiro procura lesões de ocupantes do veículo pequeno. • Air bag: importante verificar se o air bag abriu nas colisões frontais e posteriores. Procurar lesões nos membros inferiores de indivíduos que ficaram contidos. • Cinto de segurança: quem determina é o indivíduo que está dirigindo. Colisões de motocicleta O mais comum é o carro sendo o projétil e a moto o alvo. São lesões que causam muitas incapacidades, com muito desrespeito às leis e brigas, bem como mortes. No caso abaixo, a moto foi o projétil. Impacto frontal da moto 6 Louyse Jerônimo de Morais • Colisão com o guidão: trauma de crânio, tórax, abdome, braço, perna, pelve [frequente fratura bilateral do fêmur]. Quando se é arremessado para frente em uma moto, a coxa já bate no guidão e já quebra o fêmur. Procurar lesões em tudo o que é órgão do motoqueiro. Impacto angular Queda sobre o motociclista: a moto cai sobre o motociclista e faz o sanduíche – moto, motociclista e veículo ou moto, motociclista e chão. Então, vamos encontrar lesões de membros superiores e inferiores, bem como lesões abdominais. Ejeção Todo o corpo é a carenagem, então todos devem ser examinados. Muitas vezes se perde pacientes, por conta do excesso de lesões e da gravidade destas. Atropelamentos • Impacto inicial: pernas e, às vezes, quadris. Existe impacto inicial, depois a vítima é arremessada ou passa por cima do carro, o tronco rola sobre o capô, e existe impacto final, que é quando a vítima cai. • Tronco rola sobre o capô • Vítima cai do carro: cabeça e coluna cervical Crianças nos atropelamentos São mais leves, não tem muita ejeção por cima do carro. O carro pode passar por cima e fazer arrastamento. Costumam se virar de frente por curiosidade. Quedas • Altura • Superfície • Investigar parte do corpo que bateu em primeiro lugar: quando não conseguimos nos proteger, ao invés de machucar braços e mãos, bate na cabeça. Quantas vezes a altura para uma queda ser considerada grave? Três vezes a própria altura. • Pés: síndrome de Don Juan – quem cai apoiando os pés. As duas principais lesões ocorrem no pé e na coluna lombar. Se o pé suportar a lesão, ele transmite imediatamentepara a coluna vertebral, então tem que virar o paciente e tocar os processos espinhosos lombares. Não é trauma raquimedular se a queda for de altura pequena. Sempre avaliar calcanhar, porque é o que apoia primeiro, e as vértebras lombares. • Queda com mãos espalmadas: fratura bilateral de “Colles” Se não der tempo virar a mão, faz fratura de Smith. Deformidade em dorso de garfo • Cabeça: coluna cervical – mergulhos. Mergulho em água rasa é um perigo, porque geralmente pulamos de ponta cabeça. Provavelmente, vai bater cabeça, fazer hiperflexão e morrer. Pode bater cabeça sem machucar a coluna cervical, e pode perder o sentido dentro d’água. Mesmo assim, pode-se conseguir respirar, mas pode morrer, porque você vai respirar água, enxarcar os pulmões e vir à óbito. Então, mesmo sem machucar a coluna, mergulho em água rasa pode matar. • Mergulho em água rasa em pé: pode fazer fratura de calcâneo e até trauma raquimedular.
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