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Farmacologia do trato gastrointestinal O trato gastrointestinal é dividido em cavidade oral, esôfago, estômago, intestino delgado e intestino grosso, órgãos que possuem funções específicas e integradas para realizarem os processos de ingestão, digestão, absorção e excreção. Além disso, esses processos precisam da contribuição de alguns órgãos anexos como fígado, pâncreas e glândulas salivares. As células epiteliais do trato gastrointestinal são polarizadas, tendo diferentes proteínas e transportadores distribuídos nas membranas basolateral e apical. As secreções podem ser classificadas conforme sítio de liberação em salivar, gástrica, pancreática, biliar e entérica. A fase gástrica, caracterizada pelo momento em que o alimento passa em direção ao estômago, possui regulação por reflexos vagais longos e reflexos curtos que ativam células efetoras para promover motilidade e liberação de secreções importantes para os processos digestórios. As três regiões do estômago possuem diferentes secreções luminais. As regiões de cárdia e de antro terão produção de muco e bicarbonato, enquanto que as regiões de fundo e corpo produzem H+, fator intrínseco, muco, bicarbonato, pepsinogênio e lipase. As células enterocromafins like (ECL) produzem histamina, as células principais produzem pepsinogênio e lipase gástrica, as células D produzem somatostatina e as células G produzem gastrina. As células parietais ou oxínticas são abundantes no estômago e produzem HCl e fator intrínseco. Quando elas são estimuladas a secretar ácido clorídrico as membranas tubulovesiculares se fundem à membrana plasmática dos canalículos secretores. Na membrana basolateral tem-se a entrada de Cl- por um contratransporte com o bicarbonato. Assim, na membrana apical tem-se saída de cloreto por transporte ativo e saída de H+ por uma bomba de prótons – H+/K+ ATPase, compondo o HCl no lúmen estomacal. Esse processo depende da anidrase carbônica para produção do bicarbonato que será trocado com o cloreto na membrana basolateral. Como estimuladores endógenos da célula parietal tem-se a histamina, a acetilcolina e a gastrina, esses que por diferentes vias ativam a H+/K+ ATPase: ▪ Neurais: a acetilcolina age diretamente nas células parietais via receptores muscarínicos, enquanto que a acetilcolina age indiretamente nas células ECL para estimular a liberação de histamina, substância que agirá nas células parietais para produção de HCl. ▪ Parácrina: a histamina produzida nas células ECL estimula as células parietais a produzirem HCl. ▪ Hormonal: as células G são ativadas e liberam gastrina, que atua para estimular a célula parietal. Como inibidores endógenos da célula parietal tem-se a somatostatina e as prostaglandinas. As células endócrinas (D) na mucosa do antro gástrico percebem a presença de H+ e secretam somatostatina. Ela, então, atua sobre receptores específicos nas células G, para inibir a liberação da gastrina e consequentemente inibição da secreção ácida gástrica. As células mucosas produzem muco e bicarbonato para proteção do epitélio, em decorrência de um estímulo vagal. A mucina é produzida e armazenada em vesículas, sendo secretadas por exocitose, enquanto que o HCO3- é produzido como um gel pegajoso que adere à superfície do estômago, compondo uma barreira química que neutraliza o H+ e a pepsina. Essa barreira de muco é sensível a AINEs, isquemia, estresse e H. pylori. As prostaglandinas inibem a síntese de HCl e estimulam a de muco e bicarbonato, além de aumentar o fluxo sanguíneo. A fisiopatologia das doenças acidopépticas, como doença do refluxo gastroesofágico, úlceras duodenais e gástricas e lesão da mucosa por estresse se resume em um desequilíbrio entre a produção de ácido e os mecanismos de proteção da mucosa. Assim, os fármacos basicamente atuam promovendo um equilíbrio entre os fatores agressivos e protetores. Se o H+ penetra no epitélio gástrico ele causa danos teciduais o que gera liberação de histamina pelos mastócitos promovendo uma resposta inflamatória, que se for leve, resolve o dano, mas se for extensa pode gerar uma úlcera. A H. pylori é uma bactéria Gram negativa rica em urease, em que a amônia tampona o ácido clorídrico e permite sua sobrevivência sobre as células do estômago. Assim, ela produz um quadro de hipergastrinemia por reduzir produção de somatostatina, fato que pode levar a lesões de mucosa e formação de úlceras gástricas e duodenais. O tratamento da infecção por H. pylori é realizado por inibição da secreção ácida combinada com dois ou três antibióticos (como claritromicina, amoxicilina e metronidazol). Além disso, é um microrganismo com fator importante de carcinogênese por induzir uma resposta inflamatória persistente na mucosa. Assim, tem-se formação ou ativação de cancerígenos, danos no DNA e alterações da proliferação celular e da apoptose. A célula parietal produz ácido através de bomba de prótons na membrana luminal, tendo como reguladores positivos gastrina, acetilcolina e histamina por aumentar a ação da hidrogênio potássio ATPase. A gastrina estimula a célula ECL que produzem histamina, agindo indiretamente na produção de ácido. O efeito produtor de muco e bicarbonato por prostaglandinas auxiliam na proteção da mucosa. 1) Antagonistas dos receptores H2 A histamina ativa uma via de sinalização dependente do AMPc e ativa a bomba de prótons para promover a secreção ácida. Os fármacos irão promover uma inibição seletiva, reversível e competitiva nos receptores H2 localizados na membrana basolateral das células parietais, impedindo que a histamina se ligue e ative o receptor. São menos eficazes que os IBPs, mas inibem a secreção ácida em 70% durante 24 horas. Os antagonistas dos receptores H2 são absorvidos rapidamente após administração oral, em que a absorção pode ser aumentada pela presença de alimentos ou diminuída por antiácidos. A tolerância aos efeitos supressores desses fármacos pode se desenvolver em 3 dias após o início do tratamento, podendo não diminuir com o aumento da dose, podendo resultar em uma hipergastrinemia secundária que estimula a liberação de histamina pelas células ECL. Sua eliminação é renal e hepática, de modo que a dose deve ser reduzida em pacientes que apresentem insuficiência desses órgãos. Efeitos adversos: a cimetidina promove a inibição das enzimas do citocromo P450, podendo afetar o metabolismo de alguns fármacos como a varfarina. São fármacos bem tolerados, mas também podem ter efeito de antagonismo do receptor de androgênio, gerando galactorreia e ginecomastia como efeito colateral. Além disso, podem causar cefaleia, diarreia, fadiga, sonolência, entre outros. A cimetidina também tem a capacidade de atravessar a placenta. Usos clínicos: cicatrização de úlceras gástricas e duodenais, tratamento de DRGE, pirose, dispepsia, entre outras. Fármacos: cimetidina, famotidina, ranitidina e nizatidina. 2) Inibidores de bomba de prótons As inibidores de bomba de prótons (IBPs) são os fármacos mais potentes na redução da produção de ácidos, sendo os mais eficazes na cicatrização de úlceras pépticas. Irão agir inibindo irreversivelmente as bombas de prótons, tendo um efeito prolongado na supressão da produção de ácido (24 – 48h). São pró-fármacos que necessitam ser ativados em meio ácido. Após sua absorção na circulação sistêmica ele difunde-se nas células parietais e se retém nos canalículos secretores, não podendo passar novamente pela membrana canalicular. A forma ativada do fármaco se liga de forma covalente à bomba de prótons H+/K+ ATPase, inativando-a irreversivelmente. A secreção de ácido só retorna após a síntese de novas moléculas da bomba e sua inserção na membrana luminal. Como nem todas as bombas ou nem todas as células parietais estão simultaneamente ativas, a supressão máxima da secreção ácida requer várias doses de IBPs (utilizados por 2 a 5 dias).Esses fármacos possuem revestimento entérico (protege os IBP de uma ativação após ingestão), para evitar a ativação precoce. A conduta é que sua administração deve ser feita aproximadamente 30 minutos antes das refeições, já que a administração concomitante com alimentos pode reduzir sua absorção e esse é o tempo para ativação ácida do pró- fármaco. Efeitos adversos: podem causar náuseas, diarreia, dor abdominal, constipação e flatulência. Como são biotransformados por CYP hepáticas (CYP3A4/CYP2C19) podem interferir na eliminação de outros fármacos depurados por essa via. Usos clínicos: possuem efeito em úlceras gástricas e duodenais, na doença do refluxo esofágico, pirose, dispepsia, entre outras. Fármacos: omeprazol, esomeprazol, lansoprazol, rabeprazol e pantoprazol. 3) Antiácidos Os antiácidos são fármacos utilizados na neutralização do ácido clorídrico por utilização de compostos básicos como hidróxido de alumínio e de magnésio. Não são medicamentos tão eficazes, mas são muito utilizados pela acessibilidade e ação rápida. O magnésio aumenta a velocidade de esvaziamento gástrico e aumenta a motilidade intestinal, podendo causar diarreia. Em contraposição, o alumínio causa efeitos contrários, podendo causar constipação intestinal. Todavia, as combinações de hidróxido de Mg2+ (de reação rápida) e de Al3+ (de reação lenta) proporcionam uma capacidade de neutralização relativamente equilibrada e mantida, sendo preferidas pela maioria dos especialistas. O carbonato de cálcio neutraliza o H+ rapidamente e de modo eficaz, mas pode liberar CO2 e causar eructação, náuseas, distensão abdominal e flatulência. Além disso, o cálcio também pode induzir secreção ácida rebote. Efeitos adversos: são fármacos de neutralização rápida e duradoura, tendo poucos efeitos adversos. Todavia, ao alterar o pH gástrico e urinário, os antiácidos podem afetar diversos fármacos, alterando as taxas de dissolução, absorção, biodisponibilidade e eliminação renal. Os antiácidos contendo Al3+ e Mg2+ também são notáveis pela sua propensão a quelar outros fármacos presentes no trato gastrointestinal, reduzindo assim sua absorção. Com isso, devem ser administrados cerca de 2 horas antes ou depois de outros fármacos para reduzir a chance de interações medicamentosas. Uso clínico: úlceras não complicadas, pirose, refluxo gastroesofágico, entre outros. Geralmente a administração em suspensão é mais eficiente que em comprimido. 4) Sucralfato O sucralfato um fármaco citoprotetor utilizado por criar um efeito mucoprotetor gástrico e estimular a produção de prostaglandinas por atividade das cicloxigenases. Além disso, estimula fatores de crescimento de fibroblastos atuando na reparação dos tecidos e aumentando a circulação sanguínea que favorecem a cicatrização com absorção mínima pelo intestino. Possui uma estrutura complexa com uma porção de hidróxido de alumínio e outra com um octossulfato de sacarose, essa que sofre polimerização em ambiente ácido. Assim, produz um polímero viscoso e pegajoso que adere às células epiteliais e as crateras das úlceras durante até 6h após uma única dose. Esse fármaco possui moléculas carregadas negativamente que se ligam a carga positiva de proteínas das mucosas e das células brancas do sangue presentes na base das úlceras. Além disso, atua como uma barreira física a irritantes e tem atividade antibacteriana, tendo mais afinidade pela mucosa lesada do que pela normal. Sua administração deve ser feita em jejum cerca de 30 minutos a 1 hora antes das refeições. Sua absorção é mínima no intestino, de modo que as partículas internalizadas serão eliminadas na urina. Uso clínico: doença do refluxo gastroesofágico, úlceras gástricas e duodenais, gastrite, estomatite aftosa recorrente, entre outras. Efeitos adversos: podem causar constipação e ligação com fármacos, reduzindo sua absorção. Os análogos da prostaglandina, como o misoprostol, podem ser utilizados como citoprotetores por evitar a lesão gástrica pela estimulação da secreção de mucina e bicarbonato, além de aumentar o fluxo sanguíneo da mucosa por promoverem vasodilatação. Todavia, tal fármaco é contraindicado na gravidez por aumentar a contração da musculatura lisa uterina, além de poder promover diarreia e exacerbação da clínica da doença inflamatória intestinal. 5) Procinéticos Os fármacos procinéticos atuam promovendo a regulação de neurotransmissores como dopamina e serotonina com a função de estimular a função motora coordenada e melhorar o trânsito do material no trato gastrointestinal – tratando distúrbios de motilidade como gastroparesias e acalasia do esôfago. Usos clínicos: agem aumentando a pressão do esfíncter esofagiano inferior em casos de DRGE, aumentando o esvaziamento gástrico em gastroparesias ou quadros pós- cirúrgicos com retardo do esvaziamento gástrico, promovem o aumento da motilidade do intestino delgado em íleo pós- operatório e pseudo-obstruções intestinais crônicas, além de serem utilizados em casos de constipação ao aumentarem a motilidade do intestino grosso. Além disso, promovem alívio de náuseas e vômitos que acompanham as síndromes de dismotilidade do trato gastrointestinal. Certos estímulos – como a presença do bolo alimentar ou substâncias irritativas – promovem a liberação de serotonina pelas células enterocromafins, de modo que esse receptor atua em receptores dos neurônios sensoriais, enviando estímulos até interneurônios ascendentes e descendentes do sistema nervoso entérico. Assim, tem-se o estímulo de um neurônio motor excitatório pela liberação de acetilcolina, esse que estimula a contração da região oral. Além disso, tem-se também a ativação de um neurônio motor inibitório com liberação de peptídeo vasoativo intestinal e óxido nítrico para inibir a contração da região caudal – promovendo relaxamento. Desse modo tem-se o movimento peristáltico para movimentação do bolo alimentar. Um fármaco procinético promove um aumento da liberação de acetilcolina por neurônios motores excitatórios, que culmina no aumento das contrações do trato gastrointestinal. Esse processo pode ser realizado por duas vias, envolvendo dopamina ou serotonina. Normalmente o neurônio dopaminérgico libera dopamina, essa que se liga ao neurônio motor excitatório através de receptores do tipo D2, promovendo uma supressão da secreção de acetilcolina, reduzindo a contratilidade do trato gastrointestinal. Assim, um fármaco procinético deve ser um antagonista dopaminérgico por bloquear a ação da dopamina no neurônio motor e impedir essa inibição da secreção de acetilcolina, estimulando a contratilidade. Como exemplos tem-se a metoclopramida e a domperidona. A metoclopramida possui capacidade de atravessar a barreira hematoencefálica e agir como antagonista de D2 no núcleo estriado, processo que culmina em reações extrapiramidais com distonias, discinesia e manifestações parkinsonianas. Além disso, ela atua como antagonista D2 e remove o efeito inibitória da dopamina sobre a prolactina, podendo promover galactorreia e ginecomastia. Também pode sensibilizar receptores muscarínicos do músculo liso e agir como agonista dos receptores 5TH4. Está disponível em preparações orais e injetáveis para administração intravenosa ou intramuscular. A domperidona é um antagonista seletivo de receptores D2 que não atravessa a barreira hematoencefálica e não causa efeitos extrapiramidais, apesar de ainda causar hiperprolactinemia. O pH ácido promove redução de sua absorção, além de sofrer elevado metabolismo de primeira passagem. Além disso, o neurônio motor sofre a ação de um neurônio serotoninérgico, de modo que a serotonina atua em receptores 5HT4 e estimula a liberação de acetilcolina. Assim, o procinético deve ser um agonista de receptores 5HT4. Como exemplos tem-se a cisaprida e a prucaloprida. 6) Antieméticos São fármacos que atuarão em quadrosde náuseas e vômitos. O estímulo do vômito depende do centro emético no bulbo, local que recebe inúmeras informações de regiões como: ▪ Córtex cerebral: geralmente relacionados com vômitos de origem psicológica e aqueles preventivos. ▪ Aparelho vestibular: relacionado com distúrbios do movimento (cinetose), de modo que envolve histamina e acetilcolina, em que a informação é encaminhada ao cerebelo e segue até o centro emético. ▪ Zona do gatilho quimiorreceptora: localizada na zona postrema do quarto ventrículo, em que seus vasos são fenestrados, permitindo o contato e o monitoramento de substâncias eméticas presentes no sangue. Envolverá serotonina (5HT3), dopamina (D2) e acetilcolina (atua em receptores muscarínicos). ▪ Estímulos periféricos do trato gastrointestinal: quando existe um irritante local ou uma substância emética tem-se a liberação de serotonina que atua no receptor 5HT3, em que a informação via nervo vago passa pelo núcleo do trato solitário e é encaminhada ao centro emético. O NTS possui receptores para histamina, acetilcolina e do tipo 5HT3. Assim, como principais neurotransmissores envolvidos no estímulo do vômito tem-se de acetilcolina, serotonina e dopamina, de modo que os fármacos antieméticos devem atuar na regulação dessas moléculas e de seus receptores. Os antagonistas seletivos de receptores 5HT3 estão presentes na zona do gatilho quimiorreceptora, no núcleo do trato solitário e no trato gastrointestinal (liberação de serotonina pelas células enterocromafins), de modo que bloqueiam o estímulo do vômito pela serotonina a nível central e periférico. Os efeitos colaterais desses fármacos geralmente são brandos, mas alguns podem causar prolongamento do intervalo QT, devendo ser usado com cautela nas arritmias. Além disso, podem causar constipação, diarreia, cefaleia e tontura. Podem ser utilizados em náuseas e vômitos induzidos por quimioterapia, radioterapia e pós-operatório, além de controlar náuseas, vômitos, hiperêmese gestacional, entre outros. Não possuem eficácia na cinetose (distúrbios do movimento), já que não se tem receptores serotoninérgicos no aparelho vestibular. Como exemplo de fármacos tem-se ondansetrona, palonosetrona e dolasetrona. Anteriormente os anti-histamínicos eram classificados como antagonistas competitivos e reversíveis do receptor H1 – envolvido principalmente em vômitos induzidos por distúrbios do movimento. Atualmente são considerados agonistas inversos, bloqueando o efeito da histamina. Os anti-histamínicos de primeira geração são mais lipossolúveis em pH fisiológico, de modo que atravessam a barreira hematoencefálica e causam sedação. Além disso, eles não são tão seletivos para receptores H1, em que atuam nos receptores de acetilcolina e causam efeitos anticolinérgicos como boca seca, retenção urinária e ressecamento de vias respiratórias. Como exemplos tem-se a difenidramina e a prometazina. Os de segunda geração não atravessam tanto a barreira hematoencefálica, tendo menores efeitos de sedação. Além disso, são mais seletivos e não causam efeitos anticolinérgicos. Como exemplo tem-se a meclizina. Os anticolinérgicos possuem papel como antieméticos pelo fato de funcionarem como antagonistas seletivos de receptores muscarínicos no núcleo do trato solitário, na zona do gatilho quimiorreceptora e no aparelho vestibular. Como exemplo de fármaco tem-se a escopolamina (Hioscina), essa que é derivada da Atropa belladona e é utilizada na prevenção e tratamento da cinetose. Causa efeitos adversos centrais pela inibição a serotonina, como sonolência, amnésia e fadiga, além de efeitos periféricos como boca seca, retenção urinária e aumento da pressão intraocular. Os antagonistas do receptor da substância P, como o aprepitanto, têm efeito antiemético nas náuseas tardias e melhoram a eficácia dos regimes antieméticos padrão em pacientes que recebem sessões múltiplas de quimioterapia. O aprepitanto é contraindicado para pacientes que recebem cisaprida ou pimozida, nos quais se detectou prolongamento do segmento QT com risco à vida. O dronabinol é um agonista de receptores CB1 altamente lipossolúvel e com rápida absorção oral. Será útil em pacientes que fazem quimioterapia e não respondem aos outros fármacos. Poderá ter como efeitos adversos euforia, tontura, hiperatividade simpática, palpitações, taquicardia, entre outros. Classe do antiemético Exemplos Tipo de vômito com mais eficácia Antagonistas dos receptores dopaminérgicos de ação central Metoclopramida Induzidos por substâncias citotóxicas Antagonistas de receptor 5HT3 Ondansetrona Induzidos por substâncias citotóxicas Antagonistas de receptor H1 Prometazina Cinetose Antagonistas muscarínicos Escopolamina Cinetose Antagonistas do receptor da neurocinina Aprepitanto Vômitos tardios induzidos por substâncias citotóxicas Antagonistas do receptor canabinoide Dronabinol Induzidos por substâncias citotóxicas 7) Laxantes Por dia entra cerca de 9L de água – 2L da dieta e 7L das secreções – no intestino delgado, local que também absorve nutrientes, sendo que 1,5L atravessa a válvula ileocecal para ser absorvido pelo intestino grosso. Desse modo, apenas cerca de 0,1L de água será eliminado nas fezes por dia, porcentagem que pode ser afetada por fatores como por mecanismos neuro-humorais, fármacos, patógenos e alterações da motilidade. A redução da motilidade causa absorção excessiva de líquidos, fato que culmina na produção de fezes endurecidas e impactadas características da constipação – redução da frequência ou dificuldade para evacuar, eliminação de fezes duras ou poucas, ou a sensação de evacuação incompleta. Os opioides são exemplos de fármacos que possuem como efeito adverso a constipação intestinal grave. Laxantes e estratégias na dieta são, com frequência, ineficazes no controle da constipação pelos opioides. Uma estratégia promissora é a prevenção da constipação causada pelo opioide com antagonistas de receptor opioide-μ que atuem na periferia (MOR), origem específica da constipação, sem limitar a analgesia produzida por ação central – como a metilnaltrexona. Inicialmente a constipação pode ser resolvida por aumento da ingestão de fibras, realização de atividade física, maior ingestão de água e criação de hábito para evacuação. Todavia, caso essas ações sejam ineficazes, os laxantes podem ser utilizados no tratamento farmacológico, tendo como mecanismos de ação: ▪ Aumento da retenção de líquidos intraluminais através de mecanismos hidrofílicos ou osmóticos, fato que aumenta o peristaltismo e facilita a evacuação. ▪ Redução da absorção global de líquidos por ações no transporte de líquidos e eletrólitos nos intestinos delgado e grosso atuando nas células absortivas e secretoras. ▪ Alteração da motilidade por inibição das contrações segmentares ou estímulo das contrações propulsoras. De modo geral, os laxantes também podem ser divididos naqueles que são ativos no lúmen intestinal, os estimulantes ou irritantes específicos – que desencadeiam uma reação inflamatória – e os procinéticos. Os laxantes formadores do bolo fecal – como as fibras dietéticas – são porções do alimento que resistem à digestão e chegam inalteradas no intestino grosso. As fibras hidrossolúveis serão fermentadas pelas bactérias colônicas e formarão ácidos graxos de cadeia curta, esses que possuem um efeito procinético para estimular as contrações e um efeito trófico para o epitélio do intestino grosso. Além disso, eles fornecem energia para as bactérias, aumentando a massa bacteriana e o volume do bolo fecal, fato que estimula a evacuação. As fibras insolúveis – como a lignina encontrada no farelo de trigo – são pouco fermentáveis, de modo que aumentam o volume das fezes principalmente por atrair água. Desse modo, fibras determinam o volume, consistência e hidratação das fezes.Os laxantes osmóticos possuem o papel de reter água no lúmen e aumentar o peristaltismo. Como exemplo tem-se os sais de magnésio e fosfato, açúcares não absorvíveis e soluções eletrolíticas do polímero polietilenoglicol (PEG). O PEG pode causar a perda de eletrólitos, de modo que é comercializado em associação com eletrólitos. Os sais atraem a água e promovem a liberação de mediadores inflamatórios como a CCK, aumentando a motilidade por estímulo da peristalse. Os laxantes estimulantes promovem irritação e efeito direto em enterócitos, neurônios intestinais e células da musculatura lisa gastrointestinal, causando uma inflamação branda e limitada. Desse modo, tem-se acúmulo de exsudato inflamatório e absorção água e eletrólitos, aumentando a motilidade. Como exemplos tem-se derivados do difenilmetano (bisacodil), antraquinonas e o ácido ricinoleico. O uso a longo prazo desses laxantes é questionável pelo risco de atonia do cólon (cólon catártico) e de efeitos carcinogênicos. Os agentes umectantes e emolientes fecais – como sais de docusato – irão reduzir a tensão superficial das fezes e favorecer uma melhor mistura entre gordura e água, deixando as fezes menos endurecidas. O óleo mineral é uma mistura de hidrocarbonetos alifáticos retirados da vaselina. O óleo é indigerível e absorvido apenas em pequenas quantidades. Quando o óleo mineral é administrado por via oral durante 2 ou 3 dias, ele penetra e amacia as fezes, podendo interferir na reabsorção da água. Os fármacos procinéticos poderão ser utilizados em casos de constipação crônica e causar aumento do trânsito colônico. Os agonistas do receptor 5HT4, como o tegaserode (parcial) e a prucaloprida (específico), irão estimular a liberação da acetilcolina e aumentar a motilidade intestinal. 8) Antidiarreicos A diarreia é caracterizada pela alteração no transporte intestinal de água e eletrólitos, por aumento na secreção dessas moléculas. Poderá ser classificada em: ▪ Secretora: o fluido luminal é isotônico, sendo causada geralmente por toxinas. ▪ Osmótica: terá fluido luminal hipertônico e geralmente será causada por uma má absorção intestinal, em que o conteúdo do lúmen atrai água. ▪ Exsudativa: geralmente desencadeada por um processo inflamatório. ▪ Por aumento da motilidade: ocasionada por aumento do trânsito intestinal, reduzindo a absorção de água e de eletrólitos. ▪ Congênita por excreção de cloreto: ausência de atividade do trocador Cl/HCO3. No intestino tem-se células absortivas para, principalmente, absorver sódio e cloreto do lúmen para o interstício. Na membrana basolateral tem-se a Na+/K+ ATPase, em que o sódio é jogado para fora da célula e cria um gradiente para que o sódio entre por canais ENaC e por outros transportadores como o SGLT1 e o NHE3 (entra sódio e sai H+). Além disso, o transportador DRA será importante para saída de bicarbonato para o lúmen e internalização de cloreto. Desse modo, nota-se a importância da anidrase carbônica, já que esses processos são dependentes da clivagem do ácido carbônico em H+ e HCO3-. Na diarreia não ocorre a absorção do sódio e do cloreto, fato que ocasiona a saída da água para o lúmen. Sabe-se que o AMPc inibe os transportadores NHE3 e o DRA, de modo que o sódio e o cloreto permanecem no lúmen. Assim, algumas toxinas – como do cólera e da E. coli – irão aumentar as concentrações de AMPc, causando diarreia. Além das células absortivas tem-se células secretoras do intestino, essas que serão importantes para secretar cloreto por meio de canais de cloreto (CFTR), juntamente com a secreção de água por aquaporinas. O AMPc também estimula a atividade do CFTR para saída de cloreto em direção ao lúmen. Para tratamento da diarreia pode-se tentar reduzir a produção de AMPc, como pela utilização de opioides, esses que estimulam indiretamente o NHE3 por tirar a inibição causada pelo AMPc. Eles atuam em receptores presentes nos nervos entéricos, nas células epiteliais e nos músculos promovendo alterações da motilidade intestinal (receptores μ), da secreção intestinal (receptores δ) ou da absorção (receptores μ e δ). Como exemplo de opioides tem-se a loperamida (atividade MOR), essa que reduz a produção de AMPc causada por toxinas e ativa o NHE3, além de aumentar o tônus do esfíncter anal, tendo ação antissecretora e podendo ser utilizada em casos de diarreia crônica ou aguda de causa inespecífica. É um fármaco que não atravessará a barreira hematoencefálica, sendo seguro para usar em casos de diarreia, apesar de poder ter efeitos adversos como distensão abdominal, reações de hipersensibilidade, náuseas, vômitos e constipação intestinal. Em casos de Doença de Crohn, DII e SII pode-se ter risco de megacólon. O difenoxilato é um agonista opioide que será transformado em difenoxina, todavia, atravessará a barreira hematoencefálica e poderá gerar efeitos abusivos. Assim, ele é associado com a atropina para garantir que não tenha dependência. Além disso, a trimebutina e o elixir paregórico funcionam como antidiarreicos opioides. A somatostatina também estimula o receptor NHE3, facilitando a absorção do NaCl e da água. A octreotida – um análogo da somatostatina – poderá ser usada na inibição da diarreia secretora grave associada aos tumores secretores de hormônios do pâncreas e do trato gastrointestinal. Tem curta meia vida (1-2h), que poderá ser prolongada na administração intramuscular do acetato de octreotida. Como efeitos colaterais pode causar náuseas, flatulência, dor no local da injeção, esteatorreia e bradicardia. Os agonistas 2 adrenérgicos estimulam diretamente o NHE3 para melhorar a absorção de sódio. Além disso, agem nos receptores de mesmo nome no músculo liso intestinal, nas células epiteliais e nos neurônios colinérgicos do plexo mioentérico, reduzindo a motilidade e a secreção de fluidos e eletrólitos. Como exemplos tem-se a clonidina, administrada por via oral e tópica (adesivo transdérmico), podendo ter como efeitos adversos hipotensão, depressão e sensação de fadiga. A caboximetilcelulose é um exemplo de fármaco higroscópico, sendo um polímero hidrofílico pouco fermentável que aumenta absorção de água por aumentar o bolo fecal, modificando a consistência e a viscosidade das fezes, reduzindo a sensação de fluidez em quadros de diarreia. Além disso, podem se ligar às toxinas bacterianas e aos sais biliares. O salicilato de bismuto será utilizado por sua ação antissecretora, anti-inflamatória e antimicrobiana. Em pH ácido do estômago será convertido em oxicloreto de bismuto, que é inalterado e não absorvível, de modo que aumenta a massa do bolo fecal e a absorção de água. Todavia, com a clivagem o salicilato terá formação de ácido salicílico, esse que será absorvido e terá efeito anti-inflamatório, mas pode causar síndrome de Reye em grandes quantidades. O trato gastrointestinal contém ampla flora comensal necessária para a saúde. Alterações no equilíbrio ou composição desta flora são responsáveis pelas diarreias associadas ao uso de antibióticos e possivelmente outras doenças. Preparações probióticas contendo uma variedade de cepas bacterianas mostraram algum grau de benefício nas diarreias agudas, diarreias associadas a antibióticos e diarreias infecciosas.
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